O Papa celebrou a missa na festa litúrgica da Bem-Aventurada Virgem Maria de Guadalupe

Chamados a ser irmãos em tempos de guerra, injustiça e pobreza

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15 dezembro 2022

Num tempo «cheio de fragores de guerra, injustiça crescente, fome, pobreza, sofrimento... o Senhor, através da Virgem Maria mestiça, continua a oferecer-nos o seu Filho, que nos chama a ser irmãos», afirmou o Papa Francisco na homilia da Missa celebrada na basílica de São Pedro na tarde de segunda-feira 12 de dezembro, festa litúrgica da Bem-Aventurada Virgem de Gaudalupe.

O nosso Deus guia a história da humanidade, nada permanece fora do seu poder, que é ternura e amor providente. Faz-se presente através de um gesto, de um evento, de uma pessoa. Não deixa de olhar para o nosso mundo, necessitado, ferido, ansioso, para o ajudar com a sua compaixão e misericórdia. A sua forma de intervir, de se manifestar, surpreende-nos sempre e enche-nos de alegria. Surpreende-nos, e fá-lo com estilo próprio.

A leitura da carta aos Gálatas oferece uma indicação clara que ajuda a contemplar, com gratidão, o caminho para nos redimirmos e nos tonarmos seus filhos adotivos: «Quando chegou a hora estabelecida, Deus enviou o seu Filho, nascido de mulher» (Gl 4, 4).

E é assim, a vinda do Filho em carne humana é a expressão suprema do seu método divino a favor da salvação. Deus, que tanto amou o mundo, enviou-nos o seu Filho, «nascido de mulher», para que «todo aquele que n’Ele crer não pereça, mas tenha a Vida eterna» (Jo 3, 16). Assim, em Jesus, nascido de Maria, torna-se para sempre, irreversivelmente “Deus connosco” e caminha ao nosso lado como irmão e companheiro. Veio para ficar. Nada do que é nosso lhe é estranho porque ele é como “um de nós”, próximo, amigo, igual a nós em tudo, exceto no pecado.

E de maneira semelhante, neste estilo, o mesmo se verificou há quase cinco séculos, naquele momento complicado e difícil para os habitantes do novo mundo, o Senhor quis transformar a comoção causada pelo encontro entre dois mundos diferentes em recuperação de sentido, em recuperação de dignidade, em abertura ao Evangelho, para a transformar em encontro. E fê-lo enviando Santa Maria, sua Mãe, na lógica que o Evangelho de hoje nos lembra: depois do anúncio do anjo, «Maria pôs-se a caminho e dirigiu-se à pressa para uma aldeia de montanha» (cf. Lc 1, 39). A Virgem à pressa! Assim Nossa Senhora de Guadalupe chegou às terras da América, apresentando-se como a “Mãe do verdadeiro Deus por quem se vive” (cf. Nican Mopohua); e veio para consolar, para atender às necessidades dos mais pequeninos, sem excluir ninguém, para os aconchegar como mãe solícita com a sua presença, o seu amor e a sua consolação. É a nossa Mãe mestiça!

E este ano celebramos Guadalupe num momento difícil para a humanidade. É um período amargo, cheio de fragores de guerra, injustiças crescentes, carestias, pobreza, sofrimento. Há fome. E embora este horizonte pareça sombrio e desconcertante, com presságios de maior destruição e desolação, todavia a fé, o amor e a condescendência divina nos ensinam e nos dizem que este é também um tempo propício de salvação, em que o Senhor, através da Virgem Mãe mestiça, continua a dar-nos o seu Filho, que nos chama a ser irmãos, a pôr de lado o egoísmo, a indiferença e o antagonismo, convidando-nos a cuidar uns dos outros “sem demora”, e a ir ao encontro dos irmãos e irmãs esquecidos e descartados pelas nossas sociedades consumistas e apáticas, os nossos irmãos e irmãs deixados de lado. E fá-lo sem demora: ela é a Mãe apressada, à pressa, a Mãe solícita.

Hoje como ontem, Santa Maria de Guadalupe quer encontrar-se connosco, como fez um dia com Juan Diego na pequena colina de Tepeyac. Ela quer ficar connosco. Pede-nos que a deixemos ser nossa mãe, que abramos a nossa vida ao seu Filho Jesus e que aceitemos a sua mensagem a fim de aprender a amar como Ele. Ela veio para acompanhar o povo americano neste caminho tão duro de pobreza, exploração, colonialismos socioeconómicos e culturais. Ela está no meio das caravanas que caminham para norte em busca de liberdade e bem-estar. Ela está no meio deste povo americano ameaçado na sua identidade por um paganismo selvagem e explorador, ferido pela pregação ativa de um ateísmo prático e pragmático. E ela está lá. «Eu sou a tua Mãe», diz-nos. A Mãe do amor por quem se vive!

Hoje, 12 de dezembro, começa no continente americano a Novena Guadalupana Intercontinental, um caminho que prepara a celebração do v Centenário do Evento Guadalupano em 2031. Exorto todos os membros da Igreja em peregrinação na América, pastores e fiéis, a participarem neste caminho celebrativo. Mas, por favor, que o façam com um verdadeiro espírito Guadalupano. Preocupam-me as propostas ideológicas e culturais de todos os géneros que querem apropriar-se do encontro de um povo com a sua Mãe, que querem desmistificar e disfarçar a Mãe. Por favor, não permitamos que a mensagem seja “destilada” em diretrizes mundanas e ideológicas. A mensagem é simples, é terna: “Não estou porventura aqui, eu que sou a tua Mãe?”. E a Mãe não se ideologiza!

Que Jesus Cristo, o desejado de todas as nações, através da intercessão da Nossa Mãe de Guadalupe, nos conceda dias de alegria e serenidade, para que a paz do Senhor habite no nosso coração e no coração de todos os homens e mulheres de boa vontade!