A tarde de 14 de setembro, terceiro dia da viagem papal, começou com a visita ao bairro Luník ix de Košice, na Eslováquia, onde teve lugar um encontro com a comunidade cigana. Depois das saudações e dos testemunhos, Francisco proferiu o discurso que publicamos a seguir.
Queridos irmãos e irmãs, boa tarde!
Agradeço o vosso acolhimento e palavras afetuosas. Ján recordou aquilo que vos disse São Paulo vi: «Vós na Igreja não estais à margem... Estais no coração da Igreja» (Homilia, 26 de setembro de 1965). Na Igreja, ninguém se deve sentir estranho nem marginalizado. E não se trata apenas de um modo de dizer, mas é o modo de ser da Igreja. Pois ser Igreja é viver como convocado por Deus, sentir-se eleito na vida, fazer parte da mesma equipa. É assim que Deus nos quer: cada um diverso, mas todos unidos em redor d’Ele. O Senhor vê-nos todos juntos.
Vê-nos filhos: tem olhar de Pai, olhar de predileção por cada um dos filhos. Se acolher este olhar sobre mim, aprendo a ver justamente os outros: descubro que tenho ao meu lado outros filhos de Deus e reconheço-os como irmãos. A Igreja é isto: uma família de irmãos e irmãs com o mesmo Pai, que nos deu Jesus como irmão para compreendermos quanto ame, Ele, a fraternidade. E deseja que a humanidade inteira se torne uma família universal. Vós nutris um grande amor pela família, e olhais a Igreja a partir desta experiência. Sim, a Igreja é casa, é casa vossa. Por isso — digo-vo-lo de coração — sede bem-vindos! Senti-vos sempre em casa na Igreja e nunca tenhais medo de habitar nela. Que ninguém vos afaste, a vós ou a qualquer outra pessoa, da Igreja.
Ján, saudaste-me juntamente com a tua esposa Beata: juntos, antepusestes o sonho da família a todas as vossas grandes diversidades de proveniência, de usos e costumes. O vosso matrimónio testemunha, melhor do que muitas palavras, como a vida concreta em conjunto faz cair tantos estereótipos que, doutra forma, parecem insuperáveis. Não é fácil ultrapassar os preconceitos, mesmo entre os cristãos. Não é coisa simples sentir apreço pelos outros considerados frequentemente como obstáculos ou adversários, formulando-se juízos sem conhecer os seus rostos e as suas histórias.
Mas ouçamos o que diz Jesus no Evangelho: «Não julgueis» (Mt 7, 1). O Evangelho não deve ser atenuado, não deve ser aguado. Não julgueis: diz-nos Cristo. E, todavia, quantas vezes não só falamos sem provas ou por ouvir dizer, mas consideramos também ter razão quando somos juízes implacáveis dos outros. Indulgentes connosco mesmos, inflexíveis com os outros. Quantas vezes os juízos não passam realmente de preconceitos, quantas vezes adjetivamos! Deste modo desfiguramos com as palavras a beleza dos filhos de Deus, que são nossos irmãos. Não se pode reduzir a realidade do outro aos próprios modelos preconcebidos, não se podem rotular as pessoas. Antes de mais nada, para conhecê-los verdadeiramente, é preciso reconhecê-los: reconhecer que cada um traz em si a beleza incancelável de filho de Deus, no qual se espelha o Criador.
Queridos irmãos e irmãs, muitas vezes fostes objeto de preconceitos e juízos cruéis, estereótipos discriminatórios, palavras e gestos difamatórios. Com isso, todos ficamos mais pobres, pobres em humanidade. O que precisamos para recuperar a dignidade é passar dos preconceitos ao diálogo, dos fechamentos à integração. Mas como fazer? Nikola e René, vós nos ajudastes nisto: a vossa história de amor nasceu aqui e amadureceu graças à proximidade e ao encorajamento que recebestes. Sentistes-vos responsabilizados e quisestes ter um emprego; sentistes-vos amados e crescestes com o desejo de dar algo mais aos vossos filhos.
Assim, nos destes uma mensagem preciosa: onde se presta atenção à pessoa, onde existe trabalho pastoral, onde há paciência e ações concretas, aparecem os frutos. Não imediatamente, pois requer-se tempo, mas eles aparecem. Juízos e preconceitos só aumentam as distâncias. Contrastes e palavras duras não ajudam. Colocar as pessoas em guetos não resolve nada. Quando se cultiva o fechamento, mais cedo ou mais tarde acaba por explodir a raiva. O caminho para uma convivência pacífica é a integração. É um processo orgânico, um processo lento e vital, que começa com o conhecimento mútuo, prossegue com a paciência e estende o olhar para o futuro. E a quem pertence o futuro? É uma pergunta que podemos colocar-nos: a quem pertence o futuro? Às crianças. São elas que nos orientam: os seus grandes sonhos não podem esfacelar-se contra as nossas barreiras. Querem crescer juntas com os outros, sem obstáculos, sem restrições. Merecem uma vida integrada, uma vida livre. São elas que motivam opções clarividentes; não buscam o consenso imediato, mas olham para o futuro de todos. Pelos filhos, tomam-se decisões corajosas: pela sua dignidade, pela sua educação, para crescerem bem enraizados nas suas origens, sem ao mesmo tempo lhes ser vedada qualquer possibilidade.
Agradeço a quantos realizam este trabalho de integração que, além de exigir não pouca fadiga, por vezes é objeto também de incompreensão e ingratidão, porventura mesmo da Igreja. Queridos sacerdotes, religiosos e leigos, queridos amigos que dedicais o vosso tempo a oferecer um desenvolvimento integral aos vossos irmãos e irmãs, obrigado! Obrigado por todo o trabalho com os marginalizados. Penso também nos refugiados e nos presos. A estes, em particular, e a todas as pessoas no mundo carcerário expresso a minha proximidade. Obrigado, Padre Peter, por nos ter falado sobre os centros pastorais onde fazeis, não assistencialismo, mas acompanhamento pessoal. Obrigado a vós, Salesianos! Prossegui por esta estrada, que não gera a ilusão de poder dar tudo e súbito, mas é profética, pois inclui os últimos, constrói a fraternidade, semeia a paz. Não tenhais medo de sair ao encontro de quem está marginalizado. Dar-vos-eis conta de sair ao encontro de Jesus. Ele espera-vos onde há fragilidade, não comodidade; onde há serviço, não poder; onde é preciso encarnar-se, não louvar-se. Aí é onde Ele está.
Convido todos vós a ultrapassarem os medos, as feridas do passado, com confiança, passo a passo: no trabalho honesto, na dignidade de ganhar o pão de cada dia, no cultivo da confiança mútua. E na oração uns pelos outros, porque é isto que nos guia e fortalece. Encorajo-vos, abençoo-vos e trago-vos o abraço de toda a Igreja. Obrigado! Palikerav!