Discurso preparado

Queremos um mundo solidário

 Queremos um mundo solidário  POR-047
24 novembro 2022

Eis o discurso preparado que o Papa Francisco entregou à presidente da Focsiv por ocasião da audiência.

Encontro-me convosco por ocasião do cinquentenário da fundação da vossa Federação: representais as 90 organizações que a compõem, e que operam em mais de oitenta países em todo o mundo. Dirijo-vos as minhas cordiais saudações e agradeço à Presidente as suas amáveis palavras.

A Focsiv oferece um valioso contributo para a luta contra todas as formas de pobreza e marginalização, para a proteção da dignidade humana, para a afirmação dos direitos humanos e para a promoção do crescimento das comunidades e instituições locais; e tudo isto procura levá-lo em frente em coerência com o Evangelho e a doutrina social da Igreja. Obrigado pelo que fazeis e como o fazeis! É um bonito sinal de que a Igreja-mãe gera esperança num mundo habituado aos escândalos da fome e das guerras. O vosso testemunho é uma resposta concreta para aqueles que já não acreditam numa paz possível. De facto, com o vosso empenho demonstrais que cada pequeno fragmento diário pode construir o grande mosaico da fraternidade.

Queremos um mundo solidário, onde todos se sintam acolhidos e não sejam forçados a desistir dos próprios sonhos. Este não é apenas um simples desejo, mas uma vontade muito específica, que um dos vossos lemas exprime assim: “Um mundo a ser construído juntos, com respeito pela criação, no qual cada pessoa possa realizar-se em plena dignidade!”. É uma mensagem muito oportuna neste momento histórico: a sombra de uma terceira guerra mundial paira sobre o destino de nações inteiras, com consequências terríveis para as pessoas. Penso, em particular, nos idosos, nas mulheres e nas crianças. Que futuro edificamos para as novas gerações? Esta é uma questão que deve acompanhar sempre as decisões a nível internacional. Por conseguinte, hoje, retomando o grito dos muitos sem voz dos quais as vossas organizações estão próximas, gostaria de refletir convosco sobre três objetivos que nos dizem respeito a todos.

O primeiro tem a ver com o vosso ser voluntários no mundo. O que significa isto hoje? Parece-me que é um sinal decisivo e corajoso de abertura, de disponibilidade para com o próximo, esteja ele perto ou distante. Porque o olhar para além das fronteiras torna-se uma predisposição da mente para encontrar o “próximo”, testemunho de amor pela humanidade. O voluntariado baseia-se numa atitude de solidariedade profundamente enraizada, e todos sabemos quantas pobrezas, injustiças, e violências estão presentes em todos os continentes. Pois bem, a Focsiv mostra que podemos ser “irmãos e irmãs” abraçando cada ser humano que o Senhor coloca no caminho da nossa vida. Hoje estamos «diante da grande oportunidade de expressar o nosso ser irmãos, de sermos outros bons samaritanos que assumem a dor dos fracassos, em vez de fomentar o ódio e o ressentimento» (cf. Enc. Fratelli tutti, 77). Assim, o ensinamento do Evangelho torna-se diário. E é um convite sem exclusões: todos irmãos na humanidade e no amor.

Um segundo objetivo diz respeito à paz, que vemos ferida, violada na Ucrânia e em muitos outros lugares do planeta. Quando falta paz, quando prevalecem as “razões” da força, as pessoas sofrem, as famílias são divididas, as mais frágeis são deixadas sozinhas. Há meses que vemos imagens de destruição, de morte. A paz na justiça é uma condição necessária para uma vida digna, para a construção conjunta de um futuro melhor. Vós, voluntários da Focsiv, sois chamados a alimentar a paz nos vossos corações e a partilhá-la com quantos encontrais no vosso serviço. É o dom mais importante que podeis levar convosco para onde quer que fordes, porque «o mundo não precisa de palavras vazias, mas de testemunhas convictas, artífices da paz abertos ao diálogo sem exclusão nem manipulação» (Mensagem para o liii Dia Mundial da Paz, 1 de janeiro de 2020).

Por fim, o terceiro objetivo é o desenvolvimento. Cada pessoa, cada povo precisa de condições básicas para uma vida digna: juntamente com a paz, a habitação, os cuidados de saúde, a educação, o trabalho, o diálogo e o respeito recíproco entre culturas e credos. A promoção humana continua a ser um compromisso ao qual nos devemos dedicar com prontidão, vigor, criatividade e instrumentos adequados. Apenas um desenvolvimento integral — da pessoa e do contexto no qual vive — permite o desenvolvimento de uma vida boa, tanto pessoal como social, serena e aberta ao futuro. Mas pensemos em quantos jovens são hoje obrigados a deixar a pátria em busca de uma existência digna; em quantos homens, mulheres e crianças enfrentam viagens desumanas e violência de todo o tipo, para procurar um amanhã melhor; naqueles que continuam a morrer nas rotas do desespero, enquanto o seu destino é debatido ou ignorado! A migração forçada — para escapar de guerras, fome, perseguição ou alterações climáticas — é um dos grandes males desta época, que só podemos combater pela raiz, assegurando um desenvolvimento real em cada país. E vós, voluntários da Focsiv, também estais empenhados nisto.

Estimados amigos, nestes cinquenta anos fostes tecelões de paz e artífices de caridade e desenvolvimento. Encorajo-vos a ir em frente, nas estradas do mundo, cuidando dos irmãos, como fez o Bom Samaritano, conscientes de que «viver indiferentes perante a dor não é uma escolha possível; não podemos deixar que alguém permaneça à margem da vida» (cf. Fratelli tutti, 68). Não vos deixeis desencorajar por dificuldades ou desilusões, mas confiai no Senhor, que ao mesmo tempo é rocha e ternura. Confio cada um de vós e todos os membros das vossas organizações à proteção da Virgem Maria. De coração, abençoo-vos. E peço-vos que rezeis por mim, por favor. Obrigado!