Admoestação do cardeal Parolin na Cop27

As alterações climáticas
não esperarão por nós

 As alterações climáticas  não esperarão por nós  POR-046
17 novembro 2022

Publicamos o discurso proferido no dia 8 de novembro, pelo cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado, na xxvii sessão da Conferência das partes da convenção-quadro das Nações Unidas sobre as alterações climáticas (Cop27), que se realizou em Sharm el-Sheikh, no Egito.

Senhor Presidente!

Em nome do Papa Francisco, dirijo a todos vós as minhas cordiais saudações e asseguro-vos a sua proximidade, apoio e encorajamento no momento em que trabalhais diligentemente para um resultado frutuoso desta Conferência. Há alguns dias, no Bahrein, ele reiterou a esperança de que a Cop27 pudesse ser um passo em direção de «escolhas concretas e clarividentes, empreendidas tendo em mente as jovens gerações, antes que seja demasiado tarde e o seu futuro fique comprometido!». (1)

Esta é a primeira sessão da Unfccc na qual a Santa Sé participa como Estado-Parte tanto da Convenção como do Acordo de Paris. Este importante passo é coerente com o anúncio feito em 2020 pelo Papa Francisco de que a Santa Sé se comprometeria com o objetivo de zerar as emissões líquidas, respondendo a dois níveis: (2)

1) Antes de tudo, o Estado da Cidade do Vaticano comprometeu-se a atingir as emissões líquidas zero até 2050, intensificando os seus esforços para melhorar a sua gestão ambiental, esforços que já estão em curso há vários anos;

2) Em segundo lugar, a Santa Sé está empenhada em promover uma educação em ecologia integral. Com efeito, as medidas políticas, técnicas e operacionais não são suficientes e devem ser combinadas com uma abordagem técnica que promova novos estilos de vida, favorecendo também um renovado modelo de desenvolvimento e sustentabilidade baseado no cuidado, na fraternidade e na cooperação como humanidade, e no reforço da “aliança entre ser humano e meio ambiente”. (3)

Senhor Presidente!

A crise socioecológica que vivemos é um momento propício para a conversão individual e coletiva e para decisões concretas que não podem mais ser adiadas. O rosto humano da emergência climática desafia-nos profundamente. Temos o dever moral de tomar medidas concretas para prevenir e responder aos impactos humanitários cada vez mais graves das alterações climáticas. O fenómeno crescente dos migrantes deslocados por esta razão é um sinal preocupante. Até quando não têm acesso à proteção internacional, os Estados não podem deixá-los sem soluções tangíveis, que incluem as áreas de adaptação, mitigação e resiliência. Quando isto não for possível, será importante reconhecer a migração como forma de adaptação e aumentar a disponibilidade e flexibilidade de percursos para a migração regular.

De maneira preocupante, somos forçados a admitir que acontecimentos globais como a Covid-19 e o número crescente de conflitos em todo o mundo, com as suas graves consequências éticas, sociais e económicas, correm o risco de minar a segurança global, exacerbar a insegurança alimentar, minar o multilateralismo e até ofuscar os nossos esforços aqui em Sharm el-Sheikh.

Não podemos permitir que isto aconteça. As alterações climáticas não esperarão por nós. O nosso mundo hoje é demasiado interdependente e não se pode dar ao luxo de ser estruturado em blocos insustentáveis de países isolados. Este é o momento da solidariedade internacional e intergeracional. Devemos ser responsáveis, corajosos e clarividentes não só para nós mesmos, mas também para os nossos filhos.

No ano passado, na Cop26 em Glasgow, o Papa Francisco enviou uma mensagem na qual sublinhava que as feridas causadas à humanidade pela pandemia de Covid-19 e o fenómeno das alterações climáticas são comparáveis às resultantes de um conflito global. (4) Agora esta mensagem assume uma importância ainda maior. A nossa vontade política deve ser guiada pela consciência de que ou vencemos juntos, ou perdemos juntos.

Devemos admitir que o caminho para alcançar os objetivos do Acordo de Paris é complexo, e que temos cada vez menos tempo para corrigir a rota. A Cop27 oferece-nos outra oportunidade, que não pode ser desperdiçada. É uma oportunidade, mas também um desafio para abordar seriamente os quatro pilares do Acordo de Paris: atenuação, adaptação, finanças, perdas e danos. Estes quatro pilares estão interligados e são uma questão de retidão, justiça e equidade. Também não devemos negligenciar o lado não económico das perdas e danos, tais como a perda de legados e culturas. Aqui temos muito a aprender com os povos indígenas.

Ao aderir à Convenção e ao Acordo de Paris, a Santa Sé está ainda mais comprometida em avançar juntos nesta viagem, para o bem comum da humanidade e especialmente para os nossos jovens, que esperam de nós o cuidado das gerações presentes e futuras.

Obrigado!


1 Papa Francisco, Encontro com as Autoridades, com a Sociedade Civil e com o Corpo Diplomático, Awali, Bahrein, 3 de novembro de 2022.

2 Papa Francisco, Mensagem de vídeo por ocasião do Climate Action Summit, Nova Iorque, 12 de dezembro de 2020.

3 Bento xvi , xli Dia Mundial da Paz: Família humana, comunidade de paz, n. 7, 8 de dezembro de 2007.

4 Papa Francisco, Mensagem à Cop26, 29 de outubro de 2021.