Audiência ao Chemin Neuf

A política é acolher e respeitar o outro de modo incondicional

 A política é acolher e respeitar o outro de modo incondicional  POR-021
24 maio 2022

«A política é antes de tudo a arte do encontro», mas também reflexão e ação, «acolhendo o outro e aceitando a sua diferença, num diálogo respeitador», salientou o Papa Francisco dirigindo-se à fraternidade política da comunidade Chemin Neuf, recebida em audiência a 16 de maio na Sala Clementina. Eis o discurso do Pontífice.

Prezados amigos!

Estou feliz por vos receber, jovens membros da “Fraternidade política” de Chemin Neuf. Quando nos encontrámos no ano passado, confiastes à minha oração a vossa participação no evento Changemakers, em Budapeste. Lá tivestes momentos de encontro, de formação, mas também de ação, junto das associações locais. O modo como vivestes este evento parece-me uma boa implementação do verdadeiro significado do que é a política, especialmente para os cristãos. A política é encontro, reflexão, ação.

A política é, antes de tudo, a arte do encontro. Certamente, este encontro vive-se acolhendo o outro e aceitando a sua diferença, num diálogo respeitador. Como cristãos, todavia, há mais: dado que o Evangelho nos pede que amemos os nossos inimigos (cf. Mt 5, 44), não posso contentar-me com um diálogo superficial e formal, como as negociações muitas vezes hostis entre partidos políticos. Somos chamados a viver o encontro político como um encontro fraterno, especialmente com aqueles que estão menos de acordo connosco; e isto significa ver naquele com quem dialogamos um verdadeiro irmão, um filho amado de Deus. Então, esta arte do encontro começa com uma mudança de perspetiva sobre o outro, com aceitação e respeito incondicionais pela sua pessoa. Se esta mudança de coração não se verificar, a política corre o risco de se transformar num confronto frequentemente violento para fazer triunfar as próprias ideias, numa busca de interesses particulares em vez do bem comum, contra o princípio de que «a unidade prevalece sobre o conflito» (cf. Evangelii gaudium, 226-230).

De uma perspetiva cristã, a política é também reflexão, ou seja, a formulação de um projeto comum. Um político do século xviii , Edmund Burke, explicou aos eleitores de Bristol que não poderia limitar-se a defender interesses particulares, mas ao contrário teria sido enviado, em nome de todos, para elaborar com os outros membros do Parlamento uma visão para o bem de todo o país, para o bem comum. Como cristãos, entendemos que a política se leva em frente não só com encontros, mas com uma reflexão comum, em busca do bem geral, e não simplesmente através do confronto de interesses contrastantes e muitas vezes opostos. Em suma, «o todo é superior à parte» (cf. ibid., 234-237). E a nossa bússola para elaborar este projeto comum é o Evangelho, que traz ao mundo uma visão profundamente positiva do homem amado por Deus.

Por fim, a política é também ação. Alegro-me que a vossa Fraternidade não se contenta em ser um espaço de debate e intercâmbio, mas também vos conduz a um compromisso concreto. Como cristãos, precisamos de comparar sempre as nossas ideias com a profundidade da realidade, se não quisermos construir sobre areia que, mais cedo ou mais tarde, acaba por ruir. Não esqueçamos que «a realidade é mais importante do que a ideia» (cf. ibid., 231-233). E por isso encorajo o vosso compromisso a favor dos migrantes e da ecologia. Assim tomei conhecimento de que alguns de vós escolhestes viver juntos num bairro operário em Paris, para ouvir os pobres: eis uma forma cristã de fazer política! Não vos esqueçais destas linhas, que a realidade é mais importante do que a ideia: não se pode fazer política com ideologia. O todo é superior à parte, e a unidade é superior ao conflito. Procurai sempre a unidade e não vos percais no conflito.

Encontro, reflexão, ação: aqui está um programa de política no sentido cristão. Penso que na realidade experimentais isto, especialmente nas vossas reuniões de domingo à noite: é rezando juntos ao Pai do qual todas as coisas procedem, é imitando Jesus Cristo, é ouvindo o Espírito Santo que o vosso cuidado pelo bem comum adquire uma força interior muito poderosa e estimulante. Pois é assim que se pratica a política, como “a mais alta forma de caridade”, como a definia o Papa Pio xi .

Friso um aspeto que este simpático brasileiro disse: ele falou de memória, esperança e espanto — foi isso, não foi? Espanto: a vida cristã não é possível sem este espanto, sem a admiração. O espanto é o que me faz sentir que estou em Jesus, com Jesus. O espanto de ver a grandeza do Senhor, a grandeza da sua Pessoa, a grandeza do seu programa, de sentir a grandeza das bem-aventuranças como um programa de vida. E depois aquela outra palavra... memória... Memória, esperança, espanto. O passado, o futuro e o presente: não há futuro sem o presente, e não há esperança sem espanto. Cultivar a oração com o Evangelho para sentir a maravilha do encontro com Jesus Cristo.

A minha oração acompanha-vos neste caminho. Agradeço-vos por me terdes ouvido e abençoo-vos. E por favor não vos esqueçais de rezar por mim!

E agora, todos juntos em oração, peçamos ao Senhor que nos abençoe. Senhor Jesus, abençoai a todos nós que trabalhamos perto de vós. Abençoai as nossas ideias, abençoai os nossos corações, abençoai as nossas mãos. Amém!