O cardeal Krajewski em Izyum

Nem palavras nem lágrimas
Só orações

 O cardeal Krajewski em Izyum  POR-038
22 setembro 2022

«Não há palavras, não há lágrimas». O cardeal Konrad Krajewski, esmoler do Papa, por ele enviado à Ucrânia pela quarta vez, encerra nesta frase o significado de um dia difícil que deixa o coração apertado pela dor e que só a oração pode aliviar e erguer. De Kharkiv, relata o tempo que passou com D. Pavlo Honcharuk, bispo da diocese de Kharkiv-Zaporizhia, em Izyum, localidade «que os russos acabaram de abandonar» e onde foram encontrados os restos mortais de cerca de 500 pessoas.

«Ali assistimos a uma “celebração” — podemos dizer assim — onde 50 jovens, sobretudo polícias, bombeiros, soldados vestidos de macacão branco escavavam e tiravam das fossas, frequentemente comuns, os corpos dos ucranianos assassinados, alguns há 3-4 meses, outros enterrados de recente». Fica-se emudecido com tanto horror! «Bem sei... há guerra — explica o cardeal Krajewski — e a guerra não conhece piedade, há também os mortos. Certamente, ver tantos numa área limitada é algo difícil de contar, de explicar».

Transportar os corpos em silêncio, numa participação comovedora e tocante. Krajewski olha e vê nos que são chamados a uma tarefa dolorosa a piedade de cada homem. «Há um aspeto que me comoveu muito: estes jovens ucranianos estavam a retirar os corpos de modo tão delicado, tão silencioso, totalmente silencioso. Parecia uma celebração, ninguém falava, mas havia lá tantos polícias, soldados... Pelo menos 200 pessoas. Tudo em silêncio, com um incrível respeito pelo mistério da morte. Sem dúvida, pode-se aprender com estes jovens».

«Foi verdadeiramente um momento comovedor ver o modo como transportaram os corpos. Pareciam estar a fazê-lo pelas próprias famílias, pelos seus pais, filhos, irmãos. O bispo e eu estávamos entre eles, eu recitava o terço da Misericórdia continuamente, ficamos ali pelo menos três horas. Não podia fazer mais nada». Foi — sublinha o cardeal — «uma celebração da misericórdia», um gesto totalmente gratuito.

«Isto ficou dentro de mim agora que voltei a Kharkiv, estou na capela e penso nestes jovens». Foi um dia difícil, também marcado por uma visita a um posto de polícia, transformado numa câmara de tortura.

«Eu sabia que encontraria tantos mortos, mas conheci homens que mostraram a beleza que por vezes se esconde nos nossos corações. Eles mostraram uma beleza humana nesse lugar — diz o cardeal Krajewski, comovido — onde só podia haver vingança. Mas ao contrário. Recordaram-me as palavras da Sagrada Escritura que o mal deve ser sempre vencido com o bem». Uma certeza que é bálsamo sobre as feridas desta guerra.

No dia 18 do corrente, o cardeal polaco escapou ileso a um tiroteio russo contra o comboio humanitário em que circulava quando ia levar ajudas em Zaporizhia juntamente com dois bispos, um católico e um protestante, e acompanhado por um soldado ucraniano. «Pela primeira vez na minha vida — disse a Vatican News — não sabia para onde fugir ... pois não é suficiente fugir, é preciso saber para onde». No final tudo correu bem, ninguém ficou ferido e as ajudas foram todas entregues, também os rosários benzidos pelo Papa e aqueles que os recebiam colocavam-nos imediatamente ao pescoço. (benedetta capelli)