Ao capítulo das irmãs terciárias capuchinhas da Sagrada Família

Ao capítulo das irmãs terciárias capuchinhas da Sagrada Família

 Ao capítulo das irmãs terciárias capuchinhas da Sagrada Família  POR-039
29 setembro 2022

Escuta humilde e sinodalidade: eis os dois aspetos do “estilo da pequenez” recomendados pelo Papa Francisco às irmãs terciárias capuchinhas da Sagrada Família, recebidas em audiência na manhã de 26 de setembro, na sala do Consistório, por ocasião do xxiii capítulo geral.

Reverenda Madre-Geral
Amadas Irmãs capitulares!

É com alegria que vos posso receber hoje aqui, por ocasião da celebração do xxiii Capítulo geral. Agradeço à Madre-Geral as suas palavras cordiais, que exprimem a benevolência de todas as Irmãs terciárias capuchinhas.

Vejo com satisfação que vindes dos vários cantos do mundo; é bom, porque indica que viveis realmente um espírito de acolhimento e de fraternidade universal, de acordo com a vossa relação especial com a “Sagrada Família”. De trinta e quatro países, disse, não é verdade? Quisestes expressar esta atitude, própria do ambiente familiar, no lema do Capítulo geral, que gira em volta de duas ideias: escuta humilde e sinodalidade. É bom mandar a língua de férias e dedicar-se a ouvir [risos], que a audição trabalhe mais do que a língua. São palavras inspiradoras, que têm raízes profundas na vida religiosa. Para ouvir é preciso em primeiro lugar silêncio, silêncio profundo, silêncio interior, que encontramos na oração.

Muitas vezes os nossos estilos de vida são “cheios de barulho”. Como nos dizia São Paulo vi no seu conhecido discurso em Nazaré. Parece que o mais importante é encontrar aquele estímulo que consiga chamar a atenção do outro, que produza uma resposta mais imediata possível. Para muitos, levantar a voz, física ou moralmente, apresenta-se como a solução para levar a massa ensurdecida a optar pela sua ideia ou opinião, procurando sempre maneiras de fazer com que o seu sinal seja mais ouvido, seja mais atraente ou surpreendente, sem se afirmar. Lamentavelmente, costuma-se descobrir que quantos foram chamados acorrem quase imediatamente ao chamamento de um grito ainda mais impactante. De grito em grito. Isto embrutece, embrutece, tende medo da palavra; este ir de grito em grito embrutece o homem, limita a sua liberdade a ponto de o tornar escravo daqueles que têm a capacidade de condicionar tais sinais, através dos meios de comunicação, da educação, da opinião pública ou da política, impondo assim as suas agendas, com petulância e suficiência.

A profecia que Jesus nos pede consiste precisamente em ir contra esta corrente, procurar o silêncio, separar-se do mundo, do barulho. Isto permite-nos prestar atenção e, com paciência artesanal, identificar os vários sons, ponderá-los, distingui-los. Assim, aquele ruído inicial começará a adquirir forma, o que parecia dissonante poderá ser compreendido e localizado, terá um nome, terá um semblante. Nenhuma nota será demasiado alta, nem demasiado baixa, e nenhum som será estridente aos nossos ouvidos, se encontrar a harmonia que somente o nosso silêncio lhe pode dar. E digo que só o nosso silêncio lhe pode dar, porque a harmonia encontra-se, não se impõe. Quantas vezes encontramos pessoas que parecem boas, mas não são harmoniosas, pessoas que não têm interiormente uma unidade que as inspire a ir em frente. Aquela harmonia que nasce, que não se impõe.

A tentação é ter uma bela melodia na cabeça, e rejeitar ou procurar silenciar aquilo que não está em sintonia com ela. Tenho o meu verso, tenho aqui o meu ritmo, e o resto fica fora. A tentação! Mas isto significa julgar o outro, colocar-se no lugar de Deus, decidir quem merece e quem não merece estar ali. É uma grande soberba, que devemos combater com a humildade do nosso silêncio profético. Se eu for capaz de ouvir deste modo, conseguirei ouvir claramente todas as vozes, todas, compreender a sua ordem, ao que respondem, o que querem dizer e porque o dizem desta maneira, às vezes de modo tão fragmentado e incomum.

Queridas irmãs, sede profetisas da escuta, em primeiro lugar ouvindo a voz de Deus, que vos chama a amar todos sem distinção, a amar a criação como seu dom, a ver em tudo a sua grandeza, como nos ensina São Francisco no seu Cântico das criaturas. Esta é a melodia que se impõe de modo natural, pois é a essência de todas as coisas. Nesta melodia, até a dor, a escuridão, a morte, encontram o seu sentido, e encontra-o também o irmão em dificuldade, quem precisa de perdão, de redenção, de uma segunda oportunidade; podemos compreender as razões de quem pensa de modo diferente de mim, de quem me contradiz e até do nosso próprio limite.

E é precisamente a partir deste silêncio, desta escuta silenciosa de Deus, deste silêncio em que o homem se encontra com Deus, que do cacofónico podemos chegar ao sinfónico. Ao “sin” (συν-) da sinodalidade ou, e é a mesma coisa, de caminhar juntos (συν - óδος), de ser um coro com um só coração e uma só alma, ainda que nos encontremos em tempos e situações diferentes. Não é uma utopia, se nos convencermos verdadeiramente de que levantar a voz não é o caminho, que o único caminho é Jesus. Não vos escondo que é o caminho da cruz, da humildade, da pobreza, do serviço. É o caminho escolhido por São Francisco, e pelo vosso venerável fundador, Luis Amigó, que meditava diariamente sobre a Paixão, convidando-vos a abraçar o estilo da pequenez e da mortificação como caminho do céu. É interessante que saibais, que cada uma com a própria voz, que deve ser ouvida pelos outros, se houver um bom espírito, contribui para esta sinfonia do coração, para esta consonância de uma comunidade, que não significa que todas ouçam a mesma coisa, pensem do mesmo modo, mas que estão harmoniosamente unidas. E o único capaz de dar harmonia é o Espírito Santo. Pedi ao Espírito Santo que haja harmonia nas vossas comunidades.

Se, perante o silêncio ensurdecedor da Paixão, o mundo for interpelado como Pilatos, e confrontado com a Verdade nua e crua, peçamos, com as palavras de São Paulo vi , que o silêncio de Nazaré, que a Sagrada Família cultivou, vos ensine, na vossa vocação específica de religiosas, «o recolhimento e a interioridade, permanecendo sempre dispostas a ouvir as boas inspirações e a doutrina dos verdadeiros mestres, a necessidade e o valor de uma formação oportuna, do estudo, da meditação, de uma vida interior intensa, da oração pessoal que só Deus vê» (cf. São Paulo vi , Discurso em Nazaré, 5 de janeiro de 1964), esta última parte é inteiramente de São Paulo vi . E isto, de tal forma que sejais sempre profecia daquela escola do Evangelho que, para o mundo, é caminho de salvação. Obrigado! E peço-vos que não vos esqueçais de rezar por mim!