Com o jornalista israelita Gideon Levy

«A única vitória total será um acordo diplomático»

An Israeli flag flutters, near the site at which Ron Benjamin was slain by Hamas, nearly a year ...
10 outubro 2024

«Creio que depois do que aconteceu a 7 de outubro, considerando a brutalidade, a maioria dos israelitas, se não todos, pensam que Israel tem o direito de fazer o que quiser». É assim que Gideon Levy, jornalista israelita e colunista do diário “Haaretz”, descreve a “L’Osservatore Romano” a mudança a que assistiu na opinião pública nos últimos doze meses. «Em muitos aspetos» observa, «Israel perdeu a sua humanidade a 7 de outubro, perdeu qualquer tipo de interesse pelo sofrimento dos palestinianos». A reação da sociedade foi, segundo o jornalista, culpar «todos os palestinianos pela responsabilidade» desse ataque armado. No entanto, houve também uma falta de atenção à questão dos israelitas raptados e que continuam em Gaza nas mãos do Hamas: «Penso que os reféns foram completamente abandonados e que, desde o início, não foram a primeira prioridade do governo. Entretanto, foi levada a cabo uma guerra destrutiva, que — escreveu o jornalista — não terminará com aquela «vitória total» de que muitos falam: «Não existe vitória total sobre o Hamas, o Hezbollah ou o Irão. E o que é afinal a vitória total?». «Depois de um ano, com um dos exércitos mais fortes do mundo, Israel não conseguiu obter nem a libertação dos reféns nem a aniquilação do Hamas», argumenta: «A única vitória total será um acordo, um acordo diplomático. As guerras já não terminam com vitórias totais como nos contos de fadas».

Hoje, Israel vive um momento histórico em que as vozes de forte crítica, como a de Levy, têm «uma audiência limitada» de interessados mas, sublinha o jornalista, «tenho, de qualquer modo, a liberdade de me exprimir». Com efeito, segundo Levy, Israel apoia totalmente esta guerra: «Normalmente, as guerras em Israel começam com um apoio total e depois, passado algum tempo, surgem as perguntas», observa, «especialmente se Israel está a pagar o preço. Israel está a pagar o preço destas guerras: todos os dias são mortos soldados, muito menos do que palestinianos ou libaneses, mas são mortos. E continuo a não ver qualquer mudança».

Nos jornais, na televisão, nas ruas reina a linguagem da guerra: «A paz está muito longe», diz Levy, «mas penso que estas guerras se poderiam evitar, tanto em Gaza como no Líbano», onde «as pessoas estão a pagar um preço terrível».

Na ótica de agir em direção a um horizonte de mudança, «o primeiro objetivo deve ser parar estas guerras, que não levam a lado nenhum», mesmo que isso pareça muito difícil hoje. «Não quero usar clichés», confessa o jornalista: «Não quero falar de coisas que, neste momento, não são realistas. Não sou um sonhador. Tenho os meus sonhos, mas isso não tem nada a ver com a realidade».

Para compreender o panorama geral, é preciso lembrar que Israel tem diferentes componentes no interior da sociedade, muitas vezes em contraste entre si: os haredim (judeus ultra-ortodoxos), os colonos que vivem nos territórios da Palestina, os judeus secularizados que se concentram em cidades como Telaviv, mas também os palestinianos com cidadania israelita, que vivem em território israelita e constituem 20% da população. No entanto, «neste momento, Israel está mais unido do que parece no apoio à guerra», diz Levy. «Há muita resistência e oposição contra Netanyahu. Há muita oposição ao facto de os reféns não terem sido libertados e há muitos protestos. Mas não há protestos contra a guerra, nem contra a continuação da guerra, nem contra os assassínios em massa em Gaza».

«Devemos tentar parar esta guerra antes de qualquer outra coisa e depois mudar o governo, a liderança de ambos os povos, ambos os povos precisam de uma nova liderança, tanto Israel como os palestinianos». «Este — conclui o jornalista — é o momento de, antes de mais, tentar trazer alguma humanidade, de reconhecer os sofrimentos dos outros, de compreender que o 7 de outubro não surgiu do nada. Surgiu depois de anos em que Gaza viveu numa jaula. Isto não o justifica. Há razões para tudo, mesmo para os comportamentos mais loucos, mais cruéis e brutais».

Beatrice Guarrera