A amizade entre o Papa Montini e Jacques Maritain no centro de uma exposição nos Museus do Vaticano

Arte e humanismo integral

 Arte e humanismo integral  POR-008
02 julho 2025

Paolo Ondarza

Uma amizade intelectual que durou cinquenta anos, num período histórico marcado por acontecimentos complexos que abalaram a Europa. A profunda relação de estima entre Giovanni Battista Montini e Jacques Maritain, que se desenvolveu entre os anos 20 e 70 do século passado entre Paris e Roma, está no centro da exposição durante todo o verão nas pequenas salas da Torre Borgia dos Museus do Vaticano. As obras provêm da Coleção de arte moderna e contemporânea desejada e inaugurada no Vaticano por Paulo VI em 1973, ano do falecimento do filósofo neotomista francês que teve vasta influência nas ideias do Concílio Vaticano II e na Carta fundamental dos direitos do homem, apresentam uma perspetiva transversal do intenso debate em volta da arte sacra contemporânea que caraterizou a primeira e a segunda metade do século XX entre a Itália, a França e a Suíça.

Uma reflexão que se inscreve na visão maritainiana mais ampla de um humanismo integral onde razão e fé, liberdade e graça, beleza e verdade encontram uma síntese. A exposição — fruto da colaboração entre os Museus do Vaticano, a Embaixada da França junto da Santa Sé, o Centro cultural São Luís dos Franceses e a Bibliothèque nationale et universitaire de Strasbourg — realiza-se num duplo aniversário: por um lado, os oitenta anos da nomeação de Jacques Maritain como embaixador da França junto da Santa Sé, em 1945; e por outro o sexagésimo aniversário do encerramento do Concílio Vaticano II, em dezembro de 1965. Depois da segunda guerra mundial, durante os anos da experiência diplomática na Cidade eterna, consolidou-se a amizade entre Maritain e Montini, desabrochada em Paris nos anos 20.

O filósofo francês aproximou-se e converteu-se ao catolicismo no início do século XX com a esposa Raïssa, com quem recebeu o batismo em 1906. Nas primeiras décadas do século, o casal deu vida a um intenso cenáculo de alcance internacional, crucial para a reflexão sobre o pensamento cristão contemporâneo, aberto a filósofos, homens de Igreja, artistas, poetas e intelectuais de várias formações, como Paul Claudel e Jean Cocteau. «A reflexão sobre a arte sacra despertou o interesse de todo o mundo intelectual», confirma Micol Forti, curadora da exposição e responsável pela Coleção de arte moderna e contemporânea dos Museus do Vaticano. «Trata-se de um tema que abrangeu a sociedade civil de modo profundo e enraizado através da amizade destas duas personalidades e gigantes do século XX».

O amplo alcance que distinguiu o debate, sinal de grande abertura e de ausência de fechamentos, reflete-se no rico núcleo de obras de arte reunido pelo casal, graças a ofertas recebidas de muitos amigos artistas. Mais tarde, várias delas farão parte da Coleção de arte moderna dos Museus do Vaticano, com outras doadas pelo Cercle des études Jacques et Raïssa Maritain. Algumas são apresentadas pela primeira vez na exposição, que se abriu ao público a 13 de junho. Pinturas, desenhos, gravuras, fotografias, bem como livros de época e testemunhos materiais, contam a história do mundo interior e intelectual das pessoas que gravitavam ao redor de Jacques e Raïssa: de Maurice Denis a Georges Roualt, pintor particularmente apreciado por Maritain; de Émile Bernard a Gino Severini; de Marc Chagall, ligado por uma profunda amizade a Raïssa, com quem partilhava as origens judaicas, a Henri Matisse e ao americano William Congdon, que a família Maritain conheceu nos anos precedentes ao Concílio Vaticano II. «Artistas que, no final do século XIX, lançaram as bases para a superação de uma arte devocional, replicada a partir das formas do passado. Semearam o terreno para que se abrisse um amplo debate sobre a arte sacra. Algumas das obras da exposição são totalmente inéditas, estudadas para esta ocasião», salienta Forti. Estão expostos também retratos de alguns intelectuais importantes da vida cultural do século XX. Particularmente expressivos são aqueles pintados por Jean Guitton: dos filósofos Henri Bergson e Maurice Blondel ao poeta Paul Claudel.

Como testemunho do diálogo de Paulo VI até com as correntes artísticas mais progressistas, na exposição não podia faltar um representante significativo do debate sobre a renovação da arte sacra na França: o padre dominicano Marie-Alain Couturier, líder de uma linha operacional e teórica sob muitos aspetos oposta à de Maritain. Com efeito, o religioso não considerava a fé um requisito necessário para a criação de uma obra de arte cristã. Pelo contrário, a seu ver, era necessária a orientação de mecenas iluminados, capazes de esclarecer aos pintores os objetivos a alcançar. «Couturier, realça a curadora, abre-se à arte abstrata e anicónica, confiando no poder do processo criativo. Na sala que lhe é dedicada, expusemos obras de Matisse, Bazaine, Jean Cocteau e Manessier. Estes quadros retratam as extraordinárias iniciativas que tiveram lugar na França nos anos 40 e 50, quando até artistas agnósticos ou seguidores de outras religiões contribuíram com a própria obra, fantasia e imaginação para a renovação desta linguagem».

Por detrás de cada obra-prima escondem-se histórias às vezes ignoradas. Da gestação espiritual do tema, elaborado nos recônditos da alma do pintor, aos confrontos às vezes inflamados entre pintores e intelectuais sobre a grande questão do modo de dar forma aos temas da fé. Micol Forti concentra-se em particular na Resurrection, uma aquarela inédita de Jean Cocteau: «O artista realiza-a após a conversão ao catolicismo, ocorrida em 1926, e depois oferece-a a Maritain. O pintor representa-se a si próprio pequeno, no canto inferior esquerdo, na presença da visão divina. Esta folha, conservada em casa pelo casal Maritain, foi doada pelo próprio Jacques a Paulo VI, em vista da decisão de instituir uma Coleção de arte contemporânea no Vaticano. Portanto, trata-se de um dom recebido que se tornou fértil graças a outro dom: para selar o vínculo íntimo, mas também público e universal, que a figura do Pontífice mantinha».

A exposição, que estará aberta até 20 de setembro, testemunha que os Museus do Papa não são apenas coleções de arte clássica, renascentista ou barroca: «São uma importante encruzilhada de diálogo com os artistas do século XX, encetada por Paulo VI num dos pontificados intelectualmente mais elevados do século passado», frisa a diretora dos Museus do Vaticano, Barbara Jatta. «A nossa Galeria de arte moderna e contemporânea é testemunho da herança de Montini, bem como da sua atenção ao diálogo com os artistas sobre a representação do invisível, até em formas totalmente inovadoras e anicónicas, pouco tradicionais para a Igreja da época».