Catequese dedicada a São José

 Catequese dedicada a São José  POR-006
08 fevereiro 2022

«São José e a comunhão dos santos»: eis o tema da catequese proferida pelo Papa Francisco na audiência geral de quarta-feira, 2 de fevereiro, na sala Paulo vi. Dando continuidade ao ciclo de reflexões dedicado ao esposo de Maria, o Sumo Pontífice confidenciou que todos os dias, há mais de 40 anos, recita ao santo uma oração de 1700, que encontrou num livro das Irmãs de Jesus e Maria. Publicamos a seguir a meditação do Santo Padre.

Estimados irmãos e irmãs
bom dia!

Nas últimas semanas pudemos aprofundar a figura de São José, guiados pelas poucas mas importantes informações dadas nos Evangelhos, e também pelos aspetos da sua personalidade, que a Igreja ao longo dos séculos foi capaz de destacar através da oração e da devoção. Partindo precisamente deste “sentir comum”, que na história da Igreja acompanhou a figura de São José, hoje gostaria de me concentrar num importante artigo de fé que pode enriquecer a nossa vida cristã e também moldar da melhor maneira a nossa relação com os santos e com os nossos entes queridos falecidos: refiro-me à comunhão dos santos. Muitas vezes dizemos, no Credo, “creio na comunhão dos santos”. Mas se nos perguntarmos o que é a comunhão dos santos, lembro-me que quando era criança respondia imediatamente: “Ah, os santos fazem a comunhão”. É algo... não compreendemos o que dizemos. O que é a comunhão dos santos? Não é que os santos fazem a comunhão, não é isto: é outra coisa.

Às vezes até o cristianismo pode cair em formas de devoção que parecem refletir uma mentalidade que é mais pagã do que cristã. A diferença fundamental é que a nossa oração e a nossa devoção de povo fiel não se baseia, naqueles casos, na confiança num ser humano ou numa imagem ou num objeto, mesmo quando sabemos que eles são sagrados. O profeta Jeremias lembra-nos: «Maldito o homem que confia noutro homem [...] Bendito o homem que deposita a confiança no Senhor» (17, 5-7). Até quando confiamos plenamente na intercessão de um santo, ou ainda mais na Virgem Maria, a nossa confiança só tem valor em relação a Cristo. Como se o caminho para este santo ou para Nossa Senhora não acabasse ali: não! Chega ali, mas em relação a Cristo. Cristo é o vínculo que nos une a Ele e entre nós, e tem um nome específico: este vínculo que nos une a todos, entre nós e com Cristo, é a “comunhão dos santos”. Não são os santos que fazem milagres, não! “Este santo é muito milagroso...”: não, observai: os santos não realizam milagres, mas é apenas a graça de Deus que atua através deles. Os milagres foram realizados por Deus, pela graça de Deus que age por intermédio de uma pessoa santa, uma pessoa justa. É preciso esclarecer isto. Há pessoas que dizem: “Não creio em Deus, mas creio neste santo”. Não, está errado! O santo é um intercessor, alguém que reza por nós e nós rezamos a ele, e ora por nós e o Senhor concede-nos a graça: o Senhor age através do santo.

O que é, então, a “comunhão dos santos”? O Catecismo da Igreja Católica afirma: «A comunhão dos santos é precisamente a Igreja» (n. 946). Mas, que bonita definição! “A comunhão dos santos é precisamente a Igreja”. O que significa isto? Que a Igreja é reservada aos perfeitos? Não! Isto significa que é a comunidade dos pecadores salvos. A Igreja é a comunidade dos pecadores salvos. Como é bela esta definição! Ninguém se pode excluir da Igreja, todos somos pecadores salvos. A nossa santidade é o fruto do amor de Deus manifestado em Cristo, que nos santifica amando-nos na nossa miséria e salvando-nos dela. Graças a Ele formamos sempre um só corpo, diz São Paulo, no qual Jesus é a Cabeça e nós os membros (cf. 1 Cor 12, 12). Esta imagem do corpo de Cristo, a imagem do corpo, faz-nos compreender imediatamente o que significa estar ligados uns aos outros em comunhão: «Se um membro sofre — escreve São Paulo — todos os membros padecem com ele; e se um membro é tratado com carinho, todos os outros se congratulam por ele. Ora, vós sois o corpo de Cristo e cada um, por sua vez, é um dos seus membros» (1 Cor 12, 26-27). Paulo diz isto: somos todos um só corpo, todos unidos pela fé, pelo batismo, todos em comunhão: unidos em comunhão com Jesus Cristo. E esta é a comunhão dos santos.

Amados irmãos e irmãs, a alegria e o sofrimento que atingem a minha vida dizem respeito a todos, assim como a alegria e o sofrimento que atingem a vida do irmão e da irmã ao nosso lado também dizem respeito a mim. Não posso ficar indiferente em relação aos outros, pois somos todos parte de um só corpo, em comunhão. Neste sentido, também o pecado de uma pessoa atinge sempre todos, e o amor de cada pessoa atinge todos. Em virtude da comunhão dos santos, desta união, cada membro da Igreja está ligado a mim de um modo profundo — mas não digo a mim porque sou o Papa — estamos ligados reciprocamente e de maneira profunda, e este vínculo é tão forte que não pode ser interrompido nem sequer pela morte. Com efeito, a comunhão dos santos não diz respeito apenas aos irmãos e irmãs que estão ao meu lado neste momento da história, mas também àqueles que concluíram a sua peregrinação terrena e atravessaram o limiar da morte. Também eles estão em comunhão connosco. Pensemos, caros irmãos e irmãs: em Cristo ninguém nos pode separar verdadeiramente daqueles que amamos, porque o vínculo é um vínculo existencial, um laço forte que está na nossa própria natureza; só muda a forma de estar juntos com cada um deles, mas nada e ninguém pode interromper este vínculo. “Padre, pensemos naqueles que negaram a fé, que são apóstatas, que são perseguidores da Igreja, que negaram o batismo: também eles estão em casa?”. Sim, também eles, inclusive os blasfemadores, todos. Somos irmãos: esta é a comunhão dos santos. A comunhão dos santos mantém unida a comunidade dos crentes na terra e no Céu.

Neste sentido, a relação de amizade que posso construir com um irmão ou irmã ao meu lado, também a posso estabelecer com um irmão ou irmã no Céu. Os santos são amigos com quem muito frequentemente estabelecemos relações de amizade. Aquilo a que chamamos devoção a um santo — sou muito devoto deste santo, desta santa — a que chamamos devoção é na verdade um modo de expressar amor a partir deste mesmo vínculo que nos une. Também na vida de todos os dias podemos dizer: “Mas esta pessoa tem muita devoção pelos seus pais idosos”: não, é um modo de amar, uma expressão de amor. E todos sabemos que podemos sempre recorrer a um amigo, especialmente quando estamos em dificuldade e precisamos de ajuda. E nós precisamos dos amigos no Céu. Todos precisamos de amigos; todos precisamos de relações significativas que nos ajudem a enfrentar a vida. Também Jesus tinha os seus amigos e recorreu a eles nos momentos mais decisivos da sua experiência humana. Na história da Igreja há algumas constantes que acompanham a comunidade crente: em primeiro lugar, o grande afeto e o vínculo muito forte que a Igreja sempre sentiu em relação a Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe. Mas também a honra especial e o afeto que Ela dedicou a São José. No fundo, Deus confia-lhe as coisas mais preciosas que tem: o seu Filho Jesus e a Virgem Maria. É sempre graças à comunhão dos santos que nos sentimos próximos dos santos e das santas que são nossos padroeiros, pelo nome que recebemos, por exemplo, pela Igreja a que pertencemos, pelo lugar onde vivemos, e assim por diante, também por uma devoção pessoal. E esta é a confiança que nos deve animar sempre a recorrer a eles nos momentos decisivos da nossa vida. A devoção aos santos não é algo mágico, não é uma superstição; é simplesmente falar com um irmão, uma irmã que está diante de Deus, que viveu uma vida justa, uma vida santa, uma vida exemplar, e agora está diante de Deus. E falo com este irmão, com esta irmã, e peço a sua intercessão para as minhas necessidades.

É precisamente por isto que me agrada concluir esta catequese com uma oração a São José, à qual estou particularmente ligado e que recito todos os dias há mais de 40 anos. É uma oração que encontrei num livro de preces das Irmãs de Jesus e Maria, de 1700, do final do século xvi. É muito bonita, mas mais do que uma oração é um desafio a este amigo, a este pai, a este nosso guardião que é São José. Seria bom se aprendêsseis esta oração e pudésseis repeti-la. Lê-la-ei: “Glorioso Patriarca São José, cujo poder sabe tornar possíveis coisas impossíveis, vinde em meu auxílio nestes momentos de angústia e dificuldade. Tomai sob a vossa proteção as situações muito graves e difíceis que vos confio, para que possam ter uma solução feliz. Meu amado Pai, toda a minha confiança está depositada em vós. Que não se diga que vos invoquei em vão, e dado que tudo podeis junto de Jesus e Maria, mostrai-me que a vossa bondade é grande como o vosso poder”. E termina com um desafio, isto é desafiar São José: “E dado que tudo podeis junto de Jesus e Maria, mostrai-me que a vossa bondade é grande como o vosso poder”. Confio-me todos os dias a São José, com esta oração, há mais de 40 anos: é uma antiga prece.

Em frente, coragem, nesta comunhão de todos os santos que temos no céu e na terra: o Senhor não nos abandona!

No final da catequese, o Pontífice convidou a rezar por uma pessoa que pouco antes tinha começado a gritar dentro da sala. Depois, saudou os vários grupos presentes, entre os quais os de expressão portuguesa, lançou um apelo a favor da paz em Myanmar e recordou que a 4 de fevereiro será celebrado o segundo Dia mundial da fraternidade humana, e que em breve serão inaugurados os jogos olímpicos de inverno em Pequim.

Ouvimos, há alguns minutos, uma pessoa que gritava, gritava, que tinha algum problema, não sei se físico, psíquico ou espiritual: mas é um nosso irmão com problemas. Gostaria de concluir rezando por ele, o nosso irmão que sofre, pobrezinho: se gritava, é porque sofre, tem alguma necessidade. Não devemos permanecer surdos à necessidade deste irmão. Oremos juntos a Nossa Senhora por ele: Ave Maria...

Dirijo uma cordial saudação aos fiéis de língua portuguesa, convidando todos a permanecerem fiéis a Cristo Jesus, que hoje vemos nos braços de Simeão e Ana, felizes por tê-lo encontrado. E não são os únicos; quase seguramente tereis visto a mesma alegria no rosto das pessoas consagradas: é do encontro diário com Jesus que vem a luz dos seus olhos e a força para os seus passos. Que o Espírito Santo vos ilumine para levardes a Bênção de Deus a todos os homens. A Virgem Mãe vele sobre o vosso caminho e vos proteja!

Já há um ano que assistimos de forma dolorosa às violências que ensanguentam Myanmar. Faço meu o apelo dos Bispos birmaneses, para que a Comunidade internacional trabalhe em prol da reconciliação entre as partes interessadas. Não podemos desviar o olhar diante do sofrimento de tantos irmãos e irmãs. Peçamos a Deus, na oração, a consolação por essa população atormentada; a Ele confiemos os esforços de paz.

Depois de amanhã, 4 de fevereiro, celebrar-se-á o segundo Dia Internacional da Fraternidade Humana. É gratificante que nações de todo o mundo se unam nesta celebração, destinada a promover o diálogo inter-religioso e intercultural, como também desejado no Documento sobre a fraternidade humana em prol da paz mundial e da convivência comum, assinado a 4 de fevereiro de 2019 em Abu Dhabi pelo Grão-Imã de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyib, e por mim. Fraternidade significa estender a mão aos outros, respeitá-los e escutá-los com o coração aberto. Espero que sejam dados passos concretos, com crentes de outras religiões e pessoas de boa vontade, para afirmar que hoje é um tempo de fraternidade, evitando alimentar conflitos, divisões e fechamentos. Oremos e comprometamo-nos cada dia para que todos possamos viver em paz como irmãos e irmãs.

Estão prestes a inaugurar-se os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de Inverno em Pequim, respetivamente a 4 de fevereiro e a 4 de março. Dirijo de coração a minha saudação a todos os participantes; desejo aos organizadores o melhor êxito e aos atletas que deem o melhor de si. O desporto, com a sua linguagem universal, pode construir pontes de amizade e solidariedade entre pessoas de todas as culturas e religiões. Por conseguinte, apreciei que ao histórico lema olímpico Citius, Altius, Fortius — mais veloz, mais alto, mais forte — o Comité Olímpico Internacional tenha acrescentado a palavra Communiter, ou seja, Juntos, para que os Jogos Olímpicos façam crescer um mundo mais fraternal.

Com um pensamento especial, abraço todo o mundo paraolímpico. Ganharemos juntos a medalha mais importante, se o exemplo dos atletas com deficiências ajudar todos a superar preconceitos e receios e a tornar as nossas comunidades mais acolhedoras e inclusivas. Esta é a verdadeira medalha de ouro! Também acompanho com atenção e emoção as histórias pessoais dos atletas refugiados. Que os seus testemunhos ajudem a encorajar as sociedades civis a abrir-se com confiança cada vez maior a todos, sem deixar ninguém para trás. Desejo à grande família olímpica e paraolímpica que viva uma singular experiência de fraternidade humana e de paz. Bem-aventurados os pacificadores! (Mt 5, 9).