Dar voz aos excluídos com
Publicamos o discurso que o Papa Francisco entregou aos participantes na assembleia plenária do Dicastério para a comunicação, recebidos em audiência na manhã de 12 de novembro.
Prezados irmãos e irmãs
bom dia e bem-vindos!
Agradeço ao doutor Ruffini as suas amáveis palavras e saúdo todos vós que participais na Assembleia plenária do Dicastério para a Comunicação, cujo tema é “Sínodo e comunicação: um percurso a desenvolver”.
O Sínodo não é um simples exercício de comunicação, nem sequer a tentativa de repensar a Igreja segundo a lógica das maiorias e das minorias que devem chegar a um acordo. Este tipo de visão é mundana e segue o modelo de muitas experiências sociais, culturais e políticas. Ao contrário, a essência do percurso sinodal reside numa verdade básica que nunca devemos perder de vista: ele tem a finalidade de ouvir, compreender e pôr em prática a vontade de Deus.
Se, como Igreja, quisermos conhecer a vontade de Deus para tornar ainda atual neste nosso tempo a luz do Evangelho, então devemos voltar a ter a consciência de que ela nunca se revela ao indivíduo, mas sempre a Igreja na sua totalidade. É apenas no tecido vivo das nossas relações eclesiais que nos tornamos capazes de ouvir e compreender o Senhor que nos fala. Sem “caminhar juntos”, podemos simplesmente tornar-nos uma instituição religiosa, que no entanto perdeu a capacidade de fazer resplandecer a luz da mensagem do seu Mestre, que perdeu a capacidade de dar sabor às diferentes vicissitudes do mundo.
Jesus alerta-nos contra uma semelhante deriva. Ele repete-nos: «Vós sois o sal da terra; se o sal se corromper, com que se há de salgar? Já não serve para nada, senão para ser lançado fora e calcado pelos homens. Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade situada sobre uma montanha, nem se acende uma lâmpada para a colocar debaixo de um alqueire, mas sobre o candeeiro, para iluminar todos os que estiverem em casa» (Mt 5, 13-16). Por isso, a dimensão sinodal é constitutiva da Igreja, e a reflexão que nos mantém comprometidos nestes anos visa fazer sobressair com vigor aquilo em que a Igreja sempre acreditou de modo implícito.
A Bíblia está cheia de histórias de homens e mulheres que, às vezes erroneamente, imaginamos como heróis solitários. Por exemplo, Abraão, o primeiro a quem Deus dirige a sua palavra, não é um solitário que se põe a caminho, mas um homem que leva a sério a voz de Deus, que o convida a deixar a própria terra, e fá-lo com a sua família (cf. Gn 12, 1-9). A história de Abraão é a história dos seus vínculos.
Também Moisés, o libertador de Israel, não teria conseguido cumprir a sua missão, a não ser graças à ajuda do irmão Aarão, da irmã Maria, do sogro Jetro e de uma multidão de outros homens e mulheres que o ajudaram a ouvir a Palavra do Senhor e a pô-la em prática, para o bem de todos. Ele é um homem ferido na própria história pessoal e não tem capacidades oratórias, aliás, é gago. Quase poderíamos dizer que é um homem que tem dificuldade precisamente de comunicar, mas quantos o circundam compensam a sua incapacidade (cf. Êx 4, 10, 12-16).
Maria de Nazaré não teria podido cantar o seu Magnificat sem a presença e a amizade da prima Isabel (cf. Lc 1, 46-55), e não teria podido defender o Menino Jesus contra o ódio daqueles que o queriam matar, se José não estivesse ao seu lado (cf. Mt 2, 13-15, 19-23).
O próprio Jesus necessita de vínculos e quando deve enfrentar a batalha decisiva da sua missão em Jerusalém, na noite da prisão, leva consigo ao horto do Getsémani os amigos Pedro, Tiago e João (cf. Mt 26, 36-46).
A contribuição da comunicação é precisamente aquela de tornar possível esta dimensão comunional, esta capacidade relacional, esta vocação para os vínculos. E assim entendemos que a tarefa da comunicação consiste em promover a proximidade, dar voz aos excluídos, chamar a atenção para o que normalmente descartamos e ignoramos. A comunicação é, por assim dizer, o artesanato dos vínculos, nos quais ressoa e se faz ouvir a voz de Deus.
Gostaria de vos indicar três coisas como possíveis pistas para um futuro percurso de reflexão neste âmbito.
A primeira tarefa da comunicação deveria ser a de tornar as pessoas menos sozinhas. Se ela não fizer diminuir a sensação de solidão a que tantos homens e mulheres se sentem condenados, então tal comunicação é apenas diversão, não é artesanato de vínculos, como dissemos antes.
Para poder levar a cabo esta missão, é preciso deixar claro que uma pessoa se sente menos só quando se dá conta de que as perguntas, as esperanças, as dificuldades que tem dentro de si encontram expressão fora. Só uma Igreja que estiver imersa na realidade sabe realmente o que há no coração do homem contemporâneo. Portanto, toda a comunicação verdadeira é feita sobretudo de escuta concreta, de encontros, de rostos, de histórias. Se não soubermos como estar na realidade, limitar-nos-emos a indicar de cima orientações que ninguém ouvirá. A comunicação deveria ser uma grande ajuda para a Igreja, para viver concretamente na realidade, favorecendo a escuta e captando as grandes perguntas dos homens e das mulheres de hoje.
Ligado a este primeiro desafio, gostaria de acrescentar outro: dar voz a quem não a tem. Muito frequentemente vemos sistemas de comunicação que marginalizam e censuram o que é desconfortável e o que não queremos ver. Graças ao Espírito Santo, a Igreja sabe bem que é sua tarefa estar com os últimos, e o seu habitat natural é o das periferias existenciais.
Mas periferias existenciais não são apenas aqueles que por motivos económicos se encontram à margem da sociedade, mas também quantos estão saciados de pão mas vazios de sentido, são também aqueles que vivem situações de marginalidade devido a certas escolhas, ou a fracassos familiares, ou por causa de situações pessoais que marcaram indelevelmente a sua história. Jesus nunca teve medo do leproso, do pobre, do estrangeiro, embora estas pessoas fossem marcadas por um estigma moral. Jesus nunca ignorou os irregulares de todos os tipos. Pergunto-me se, como Igreja, também nós sabemos dar voz a estes irmãos e irmãs, se sabemos ouvi-los, se com eles sabemos discernir a vontade de Deus e assim dirigir-lhes uma Palavra que salva.
Para concluir, o terceiro desafio da comunicação que gostaria de vos deixar é educar-nos para a fadiga de comunicar. Não raro, inclusive no Evangelho há mal-entendidos, lentidão na compreensão das palavras de Jesus, ou equívocos que às vezes se tornam verdadeiras tragédias, como acontece com Judas Iscariotes, que confunde a missão de Cristo com um messianismo político.
Portanto, na comunicação devemos aceitar também esta dimensão de “fadiga”. Muitas vezes quem olha para a Igreja de fora fica perplexo com as diferentes tensões nela presentes. Mas quem conhece o modo de agir do Espírito Santo sabe bem que Ele ama fazer comunhão entre as diversidades e criar harmonia a partir da confusão. A comunhão nunca é uniformidade, mas capacidade de manter unidas realidades muito diferentes. Penso que também deveríamos ser capazes de comunicar esta fadiga, sem ter a pretensão de a resolver ou ocultar. A dissensão não é necessariamente uma atitude de rutura, mas pode ser um dos ingredientes da comunhão. A comunicação deve tornar possível também a diversidade de opiniões, mas procurando sempre preservar a unidade e a verdade, e combatendo calúnias, violências verbais, personalismos e fundamentalismos que, sob o pretexto de ser fiéis à verdade, difundem apenas divisão e discórdia. Se sucumbir a tais degenerações, a comunicação, em vez de fazer muito bem, acabará por fazer muito mal.
Caros irmãos e irmãs, o trabalho deste Dicastério não é simplesmente técnico. A vossa vocação, como vimos, toca o próprio modo de ser Igreja. Obrigado pelo que fazeis! Encorajo-vos a progredir de modo decisivo e profético. Servir a Igreja significa ser confiável e também corajoso, ousando novos caminhos. Neste sentido, sede sempre fiáveis e corajosos. Abençoo todos vós de coração! E, por favor, não vos esqueçais de rezar por mim.