Aos participantes no capítulo dos Cistercienses da comum observância

Pobreza de espírito, de bens
e disponibilidade
para o Senhor

 Discurso aos cistercienses   POR-043
27 outubro 2022

O convite a passar «de uma comunidade autorreferencial para uma comunidade extrovertida, no bom sentido da palavra, acolhedora e missionária» foi dirigido pelo Papa aos cistercienses da comum observância, recebidos em audiência a 17 de outubro na Sala Clementina, por ocasião do capítulo geral.

Estimados irmãos e irmãs
bom dia e bem-vindos a todos!

Agradeço ao Abade-Geral as suas palavras de introdução — com os melhores votos pela renovação do seu cargo — e saúdo todos vós que participais no Capítulo Geral da Ordem Cisterciense da Comum Observância.

Este adjetivo “comum” faz pensar. Sabemos que se destina a distinguir de uma observância “especial”. Mas comum tem sempre um sentido mais rico, indicando o todo, a comunhão. E apraz-me começar por isto, por esta realidade fundamental que nos constitui como Igreja, graças ao dom do Deus Uno e Trino e ao nosso estar em Cristo. Comunidade, comum.

Por conseguinte, comum observância, como um caminhar juntos atrás do Senhor Jesus, para estar com Ele, escutá-lo, “observá-lo”... Observar Jesus. Como uma criança que observa o pai, ou o melhor amigo. Observar o Senhor: o seu modo de fazer, o seu rosto, cheio de amor e paz, por vezes indignado face à hipocrisia e ao fechamento, e também perturbado e angustiado na hora da paixão. E este observar fazei-o em conjunto, não individualmente, fazei-o em comunidade. Fazei-o cada um com o próprio ritmo, certamente, cada um com a própria história única e irrepetível, mas juntos. Como os Doze, que estavam sempre com Jesus e caminhavam com Ele. Não foram eles que se escolheram, foi Ele que os escolheu. Não era sempre fácil estar de acordo: eram diferentes uns dos outros, cada um com as suas “arestas”, e o seu orgulho. Também nós somos assim, e também para nós não é simples caminharmos juntos em comunhão. No entanto, nunca deixa de nos surpreender e de nos dar alegria este dom que recebemos: ser a sua comunidade, como somos, não perfeitos, não uniformes, não, não assim, mas convocados, concernidos, chamados a estar e caminhar juntos atrás d’Ele, nosso Mestre e Senhor.

Irmãos e irmãs, esta é a base de tudo. Agradeço-vos por enfatizardes isto e encorajo-vos a reacender o vosso desejo e a vossa vontade por esta comum observância de Cristo.

Ela implica um compromisso constante de conversão de um eu fechado para um eu aberto, de um coração egocêntrico para um coração que sai de si mesmo e vai ao encontro do outro. E isto, por analogia, aplica-se também à comunidade: de uma comunidade autorreferencial para uma comunidade extrovertida, no bom sentido da palavra, acolhedora e missionária. É o movimento que o Espírito Santo procura sempre imprimir à Igreja, trabalhando em cada um dos seus membros e em cada uma das suas comunidades e instituições. Um movimento que remonta ao Pentecostes, o “batismo” da Igreja. O mesmo Espírito despertou e ainda desperta uma grande variedade de carismas e formas de vida, uma grande “sinfonia”. As formas são muitas, muito diferentes umas das outras, mas para fazerem parte da sinfonia eclesial devem obedecer a este movimento de saída. Não uma saída caótica, sem ordem alguma: uma saída conjunta, todos sintonizados no único coração da Igreja que é o amor, como afirma com muito entusiamo Santa Teresa do Menino Jesus. Não há comunhão sem conversão, por conseguinte, ela é necessariamente fruto da Cruz de Cristo e da ação do Espírito, tanto nos indivíduos como na comunidade.

Voltando à imagem — ou melhor, ao som — da sinfonia, propondes-vos abraçar o grande alcance missionário da Igreja, valorizando também a complementaridade entre masculino e feminino, bem como a diversidade cultural entre os membros asiáticos, africanos, latino-americanos, norte-americanos e europeus. Encorajo-vos neste caminho, que não é fácil, mas que sem dúvida pode ser uma riqueza para as comunidades e para a Ordem.

Agradeço-vos o compromisso com que colaborais no esforço que toda a Igreja faz neste sentido em cada Comunidade particular: hoje, a experiência de encontrar a diversidade é um sinal dos tempos. A vossa é uma contribuição preciosa, particularmente rica, pois devido à vossa vocação contemplativa, não vos contentais em pôr em comum as diversidades a um nível superficial, mas também as viveis a nível de interioridade, de oração e de diálogo espiritual. E isto enriquece a “sinfonia” com ressonâncias mais profundas e mais generativas.

Outro aspeto para o qual gostaria de vos encorajar é o vosso propósito de uma maior pobreza, tanto de espírito como de bens, para estar mais disponíveis ao Senhor, com todas as vossas forças, fragilidades e florescimentos que Ele vos conceder. Portanto, louvemos a Deus por tudo, pela velhice e pela juventude, pela enfermidade e pela boa saúde, pelas comunidades que estão no “outono” e pelas que se encontram na “primavera”. O essencial é não deixar que o maligno roube a nossa esperança! A primeira coisa que o maligno procura é roubar a esperança, assim tira-a das nossas mãos, sempre. Porque a pobreza evangélica está cheia de esperança, fundada nas bem-aventuranças que o Senhor anuncia aos seus discípulos: «Bem-aventurados sois vós, pobres, porque vosso é o reino de Deus» (Lc 6, 20).

Prezados irmãos e irmãs, obrigado por esta visita! Que a Virgem Maria vos acompanhe e ampare sempre no vosso caminho. De coração abençoo a vós e a todas as vossas comunidades. E, por favor, não vos esqueçais de rezar por mim. Obrigado!