Prefácio do Papa Francisco ao novo documento do Dicastério para os leigos, a família e a vida

Itinerários catecumenais para a vida matrimonial

 Itinerários catecumenais para a vida matrimonial  POR-025
21 junho 2022

Itinerários catecumenais para a vida matrimonial. Orientações pastorais para as Igrejas particulares é o documento que o Dicastério para os leigos, a família e a vida editou para oferecer aos pastores, esposos e quantos trabalham na pastoral familiar, uma visão e metodologia renovadas da preparação para o sacramento do matrimónio e de toda a vida conjugal. Publicado a 15 de junho, o texto nasce de uma indicação repetidamente manifestada pelo Papa Francisco no seu magistério, nomeadamente «a necessidade de um “novo catecumenato” que inclua todas as etapas do caminho sacramental: os tempos de preparação para o matrimónio, da sua celebração e dos anos seguintes». «A preocupação do Dicastério, comentou o cardeal prefeito Kevin Farrell, é transmitir aos bispos, agentes da pastoral familiar e formadores, o convite do Santo Padre a reconsiderar seriamente a preparação do matrimónio como um acompanhamento contínuo, antes e depois do rito sacramental. Uma proximidade competente e concreta, feita de vínculos entre famílias que se apoiam umas às outras». O documento é publicado pela Libreria Editrice Vaticana.

«O anúncio cristão sobre a família é verdadeiramente uma boa notícia» (Amoris laetitia, 1). Esta afirmação da relatio finalis do Sínodo dos bispos sobre a família merecia abrir a Exortação apostólica Amoris laetitia. Porque a Igreja, em todas as épocas, é chamada a anunciar de novo, especialmente aos jovens, a beleza e a abundância da graça que estão encerradas no sacramento do matrimónio e na vida familiar que dele brota. Cinco anos depois da sua publicação, o Ano “Família Amoris laetitia” quis recolocar a família no centro, convidar à reflexão sobre os temas da Exortação apostólica e animar toda a Igreja no jubiloso compromisso de evangelização para e com as famílias.

Um dos frutos deste Ano especial são os “Itinerários catecumenais para a vida matrimonial”, que agora tenho o prazer de confiar aos pastores, aos cônjuges e a todos aqueles que trabalham na pastoral familiar. Trata-se de um instrumento pastoral preparado pelo Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, na sequência de uma indicação que manifestei repetidamente, ou seja, «a necessidade de um “novo catecumenato” em preparação para o matrimónio”; com efeito, «é urgente atuar concretamente aquilo que já foi proposto na Familiaris consortio (cf. n. 66), ou seja, que assim como para o Batismo dos adultos o catecumenato faz parte do processo sacramental, também a preparação para o matrimónio se torne uma parte integrante de todo o procedimento sacramental do casamento, como antídoto que impede o multiplicar-se de celebrações matrimoniais nulas ou inconsistentes» (Discurso à Rota Romana, 21 de janeiro de 2017).

Aqui sobressaía, sem meios-termos, a séria preocupação de que, com uma preparação demasiado superficial, os casais correm o risco real de celebrar um casamento nulo ou com fundamentos tão frágeis que “desmorona” em pouco tempo e não conseguem resistir nem sequer às primeiras inevitáveis crises. Estes fracassos trazem consigo grandes sofrimentos, deixando feridas profundas nas pessoas. Elas ficam desiludidas, amarguradas e, nos casos mais dolorosos, até acabam por não acreditar mais na vocação para o amor, inscrita pelo próprio Deus no coração do ser humano. Portanto, antes de mais nada há o dever de acompanhar com sentido de responsabilidade aqueles que manifestam a intenção de se unir em matrimónio, para que sejam preservados dos traumas da separação e nunca percam a confiança no amor.

Mas há também um sentimento de justiça que deveria animar-nos. A Igreja é mãe, e uma mãe não tem preferências entre os filhos. Não os trata de forma desigual, dedica a todos os mesmos cuidados, as mesmas atenções, o mesmo tempo. Dedicar tempo é um sinal de amor: se não dedicarmos tempo a uma pessoa, é sinal de que não gostamos dela. Isto vem-me à mente muitas vezes quando penso que a Igreja dedica muito tempo, vários anos, à preparação dos candidatos ao sacerdócio ou à vida religiosa, mas dedica pouco tempo, apenas algumas semanas, a quantos se preparam para o casamento. Como os sacerdotes e as pessoas consagradas, também os casais são filhos da Igreja mãe, e uma diferença tão grande no tratamento não é justa. Os casais constituem a grande maioria dos fiéis, e são frequentemente pilares principais nas paróquias, grupos de voluntários, associações e movimentos. São verdadeiros “guardiões da vida”, não só porque geram filhos, porque os educam e os acompanham no crescimento, mas também porque cuidam dos idosos na família, dedicando-se ao serviço das pessoas com deficiência e não raro a muitas situações de pobreza com as quais entram em contacto. Nas famílias nascem as vocações para o sacerdócio e a vida consagrada; e são as famílias que compõem o tecido da sociedade e “remendam os seus rasgões” com paciência e sacrifícios diários. Portanto, para a Igreja-mãe é um dever de justiça dedicar tempo e energia à preparação daqueles que o Senhor chama para uma missão tão grande como a familiar.

Por isso, para dar consistência a esta necessidade urgente, «recomendei que se ponha em prática um verdadeiro catecumenato dos futuros nubentes, incluindo todas as etapas do caminho sacramental: as fases de preparação para o matrimónio, da sua celebração e dos anos imediatamente sucessivos» (Discurso aos participantes no curso sobre o processo matrimonial, 25 de fevereiro de 2017). É o que se propõe fazer o Documento que aqui apresento e pelo qual estou grato. Ele subdivide-se segundo as três etapas: a preparação para o matrimónio (remota, próxima e imediata); a celebração das bodas; o acompanhamento dos primeiros anos de vida conjugal. Como vereis, trata-se de percorrer um importante trecho de estrada com casais no seu caminho de vida, inclusive depois do casamento, especialmente quando poderão passar por crises e momentos de desânimo. Assim, procuraremos ser fiéis à Igreja, que é mãe, mestra e companheira de viagem, sempre ao nosso lado.

Desejo ardentemente que a este primeiro Documento se siga quanto antes outro, em que sejam indicados métodos pastorais concretos e possíveis itinerários de acompanhamento, especificamente dedicados aos casais que experimentaram o fracasso do seu matrimónio e que vivem numa nova união ou voltaram a casar civilmente. Com efeito, a Igreja quer estar perto destes casais e percorrer também com eles a via caritatis (cf. Amoris laetitia, 306), para que não se sintam abandonados e possam encontrar nas comunidades lugares acessíveis e fraternos de acolhimento, de ajuda no discernimento e de participação. Este primeiro Documento agora oferecido é um dom e ao mesmo tempo uma tarefa. Um dom, porque põe à disposição de todos um material abundante e estimulante, fruto de reflexões e experiências pastorais já ativadas em várias dioceses/eparquias do mundo. E é também uma tarefa, porque não se trata de “fórmulas mágicas” que funcionam automaticamente. É uma roupa que deve ser “feita à medida” para as pessoas que a usarão. Com efeito, trata-se de orientações que pedem para ser recebidas, adaptadas e praticadas nas situações sociais, culturais e eclesiais concretas em que cada Igreja particular vive. Portanto, apelo à docilidade, zelo e criatividade dos pastores da Igreja e dos seus colaboradores, para tornar mais eficaz esta obra vital e indispensável de formação, anúncio e acompanhamento das famílias, que o Espírito Santo nos pede para levar a cabo neste momento.

«Nunca ocultei nada do que vos podia ser útil para vos pregar e instruir» (At 20, 20). Convido todos aqueles que trabalham na pastoral familiar a fazer suas estas palavras do apóstolo Paulo, e a não desanimar diante de uma tarefa que pode parecer difícil, exigente ou até acima das suas possibilidades. Coragem! Comecemos a dar os primeiros passos! Iniciemos processos de renovação pastoral! Ponhamos a mente e o coração ao serviço das futuras famílias, e asseguro-vos que o Senhor nos apoiará, nos dará sabedoria e força, fará crescer o entusiasmo em todos nós e, sobretudo, nos fará experimentar a «doce e reconfortante alegria de evangelizar» (Evangelii gaudium, 9), enquanto anunciamos o Evangelho da família às novas gerações.