«Cristãos e budistas: trabalhar juntos pela paz através da reconciliação e da resiliência»: eis o tema da mensagem do Dicastério para o diálogo inter-religioso aos budistas de todo o mundo por ocasião da festa anual do Vesak, que comemora os principais acontecimentos da vida de Buda. Publicamos o texto divulgado a 6 de maio, assinado pelo cardeal prefeito Miguel Ángel Ayuso Guixot e pelo secretário monsenhor Indunil Janakaratne Kodithuwakku Kankanamalage.
Prezados amigos budistas!
A celebração do Vesak, este tempo sagrado para vós que comemora o nascimento, a iluminação e a despedida de Buda, proporciona-nos uma boa ocasião para vos apresentar as nossas mais calorosas saudações e para refletir convosco sobre a nossa responsabilidade comum, como cristãos e budistas, de promover a paz, a reconciliação e a resiliência, valores profundamente enraizados nas nossas respetivas tradições religiosas.
«Nunca mais a guerra, nunca mais a guerra! É a paz, a paz, que deve guiar o destino das nações de toda a humanidade!». Este forte apelo, lançado pelo Papa Paulo vi no seu discurso às Nações Unidas em 4 de outubro de 1965, foi repetido em numerosos encontros inter-religiosos nos últimos anos para condenar a destruição causada pelas guerras em todo o mundo. Já debatemos esta questão em várias ocasiões, mas a escalada contínua dos conflitos no mundo inteiro exige uma atenção renovada à questão crítica da paz e uma reflexão mais profunda sobre o nosso papel na superação dos obstáculos ao seu crescimento. Além das nossas orações e esperanças constantes, a situação atual exige esforços vigorosos da nossa parte. Para desempenhar o nosso papel no sentido de pôr fim ao ódio e ao desejo de vingança que conduzem à guerra, e para curar as feridas que a guerra infligiu à humanidade e à terra, nossa casa comum, devemos fortalecer o nosso compromisso a trabalhar pela reconciliação e a resiliência.
Se as causas profundas do conflito e da violência não forem devidamente abordadas, a aurora de uma paz duradoura será uma ilusão, pois não pode haver paz e reconciliação sem equidade e justiça na vida política, na economia e na cultura. «Perdoar e reconciliar-se não significa fingir que as coisas são diferentes do que na realidade são. Não se trata de dar palmadinhas nas costas uns dos outros, nem de fechar os olhos ao mal. A verdadeira reconciliação põe a nu o horror, o abuso, a dor, a degradação, a verdade» (Desmond Tutu, No Future Without Forgiveness, 218).
Os nobres ensinamentos das nossas respetivas tradições e as vidas exemplares vividas por aqueles que veneramos dão testemunho dos abundantes benefícios da reconciliação e da resiliência. Quando se procura o perdão e se curam as relações interrompidas, os que se tinham afastado reconciliam-se e a harmonia é restabelecida. A resiliência permite que os indivíduos e as comunidades se recuperem das adversidades e dos traumas. Promove a coragem e a esperança num futuro melhor, uma vez que transforma tanto as vítimas como os agressores, conduzindo a uma nova vida. A reconciliação e a resiliência unem-se para formar uma sinergia poderosa que cura as feridas do passado, forja laços fortes e permite enfrentar os desafios da vida com força e otimismo.
Como ensinam os rituais e os cultos das nossas respetivas tradições religiosas, a reconciliação e a resiliência são, por conseguinte, correções úteis para uma cultura da violência que é frequentemente justificada como resposta deplorável mas necessária a ações militares ou terroristas agressivas. A reconciliação e a resiliência permitem-nos perdoar e pedir perdão, amar e estar em paz connosco próprios e com os outros, incluindo aqueles que nos feriram.
Buda transmitiu a sabedoria intemporal, segundo a qual «neste mundo, o ódio nunca se mitiga com o ódio. Só é aplacado com bondade amorosa» (Dhammapada, v. 5), enquanto São Paulo, fazendo eco ao apelo de Jesus ao perdão sem limites (Evangelho de Mateus 6, 14), exorta os cristãos a abraçar o ministério da reconciliação iniciado por Deus em Cristo (2 Coríntios 5, 11-21).
Ao dirigir-vos as nossas cordiais saudações por ocasião do Vesak, permitimo-nos invocar a sabedoria intemporal do Venerável Maha Ghosanda, testemunha dos horrores do genocídio cambojano e inspirador da Dhamma Yatra Peace Pilgrimage, que nos exorta a «remover as minas do ódio do nosso coração» (cf. Oração pela paz). Também o Papa Francisco nos assegura: «A reconciliação reparadora ressuscitar-nos-á, fazendo perder o medo a nós mesmos e aos outros» (Fratelli tutti, 78). Aconselha aqueles que foram inimigos acérrimos a «aprender a cultivar uma memória penitencial, capaz de assumir o passado para libertar o futuro das próprias insatisfações, confusões ou projeções» (Fratelli tutti, 226). Todos somos chamados a redescobrir e a promover estes valores nas nossas respetivas tradições, a dar a conhecer melhor as figuras espirituais que os encarnaram e a caminhar juntos rumo à paz.
Com estes pensamentos de oração, desejamos-vos uma frutuosa celebração do Vesak!