Quatro capítulos no sinal da promoção da unidade dos cristãos e da sinodalidade na Igreja

O Credo que é o documento de identidade do cristão

 O Credo que é o documento  de identidade do cristão  POR-005
30 abril 2025

Publicado pela Comissão teológica internacional, o documento “Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador — 1.700º aniversário do Concílio ecuménico de Niceia (325-2025)”, dedicado à assembleia que entrou na história pelo Símbolo que proclama a fé na salvação em Jesus Cristo e no Deus Uno, Pai, Filho e Espírito Santo. Quatro capítulos sob o sinal da promoção da unidade dos cristãos e da sinodalidade na Igreja.

No próximo dia 20 de maio, o mundo cristão faz memória dos 1.700 anos da abertura do primeiro Concílio ecuménico, celebrado em Niceia em 325, que entrou na história principalmente pelo Símbolo que reúne, define e proclama a fé na salvação em Jesus Cristo e no Deus Uno, Pai, Filho e Espírito Santo. Mais tarde completado pelo Concílio de Constantinopla em 381, o Credo niceno tornou-se, na prática, o documento de identidade da fé professada pela Igreja. Por esse motivo, a Comissão teológica internacional (Cti) decidiu dedicar um documento de quase setenta páginas ao Concílio convocado pelo imperador Constantino na Ásia menor, com o duplo objetivo de recordar o seu significado fundamental e destacar os extraordinários recursos do Credo, relançando-os na perspetiva da nova etapa de evangelização que a Igreja é chamada a viver na atual mudança de época. Também porque o aniversário ocorre durante o Jubileu da esperança e coincide com a data da Páscoa para todos os cristãos, no Oriente e no Ocidente.

Por estas razões, Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador — 1.700º aniversário do Concílio ecuménico de Niceia (325-2025), este é o título do documento divulgado a 3 de abril, não é um simples texto de teologia académica, mas propõe-se como síntese que pode acompanhar o aprofundamento da fé e o seu testemunho na vida da comunidade cristã. Afinal, em Niceia, pela primeira vez, a unidade e a missão da Igreja foram expressas a nível universal (por isso foi qualificado como “ecuménico”) na forma sinodal daquele caminhar que lhe é própria, constituindo-se assim também como ponto de referência e inspiração no processo sinodal em que a Igreja católica está imersa hoje.

No documento
trabalharam também duas teólogas

Composto por 124 pontos, o documento é o resultado da decisão da Cti de aprofundar durante o seu décimo quinquénio um estudo sobre a atualidade dogmática de Niceia. O trabalho foi conduzido por uma subcomissão presidida pelo sacerdote francês Philippe Vallin e composta pelos bispos Antonio Luiz Catelan Ferreira e Etienne Vetö, pelos sacerdotes Mario Angel Flores Ramos, Gaby Alfred Hachem e Karl-Heinz Menke, e pelas professoras Marianne Schlosser e Robin Darling Young. O texto foi votado e aprovado de forma específica por unanimidade em 2024 e, em seguida, submetido à aprovação do cardeal presidente Víctor Manuel Fernández, prefeito do Dicastério para a doutrina da fé, no qual a Comissão foi instituída. Depois de receber a aprovação do Papa Francisco, em 16 de dezembro passado o purpurado autorizou a sua publicação. Os quatro capítulos em que se desenvolve a reflexão das teólogas e dos teólogos são precedidos por uma introdução intitulada “Doxologia, teologia e anúncio” e seguidos pela conclusão.

Uma leitura doxológica do Símbolo

O primeiro capítulo “Um Símbolo para a salvação: doxologia e teologia do dogma de Niceia” (nn. 7-47) é o mais amplo. Oferece “uma leitura doxológica do Símbolo, para destacar os seus recursos soteriológicos e, portanto, cristológicos, trinitários e antropológicos”, com a intenção de dar “novo ímpeto ao caminho rumo à unidade dos cristãos”. Ao destacar o alcance ecuménico da fé de Niceia, o texto expressa a esperança de uma data comum para a celebração da Páscoa, que o próprio Papa Bergoglio pediu repetidamente. Com efeito, o n. 43 evidencia como este 2025 representa para todos os cristãos «uma oportunidade inestimável para sublinhar que o que temos em comum é muito mais forte do que o que nos divide: todos juntos, acreditamos no Deus trino, em Cristo verdadeiro homem e verdadeiro Deus, na salvação em Jesus Cristo, de acordo com as Escrituras lidas na Igreja e sob a moção do Espírito Santo. Juntos, acreditamos na Igreja, no batismo, na ressurreição dos mortos e na vida eterna». Consequentemente, adverte a Cti no n. 45, «a divergência dos cristãos em relação à festa mais importante do seu calendário cria desconforto pastoral nas comunidades, a ponto de dividir as famílias, e causa escândalo entre os não-cristãos, prejudicando assim o testemunho dado ao Evangelho».

«Acreditamos como batizamos
e rezamos como acreditamos»

Mas acolher a riqueza de Niceia depois de 17 séculos leva também a perceber como aquele Concílio alimenta e orienta a existência cristã diária: por isso, o segundo capítulo “O Símbolo de Niceia na vida dos crentes” (nn. 48-69), de teor patrístico, explora como a liturgia e a oração foram fecundadas na Igreja desde aquele evento, que constitui um avanço na história do cristianismo «Acreditamos como batizamos e rezamos como acreditamos», recorda o documento, exortando-nos a beber hoje e sempre dessa “fonte de água viva”, cujo rico conteúdo dogmático foi decisivo para estabelecer a doutrina cristã. E, neste sentido, o documento aprofunda a receção do Credo na prática litúrgica e sacramental, na catequese e na pregação, na oração e nos hinos do século iv.

Evento teológico e eclesial

O terceiro capítulo, “Niceia como evento teológico e como evento eclesial” (nn. 70-102), aprofunda como o Símbolo e o Concílio «testemunham o mesmo evento de Jesus Cristo, cuja irrupção na história oferece um acesso inaudito a Deus e introduz uma transformação do pensamento humano» e como eles também representam uma novidade na forma como a Igreja se estrutura e cumpre a sua missão. «Convocado pelo imperador para resolver uma disputa local que se tinha estendido a todas as Igrejas do Império romano do Oriente e a muitas Igrejas do Ocidente — explica o documento — reuniu bispos de várias regiões do Oriente e legados do bispo de Roma. Pela primeira vez, portanto, os bispos de toda a Oikouménè foram reunidos em Sínodo. A sua profissão de fé e as suas decisões canónicas foram promulgadas como normativas para toda a Igreja. A comunhão e a unidade sem precedentes que o evento Jesus Cristo introduziu na Igreja tornam-se visíveis e eficazes de modo novo, através de uma estrutura de alcance universal. O anúncio do Evangelho de Cristo, em toda a sua imensidão, recebe, também ele, um instrumento de autoridade e alcance sem precedentes» (cf. n. 101).

Uma fé acessível até aos simples

Por fim, no quarto e último capítulo, “Manter a fé acessível a todo o povo de Deus” (nn. 103-120), «as condições de credibilidade da fé professada em Niceia são destacadas em uma etapa da teologia fundamental que lança luz sobre a natureza e a identidade da Igreja, na medida em que ela é a intérprete autêntica da verdade normativa da fé por meio do Magistério e a guardiã dos crentes, especialmente dos menores e mais vulneráveis». De acordo com a Cti, a fé pregada por Jesus aos simples não é uma fé simplista e o cristianismo nunca se considerou uma forma de esoterismo reservada a uma elite de iniciados; pelo contrário, Niceia, embora devido à iniciativa de Constantino, representa «um marco no longo caminho em direção à libertas Ecclesiae, que é em toda a parte uma garantia de proteção da fé dos mais vulneráveis face ao poder político». Em 325, o bem comum da Revelação foi realmente “disponibilizado” a todos os fiéis, conforme confirmado pela doutrina católica da infalibilidade “in credendo” do povo dos batizados. Embora os bispos tenham um papel específico na definição da fé, não podem assumi-lo sem estar na comunhão eclesial de todo o Santo Povo de Deus, tão caro ao Papa Francisco.

Atualidade perene do i Concílio ecuménico

Eis, então, as conclusões do documento com «um convite premente» a «anunciar a todos Jesus, nossa Salvação hoje», a partir da fé expressa em Niceia em uma multiplicidade de significados. Em primeiro lugar, a perene atualidade daquele Concílio e do Símbolo que dele brotou está em continuar a deixar-nos «maravilhar pela imensidão de Cristo, para que todos fiquem maravilhados» e «reavivar o fogo do nosso amor por ele», porque «em Jesus homooúsios (consubstancial) ao Pai... foi o próprio Deus que se uniu à humanidade para sempre»; em segundo lugar, significa não ignorar «a realidade» ou afastar-se «dos sofrimentos e das convulsões que atormentam o mundo e parecem comprometer toda a esperança», ouvindo também a cultura e as culturas; em terceiro lugar, significa estarmos «particularmente atentos aos mais pequeninos entre os nossos irmãos e irmãs», porque «estes crucificados da história são o Cristo entre nós», ou seja, «aqueles que mais precisam da esperança e da graça», mas ao mesmo tempo, conhecendo os sofrimentos do Crucificado, são por sua vez «os apóstolos, mestres e evangelizadores dos ricos e abastados»; e, por fim, significa anunciar «como Igreja» ou melhor, «com o testemunho da fraternidade», mostrando ao mundo as maravilhas pelas quais ela, «una, santa, católica e apostólica» é o «sacramento universal da salvação» e, ao mesmo tempo, difundindo o tesouro das Escrituras que o Símbolo interpreta, a riqueza da oração, da liturgia e dos sacramentos que derivam do batismo professado em Niceia e da luz do Magistério; sempre com o olhar fixo no Ressuscitado, que triunfa sobre a morte e o pecado, e não nos adversários, pois não há perdedores no Mistério pascal, exceto o perdedor escatológico, Satanás, o divisor. Não foi por acaso que, no dia 28 de novembro passado, ao receber em audiência os membros da Cti, o Pontífice, elogiando o trabalho deles, falou da utilidade de um documento destinado a «ilustrar o significado atual da fé professada em Niceia... para alimentar a fé dos crentes e, partindo da figura de Jesus, oferecer também pistas e reflexões úteis para um novo paradigma cultural e social, inspirado precisamente na humanidade de Cristo».