Francisco à União das superioras maiores da Itália

Escutar, rezar e caminhar
no espírito sinodal

 O Papa à União das superioras maiores da Itália  POR-016
20 abril 2023

«Escutar, rezar e caminhar»: foi este o autêntico «espírito sinodal» indicado pelo Papa Francisco às religiosas participantes na assembleia geral da União das superiores maiores da Itália (usmi) , recebidas em audiência na manhã de 13 de abril, na Sala Clementina.

Caríssimas irmãs em Cristo!

«A paz esteja convosco!». Foi assim que o Senhor saudou as mulheres: que a paz esteja convosco. Agradeço à Presidente pelas palavras dirigidas em nome de todas.

Nestes dias estais reunidas para a vossa 70ª Assembleia Geral, guiadas pelo tema «No caminho sinodal, mulheres testemunhas do Ressuscitado». O número 70 já indica um bom caminho realizado em conjunto! Por isto devemos dar graças ao Senhor, que vós como organização não fostes para a reforma: agradeçamos muito ao Senhor!

Gostaria de salientar três aspetos que este tema sugere.

Antes de mais, mulheres testemunhas do Ressuscitado. As primeiras testemunhas da Ressurreição do Senhor foram precisamente as mulheres, as discípulas, que com a sua audácia nos recordam repetidamente que «Jesus Cristo pode romper também os esquemas enfadonhos em que pretendemos aprisioná-lo, e surpreende-nos com a sua constante criatividade divina». «Cristo é a “Boa Nova de valor eterno” (Ap 14, 6)», e «a sua riqueza e a sua beleza são inesgotáveis» (Exort. Ap. Evangelii gaudium, 11). Aquelas mulheres corajosas deixaram-se surpreender e comover pelo poder e pela luz do Ressuscitado e puseram-se a caminho à sua procura. Estavam conscientes de como é importante ter o Senhor vivo no coração. A sua atitude lembra-nos que se tivermos a coragem de «voltar à fonte e recuperar o frescor original do Evangelho, despontam novas estradas, métodos criativos, outras formas de expressão, sinais mais eloquentes, palavras cheias de renovado significado para o mundo atual» (ibid.). É curioso, isto, quando se diz por acaso: “O que fazemos agora nesta situação?” — “Rezemos um pouco, vejamos o que diz o Senhor no Evangelho...”, e eis que dali vem a inspiração, dali sai um novo caminho, por vezes acontece que uma família religiosa tome decisões que parecem assustadoras, mas não, é algo do Senhor! Ir sempre com coragem, procurar o Senhor, o que Ele nos diz hoje; não o que Ele nos disse ontem, deixai isso para as irmãs de ontem, mas o que é de hoje. Claro, cada um dos vossos Institutos tem o próprio carisma, e este é o espírito com que quereis fazer a pergunta, com esse espírito dos fundadores que tendes no coração, fazei a pergunta, hoje: “Senhor, o que devo fazer hoje? O que devemos fazer?”. E as mulheres são boas nisto, sabem como criar novos caminhos, sabem doar... São corajosas.

Segundo aspeto: no caminho sinodal. Noutro trecho, o Evangelho diz que «as mulheres correram a dar o anúncio aos seus discípulos» (Mt 28, 8). Alguém que pensa um pouco mal diz: “Foram enviadas para tagarelar”. Não, não, elas correram para fazer um anúncio, isto não é tagarelar: isto é outra coisa. A presença de Jesus não nos fecha em nós mesmos, impele-nos para um encontro com os outros e para a decisão de caminhar com os outros. Aquelas mulheres escolheram não guardar a alegria do encontro só para elas, nem percorrer o caminho sozinhas: escolheram caminhar com os outros. Porque é caraterístico das mulheres ser generosas, é assim. Por vezes, sim, há alguma neurótica, mas isso acontece um pouco por todo o lado, não é? Mas a mulher é dar vida, abrir caminhos, chamar outros... Caminhar juntas, escolheram caminhar juntas: recordemos sempre que «para “caminhar juntos”, é necessário que nos deixemos educar pelo Espírito para uma mentalidade verdadeiramente sinodal, entrando com coragem e liberdade de coração num processo de conversão» porque «a sinodalidade representa a via mestra para a Igreja, chamada a renovar-se sob a ação do Espírito e graças à escuta da Palavra».1

Por vezes fico um pouco assustado quando falamos do espírito sinodal e penso imediatamente: “Agora devem mudar isto, isso, aquilo...”, e voltamos a fechar-nos de outro modo. Não, caminhar no espírito sinodal é escutar, rezar e caminhar. O Senhor dir-nos-á o que temos de fazer. Vi em algumas propostas: “Agora temos de tomar esta decisão, isso, isto, aquilo...”. Não, este não é o caminho sinodal. Isto é “parlamento”. Não esqueçamos que o caminho sinodal é feito pelo Espírito Santo: Ele é o chefe do caminho sinodal, Ele é o protagonista. E as mulheres, nesta dinâmica, vão em frente com os pastores, inclusive quando muitas vezes não se sentem valorizadas e às vezes incompreendidas, estão dispostas a ouvir, a encontrar-se, a dialogar, a fazer projetos juntos. Abertas, com a graça do Espírito Santo!

E o terceiro aspeto: semeadoras de esperança. Hoje falta-nos esta pequena virtude humilde que é a esperança, falta-nos muito. Temos versões mundanas: o otimismo, o bom senso elevado... Não, a esperança, a menor mas a mais forte das virtudes, a que não dececiona, nunca desilude. E deveis ser semeadoras de esperança, o que não é o mesmo que semeadoras de otimismo, não, de esperança, que é outra coisa. O encontro com Jesus ressuscitado enche-nos de esperança e «isto implica ser o fermento de Deus no meio da humanidade». Por outras palavras, significa «anunciar e levar a salvação de Deus a este nosso mundo, que muitas vezes se sente perdido, necessitado de ter respostas que encorajem, deem esperança e novo vigor para o caminho» (ibid., 114). «Os desafios existem para ser superados»: as poucas vocações, a interculturalidade das comunidades de vida consagrada, o problema das obras (mas as obras não são o carisma, tomai cuidado!). Às vezes encontramos pessoas que perante as obras acabam mal, como escravas das obras, sem a liberdade que o Espírito dá para ir em frente. Irmãs, permanecei fiéis à chamada porque o Senhor é fiel. Chamada, resposta fiel e esperança, ir em frente com esperança. «Sejamos realistas, mas sem perder a alegria, a audácia e a dedicação cheia de esperança!» (ibid., 109). Os vossos numerosos projetos falam desta dedicação cheia de esperança. Continuai por este caminho! A esperança é muito importante para seguir em frente.

Assim, vimos três passos de mulheres e testemunhas do Ressuscitado. Se uma consagrada não testemunhar o Ressuscitado, a sua vida termina ali. Segundo, o caminho sinodal, escutar, olhar para a realidade, tocar a realidade, não estar “em órbita”. E este é o terceiro, semeadoras de esperança. Queridas irmãs, inspirando-me no tema da vossa Assembleia, permiti-me invertê-lo um pouco, para vos dizer no final que o Senhor vos chama a ser, com renovado entusiasmo, «mulheres testemunhas do Ressuscitado, no caminho sinodal e semeadoras de esperança».

O caminho sinodal não consiste em ter respostas e tomar decisões. O caminho sinodal é caminhar, escutar — escutar! — sentir e ir em frente. O caminho sinodal não é um parlamento; o caminho sinodal não é uma recolha de opiniões. O caminho sinodal é pôr-se à escuta da vida sob a orientação do Espírito Santo, que é o protagonista do Sínodo. E vós ide por este caminho com renovado entusiasmo, como mulheres testemunhas do Ressuscitado.

Abençoo-vos de coração e confio ao Senhor e a Maria Santíssima cada uma de vós e cada uma das consagradas que vivem a sua missão na Itália, para que sejam testemunhas na Igreja e na sociedade.

Gostaria de dizer uma coisa para concluir: que estejais atentas com as doenças da vida consagrada, porque há muitas. Gostaria de destacar uma que vai contra tudo o que dissemos: a amargura. Aquele espírito de acidez dentro. Amargo. Sempre a olhar para as dificuldades, sempre a fazer um monumento ao “mas, contudo...”, sempre a repetir que as coisas não estão bem... Mas a amargura é o licor do diabo: o diabo cozinha dentro de nós com este licor. Não estou a falar de otimismo: o otimismo é uma coisa psicológica. Falo de esperança, de abertura ao Espírito, e isto é teológico, e uma vocação religiosa deve seguir por este caminho. Mas quando se cultiva vinagre em vez de açúcar, algo não funciona. A amargura, a acidez do coração, dói muito. Por favor, quando virdes que numa comunidade ou alguma religiosa se sente assim, ajudai-as a sair desta situação; ajudai-as a sair da situação de pessoas melancólicas que pensam sempre: “Ah, os velhos tempos eram melhores! As coisas não correm bem, e isto e aquilo...”. Este é o elixir do diabo, esta amargura, este licor de amargura. Por favor, nada disto! Só devemos deixar que o Espírito nos dê esta doçura, que é uma doçura espiritual.

Desejo-vos o melhor e peço-vos um favor: rezai sempre por mim, como de costume. Porque este trabalho não é nada fácil. Obrigado!


1 Documento preparatório da xvi Assembleia geral ordinária do Sínodo dos Bispos (7 de setembro de 2021), n. 9.