Novo apelo do Pontífice no Angelus

«A paz é possível
Não nos resignemos
à guerra»

 «A paz é possível  Não nos resignemos à guerra»  POR-046
17 novembro 2022

Um novo apelo a favor da paz na Ucrânia depois de nove meses de guerra foi lançado pelo Papa no final do Angelus de domingo. Da janela do Palácio apostólico do Vaticano antes de recitar a prece mariana com os fiéis presentes na praça de São Pedro, o Papa comentou, como de costume, o evangelho dominical, (Lc 21, 5-19) com a seguinte meditação.

Prezados irmãos e irmãs,
bom dia, bom domingo!

O Evangelho de hoje leva-nos a Jerusalém, ao lugar mais sagrado: o templo. Ali, à volta de Jesus, algumas pessoas falam da magnificência daquele grandioso edifício, «guarnecido de belas pedras» (Lc 21, 5). Mas o Senhor diz: «Dias hão de vir em que, de tudo isto que estais a contemplar, não ficará pedra sobre pedra» (v. 6). Depois reforça a mensagem, explicando como na história quase tudo desmorona: haverá, diz ele, revoluções e guerras, terramotos e carestias, pestes e perseguições (cf. vv. 9-17). Como para dizer: não se deve confiar demasiado nas realidades terrenas: elas passam. São palavras sábias, mas podem causar-nos alguma amargura: já tantas coisas correm mal, por que faz o Senhor também discursos tão negativos? Na realidade, a sua intenção não é ser negativo, é outra, é dar-nos um ensinamento precioso, ou seja, a saída de toda esta precariedade. E qual é a saída? Como podemos sair desta realidade que vai passando e deixará de existir?

Ela está numa palavra que talvez nos surpreenda. Cristo revela-a na última frase do Evangelho, quando diz: «Pela vossa constância é que salvareis as vossas almas» (v. 19). Perseverança. O que significa? A palavra indica ser “muito severo”; mas severos em que sentido? Com nós próprios, não nos considerando à altura? Não. Com os outros, tornando-nos rígidos e inflexíveis? Nem sequer. Jesus pede-nos para sermos “severos”, inflexíveis, persistentes naquilo que lhe agrada, no que conta. Porque, o que realmente conta, muitas vezes não coincide com o que atrai o nosso interesse: muitas vezes, como aquelas pessoas no templo, damos prioridade às obras das nossas mãos, às nossas realizações, às nossas tradições religiosas e civis, aos nossos símbolos sagrados e sociais. Isto está bem, mas damos-lhes demasiada prioridade. Estas coisas são importantes, mas passam. Ao contrário, Jesus diz para nos concentrarmos no que permanece, para evitar que dediquemos a vida à construção de algo que mais tarde será destruído, como aquele templo, e nos esqueçamos de edificar o que não desmorona, de construir sobre a sua palavra, sobre o amor, sobre o bem. Ser perseverante, ser severo e decidido a construir sobre aquilo que não passa.

Eis então o que é a perseverança: construir o bem todos os dias. Perseverar é permanecer constantes no bem, sobretudo quando a realidade à nossa volta nos impele a fazer outra coisa. Façamos alguns exemplos: sei que rezar é importante, mas eu também, como todos, tenho sempre muito que fazer, e então adio: “Não, estou ocupado agora, não posso, faço-o mais tarde”. Ou vejo tantas pessoas astutas que se aproveitam das situações, que “driblam” as regras, e eu também deixo de as observar, de perseverar na justiça e na legalidade: “Mas se estes espertinhos o fazem, faço eu também”. Cuidado com isso! E ainda: presto um serviço na Igreja, à comunidade, aos pobres, mas vejo que tantas pessoas no seu tempo livre só pensam em divertir-se, e depois apetece-me desistir e fazer o que elas fazem. Pois não vejo resultados ou fico aborrecido ou isso não me faz feliz.

Perseverar, ao contrário, é permanecer no bem. Perguntemo-nos: como está a minha perseverança? Sou constante ou vivo a fé, a retidão e a caridade de acordo com o momento: se me apetece, rezo, se me convém, sou justo, prestável e útil, enquanto que se estou insatisfeito, se ninguém me agradece, não faço mais? Em suma, a minha oração e serviço dependem das circunstâncias ou de um coração inabalável no Senhor? Se perseverarmos — lembra-nos Jesus — não temos nada a temer, até das vicissitudes tristes e difíceis da vida, nem sequer do mal que vemos à nossa volta, pois continuamos enraizados no bem. Dostoievski escreveu: «Não temas os pecados dos homens, ama o homem mesmo com o seu pecado, porque este reflexo do amor divino é o ápice do amor na terra» (Os Irmãos Karamazov, ii , 6, 3g). A perseverança é o reflexo do amor de Deus no mundo, pois o amor de Deus é fiel, é perseverante, nunca muda.

Que Nossa Senhora, serva do Senhor perseverante na oração (cf. At 1, 12), fortaleça a nossa constância.

No final da prece mariana, o Papa recordou o aniversário da Plataforma de Ação Laudato si’ e a Cimeira cop27 sobre o clima que está a decorrer em Sharm el-Sheikh, e por fim, recordou o drama da Ucrânia.

Estimados irmãos e irmãs!

Amanhã celebra-se o primeiro aniversário do lançamento da Plataforma de Ação Laudato si’, que promove a conversão ecológica e estilos de vida coerentes com a mesma. Gostaria de agradecer a quantos aderiram a esta iniciativa: trata-se de cerca de seis mil participantes, incluindo indivíduos, famílias, associações, empresas, instituições religiosas, culturais e de saúde. É um excelente começo para um percurso de sete anos, destinado a responder ao grito da terra e ao grito dos pobres. Encorajo esta missão, que é crucial para o futuro da humanidade, a fomentar em todos um compromisso concreto pelo cuidado da criação.

Nesta perspetiva, gostaria de mencionar a Cimeira cop 27 sobre o clima, que está a decorrer no Egito. Espero que se façam progressos, com coragem e determinação, na sequência do Acordo de Paris.

Permaneçamos sempre próximos dos nossos irmãos e irmãs da martirizada Ucrânia. Próximos com a oração e a solidariedade concreta. A paz é possível! Não nos resignemos à guerra.

Saúdo todos vós, peregrinos da Itália e de vários países, famílias, paróquias, associações e fiéis. Em particular, saúdo o grupo carismático “El Shaddai” dos Estados Unidos da América, os músicos uruguaios do “bandoneón” — vejo ali a bandeira, muito bem! — a Missão greco-católica romena de Paris, os representantes do ministério pastoral escolar de Limoges e Tulle com os seus respetivos Bispos, e os membros da comunidade eritreia em Milão, aos quais garanto as minhas orações pelo seu país. Sinto-me feliz por receber os ministrantes de Ovada, a cooperativa “La Nuova Famiglia” de Monza, a Defesa Civil de Lecco, os fiéis de Perugia, Pisa, Sassari, Catânia e Bisceglie, e os jovens da Imaculada.

Desejo a todos bom domingo. Por favor, não vos esqueçais de rezar por mim. Bom almoço e até à vista!