
Audiência jubilar
1 de fevereiro
Amados irmãos e irmãs!
O Jubileu é, para as pessoas e para a Terra, um novo início; é um tempo onde tudo tem de ser repensado dentro do sonho de Deus. E sabemos que a palavra “conversão” indica uma mudança de direção. Tudo se pode ver, finalmente, de uma outra perspetiva e, assim, também os nossos passos vão rumo a novas metas. Surge deste modo a esperança que nunca desilude. A Bíblia narra isto de muitas maneiras. E também para nós a experiência da fé foi estimulada pelo encontro com pessoas que na vida souberam mudar e que, por assim dizer, entraram nos sonhos de Deus. De facto, embora no mundo haja tanto mal, nós podemos distinguir quem é diferente: a sua grandeza, que muitas vezes coincide com a pequenez, conquista-nos.
Nos Evangelhos, a figura de Maria Madalena destaca-se por isto de todas as outras. Jesus curou-a com a misericórdia (cf. Lc 8, 2) e ela mudou. Irmãs e irmãos, a misericórdia muda, a misericórdia muda o coração. E Maria Madalena, a misericórdia reconduziu-a aos sonhos de Deus e deu novas metas ao seu caminho.
O Evangelho de João narra o seu encontro com Jesus Ressuscitado de uma forma que nos faz pensar. Várias vezes se repete que Maria se voltou. O Evangelista escolhe bem as palavras! Em lágrimas, Maria olha primeiro para dentro do sepulcro, depois volta-se: o Ressuscitado não está do lado da morte, mas do lado da vida. Pode ser confundido com uma das pessoas que encontramos todos os dias. Depois, quando ouve pronunciar o próprio nome, o Evangelho diz que Maria se volta de novo. É assim que cresce a sua esperança: agora vê o sepulcro, mas não como antes. Pode enxugar as suas lágrimas, porque ouviu o próprio nome: só o seu Mestre o pronuncia assim. O mundo antigo parece ainda existir, mas já não existe. Quando nós sentimos que o Espírito Santo atua nos nossos corações e ouvimos que o Senhor nos chama pelo nome, sabemos distinguir a voz do Mestre?
Queridos irmãos e irmãs, de Maria Madalena, a quem a tradição chamou “apóstola dos apóstolos”, aprendamos a esperança. Entra-se no mundo novo convertendo-se mais do que uma vez. O nosso caminho é um convite constante a mudar de perspetiva. O Ressuscitado leva-nos ao seu mundo, passo a passo, com a condição de que não pretendamos saber já tudo.
Perguntemo-nos hoje: sei voltar-me para ver as coisas de forma diferente, com um olhar diferente? Tenho o desejo de conversão?
Um eu demasiado seguro, demasiado orgulhoso impede-nos de reconhecer Jesus Ressuscitado: também hoje, de facto, o seu aspeto é o de pessoas comuns que facilmente permanecem para trás. Mesmo quando choramos e nos desesperamos, deixamo-lo para trás. Em vez de olharmos para a escuridão do passado, para o vazio de um sepulcro, aprendamos de Maria Madalena a voltar-nos para a vida. Ali espera-nos o nosso Mestre. Ali o nosso nome é pronunciado. Porque na vida real há um lugar para nós, sempre e em todo o lado. Há um lugar para ti, para mim, para cada um. Ninguém o pode tirar, porque foi pensado sempre para nós. É mau, como se diz em linguagem popular, mau deixar a cadeira vazia. Este lugar é para mim, se eu não for para lá... Cada um pode dizer: eu tenho um lugar, eu sou uma missão! Pensai nisto: qual é o meu lugar? Qual é a missão que o Senhor me dá? Que este pensamento nos ajude a tomar uma atitude corajosa na vida. Obrigado!
Primeiras Vésperas
na festa da Apresentação do Senhor
por ocasião do xxix Dia mundial
da vida consagrada
1 de fevereiro
«Eis que venho […] para fazer, ó Deus, a tua vontade» (Hb 10, 7). Com estas palavras, o autor da Carta aos Hebreus manifesta a total adesão de Jesus ao projeto do Pai. Hoje, lemo-las na festa da Apresentação do Senhor, Dia Mundial da Vida Consagrada, durante o Jubileu da Esperança, num contexto litúrgico caraterizado pelo simbolismo da luz. E todos vós, irmãs e irmãos, que escolhestes o caminho dos conselhos evangélicos, vos consagrastes, como «Esposa na presença do Esposo […] envolvida pela sua luz» (São João Paulo ii, Exort. ap. Vita consecrata, 15), àquele mesmo desígnio luminoso do Pai que remonta às origens do mundo. Ele terá a sua plena realização no fim dos tempos, mas já agora se torna visível através das «maravilhas que Deus realiza na frágil humanidade das pessoas chamadas» (ibid., 20). Meditemos, pois, sobre o modo como, através dos votos de pobreza, castidade e obediência que professastes, também vós podeis ser portadores de luz para as mulheres e homens do nosso tempo.
Primeiro aspeto: a luz da pobreza. Ela está radicada na própria vida de Deus, eterno e total dom recíproco do Pai, do Filho e do Espírito Santo (cf. ibid., 21). Exercendo a pobreza, a pessoa consagrada, pelo uso livre e generoso de todas as coisas, com elas faz-se portadora de bênção: manifesta a sua bondade na ordem do amor, rejeita tudo o que pode ofuscar a sua beleza — o egoísmo, a avareza, a dependência, o uso violento e para fins de morte — e abraça, em vez disso, tudo o que a pode exaltar: a sobriedade, a generosidade, a partilha, a solidariedade. Paulo diz: «Tudo é vosso. Mas vós sois de Cristo e Cristo é de Deus» (1 Cor 3, 22-23).
O segundo elemento é a luz da castidade. Também esta tem a sua origem na Trindade e manifesta um «reflexo do amor infinito que une as três Pessoas divinas» (Vita consecrata, 21). Na renúncia ao amor conjugal e no caminho da continência, a sua profissão reafirma o primado absoluto, para o ser humano, do amor de Deus, acolhido com um coração indiviso e esponsal (cf. 1 Cor 7, 32-36), e aponta-o como fonte e modelo de qualquer outro amor. Sabemos que estamos a viver num mundo frequentemente marcado por formas distorcidas de afetividade, em que o princípio “o que me agrada acima de tudo” — este princípio — leva a procurar no outro mais a satisfação das próprias necessidades do que a alegria de um encontro fecundo. É verdade! Isto gera, nas relações, atitudes de superficialidade e precariedade, egocentrismo, hedonismo, imaturidade e irresponsabilidade moral, em que o esposo e a esposa de uma vida inteira são trocados pelo parceiro do momento, e os filhos recebidos como dom são substituídos pelos filhos exigidos como “direito” ou eliminados como “incómodo”.
Irmãs, irmãos, num contexto assim, perante a «necessidade crescente de transparência interior nas relações humanas» (Vita consecrata, 88) e de humanização dos laços entre as pessoas e as comunidades, a castidade consagrada mostra-nos — ao homem e à mulher do século xxi — um caminho para curar o mal do isolamento, no exercício de um modo de amar livre e libertador, que acolhe e respeita todos e não obriga nem rejeita ninguém. Que remédio para a alma é encontrar religiosas e religiosos capazes deste tipo de relacionamento maduro e alegre! Eles são um reflexo do amor divino (cf. Lc 2, 30-32). Para isso, porém, é importante, nas nossas comunidades, cuidar do crescimento espiritual e afetivo das pessoas, já desde a formação inicial, mas também na permanente, para que a castidade mostre verdadeiramente a beleza do amor que se doa, e não surjam fenómenos deletérios como o endurecimento do coração ou a ambiguidade das escolhas, fonte de tristeza, insatisfação e causa, por vezes, em sujeitos mais frágeis, do desenvolvimento de verdadeiras “vidas duplas”. A luta contra a tentação da “vida dupla” é quotidiana.
E chegamos ao terceiro aspeto: a luz da obediência. O texto que escutámos fala-nos também disso, apresentando-nos, na relação entre Jesus e o Pai, a «graça libertadora de uma dependência filial e não servil, rica de sentido de responsabilidade e animada pela confiança recíproca» (Vita consecrata, 21). É precisamente a luz da Palavra que se torna dom e resposta de amor, sinal para a nossa sociedade, na qual se tende a falar muito e a escutar pouco: na família, no trabalho e sobretudo nas redes sociais, onde podemos trocar uma quantidade infinita de palavras e imagens sem nos encontrarmos realmente, porque não nos comprometemos verdadeiramente uns com os outros. E isto é algo interessante. Tantas vezes, no diálogo quotidiano, antes que alguém acabe de falar, já sai a resposta. Não se escuta. Devemos escutar-nos antes de responder; acolher a palavra do outro como uma mensagem, um tesouro, uma ajuda para mim. A obediência consagrada é um antídoto contra esse individualismo solitário, promovendo como alternativa um modelo de relação marcado pela escuta ativa, onde ao “dizer” e ao “ouvir” se segue a concretude do “agir”, e isto também à custa de renunciar aos meus próprios gostos, planos e preferências. Só assim, com efeito, a pessoa pode experimentar profundamente a alegria do dom, superando a solidão e encontrando o sentido da sua existência no grande projeto de Deus.
Gostaria de concluir recordando um outro ponto: o “retorno às origens”, de que tanto se fala hoje na vida consagrada. Mas não um regresso às origens como um voltar a um museu. Não! Que seja precisamente um regresso à origem da nossa vida. A este propósito, a Palavra de Deus que escutámos recorda-nos que o primeiro e mais importante “retorno às origens” de cada consagração é, para todos nós, aquele retorno a Cristo e ao seu “sim” ao Pai. Lembra-nos que a renovação, antes dos encontros e das “mesas redondas” — que se devem fazer e são úteis — se faz diante do Sacrário, na adoração. Irmãs, irmãos, perdemos um pouco o sentido da adoração! Somos demasiado práticos, desejamos fazer as coisas, mas... Adorar! Adorar! A capacidade de adorar em silêncio. Assim se redescobrem as próprias Fundadoras e os próprios Fundadores, sobretudo como mulheres e homens de fé, repetindo com eles, na oração e na oferta: «Eis que venho […] para fazer, ó Deus, a tua vontade» (Hb 10, 7).
Muito obrigado pelo vosso testemunho. É fermento na Igreja. Obrigado!
Angelus
na festa da Apresentação do Senhor
no templo
2 de fevereiro
Amados irmãos e irmãs, bom domingo!
O Evangelho da liturgia de hoje (Lc 2, 22-40) fala-nos de Maria e José que levam o menino Jesus ao Templo de Jerusalém. Segundo a Lei, eles apresentam-no na morada de Deus, para recordar que a vida vem do Senhor. E enquanto a Sagrada Família faz o que sempre se fazia no povo de Israel, de geração em geração, passa-se algo que nunca tinha acontecido antes.
Dois idosos, Simeão e Ana, profetizam sobre Jesus: ambos louvam a Deus e falam do menino «a quantos esperavam a redenção de Jerusalém» (v. 38). As suas vozes comovidas ressoam entre as velhas pedras do Templo, anunciando a realização das expetativas de Israel. Deus está verdadeiramente presente no meio do seu povo: não porque habita entre quatro paredes, mas porque vive como homem entre os homens. É esta a novidade de Jesus. Na velhice de Simeão e Ana, acontece a novidade que muda a história do mundo.
Maria e José, por seu lado, ficaram admirados com as coisas que ouviram (cf. v. 33). Quando Simeão toma o menino nos braços, de facto, chama-o de três maneiras muito bonitas, que merecem reflexão. Três modos, três nomes que lhe dá. Jesus é a salvação; Jesus é a luz; Jesus é sinal de contradição.
Antes de mais, Jesus é a salvação. Assim diz Simeão, rezando a Deus: «Os meus olhos viram a tua salvação, preparada por ti diante de todos os povos» (vv. 30-31). Isto deixa-nos sempre estupefactos: a salvação universal concentrada num só! Sim, porque em Jesus habita toda a plenitude de Deus, do seu Amor (cf. Cl 2, 9).
Segundo aspeto: Jesus é «luz para iluminar os gentios» (v. 32). Como o sol que nasce sobre o mundo, este menino redimirá o mundo das trevas do mal, da dor e da morte. Como temos necessidade, ainda hoje, de luz, desta luz!
Por fim, o menino abraçado por Simeão é sinal de contradição «para que sejam revelados os pensamentos de muitos corações» (v. 35). Jesus revela o critério para julgar toda a história e o seu drama, e também a vida de cada um de nós. E qual é esse critério? É o amor: quem ama vive, quem odeia morre.
Jesus é a salvação, Jesus é a luz, Jesus é o sinal de contradição.
Iluminados por este encontro com Jesus, podemos então interrogar-nos: o que espero eu na minha vida? Qual é a minha grande esperança? O meu coração anseia por ver o rosto do Senhor? Espero a manifestação do seu projeto de salvação para a humanidade?
Rezemos juntos a Maria, Mãe Puríssima, para que nos acompanhe nas luzes e nas sombras da história, nos acompanhe sempre ao encontro do Senhor.
Discurso aos participantes
no Encontro mundial
sobre os direitos das crianças
3 de fevereiro
Majestade
Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Saúdo os Senhores Cardeais e as Personalidades aqui presentes, por ocasião do Encontro mundial sobre os direitos das crianças, intitulado “Amemo-las e protejamo-las”. Obrigado por terdes aceite o convite e estou confiante de que, pondo em comum as vossas experiências e competências, podereis abrir novos caminhos para socorrer e proteger as crianças cujos direitos são espezinhados e ignorados todos os dias.
Ainda hoje, a vida de milhões de crianças é marcada por pobreza, guerra, privação escolar, injustiça e exploração. As crianças e os adolescentes dos países mais pobres, ou dilacerados por conflitos trágicos, são obrigados a enfrentar provações terríveis. Nem sequer o mundo mais rico está imune às injustiças. Onde, graças a Deus, não se sofre devido à guerra ou à fome, no entanto existem periferias difíceis, onde os mais pequeninos são frequentemente vítimas de fragilidades e problemas que não podemos subestimar. Com efeito, muito mais do que no passado, as escolas e os serviços de saúde devem ter em conta crianças já provadas por tantas dificuldades, jovens ansiosos ou deprimidos, adolescentes que enveredam pelos caminhos da agressividade ou da autolesão. Além disso, de acordo com a cultura eficientista, a própria infância, assim como a velhice, é uma “periferia” da existência.
Cada vez mais com mais frequência, quem tem a vida pela frente não consegue olhar para ela com atitude confiante e positiva. Precisamente os jovens, que na sociedade constituem sinais de esperança, têm dificuldade em reconhecer a esperança em si próprios. Isto é triste e preocupante! «Se bem que se torna inevitável viver o presente na melancolia e no tédio, quando o futuro é incerto e impermeável aos sonhos, o estudo não oferece saídas e a falta de emprego ou de um trabalho suficientemente estável corre o risco de suprimir os desejos» (Bula Spes non confundit, 12).
Não é aceitável aquilo a que infelizmente assistimos quase todos os dias nos últimos tempos, ou seja, crianças que morrem sob as bombas, sacrificadas aos ídolos do poder, da ideologia e dos interesses nacionalistas. Na realidade, nada vale a vida de uma criança. Matar os mais pequeninos significa negar o futuro. Em certos casos, os próprios menores são obrigados a combater sob o efeito de drogas. Até nos países onde não há guerra, a violência entre bandos de criminosos torna-se igualmente mortal para os jovens, deixando-os muitas vezes órfãos e marginalizados.
Também o individualismo exasperado dos países desenvolvidos é deletério para os mais pequeninos. Às vezes, são maltratados ou até suprimidos por quantos os deveriam proteger e nutrir; são vítimas de lutas, de desordens sociais ou mentais, e de dependências dos pais.
Muitas crianças morrem como migrantes no mar, no deserto ou nas numerosas rotas de viagens de esperança desesperada. Muitas outras sucumbem por falta de cuidados ou por vários tipos de exploração. São situações diferentes, mas perante as quais fazemos a mesma pergunta: como é possível que a vida de uma criança acabe assim?
Não! Não é aceitável e devemos resistir ao hábito. A infância negada é um clamor silencioso que denuncia a iniquidade do sistema económico, a criminalidade das guerras, a falta de cuidados médicos e de educação escolar. A soma destas injustiças pesa principalmente sobre os mais pequeninos e os mais frágeis. No âmbito das Organizações internacionais, isto chama-se “crise moral global”.
Hoje estamos aqui para dizer que não queremos que tudo isto se torne uma nova normalidade. Não podemos aceitar que nos habituemos a isto. Algumas dinâmicas mediáticas tendem a tornar a humanidade insensível, provocando um endurecimento geral das mentalidades. Corremos o risco de perder o que há de mais nobre no coração humano: a piedade, a misericórdia. Pudemos partilhar várias vezes esta preocupação com alguns de vós, representantes de comunidades religiosas.
Atualmente, mais de quarenta milhões de crianças vivem deslocadas devido aos conflitos e cerca de cem milhões estão desabrigadas. Há o drama da escravatura infantil: aproximadamente cento e sessenta milhões de crianças são vítimas de trabalhos forçados, tráfico, abusos e explorações de todos os tipos, incluindo os casamentos forçados. Existem milhões de crianças migrantes, às vezes com as famílias, mas muitas outras sozinhas: o problema dos menores não acompanhados é cada vez mais frequente e grave!
Muitos outros menores vivem no limbo, porque não foram registados quando nasceram. Estima-se que cento e cinquenta milhões de crianças “invisíveis” não têm existência legal. Isto representa um obstáculo para aceder à escola ou aos cuidados de saúde, mas para elas não há sobretudo a tutela da lei e podem ser facilmente maltratadas ou vendidas como escravos. E isto acontece! Recordemos os pequeninos Rohinghyas, que muitas vezes lutam para ser registados, as crianças indocumentadas na fronteira dos Estados Unidos, as primeiras vítimas daquele êxodo do desespero e da esperança de milhares de pessoas que partem do sul para chegar aos eua, e muitas outras.
Infelizmente, esta história de opressão das crianças repete-se: se perguntarmos aos idosos, aos avôs e avós, sobre a guerra que viveram quando eram crianças, da sua memória sobressai a tragédia: a escuridão — tudo é escuro durante a guerra, as cores quase desaparecem — os cheiros repugnantes, o frio, a fome, a imundície, o medo, a vida errante, a perda dos pais, da casa, o abandono, todos os tipos de violência. Cresci com as histórias da primeira guerra mundial, contadas pelo meu avô, e isto abriu-me os olhos e o coração para o horror da guerra.
Ver com os olhos daqueles que viveram a guerra é a melhor maneira de compreender o valor inestimável da vida. Mas também ouvir as crianças que hoje vivem na violência, na exploração ou na injustiça ajuda a fortalecer o nosso “não” à guerra, à cultura do descarte e do lucro, em que tudo se compra e se vende, sem respeito nem cuidado pela vida, sobretudo a vida pequena e indefesa. Em nome desta lógica do descarte, em que o ser humano se torna todo-poderoso, a vida nascente é sacrificada mediante a prática homicida do aborto. O aborto suprime a vida das crianças e elimina a fonte da esperança de toda a sociedade.
Irmãs e irmãos, é importante escutar: devemos estar conscientes de que as crianças pequenas observam, compreendem e recordam. E, com os seus olhares e silêncios, falam-nos. Escutemo-las!
Prezados amigos, agradeço-vos e encorajo-vos a valorizar ao máximo, com a ajuda de Deus, a oportunidade deste encontro. Rezo a fim de que a vossa contribuição possa ajudar a construir um mundo melhor para as crianças e, portanto, para todos! Enche-me de esperança estarmos aqui, todos juntos, para colocar no centro as crianças, os seus direitos, os seus sonhos, a sua exigência de futuro. Obrigado a todos vós e Deus vos abençoe!
Audiência geral de quarta-feira
5 de fevereiro
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje contemplamos a beleza de Jesus Cristo, nossa esperança, no mistério da Visitação. A Virgem Maria visita Santa Isabel; mas é sobretudo Jesus, no seio da mãe, que visita o seu povo (cf. Lc 1, 68), como diz Zacarias no seu hino de louvor.
Depois da admiração e maravilha por aquilo que lhe foi anunciado pelo Anjo, Maria levanta-se e põe-se a caminho, como todos os chamados da Bíblia, pois «o único ato com que o homem pode corresponder ao Deus que se revela é o da disponibilidade ilimitada» (H.U. von Balthasar, Vocazione, Roma 2002, 29). Esta jovem filha de Israel não decide proteger-se do mundo, não teme os perigos e os julgamentos alheios, mas vai ao encontro dos outros.
Quando alguém se sente amado, experimenta uma força que faz circular o amor; como diz o apóstolo Paulo, «o amor de Cristo constrange-nos» (2 Cor 5, 14), impele-nos, move-nos. Maria sente o impulso do amor e vai ajudar uma mulher que é sua parente, mas é também uma idosa que, depois de longa espera, acolhe uma gravidez inesperada, difícil de enfrentar na sua idade. Mas a Virgem vai ao encontro de Isabel também para partilhar a fé no Deus do impossível e a esperança no cumprimento das suas promessas.
O encontro entre as duas mulheres produz um impacto surpreendente: a voz da “cheia de graça” que saúda Isabel provoca a profecia no menino que a idosa traz no ventre e suscita nela uma dupla bênção: «Bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre!» (Lc 1, 42). E também uma bem-aventurança: «Bem-aventurada sois vós que acreditastes, porque se hão de cumprir as coisas que Senhor vos disse» (v. 45).
Perante o reconhecimento da identidade messiânica do seu Filho e da sua missão de mãe, Maria não fala de si mesma, mas de Deus, elevando um louvor cheio de fé, esperança e alegria, um cântico que ressoa todos os dias na Igreja durante a oração das Vésperas: o Magnificat (Lc 1, 46-55).
Este louvor a Deus salvador, que jorra do coração da sua humilde serva, é um memorial solene que resume e cumpre a prece de Israel. Está imbuído de ressonâncias bíblicas, sinal de que Maria não quer cantar “fora do coro”, mas sintonizar-se com os pais, exaltando a sua compaixão pelos humildes, os pequeninos que, na sua pregação, Jesus declarará «bem-aventurados» (cf. Mt 5, 1-12).
A presença maciça do motivo pascal faz do Magnificat também um cântico de redenção, que tem como pano de fundo a memória da libertação de Israel do Egito. Os verbos estão todos no passado, impregnados de uma memória de amor que acende o presente de fé e ilumina o futuro de esperança: Maria canta a graça do passado, mas é a mulher do presente que no seio traz o futuro.
A primeira parte deste cântico louva a ação de Deus em Maria, microcosmo do povo de Deus que adere plenamente à aliança (vv. 46-50); a segunda dilui-se na obra do Pai no macrocosmo da história dos seus filhos (vv. 51-55), mediante três palavras-chave: memória — misericórdia — promessa.
O Senhor, que se inclinou sobre a pequena Maria para nela fazer “grandes coisas” e para a tornar mãe do Senhor, começou a salvar o seu povo desde o êxodo, recordando-se da bênção universal prometida a Abraão (cf. Gn 12, 1-3). O Senhor, Deus fiel para sempre, fez fluir uma corrente ininterrupta de amor misericordioso, «de geração em geração» (v. 50) sobre o povo fiel à aliança, e agora manifesta a plenitude da salvação no seu Filho, enviado para salvar o povo dos seus pecados. De Abraão a Jesus Cristo e à comunidade dos crentes, a Páscoa aparece assim como a categoria hermenêutica para compreender todas as libertações posteriores, até à realizada pelo Messias na plenitude dos tempos.
Amados irmãos e irmãs, peçamos hoje ao Senhor a graça de saber esperar o cumprimento de todas as suas promessas; e de nos ajudar a acolher na nossa vida a presença de Maria. Colocando-nos na sua escola, todos nós podemos descobrir que cada alma que crê e espera «concebe e gera o Verbo de Deus» (Santo Ambrósio, Exposição do Evangelho segundo Lucas 2, 26).
Mensagem
para o 99º Dia mundial das missões
19 de outubro
Missionários de esperança entre os povos
Queridos irmãos e irmãs!
Para o Dia Mundial das Missões deste Ano Jubilar de 2025, cuja mensagem central é a esperança (cf. Bula Spes non confundit, 1), escolhi o lema “Missionários de esperança entre os povos”, que recorda a cada um dos cristãos e a toda a Igreja, comunidade dos batizados, a vocação fundamental de ser mensageiros e construtores da esperança nas pegadas de Cristo. Faço votos de que seja um tempo de graça para todos, na companhia do Deus fiel que nos regenerou em Cristo ressuscitado «para uma esperança viva» (cf. 1 Pd 1, 3-4); e desejo recordar alguns aspetos relevantes da identidade missionária cristã, para que nos deixemos guiar pelo Espírito de Deus e ardamos de santo zelo por uma nova estação evangelizadora da Igreja, enviada a reanimar a esperança num mundo sobre o qual pesam sombras tenebrosas (cf. Carta enc. Fratelli tutti, 9-55).
1. Nas pegadas de Cristo, nossa esperança
Celebrando, depois do ano 2000, o primeiro Jubileu ordinário do Terceiro Milénio, fixemos o nosso olhar em Cristo, que é o centro da história, «o mesmo ontem, hoje e pelos séculos» (Hb 13, 8). Ele, na sinagoga de Nazaré, declarou o cumprimento da Escritura no “hoje” da sua presença histórica. Deste modo, revelou-se como o Enviado do Pai, com a unção do Espírito Santo, a fim de levar a Boa Nova do Reino de Deus e inaugurar «um ano favorável da parte do Senhor» para toda a humanidade (cf. Lc 4, 16-21).
Neste místico “hoje” que se prolonga até ao fim do mundo, Cristo é o cumprimento da salvação para todos, especialmente para aqueles cuja única esperança é Deus. Na sua vida terrena, Ele «andou de lugar em lugar, fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos» pelo mal e pelo Maligno (cf. At 10, 38), restituindo a esperança em Deus aos necessitados e ao povo. Além disso, experimentou cada uma das fragilidades humanas, exceto a do pecado, passando mesmo por momentos críticos, como na agonia do Getsémani e na cruz, que podiam levar ao desespero. Porém, Jesus tudo entregava a Deus Pai, obedecendo com total confiança ao seu projeto salvífico em favor da humanidade, um projeto de paz por um futuro repleto de esperança (cf. Jr 29, 11). Deste modo, tornou-se o divino Missionário da esperança, modelo supremo de todos aqueles que, ao longo dos séculos, dão seguimento à missão recebida de Deus, mesmo no meio de provações extremas.
Através dos seus discípulos, enviados a todos os povos e acompanhados misticamente por Ele, o Senhor Jesus continua o seu ministério de esperança em favor da humanidade. Ele ainda hoje se inclina sobre cada pobre, aflito, desesperado e oprimido pelo mal, para derramar «sobre as suas feridas o óleo da consolação e o vinho da esperança» (Prefácio Cristo, Bom Samaritano). A Igreja, comunidade dos discípulos-missionários de Cristo, obediente ao seu Senhor e Mestre e com o seu espírito de serviço, prolonga esta missão no meio dos povos, oferecendo a sua vida por todos. Embora tenha de enfrentar, por um lado, perseguições, tribulações e dificuldades e, por outro, as suas próprias imperfeições e quedas devido às fraquezas de cada um dos seus membros, ela é constantemente impelida pelo amor de Cristo a avançar, unida a Ele, neste caminho missionário e a escutar, como Ele e com Ele, o grito da humanidade, ou melhor, o gemido de toda a criatura que espera a redenção definitiva. Eis a Igreja que o Senhor chama desde sempre e para sempre a seguir os seus passos: «Não uma Igreja estática, mas uma Igreja missionária, que caminha com o Senhor pelas estradas do mundo» (Homilia na Santa Missa por ocasião da conclusão da Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, 27 de outubro de 2024).
Por isso, sintamo-nos nós também inspirados a pôr-nos a caminho, seguindo os passos do Senhor Jesus, para nos tornarmos, com Ele e n’Ele, sinais e mensageiros de esperança para todos, em qualquer lugar e circunstância que Deus nos concede viver. Que cada um dos batizados, discípulos-missionários de Cristo, faça brilhar a sua esperança em todos os cantos da terra!
2. Os cristãos, portadores e construtores
de esperança entre os povos
No seguimento de Cristo Senhor, os cristãos são chamados a transmitir a Boa Nova, partilhando as condições concretas de vida daqueles que encontram e tornando-se assim portadores e construtores de esperança. Com efeito, «as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração» (Conc. Ecum. Vat. ii, Const. past. Gaudium et spes, 1).
Esta célebre afirmação do Concílio Vaticano ii, que exprime o sentir e o estilo das comunidades cristãs de todas as épocas, continua a inspirar os seus membros, ajudando-os a caminhar no mundo com os seus irmãos e irmãs. Penso particularmente em vós, missionários e missionárias ad gentes que, correspondendo à chamada divina, partistes rumo a outras nações para dar a conhecer o amor de Deus em Cristo. De todo o coração, muito obrigado! A vossa vida é uma resposta concreta ao mandato de Cristo ressuscitado, que enviou os discípulos a evangelizar todos os povos (cf. Mt 28, 18-20). Assim, recordais a vocação universal dos batizados a ser entre os povos, com a força do Espírito e o empenho quotidiano, missionários da grande esperança que nos foi dada pelo Senhor Jesus.
O horizonte desta esperança ultrapassa as realidades passageiras do mundo e abre-se às divinas, que já podemos saborear no tempo presente. Efetivamente, como recordava São Paulo vi, a salvação em Cristo, que a Igreja oferece a todos como dom da misericórdia de Deus, não é apenas «imanente ao mundo, limitada às necessidades materiais ou mesmo espirituais, e […] em última análise, [identificada] com as aspirações, com as esperanças, com as diligências e com os combates temporais; mas sim uma salvação que ultrapassa todos estes limites, para vir a ter a sua plena realização numa comunhão com o único Absoluto, que é o de Deus: salvação transcendente e escatológica, que já tem certamente o seu começo nesta vida, mas que terá realização completa na eternidade» (Exort. ap. Evangelii nuntiandi, 27).
As comunidades cristãs, animadas por tão grande esperança, podem ser sinais de nova humanidade num mundo que, nas regiões mais “desenvolvidas”, apresenta graves sintomas de crise do humano: sensação generalizada de desorientação, solidão e abandono dos idosos, dificuldade em encontrar disponibilidade para ajudar quem vive ao nosso lado. Nas nações tecnologicamente mais avançadas, a proximidade está a extinguir-se: todos nos encontramos interligados, mas não em relação. A ânsia de eficiência e o apego às coisas e às ambições levam-nos a estar centrados em nós próprios e a ser incapazes de altruísmo. O Evangelho, vivido em comunidade, pode devolver-nos uma humanidade íntegra, saudável e redimida.
Renovo, portanto, o convite a concretizar as ações indicadas na Bula de proclamação do Jubileu (nn. 7-15), com especial atenção aos mais pobres e fracos, aos doentes, aos idosos, aos excluídos da sociedade materialista e consumista. E a fazê-lo com o estilo de Deus, ou seja, com proximidade, compaixão e ternura, cuidando da relação pessoal com os irmãos e irmãs na situação concreta em que se encontram (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium, 127-128). Então, serão eles a ensinar-nos muitas vezes a viver com esperança. E, através do contacto pessoal, poderemos transmitir o amor do Coração compassivo do Senhor. Experimentaremos que «o Coração de Cristo [...] é o núcleo vivo do primeiro anúncio» (Carta enc. Dilexit nos, 32). Com efeito, bebendo desta fonte, é possível oferecer com simplicidade a esperança recebida de Deus (cf. 1 Pd 1, 21), levando aos outros a mesma consolação com que somos consolados por Deus (cf. 2 Cor 1, 3-4). No Coração humano e divino de Jesus, Deus quer falar ao coração de cada pessoa, atraindo todos ao seu Amor. «Fomos enviados para continuar esta missão: ser sinal do Coração de Cristo e do amor do Pai, abraçando o mundo inteiro» (Discurso aos participantes na Assembleia Geral das Pontifícias Obras Missionárias, 3 de junho de 2023).
3. Renovar a missão da esperança
Hoje, perante a urgência da missão da esperança, os discípulos de Cristo são os primeiros convocados a formar-se para serem “artesãos” de esperança e restauradores de uma humanidade, frequentemente, distraída e infeliz.
Para isso, é necessário renovar em nós a espiritualidade pascal, que vivemos em cada celebração eucarística e especialmente no Tríduo Pascal, centro e cume do ano litúrgico. Somos batizados na morte e ressurreição redentora de Cristo, na Páscoa do Senhor que marca a eterna primavera da história. Somos, pois, “gente de primavera”, com um olhar sempre repleto de esperança, a partilhar com todos, porque em Cristo «acreditamos e sabemos que a morte e o ódio não são as últimas palavras» acerca da existência humana (cf. Catequese, 23 de agosto de 2017). Por isso, do Mistério Pascal, que se realiza nas celebrações litúrgicas e nos sacramentos, tiramos continuamente a força do Espírito Santo, com o zelo, a determinação e a paciência para trabalhar no vasto campo da evangelização do mundo. «Cristo ressuscitado e glorioso é a fonte profunda da nossa esperança, e não nos faltará a sua ajuda para cumprir a missão que nos confia» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 275). N’Ele vivemos e damos testemunho daquela santa esperança que é «um dom e uma tarefa para todo o cristão» (La speranza è una luce nella notte, Città del Vaticano 2024, 7).
Os missionários de esperança são homens e mulheres de oração, porque «a pessoa que tem esperança é uma pessoa que reza», como sublinhava o Venerável Cardeal Van Thuan, o qual, graças à força que recebia da oração perseverante e da Eucaristia, manteve viva a esperança na longa tribulação da prisão (cf. F.X. Nguyen Van Thuan, Il cammino della speranza, Roma 2001, n. 963). Não esqueçamos que a oração é a primeira ação missionária e, ao mesmo tempo, «a primeira força da esperança» (Catequese, 20 de maio de 2020).
Renovemos, pois, a missão da esperança a partir da oração, sobretudo daquela que se faz com a Palavra de Deus e, de modo particular, com os Salmos, que são uma grande sinfonia de oração cujo compositor é o Espírito Santo (cf. Catequese, 19 de junho de 2024). Os Salmos educam-nos a ter esperança no meio das adversidades, a distinguir os sinais de esperança e a ter o constante desejo “missionário” de que Deus seja louvado por todos os povos (cf. Sl 41, 12; 67, 4). Rezando, mantemos viva em nós a centelha da esperança, que foi acesa por Deus para que se torne um grande fogo, iluminando e aquecendo todos os que nos rodeiam, também através de ações e gestos concretos inspirados pela mesma oração.
Por fim, a evangelização é sempre um processo comunitário, como o caráter da esperança cristã (cf. Bento xvi, Carta enc. Spe salvi, 14). Este processo não termina com o primeiro anúncio e com o batismo, antes continua com a construção de comunidades cristãs através do acompanhamento de cada batizado a caminho nas vias do Evangelho. Na sociedade moderna, a pertença à Igreja nunca é uma realidade adquirida de uma vez para sempre. Por isso, a ação missionária de transmitir e formar a maturidade da fé em Cristo é «o paradigma de toda a obra da Igreja» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 15), uma obra que exige comunhão de oração e ação. Volto a insistir nesta sinodalidade missionária da Igreja, bem como no serviço das Pontifícias Obras Missionárias em promover a responsabilidade missionária dos batizados e em apoiar as novas Igrejas particulares. E exorto todos vós — crianças, jovens, adultos, idosos — a participar ativamente na comum missão evangelizadora com o testemunho da vossa vida e oração, com os vossos sacrifícios e a vossa generosidade. Muito obrigado por tudo isto!
Queridos irmãos e irmãs, dirijamo-nos a Maria, Mãe de Jesus Cristo, nossa esperança. Para este Jubileu e para os anos futuros, a Ela entregamos o desejo de «que a luz da esperança cristã chegue a cada pessoa, como mensagem do amor de Deus dirigida a todos. E que a Igreja seja testemunha fiel deste anúncio em todas as partes do mundo» (Bula Spes non confundit, 6).
Roma, São João de Latrão
Festa da Conversão de São Paulo
25 de janeiro de 2025.
Francisco
Saudação à delegação
da rede “Talitha Kum”
por ocasião do xi Dia mundial
contra o tráfico de pessoas
7 fevereiro
Queridas irmãs e queridos irmãos!
Estou feliz por me encontrar convosco e por me unir a vós que vos empenhais diariamente contra o tráfico de pessoas. Agradeço em particular a “Talitha Kum” pelo serviço que desempenha. Obrigado!
Encontramo-nos na véspera da festa de Santa Josefina Bakhita, que foi vítima deste terrível flagelo social. A sua história dá-nos muita força, mostrando-nos como, apesar das injustiças e dos sofrimentos suportados, com a graça do Senhor é possível quebrar as correntes, voltar a ser livres e tornar-se mensageiros de esperança para outros que estão em dificuldade.
O tráfico é um fenómeno global que ceifa milhões de vítimas e não pára diante de nada. Encontra sempre novas formas de se insinuar nas nossas sociedades, em todas as latitudes. Perante este drama, não podemos ficar indiferentes e, tal como fazeis vós, devemos unir as nossas forças, as nossas vozes e chamar cada um às suas responsabilidades, para lutar contra esta forma de criminalidade que lucra sobre a pele das pessoas mais vulneráveis.
Não podemos aceitar que tantas irmãs e tantos irmãos sejam explorados de forma tão ignóbil. O comércio dos corpos, a exploração sexual, incluindo de meninos e meninas, o trabalho forçado são uma vergonha e uma violação gravíssima dos direitos humanos fundamentais.
Sei que sois um grupo internacional, alguns de vós vieram de muito longe para esta semana de oração e reflexão contra o tráfico. Agradeço-vos! Felicito de modo especial os jovens embaixadores contra o tráfico que, com criatividade e energia, encontram sempre novas formas para sensibilizar e informar.
Encorajo todas as organizações desta rede e todos os indivíduos que dela fazem parte a continuarem a unir as forças, colocando as vítimas e os sobreviventes no centro, ouvindo as suas histórias, cuidando das suas feridas e amplificando a sua voz. Isto significa ser embaixadores de esperança; e espero que, neste Jubileu, muitas outras pessoas sigam o vosso exemplo.
Abençoo-vos e acompanho-vos com a oração. E também vós, por favor, rezai por mim. Obrigado!
Mensagem
por ocasião do xi Dia mundial de oração
e reflexão para combater o flagelo
do tráfico de pessoas
8 de fevereiro
Embaixadores de esperança:
juntos contra o tráfico de pessoas
Estimados irmãos e irmãs!
É com alegria que me uno a vós no décimo primeiro Dia mundial de oração e reflexão contra o tráfico de pessoas. Este evento celebra-se na memória litúrgica de Santa Josefina Bakhita, mulher e religiosa sudanesa, desde criança vítima do tráfico, que se tornou um símbolo do nosso compromisso contra este terrível fenómeno. Neste ano jubilar, caminhemos juntos como “peregrinos de esperança”, também na vereda do combate ao tráfico.
Mas como é possível continuar a alimentar a esperança diante de milhões de pessoas, sobretudo mulheres e crianças, jovens, migrantes e refugiados, presos nesta escravatura moderna? De onde tirar impulsos sempre novos para lutar contra o comércio de órgãos e tecidos humanos, a exploração sexual de meninos e meninas, o trabalho forçado, inclusive a prostituição, o tráfico de drogas e de armas? Como podemos constatar tudo isto no mundo, sem perder a esperança? Unicamente levantando o olhar para Cristo, nossa esperança, podemos encontrar a força de um compromisso renovado que não se deixa vencer pela dimensão dos problemas e dos dramas, mas que na escuridão se esforça por acender fachos de luz que, juntas, podem iluminar a noite até ao romper da aurora.
Os jovens que no mundo inteiro lutam contra o tráfico oferecem-nos um exemplo: dizem-nos que devemos tornar-nos embaixadores de esperança e agir em conjunto, com tenacidade e amor; que é preciso estar ao lado das vítimas e dos sobreviventes.
Com a ajuda de Deus, podemos evitar habituar-nos à injustiça, afastar a tentação de pensar que certos fenómenos não podem ser debelados. O Espírito do Senhor ressuscitado sustenta-nos na promoção, com coragem e eficácia, de iniciativas que visam debilitar e combater os mecanismos económicos e criminosos que lucram com o tráfico e a exploração. Ensina-nos, em primeiro lugar, a escutar, com proximidade e compaixão, as pessoas que viveram a experiência do tráfico, a ajudá-las a levantar-se e, com elas, a identificar as melhores maneiras de libertar outros e de fazer prevenção.
O tráfico é um problema complexo, em constante evolução, e é alimentado por guerras, conflitos, carestias e consequências das mudanças climáticas. Por conseguinte, exige respostas globais e um esforço comum, a todos os níveis, para o debelar.
Portanto, convido todos vós, de modo especial os representantes dos governos e das organizações que compartilham este compromisso, a unir-vos a nós, animados pela oração, para promover iniciativas em defesa da dignidade humana, para a eliminação do tráfico de pessoas em todas as suas formas e para a promoção da paz no mundo.
Juntos — confiando na intercessão de Santa Bakhita — podemos envidar um grande esforço e criar as condições a fim de que o tráfico e a exploração sejam banidos e prevaleça sempre o respeito pelos direitos humanos fundamentais, no reconhecimento fraterno da humanidade comum.
Irmãs e irmãos, agradeço-vos a coragem e a tenacidade com que realizais este trabalho, envolvendo tantas pessoas de boa vontade. Ide em frente com esperança no Senhor, que caminha convosco! Abençoo-vos de coração. Rezo por vós, e vós orai por mim!
Vaticano, 4 de fevereiro de 2025
Francisco
Homilia da missa
para o Jubileu das forças armadas
polícia e segurança
9 de fevereiro
A atitude de Jesus no lago de Genesaré é descrita pelo evangelista com três verbos: viu, subiu, sentou-se. Jesus viu, Jesus subiu, Jesus sentou-se. Jesus não está preocupado em dar uma imagem de si mesmo às multidões, em executar uma tarefa, em seguir um cronograma; pelo contrário, coloca sempre em primeiro lugar o encontro com os outros, a relação, a preocupação com aqueles trabalhos e fracassos que muitas vezes sobrecarregam o coração e tiram a esperança.
Foi por isso que naquele dia Jesus viu, subiu e sentou-se.
Antes de mais, Jesus viu. Ele tem um olhar atento que lhe permite, mesmo no meio de tanta gente, avistar dois barcos atracados na margem e notar a desilusão no rosto daqueles pescadores, que, depois de uma noite que correu mal, lavam as redes vazias. E Jesus dirige [para eles] o seu olhar cheio de compaixão... Não esqueçamos isto: a compaixão de Deus! As três atitudes de Deus são a proximidade, a compaixão e a ternura. Não esqueçamos: Deus é próximo, Deus é terno, Deus é compassivo, sempre. E Jesus dirige aquele olhar cheio de compaixão para os olhos daquelas pessoas, captando o seu desânimo, a frustração de terem trabalhado toda a noite sem apanhar nada, o sentimento de terem o coração vazio, tal como as redes que agora seguram nas mãos.
E agora desculpem-me, mas peço ao Mestre [das Cerimónias litúrgicas] que continue a ler, devido a dificuldades em respirar.
E, vendo o seu desânimo, Jesus subiu. Pede precisamente a Simão que afaste o barco da terra e sobe a bordo, entrando no espaço da vida de Pedro e abrindo caminho naquele fracasso que habita o seu coração. E isto é bonito: Jesus não se limita a observar as coisas que não correm bem, como nós fazemos muitas vezes, acabando por nos fecharmos em lamentos e amarguras; em vez disso, Ele toma a iniciativa, vai ao encontro de Simão, detém-se com ele naquele momento difícil e decide subir para a barca da sua vida, que naquela noite regressou à terra sem nenhum resultado.
Por fim, tendo subido, Jesus sentou-se. Nos Evangelhos, esta é a postura típica do mestre, daquele que ensina. Efetivamente, o Evangelho diz que ele se sentou e ensinou. Depois de ter visto nos olhos e no coração daqueles pescadores a amargura de uma noite de trabalho em vão, Jesus sobe a bordo do barco para ensinar, isto é, para anunciar a boa nova, para levar luz àquela noite de desilusão, para narrar a beleza de Deus no meio das dificuldades da vida humana, para fazer sentir que, mesmo quando tudo parece perdido, ainda há esperança.
E é aí que acontece o milagre: quando o Senhor sobe para o barco da nossa vida trazendo-nos a boa nova do amor de Deus que sempre nos acompanha e sustenta, então a vida recomeça, a esperança renasce, o entusiasmo perdido retorna e podemos lançar de novo as redes ao mar.
Irmãos e irmãs, esta palavra de esperança acompanha-nos hoje ao celebrarmos o Jubileu das Forças Armadas, Polícia e Segurança, a quem agradeço o serviço prestado, saudando todas as Autoridades presentes, as Associações e Academias Militares, bem como os Ordinários castrenses e os Capelães. A vós está confiada uma grande missão, que abrange múltiplas dimensões da vida social e política: a defesa dos nossos países, o empenho em prol da segurança, a guarda da legalidade e da justiça, a presença nas prisões, a luta contra a criminalidade e as diferentes formas de violência que ameaçam perturbar a paz social. E recordo ainda aqueles que prestam o seu importante serviço em situação de catástrofes naturais, na salvaguarda da criação, no resgate de vidas em alto mar, na defesa dos mais frágeis, na promoção da paz.
Também a vós o Senhor pede para fazerdes como Ele: ver, subir, sentar-se. Ver, porque sois chamados a manter um olhar atento, capaz de captar as ameaças ao bem comum, os perigos que pairam sobre a vida dos cidadãos, os riscos ambientais, sociais e políticos a que estamos expostos. Subir, porque as vossas divisas, a disciplina que vos forjou, a coragem que vos distingue, o juramento que prestastes, são tudo coisas que vos recordam o quanto é importante não só ver o mal para o denunciar, mas subir a bordo do barco que está numa tempestade e, com a missão ao serviço do bem, da liberdade e da justiça, empenhar-se para que ele não afunde. E, finalmente, sentar-se, porque a vossa presença nas nossas cidades e bairros, o modo como estais sempre do lado da legalidade e dos mais fracos, torna-se ensinamento para todos nós: ensina-nos que, apesar de tudo, o bem pode vencer; ensina-nos que a justiça, a lealdade e a paixão cívica continuam a ser valores necessários hoje em dia; ensina-nos que podemos criar um mundo mais humano, mais justo e mais fraterno, apesar das forças contrárias do mal.
E nesta missão, que compreende toda a vossa vida, sois também acompanhados pelos capelães, que são uma presença sacerdotal importante no meio de vós. Eles não servem — como por vezes e infelizmente aconteceu na história — para abençoar atos perversos de guerra. Não! Eles encontram-se no meio de vós como a presença de Cristo, que quer acompanhar-vos, ouvir-vos e oferecer-vos a sua proximidade, dar-vos coragem para vos fazerdes ao largo e apoiar-vos na missão que desempenhais todos os dias. Como apoio moral e espiritual, eles caminham convosco, ajudando-vos a realizar as vossas tarefas à luz do Evangelho e ao serviço do bem.
Queridos irmãos e irmãs, estamos muito gratos pelo que fazeis, por vezes correndo riscos pessoais. Obrigado porque, subindo a bordo dos nossos barcos em perigo, nos ofereceis a vossa proteção e nos encorajais a continuar a nossa travessia. Mas gostaria também de vos exortar a não perder de vista o propósito do vosso serviço e das vossas ações: promover a vida, salvar a vida, defender sempre a vida. Por favor, peço-vos que sejais vigilantes: vigilantes contra a tentação de cultivar um espírito de guerra; vigilantes para não vos deixardes seduzir pelo mito da força e pelo rumor das armas; vigilantes para não serdes contaminados pelo veneno da propaganda do ódio, que divide o mundo entre amigos a defender e inimigos a combater. Em vez disso, sede testemunhas corajosas do amor de Deus Pai, que nos quer todos irmãos. E, juntos, caminhemos para construir uma nova era de paz, justiça e fraternidade.
Angelus do v domingo
do tempo comum
9 de fevereiro
Prezados irmãos e irmãs!
Antes de concluir a celebração, desejo saudar todos vós, que destes vida a esta peregrinação jubilar das Forças Armadas, da Polícia e da Segurança. Agradeço pela sua presença às ilustres Autoridades civis e, pelo seu serviço pastoral, aos Ordinários militares e aos Capelães. Estendo a minha saudação a todos os militares do mundo e gostaria de recordar o ensinamento da Igreja a este respeito. O Concílio Vaticano ii afirma: «Aqueles que se dedicam ao serviço da pátria no exército, considerem-se servidores da segurança e da liberdade dos povos» (Constituição pastoral Gaudium et spes, 79). Este serviço armado deve ser exercido apenas em legítima defesa, nunca para impor o domínio sobre outras nações, observando sempre as convenções internacionais em matéria de conflitos (cf. ibid.) e, ainda antes, no sagrado respeito pela vida e pela criação.
Irmãos e irmãs, rezemos pela paz, na martirizada Ucrânia, na Palestina, em Israel e em todo o Médio Oriente, em Myanmar, no Kivu, no Sudão. Silenciem-se as armas em toda a parte e escute-se o grito dos povos, que pedem paz!
Confiemos a nossa oração à intercessão da Virgem Maria, Rainha da Paz.
Mensagem à cimeira
sobre a inteligência artificial
que se realizou em Paris
10 e 11 de fevereiro
Senhor Presidente
Excelências, ilustres participantes!
Tomei conhecimento da vossa louvável iniciativa de realizar uma cimeira sobre a inteligência artificial, em Paris, a 10 e 11 de fevereiro de 2025. Soube que Vossa Excelência, Senhor Presidente, quis dedicar esta cimeira à ação em matéria de inteligência artificial.
Durante o nosso encontro, na Apúlia, no âmbito do g7, tive a oportunidade de salientar a urgência de «garantir e proteger um espaço de controle significativo do ser humano sobre o processo de escolha dos programas de inteligência artificial». De facto, considerava que sem estes mecanismos, a inteligência artificial, embora sendo um novo instrumento «fascinante», poderia mostrar o seu lado mais «tremendo», tornando-se uma ameaça para a dignidade humana (cf. Discurso na sessão do g7 sobre a Inteligência artificial).
Por isso, felicito-vos pelos esforços realizados, com coragem e determinação, para enveredar por um percurso político destinado a proteger a humanidade contra um uso da inteligência artificial que «limita a visão do mundo a realidades expressáveis em números e encerradas em categorias preconcebidas, excluindo o contributo de outras formas de verdade e impondo modelos antropológicos, socioeconómicos e culturais uniformes» (ibid.); e pelo facto de na cimeira de Paris terdes querido envolver o maior número possível de atores e de peritos numa reflexão que visa produzir resultados concretos.
Na minha última Carta encíclica, Dilexit nos, quis distinguir a categoria dos algoritmos da do “coração”, conceito-chave defendido pelo grande filósofo e cientista Blaise Pascal, a quem dediquei uma Carta apostólica por ocasião do quarto centenário do seu nascimento (cf. Sublimitas et miseria hominis , 2023), para sublinhar que, se os algoritmos podem ser usados para enganar o homem, o “coração”, entendido como a sede dos sentimentos mais íntimos e mais verdadeiros, nunca o poderá enganar (cf. Carta encíclica Dilexit nos, nn. 14.20).
A todos os que participarão na cimeira de Paris, peço que não esqueçam que é apenas do “coração” do homem que provém o sentido da sua existência (cf. Blaise Pascal, Pensamentos). Convido a acolher como axiomático o princípio expresso com tanta elegância por um outro grande filósofo francês, Jacques Maritain: «O amor vale mais do que a inteligência» (Jacques Maritain, Reflexões sobre a inteligência, 1938).
Os vossos esforços, caros participantes, são um exemplo brilhante de uma política sadia que quer inscrever as novidades tecnológicas num projeto que visa o bem comum, para «abrir caminho a oportunidades diferentes, que não implicam frenar a criatividade humana nem o seu sonho de progresso, mas orientar esta energia por novos canais» (Laudato si’, n. 191).
Estou convencido de que a inteligência artificial pode tornar-se um instrumento poderoso para os cientistas e os peritos que procuram em conjunto soluções inovadoras e criativas a favor da eco sustentabilidade do nosso planeta. Sem esquecer que o consumo de energia associado ao funcionamento das infraestruturas de inteligência artificial é, em si mesmo, muito elevado.
Já na minha Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2024, dedicada à inteligência artificial, salientei que «nos debates sobre a regulamentação da inteligência artificial, dever-se-ia ter em conta as vozes de todas as partes interessadas, incluindo os pobres, os marginalizados e outros que muitas vezes permanecem ignorados nos processos de decisão globais». (Mensagem para o 57º Dia Mundial da Paz, 1 de janeiro de 2024). Nesta perspetiva, faço votos de que a cimeira de Paris se empenhe na criação de uma plataforma de interesse público sobre a inteligência artificial; e para que cada nação possa encontrar na inteligência artificial um instrumento de por um lado desenvolvimento e por outro de luta contra a pobreza, e de tutela das culturas e das línguas locais. Só assim todos os povos da terra poderão contribuir para a criação de dados, que serão utilizados pela inteligência artificial, representando a verdadeira diversidade e riqueza que caracterizam toda a humanidade.
Este ano, o Dicastério para a Doutrina da Fé e o Dicastério para a Cultura e a Educação colaboraram na redação de uma Nota sobre «Inteligência Artificial e Inteligência Humana». Nesse documento, publicado a 28 de janeiro, foram examinadas diversas questões específicas relativas à inteligência artificial, que a atual cimeira está a abordar, bem como outras que me preocupam particularmente. Para o futuro, espero que os trabalhos das próximas cimeiras, que deveriam dar seguimento à presente, examinem mais detalhadamente os efeitos sociais da inteligência artificial nas relações humanas, na informação e na educação. A questão fundamental, porém, continua e continuará sempre a ser antropológica, ou seja: se «o homem, enquanto homem», no contexto do progresso tecnológico, se tornará «verdadeiramente melhor, isto é, mais amadurecido espiritualmente, mais consciente da dignidade da sua humanidade, mais responsável, mais aberto para com os outros, em particular para com os mais necessitados e os mais fracos» (Carta encíclica Redemptor hominis, n. 15). O nosso desafio último é o homem e continuará a ser sempre o homem; nunca o esqueçamos. Obrigado, senhor Presidente, e obrigado a todos os que contribuíram para esta Cimeira.
Vaticano, 7 de fevereiro de 2025
Francisco
Audiência geral de quarta-feira
12 de fevereiro
Caríssimos irmãos e irmãs, bom dia!
No nosso percurso jubilar de catequeses sobre Jesus, que é a nossa esperança, meditemos hoje sobre o acontecimento do seu nascimento em Belém.
O Filho de Deus entra na história, fazendo-se nosso companheiro de caminho, e começa a viajar quando ainda está no seio materno. O evangelista Lucas narra-nos que, assim que foi concebido, partiu de Nazaré para a casa de Zacarias e Isabel; e depois, quando a gravidez já terminou, de Nazaré rumo a Belém, para o recenseamento. Maria e José são obrigados a ir para a cidade do rei David, onde também José tinha nascido. O Messias há tanto esperado, o Filho do Deus altíssimo, deixa-se contabilizar, isto é, ser contado e recenseado, como qualquer cidadão. Submete-se ao decreto de um imperador, César Augusto, que se julga senhor de toda a terra.
Lucas insere o nascimento de Jesus num «tempo exatamente datável» e num «ambiente geográfico exatamente indicado», de tal modo que «o universal e o concreto se tocam» (Bento xvi, A infância de Jesus, 2012, 77). Deus, que entra na história, não desarticula as estruturas do mundo, mas quer iluminá-las e recriá-las a partir de dentro.
Belém significa «casa do pão». Foi ali que, para Maria, se cumpriram os dias do parto e foi ali que nasceu Jesus, pão descido do céu para saciar a fome do mundo (cf. Jo 6, 51). O anjo Gabriel tinha anunciado o nascimento do Rei messiânico no sinal da grandeza: «Eis que conceberás e darás à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus dar-lhe-á o trono do seu pai David; reinará eternamente na casa de Jacob, e o seu reino não terá fim» (Lc 1, 32-33).
No entanto, Jesus nasce de modo totalmente inédito para um rei. Com efeito, «quando estavam naquele lugar, completaram-se para ela os dias do parto. Deu à luz o seu filho primogénito e, envolvendo-o em faixas, reclinou-o numa manjedoura, pois para eles não havia lugar na hospedaria» (Lc 2, 6-7). O Filho de Deus não nasce num palácio real, mas na parte de trás de uma casa, no espaço onde estão os animais.
Assim, Lucas mostra-nos que Deus não vem ao mundo com proclamações retumbantes, não se manifesta no clamor, mas inicia o seu caminho na humildade. E quem são as primeiras testemunhas deste acontecimento? São alguns pastores: homens de pouca cultura, malcheirosos devido ao contacto constante com os animais, vivem à margem da sociedade. Contudo, eles exercem a profissão através da qual o próprio Deus se dá a conhecer ao seu povo (cf. Gn 48, 15; 49, 24; Sl 23, 1; 80, 2; Is 40, 11). Deus escolhe-os como destinatários da notícia mais bonita que jamais ressoou na história: «Não tenhais medo: eis que vos anuncio uma boa nova, que será alegria para todo o povo: hoje, na cidade de David, nasceu para vós um Salvador, que é Cristo Senhor. Este será o sinal para vós: encontrareis um recém-nascido envolto em faixas e reclinado numa manjedoura» (Lc 2, 10-12).
O lugar para ir ao encontro do Messias é uma manjedoura. Com efeito, acontece que, depois de tanta espera, «para o Salvador do mundo, para Aquele por quem todas as coisas foram criadas (cf. Cl 1, 16), não há lugar» (Bento xvi, A infância de Jesus, 2012, 80). Assim, os pastores descobrem que, num lugar extremamente humilde, reservado aos animais, nasce para eles o Messias há tanto esperado, para ser o seu Salvador, o seu Pastor. Uma notícia que abre o seu coração à admiração, ao louvor e ao anúncio jubiloso. «Ao contrário de tanta gente ocupada a fazer muitas outras coisas, os pastores tornam-se as primeiras testemunhas do essencial, isto é, da salvação que nos é oferecida. São os mais humildes e os mais pobres que sabem acolher o acontecimento da Encarnação» (Carta apostólica Admirabile signum, 5).
Irmãos e irmãs, peçamos também nós a graça de ser, como os pastores, capazes de admiração e louvor diante de Deus, e capazes de preservar o que Ele nos confiou: os talentos, os carismas, a nossa vocação e as pessoas que coloca ao nosso lado. Peçamos ao Senhor para saber vislumbrar na debilidade a força extraordinária do Deus Menino, que vem para renovar o mundo e transformar a nossa vida com o seu desígnio cheio de esperança para toda a humanidade.
Homilia da missa
para o jubileu dos artistas
e do mundo da cultura
16 de fevereiro
No Evangelho que acabámos de escutar, Jesus proclama as bem-aventuranças diante dos seus discípulos e de uma multidão de pessoas. Já as ouvimos muitas vezes e, no entanto, não deixam de nos maravilhar: «Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus. Felizes vós, os que agora tendes fome, porque sereis saciados. Felizes vós, os que agora chorais, porque haveis de rir» (Lc 6, 20-21). Estas palavras contradizem a lógica do mundo e convidam-nos a olhar a realidade com olhos novos, com o olhar de Deus, que vê para além das aparências e reconhece a beleza, até mesmo na fragilidade e no sofrimento.
A segunda parte contém palavras duras e de repreensão: «ai de vós, os ricos, porque recebestes a vossa consolação! Ai de vós, os que estais agora fartos, porque haveis de ter fome! Ai de vós, os que agora rides, porque gemereis e chorareis!» (Lc 6, 24-25). O contraste entre “felizes vós” e “ai de vós” recorda-nos a importância de discernir onde colocamos a nossa segurança.
Vós, artistas e pessoas de cultura, sois chamados a ser testemunhas da visão revolucionária das bem-aventuranças. A vossa missão não se limita a criar beleza, mas a revelar a verdade, a bondade e a beleza escondidas nos recantos da história, a dar voz a quem não tem voz, a transformar a dor em esperança.
Vivemos numa época de crises complexas, que são económicas e sociais mas, antes de mais, são crises da alma, crises de sentido. Coloquemo-nos a questão do tempo e a questão do rumo. Somos peregrinos ou errantes? Caminhamos com uma meta ou andamos à deriva, perdidos? O artista é aquele ou aquela que tem a função de ajudar a humanidade a não se desnortear, a não perder o horizonte da esperança.
Mas atenção: não é uma esperança fácil, superficial e desencarnada. Não! A verdadeira esperança entrelaça-se com o drama da existência humana. Não é um refúgio confortável, mas um fogo que arde e ilumina, como a Palavra de Deus. Por isso, a arte autêntica é sempre um encontro com o mistério, com a beleza que nos supera, com a dor que nos interpela, com a verdade que nos chama. Caso contrário, “ai [de nós]”! O Senhor é severo no seu apelo.
Como escreve o poeta Gerard Manley Hopkins, «o mundo está pleno da grandeza de Deus. / Seu fulgor inflama, qual lâmina fulgurante». Eis a missão do artista: descobrir e revelar essa grandeza escondida, torná-la acessível aos nossos olhos e aos nossos corações. O mesmo poeta ouvia também no mundo um “eco de chumbo” e um “eco de ouro”. O artista é sensível a estas ressonâncias e, com a sua obra, realiza um discernimento e ajuda os outros a discernir no meio dos diferentes ecos dos acontecimentos deste mundo. Os homens e as mulheres de cultura são chamados a avaliar estes ecos, a explicar-no-los e a iluminar o caminho por onde nos conduzem: se são cantos de sereia que seduzem ou apelos da nossa mais verdadeira humanidade. Pede-se-vos a sabedoria para distinguir o que é como «como a palha que o vento leva», do que é sólido «como a árvore plantada à beira da água corrente» e capaz de dar fruto (cf. Sl 1, 3-4).
Queridos artistas, vejo em vós guardiães da beleza que sabe inclinar-se sobre as feridas do mundo, que sabe escutar o grito dos pobres, dos sofredores, dos feridos, dos presos, dos perseguidos, dos refugiados. Vejo em vós guardiães das bem-aventuranças! Vivemos num tempo em que se erguem novos muros, em que as diferenças se tornam um pretexto para a divisão, em vez de serem uma oportunidade de enriquecimento recíproco. Mas vós, homens e mulheres de cultura, sois chamados a construir pontes, a criar espaços de encontro e diálogo, a iluminar as mentes e a aquecer os corações.
Alguns poderão dizer: “Mas para que serve a arte num mundo ferido? Não há coisas mais urgentes, mais concretas e mais necessárias?”. A arte não é um luxo, mas uma necessidade do espírito. Não é uma fuga, mas uma responsabilidade, um convite à ação, um apelo, um grito. Educar para a beleza significa educar para a esperança. E a esperança nunca está separada do drama da existência: ela atravessa a luta quotidiana, as fadigas da vida, os desafios deste nosso tempo.
No Evangelho que escutámos hoje, Jesus proclama felizes os pobres, os aflitos, os mansos, os perseguidos. É uma lógica invertida, uma revolução da perspetiva. A arte é chamada a participar nesta revolução. O mundo precisa de artistas proféticos, de intelectuais corajosos, de criadores de cultura.
Deixai-vos guiar pelo Evangelho das bem-aventuranças e que a vossa arte seja anúncio de um mundo novo. Que a vossa poesia no-lo mostre! Nunca deixeis de procurar, interrogar, arriscar. Porque a verdadeira arte nunca é acomodada; ela oferece a paz da inquietação. E lembrai-vos: a esperança não é uma ilusão; a beleza não é uma utopia; o vosso dom não é um mero acaso, é uma chamada. Respondei com generosidade, com paixão, com amor.
Angelus do vi domingo
do tempo comum
16 de fevereiro
Irmãos e irmãs, bom domingo!
Hoje no Vaticano foi celebrada a Eucaristia dedicada em particular aos artistas vindos de várias partes do mundo para viver as Jornadas jubilares. Agradeço ao Dicastério para a Cultura e a Educação pela preparação deste evento, que nos recorda a importância da arte como linguagem universal que difunde a beleza e une os povos, contribuindo para trazer harmonia ao mundo e para silenciar cada grito de guerra.
Desejo saudar todos os artistas que participaram: teria gostado de estar entre vós mas, como sabeis, encontro-me aqui na Policlínica Gemelli porque ainda preciso de alguns tratamentos para a minha bronquite.
Dirijo a minha saudação a todos os peregrinos presentes hoje em Roma, em particular aos fiéis da Diocese de Parma, que vieram em Peregrinação diocesana, guiados pelo seu Bispo.
Convido todos a continuar a rezar pela paz na martirizada Ucrânia, na Palestina, em Israel e em todo o Médio Oriente, em Myanmar, no Kivu e no Sudão.
Agradeço-vos pelo afeto, a oração e a proximidade com que me acompanhais nestes dias, assim como gostaria de agradecer aos médicos e aos profissionais de saúde deste Hospital pela sua solicitude: fazem um trabalho precioso e tão cansativo, apoiemo-los com a oração!
E agora recomendemo-nos a Maria, “Cheia de graça”, para que nos ajude a ser como Ela cantores e artífices da beleza que salva o mundo.
Audiência geral de quarta-feira
19 de fevereiro
Queridos irmãos e irmãs!
Nos Evangelhos da infância de Jesus há um episódio que é próprio da narrativa de Mateus: a visita dos Magos. Atraídos pelo aparecimento de uma estrela, que em muitas culturas é presságio do nascimento de pessoas excecionais, alguns sábios partem do Oriente, sem saber exatamente o destino do seu peregrinar. São os Magos, pessoas que não pertencem ao povo da aliança. Na última vez falámos dos pastores de Belém, marginalizados na sociedade judaica por serem considerados “impuros”; hoje encontramos outra categoria, a dos estrangeiros, que chegam imediatamente para prestar homenagem ao Filho de Deus que entrou na história com uma realeza inteiramente nova. Por isso, os Evangelhos dizem-nos claramente que os pobres e os estrangeiros estão entre os primeiros a serem convidados para o encontro com o Deus que se fez menino, o Salvador do mundo.
Os Magos foram considerados como representantes tanto das raças primordiais, geradas pelos três filhos de Noé, como dos três continentes conhecidos na Antiguidade: Ásia, África e Europa, bem como das três fases da vida humana: juventude, maturidade e velhice. Para além de qualquer interpretação possível, são homens que não ficam parados mas que, como os grandes chamados da história bíblica, sentem o convite para se moverem, para partirem. São homens que sabem olhar para além de si mesmos, sabem olhar para o alto.
A atração da estrela que surge no céu põe-nos em marcha para a terra de Judá, para Jerusalém, onde encontram o rei Herodes. A ingenuidade e a confiança com que pedem informações sobre o recém-nascido rei dos Judeus colide com a astúcia de Herodes, que, agitado pelo medo de perder o trono, procura imediatamente ver as coisas com clareza, contactando os escribas e pedindo-lhes que investiguem.
O poder do soberano terreno mostra assim toda a sua fraqueza. Os escribas conhecem as Escrituras e referem ao rei o lugar onde, segundo a profecia de Miqueias, nasceria o chefe e o pastor do povo de Israel (Mq 5, 1): a pequena Belém e não a grande Jerusalém! De facto, como recorda Paulo aos Coríntios, «o que é fraco segundo o mundo, é que Deus escolheu para confundir o que é forte» (1 Cor 1, 27).
No entanto, os escribas, que sabem exatamente o lugar onde nasceu o Messias, mostram o caminho aos outros, mas eles próprios não se movem! De facto, não basta conhecer os textos proféticos para entrar em sintonia com as frequências divinas, é preciso deixar-se escavar e permitir que a Palavra de Deus anime o anseio de procurar, acenda o desejo de ver Deus.
Neste momento, Herodes, em segredo, como fazem os enganadores e os violentos, pergunta aos Magos o momento exato do aparecimento da estrela e incita-os a prosseguir a viagem e a voltar para lhe dar notícias, para que ele também possa ir adorar o recém-nascido. Para aqueles que estão agarrados ao poder, Jesus não é uma esperança a acolher, mas uma ameaça a eliminar!
Quando os Magos partem, a estrela reaparece e leva-os até Jesus, sinal de que a criação e a palavra profética representam o alfabeto com que Deus fala e se deixa encontrar. A visão da estrela suscita naqueles homens uma alegria irreprimível, porque o Espírito Santo, que move o coração de quem procura sinceramente Deus, enche-o também de alegria. Ao entrarem na casa, os Magos prostram-se, adoram Jesus e oferecem-lhe presentes preciosos, dignos de um rei, dignos de Deus. Porquê? O que veem? Um autor antigo escreve: veem «um humilde corpinho que o Verbo assumiu; mas a glória da divindade não lhes é oculta. Veem uma criança, mas adoram Deus» (Cromácio de Aquileia, Comentário ao Evangelho de Mateus 5, 1). Os Magos tornam-se assim os primeiros crentes entre todos os pagãos, a imagem da Igreja reunida de todas as línguas e nações.
Queridos irmãos e irmãs, coloquemo-nos também nós na escola dos Magos, destes “peregrinos de esperança” que, com grande coragem, dirigiram os seus passos, o seu coração e os seus bens para Aquele que é a esperança não só de Israel mas de todos os povos. Aprendamos a adorar Deus na sua pequenez, na sua realeza que não esmaga, mas que torna livres e capazes de servir com dignidade. E ofereçamos-lhe os presentes mais preciosos, para exprimir a nossa fé e o nosso amor.
Homilia da missa
para o Jubileu dos diáconos
23 de fevereiro
A mensagem das leituras que acabamos de escutar poderia ser resumida numa palavra: gratuidade. Um termo certamente caro a vós, Diáconos, aqui reunidos para a celebração do Jubileu. Reflitamos, pois, sobre esta dimensão fundamental da vida cristã e do vosso ministério, considerando, em particular, três aspetos: o perdão, o serviço desinteressado e a comunhão.
Primeiro: o perdão. A proclamação do perdão é uma tarefa essencial do diácono. Efetivamente, é um elemento indispensável para qualquer caminho eclesial e uma condição para toda a convivência humana. Jesus mostra-nos a sua necessidade e alcance quando diz: «Amai os vossos inimigos» (Lc 6, 27). E é exatamente assim: para crescermos juntos, partilhando luzes e sombras, sucessos e fracassos uns dos outros, é necessário saber perdoar e pedir perdão, restabelecendo as relações e não excluindo do nosso amor nem mesmo quem nos ataca e trai. Um mundo onde só prevalece o ódio pelos adversários é um mundo sem esperança, sem futuro, condenado a ser dilacerado por guerras, divisões e vinganças intermináveis — como, infelizmente, vemos ainda hoje, a tantos níveis e em várias partes do mundo. Perdoar significa, portanto, preparar em nós e nas nossas comunidades uma casa acolhedora e segura para o futuro. E o diácono, investido pessoalmente de um ministério que o leva às periferias do mundo, compromete-se a ver — e a ensinar os outros a ver — em cada um, mesmo naqueles que erram e causam sofrimento, uma irmã e um irmão feridos na alma e, por isso mesmo, mais necessitados do que qualquer outro de reconciliação, de orientação e de ajuda.
A primeira Leitura fala-nos desta abertura de coração, apresentando-nos o amor leal e generoso de David por Saul, seu rei, mas também seu perseguidor (cf. 1 Sm 26, 2.7-9.12-13.22-23). Mostra-nos ainda, noutro contexto, a morte exemplar do diácono Estêvão, que morre apedrejado, perdoando os seus lapidadores (cf. At 7, 60). Mas, sobretudo, vemo-la em Jesus, modelo de toda a diaconia, que na cruz, “esvaziando-se” até dar a vida por nós (cf. Fl 2, 7), reza pelos seus algozes e abre as portas do Paraíso ao bom ladrão (cf. Lc 23, 34.43).
E chegamos ao segundo ponto: o serviço desinteressado. O Senhor, no Evangelho, descreve-o com uma frase tão simples e clara: «Fazei o bem e emprestai, sem nada esperar em troca» (Lc 6, 35). São poucas palavras, mas trazem em si o bom perfume da amizade. Antes de mais, aquela que Deus nutre por nós, mas também a nossa. Para o diácono, esta atitude não é um aspeto acessório das suas ações, mas uma dimensão substancial do seu ser. Realmente, ele é consagrado para ser, no ministério, “escultor” e “pintor” do rosto misericordioso do Pai, testemunha do mistério de Deus-Trindade.
Em muitas passagens evangélicas, Jesus fala de si mesmo sob esta perspetiva. Assim o faz com Filipe, no Cenáculo, pouco depois de ter lavado os pés aos Doze, dizendo-lhe: «Quem me vê, vê o Pai» (Jo 14, 9). O mesmo acontece na instituição da Eucaristia, quando afirma: «Eu estou no meio de vós como aquele que serve» (Lc 22, 27). Mas já antes, no caminho para Jerusalém, quando os discípulos discutiam entre si sobre quem seria o maior, Ele tinha-lhes explicado que o «Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por todos» (Mc 10, 45).
Portanto, irmãos Diáconos, o trabalho gratuito que realizais, como expressão da vossa consagração à caridade de Cristo, é para vós o primeiro anúncio da Palavra, fonte de confiança e de alegria para aqueles que vos encontram. Acompanhai-o tanto quanto possível com um sorriso, sem reclamar e sem buscar reconhecimento, apoiando-vos mutuamente, inclusive nas vossas relações com os Bispos e os presbíteros, «como expressão de uma Igreja disposta a crescer no serviço do Reino com a valorização de todos os graus do ministério ordenado» (Cei, I Diaconi permanenti nella Chiesa in Italia. Orientamenti e norme, 1993, 55). Dessa maneira, a vossa ação unida e generosa será uma ponte que liga o Altar à rua, a Eucaristia à vida quotidiana das pessoas; a caridade será a vossa mais bela liturgia e a liturgia o vosso mais humilde serviço.
E chegamos ao último ponto: a gratuidade como fonte de comunhão. Dar sem esperar nada em troca une e cria laços, porque exprime e alimenta um estar juntos que não tem outro fim senão o dom de si e o bem das pessoas. São Lourenço, vosso patrono, quando os seus acusadores lhe pediram para entregar os tesouros da Igreja, mostrou-lhes os pobres e disse: «Aqui estão os nossos tesouros!». É assim que se constrói a comunhão: dizendo ao irmão e à irmã, com palavras, mas sobretudo com ações concretas, tanto pessoalmente quanto em comunidade: “Tu és importante para nós”, “queremos-te bem”, “queremos que participes do nosso caminho e da nossa vida”. É isso que fazeis: maridos, pais e avós prontos, no serviço, a alargar as vossas famílias aos necessitados, onde quer que vivais.
Assim, a vossa missão, que vos retira da sociedade para nela vos fazer reentrar, tornando-a cada vez mais um lugar acolhedor e aberto a todos, é uma das mais belas expressões de uma Igreja sinodal e “em saída”.
Daqui a pouco, alguns de vós, ao receberem o Sacramento da Ordem, “descerão” os degraus do ministério. Digo e sublinho intencionalmente que “descerão”, e não que “subirão”, pois, com a Ordenação, não se sobe, mas desce-se, torna-se pequeno, abaixa-se e despoja-se. Para usar as palavras de São Paulo, abandona-se, no serviço, o “homem da terra”, e se reveste, na caridade, do “homem do céu” (cf. 1 Cor 15, 45-49).
Meditemos todos sobre o que vamos fazer, confiando-nos à Virgem Maria, a serva do Senhor, e a São Lourenço, vosso padroeiro. Que eles nos ajudem a viver o nosso ministério com um coração humilde e cheio de amor, e a ser, na gratuidade, apóstolos do perdão, servos desinteressados dos irmãos e construtores de comunhão.
Angelus
do domingo vii do tempo comum
23 de fevereiro
Irmãos e irmãs, bom domingo!
Esta manhã, na Basílica de São Pedro, foi celebrada a Eucaristia com a Ordenação de alguns candidatos ao diaconado. Saúdo-os, bem como aos participantes no Jubileu dos Diáconos que se realizou nestes dias no Vaticano; e agradeço aos Dicastérios para o Clero e para a Evangelização pela preparação deste evento.
Queridos irmãos Diáconos, vós dedicais-vos ao anúncio da Palavra e ao serviço da caridade; desempenhais o vosso ministério na Igreja com palavras e obras, levando a todos o amor e a misericórdia de Deus. Exorto-vos a continuar o vosso apostolado com alegria e — como sugere o Evangelho de hoje — a ser sinal de um amor que abraça todos, que transforma o mal em bem e gera um mundo fraterno. Não tenhais medo de arriscar o amor!
Da minha parte, continuo com confiança a minha hospitalização na Policlínica Gemelli, fazendo os tratamentos necessários; e o repouso também faz parte da terapia! Agradeço sinceramente aos médicos e aos profissionais de saúde deste Hospital a atenção que me estão a dispensar e a dedicação com que prestam o seu serviço aos doentes.
Amanhã é o terceiro aniversário da guerra em grande escala contra a Ucrânia: um aniversário doloroso e vergonhoso para toda a humanidade! Enquanto renovo a minha proximidade ao
martirizado povo ucraniano, convido-vos a recordar as vítimas de todos os conflitos armados e a rezar pelo dom da paz na Palestina, em Israel e em todo o Médio Oriente, em Myanmar, no Kivu e no Sudão.
Nestes dias recebi muitas mensagens de afeto e fiquei particularmente sensibilizado com as cartas e os desenhos das crianças. Obrigado por esta proximidade e pelas orações de conforto que recebi de todo o mundo! Confio todos à intercessão de Maria e peço-vos que rezeis por mim!
Mensagem para a Quaresma
25 de fevereiro
Caminhemos juntos na esperança
Queridos irmãos e irmãs!
Com o sinal penitencial das cinzas sobre as nossas cabeças, iniciamos na fé e na esperança a peregrinação anual da Santa Quaresma. A Igreja, mãe e mestra, convida-nos a preparar os nossos corações e a abrir-nos à graça de Deus para podermos celebrar com grande alegria o triunfo pascal de Cristo, o Senhor, sobre o pecado e a morte, como exclamava São Paulo: «A morte foi tragada pela vitória. Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?» (1 Cor 15, 54-55). Realmente, Jesus Cristo, morto e ressuscitado, é o centro da nossa fé e a garantia da nossa esperança na grande promessa do Pai, já realizada n’Ele, Seu Filho amado: a vida eterna (cf. Jo 10, 28; 17, 3)1.
Nesta Quaresma, enriquecida pela graça do Ano Jubilar, gostaria de oferecer algumas reflexões sobre o que significa caminhar juntos na esperança e evidenciar os apelos à conversão que a misericórdia de Deus dirige a todos nós, enquanto indivíduos e comunidades.
Antes de tudo, caminhar. O lema do Jubileu — “Peregrinos de Esperança” — traz à mente a longa travessia do povo de Israel em direção à Terra Prometida, narrada no livro do Êxodo: a difícil passagem da escravidão para a liberdade, desejada e guiada pelo Senhor, que ama o seu povo e sempre lhe é fiel. E não podemos recordar o êxodo bíblico sem pensar em tantos irmãos e irmãs que, hoje, fogem de situações de miséria e violência e vão à procura de uma vida melhor para si e para seus entes queridos. Aqui, surge um primeiro apelo à conversão, porque todos nós somos peregrinos na vida, mas cada um pode perguntar-se: como me deixo interpelar por esta condição? Estou realmente a caminho ou estou paralisado, estático, com medo e sem esperança, acomodado na minha zona de conforto? Busco caminhos de libertação das situações de pecado e falta de dignidade? Seria um bom exercício quaresmal confrontar-nos com a realidade concreta de algum migrante ou peregrino e deixar que ela nos interpele, a fim de descobrir o que Deus pede de nós para sermos melhores viajantes rumo à casa do Pai. Esse é um bom “exame” para o viandante.
Em segundo lugar, façamos esta viagem juntos. Caminhar juntos, ser sinodal, é esta a vocação da Igreja2. Os cristãos são chamados a percorrer o caminho em conjunto, jamais como viajantes solitários. O Espírito Santo impele-nos a sair de nós mesmos para ir ao encontro de Deus e dos nossos irmãos, e nunca a fechar-nos em nós mesmos3. Caminhar juntos significa ser tecelões de unidade, partindo da nossa dignidade comum de filhos de Deus (cf. Gl 3, 26-28); significa caminhar lado a lado, sem pisar ou subjugar o outro, sem alimentar invejas ou hipocrisias, sem deixar que ninguém fique para trás ou se sinta excluído. Sigamos na mesma direção, rumo a uma única meta, ouvindo-nos uns aos outros com amor e paciência.
Nesta Quaresma, Deus pede-nos que verifiquemos se nas nossas vidas e famílias, nos locais onde trabalhamos, nas comunidades paroquiais ou religiosas, somos capazes de caminhar com os outros, de ouvir, de vencer a tentação de nos entrincheirarmos na nossa autorreferencialidade e de olharmos apenas para as nossas próprias necessidades. Perguntemo-nos diante do Senhor se somos capazes de trabalhar juntos ao serviço do Reino de Deus, como bispos, sacerdotes, pessoas consagradas e leigos; se, com gestos concretos, temos uma atitude acolhedora em relação àqueles que se aproximam de nós e a quantos se encontram distantes; se fazemos com que as pessoas se sintam parte da comunidade ou se as mantemos à margem4. Este é o segundo apelo: a conversão à sinodalidade.
Em terceiro lugar, façamos este caminho juntos na esperança de uma promessa. A esperança que não engana (cf. Rm 5, 5), mensagem central do Jubileu5, seja para nós o horizonte do caminho quaresmal rumo à vitória pascal. Como o Papa Bento xvi nos ensinou na Encíclica Spe salvi, «o ser humano necessita do amor incondicionado. Precisa daquela certeza que o faz exclamar: “Nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem o presente, nem o futuro, nem as potestades, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8, 38-39)»6. Jesus, nosso amor e nossa esperança, ressuscitou7 e, vivo, reina glorioso. A morte foi transformada em vitória e aqui reside a fé e a grande esperança dos cristãos: na ressurreição de Cristo!
Eis o terceiro apelo à conversão: o da esperança, da confiança em Deus e na sua grande promessa, a vida eterna. Devemos perguntar-nos: estou convicto de que Deus me perdoa os pecados? Ou comporto-me como se me pudesse salvar sozinho? Aspiro à salvação e peço a ajuda de Deus para a receber? Vivo concretamente a esperança que me ajuda a ler os acontecimentos da história e me impele a um compromisso com a justiça, a fraternidade, o cuidado da casa comum, garantindo que ninguém seja deixado para trás?
Irmãs e irmãos, graças ao amor de Deus em Jesus Cristo, somos conservados na esperança que não engana (cf. Rm 5, 5). A esperança é “a âncora da alma”, inabalável e segura8. Nela, a Igreja reza para que «todos os homens sejam salvos» (1Tm 2, 4) e ela própria anseia estar na glória do céu, unida a Cristo, seu esposo. Santa Teresa de Jesus expressou isso da seguinte forma: «Espera, espera, que não sabes quando virá o dia nem a hora. Vela com cuidado, que tudo passa com brevidade, embora o teu desejo faça o certo duvidoso e longo o tempo breve» (Exclamações, xv, 3)9.
Que a Virgem Maria, Mãe da Esperança, interceda por nós e nos acompanhe no caminho quaresmal.
Roma, São João de Latrão
Memória dos Santos mártires Paulo Miki e companheiros
6 de fevereiro de 2025.
Francisco
1 Cf. Carta enc. Dilexit nos (24 de outubro de 2024), 220.
2 Cf. Homilia na missa de canonização dos Beatos João Batista Scalabrini e Artemide Zatti, 9 de outubro de
2022.
3 Cf. Ibid.
4 Cf. Ibid.
5 Cf. Bula Spes non confundit, 1.
6 Carta enc. Spe salvi (30 de novembro de 2007), 26.
7 Cf. Sequência do Domingo de Páscoa.
8 Cf. Catecismo da Igreja Católica, 1820.
9 Ibid., 1821.
Audiência geral de quarta-feira
26 de fevereiro
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje contemplemos a beleza de «Jesus Cristo, nossa esperança» (1 Tm 1, 1) no mistério da sua apresentação no Templo.
Nas narrações da infância de Jesus, o evangelista Lucas mostra-nos a obediência de Maria e José à Lei do Senhor e a todas as suas prescrições. Na realidade, em Israel não havia a obrigação de apresentar o menino no Templo, mas quem vivia à escuta da Palavra do Senhor e desejava conformar-se com ela, considerava-a uma prática preciosa. Assim fez Ana, mãe do profeta Samuel, que era estéril; Deus ouviu a sua prece e ela, tendo tido o seu filho, levou-o ao Templo e ofereceu-o ao Senhor para sempre (cf. 1 Sm 1, 24-28).
Portanto, Lucas narra o primeiro ato de culto de Jesus, celebrado na cidade santa, Jerusalém, que será a meta de todo o seu ministério itinerante, a partir do momento em que tomará a firme decisão de se dirigir para lá (cf. Lc 9, 51), indo ao encontro do cumprimento da sua missão.
Maria e José não se limitam a enxertar Jesus numa história de família, de povo, de aliança com o Senhor Deus. Eles ocupam-se da sua guarda e do seu crescimento, introduzindo-o no ambiente da fé e do culto. E eles próprios crescem gradualmente na compreensão de uma vocação que os supera em grande medida.
No Templo, que é «casa de oração» (Lc 19, 46), o Espírito Santo fala ao coração de um ancião: Simeão, membro do povo santo de Deus, preparado na expetativa e na esperança, que alimenta o desejo do cumprimento das promessas feitas por Deus a Israel através dos profetas. Simeão sente no Templo a presença do Ungido do Senhor, vê a luz que resplandece no meio dos povos mergulhados «nas trevas» (cf. Is 9, 1) e vai ao encontro daquele menino que, como profetiza Isaías, «nasceu para nós», é o filho que «nos foi dado», o «Príncipe da paz» (Is 9, 5). Simeão abraça aquele menino que, pequenino e indefeso, repousa nos seus braços; mas na realidade é ele que encontra a consolação e a plenitude da sua existência, abraçando-o. Exprime-o num cântico cheio de comovida gratidão, que na Igreja se tornou a oração do fim do dia:
«Agora, Senhor, deixai o vosso servo
ir em paz, segundo a vossa palavra,
porque os meus olhos viram a vossa salvação
que preparastes diante de todos os povos:
como luz para iluminar as nações
e para a glória do vosso povo de Israel» (Lc 2, 29-32).
Simeão canta a alegria de quem viu, de quem reconheceu e pode transmitir a outros o encontro com o Salvador de Israel e das nações. É testemunha da fé, que recebe como dom e comunica aos outros; é testemunha da esperança que não desilude; é testemunha do amor de Deus, que enche o coração do homem de alegria e paz. Repleto desta consolação espiritual, o idoso Simeão vê a morte não como fim, mas como cumprimento e plenitude, espera-a como “irmã” que não aniquila, mas introduz na verdadeira vida que ele já anteviu e na qual acredita.
Naquele dia, Simeão não é o único que vê a salvação que se fez carne no menino Jesus. O mesmo acontece com Ana, mulher com mais de oitenta anos, viúva, totalmente dedicada ao serviço no Templo e consagrada à oração. Com efeito, ao ver o menino Ana celebra o Deus de Israel, que redimiu o seu povo precisamente naquele menino, e conta-o aos outros, propagando generosamente a palavra profética. Assim, o cântico da redenção de dois anciãos liberta o anúncio do Jubileu para todo o povo e para o mundo. No Templo de Jerusalém reacende-se a esperança no coração, porque nele entrou Cristo, nossa esperança!
Amados irmãos e irmãs, imitemos também nós Simeão e Ana, “peregrinos de esperança” que têm olhos límpidos capazes de ver além das aparências, que sabem “farejar” a presença de Deus na pequenez, que conseguem receber com alegria a visita de Deus e reacender a esperança no coração dos irmãos e irmãs.
Mensagem ao iv Congresso
organizado pelo Centro para a proteção dos menores, do Celam
26 de fevereiro
Estimados irmãos!
Através desta mensagem desejo unir-me a todos vós que participais no IV Congresso Latino-Americano promovido pelo Ceprome e pela Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, com o título «Inteligência artificial e abusos sexuais: um novo desafio para a prevenção», pedindo a Deus que apoie todos os esforços destinados a erradicar este cancro da sociedade e, em particular, que abençoe a iniciativa que promoveis e os frutos que é chamada a dar.
O tema que escolhestes é o da Inteligência Artificial que, como um tsunami, revolucionou as já de si inovadoras realidades da internet. Para um sacerdote idoso, os aspetos técnicos destes temas podem ser difíceis de compreender e é difícil manter-se concretamente atualizados sobre cada um dos progressos neste universo paralelo que decidimos chamar a rede. No entanto, a verdade, a Verdade com o “V” maiúsculo, que é Jesus Cristo, será sempre atual e, portanto, válida para a reflexão sobre qualquer tema que se apresente como novo.
Entre as muitas questões que poderiam surgir sobre a Inteligência Artificial, e que certamente abordareis de forma mais sistemática durante os vossos trabalhos, vem-me à mente uma que me permito de vos submeter: a da responsabilidade. Vós sabeis que a utilização da internet cria uma sensação de impunidade, como se uma grande distância nos separasse do que acontece, enquanto o observamos de uma janela distante. Por muito diferentes que sejam as circunstâncias, esta fragilidade humana mudou-nos muito. Já Adão e Eva tentaram descarregar a própria culpa sobre quem os tinha tentado e, de modo ainda mais grave, o rei David procurou fazer desaparecer os vestígios do seu delito, ao ponto de cometer um crime ainda mais horrível. Afastarmo-nos da nossa responsabilidade não é portanto uma novidade.
No caso da Inteligência Artificial, esta pretendida impunidade sobe de nível, pois da mera visualização, transmissão ou recolha de materiais inapropriados passa-se à criação de material “novo”, sintético. O facto de não ter sido a nossa mão a produzir estes materiais poderia criar a falsa ilusão de que não somos nós a “fazer” algo de vergonhoso: a agredir uma pessoa, a roubar uma imagem, a usar um conceito ou uma ideia de outro, a expor algo de íntimo que deveria permanecer na esfera privada da pessoa. Mas, não é verdade, a máquina segue as nossas ordens, executa, não toma as decisões, mas é programada para o fazer. E, tal como nós conhecemos o risco que corremos ao entrar num carro muito potente se carregarmos no acelerador ou invadirmos a faixa de rodagem oposta, também a utilização destas tecnologias pode causar danos. Dano para aqueles que, vendo o que produzimos, o querem emular; dano para o enorme fluxo de materiais inadequados que contaminam o ambiente; dano para a dificuldade que as autoridades encontram em discernir entre material real e material sintético para velar pela segurança das possíveis vítimas, e assim por diante. Por estes danos deve responder, no quadro da própria responsabilidade, tanto quem utiliza a máquina como quem a concebeu para que fosse segura.
A Escritura pode iluminar-nos sobre como responder a estes desafios, precisamente no episódio supracitado de David, quando o profeta Natan repreende o rei pelo seu pecado (cf. 2 Sm 12, 9). Em primeiro lugar, dando voz a Deus e às vítimas que O imploram, para que se tome consciência do mal que está a causar. Em segundo lugar, desmascarando a mentira que consiste em escondermo-nos atrás da tecnologia para aligeirar a nossa consciência, pedindo às pessoas, aos criadores destas tecnologias e às autoridades competentes que imponham limites e normas claras, concretamente avaliáveis, que permitam perseguir a sua utilização nociva ou criminosa.
Que Jesus vos abençoe e a Virgem Santa vos proteja. E, por favor, não vos esqueçais de rezar por mim.
Roma, São João de Latrão
13 de janeiro de 2025.
Francisco