Peregrinação do Papa Francisco na Eslováquia

Com a revolução do amor fazei da vida um dom e um empreendimento

 Com a revolução do amor fazei da vida  um dom e um empreendimento  POR-038
21 setembro 2021

Cerca de vinte e cinco mil jovens da Eslováquia reuniram-se no estádio «Lokomotiva» de Košice, no final da tarde de 14 de setembro, para um encontro com o Papa Francisco. Depois de ouvir as saudações e os testemunhos de alguns dos jovens presentes, o Santo Padre pronunciou o seguinte discurso.

Queridos jovens
amados irmãos e irmãs
dobrý večer [boa tarde]!

Causou-me alegria ouvir as palavras de D. Bernard, os vossos testemunhos e as vossas perguntas. Fizestes-me três às quais gostaria de encontrar resposta juntamente convosco.

Começo por Peter e Zuzka, com a vossa pergunta sobre o amor no casal. O amor é o maior sonho da vida, mas custa. É lindo, mas não é fácil, como aliás todas as coisas grandes da vida. É o sonho por excelência, mas não é um sonho fácil de interpretar. Roubo-vos uma frase: “Começamos a perceber este dom com olhos totalmente novos”. Na verdade, como dissestes, são necessários olhos novos, olhos que não se deixam enganar pelas aparências. Amigos, não banalizemos o amor, porque o amor não é só emoção e sentimento; isto, quando muito, será o início. O amor não é ter tudo e súbito, não obedece à lógica do usa e lança fora. O amor é fidelidade, dom, responsabilidade.

Hoje a verdadeira originalidade, a verdadeira revolução é rebelar-se contra a cultura do provisório, é ir além do instinto, além do instante, é amar por toda a vida e com todo o próprio ser. Não estamos cá para ir vivendo, mas para fazer da vida um empreendimento grandioso. Todos vós tereis em mente grandes histórias que lestes nos romances, vistes nalgum filme inesquecível, ouvistes nalgum conto comovente. Se pensardes bem, nas grandes histórias há sempre dois ingredientes: um é o amor, outro é a aventura, o heroísmo. Andam sempre juntos. Para tornar grande a vida, precisamos de ambos: amor e heroísmo. Fixemos Jesus, contemplemos o Crucifixo: estão presentes os dois, um amor sem limites e a coragem de dar a vida até ao fim, sem meias medidas. Aqui, diante dos nossos olhos, temos a Beata Ana (Kolesárová), uma heroína do amor. Diz-nos para apostarmos em metas altas. Por favor, não deixemos transcorrer os dias da vida como episódios de uma telenovela.

Por isso, quando sonhardes o amor, não acrediteis nos efeitos especiais, mas que cada um de vós é especial. Cada um de vós! Cada qual é um dom, e pode fazer da vida, da sua própria vida, um dom. Esperam-vos os outros, a sociedade, os pobres. Sonhai uma beleza que vá para além da aparência, para além da maquilhagem, para além das tendências da moda. Sem medo, sonhai formar uma família, gerar e educar filhos, passar uma vida inteira partilhando tudo com outra pessoa, sem vos envergonhardes das próprias fragilidades, porque existe ele, ou ela, que as acolhe e ama, que te ama tal como és. O amor é assim: amar o outro como é. Isto é o amor bom! Os sonhos que temos, dizem-nos a vida que desejamos. Os grandes sonhos não são o carro potente, a roupa da moda ou as férias extravagantes. Não deis ouvidos a quem vos fala de sonhos e, em vez disso, vende-vos ilusões. Uma coisa é o sonho, sonhar; outra, ter ilusões. Aqueles que vendem ilusões falando de sonhos são manipuladores de felicidade. Fomos criados para uma alegria maior: cada um de nós é único e está no mundo para se sentir amado na sua singularidade e amar os outros como ninguém o pode fazer no seu lugar. Não se vive sentado no banco de suplentes, à espera de substituir qualquer outro. Não! Cada um é único aos olhos de Deus. Não vos deixeis “homogeneizar”: não somos feitos em série, somos únicos, somos livres, e estamos no mundo para viver uma história de amor, de amor com Deus, para ter a ousadia de grandes decisões, para nos aventurarmos no risco maravilhoso de amar. Pergunto-vos: acreditais nisto? Pergunto-vos: sonhais com isto? [respondem: “Sim!”]. Tendes a certeza? [“Sim!”]. Muito bem!

Gostaria de vos dar outro conselho. Para que o amor dê fruto, não esqueçais as raízes. E quais são as vossas raízes? Os pais e sobretudo os avós — ouvistes? — os avós. Eles prepararam-vos o terreno. Regai as raízes, ide ter com os avós: far-vos-á bem. Fazei-lhes perguntas, reservai tempo para ouvir as suas histórias. Hoje há o perigo de crescer desenraizados, porque temos tendência a correr, a fazer tudo depressa: aquilo que vemos na internet pode chegar-nos imediatamente a casa; basta um clique e aparecem no visor pessoas e coisas. Depois acontece tornarem-se mais familiares do que os rostos que nos geraram. Cheios de mensagens virtuais, corremos o risco de perder as raízes reais. Desligar-nos da vida real, fantasiar no vazio, não faz bem; é uma tentação do maligno. Deus quer-nos bem assentes na terra, ligados à vida; nunca fechados, mas sempre abertos a todos. Enraizados e abertos: entendestes? Enraizados e abertos.

Sim, é verdade! Mas — observar-me-eis — o mundo pensa de forma diferente. Fala-se muito de amor, mas na realidade vigora outro princípio: cada um pense por si. Queridos jovens, não vos deixeis condicionar por isto, pelo que está errado, pelo mal que alastra. Não vos deixeis prender pela tristeza ou pelo desânimo resignado de quem diz que nada mudará jamais. Se dermos crédito a isto, adoeceremos de pessimismo. Já reparastes no rosto de um jovem, de uma jovem pessimista? Vistes que cara tem? Uma face amargurada, um rosto de amargura. O pessimismo adoece-nos de amargura envelhece-nos por dentro. Envelhece-se jovem. Hoje há tantas forças desagregadoras, tantos que culpam tudo e todos, amplificadores de negatividade, profissionais de lamentações. Não lhes deis ouvidos, porque a lamentação e o pessimismo não são cristãos; o Senhor detesta a tristeza e o fazer-se de vítima. Não estamos feitos para trazer a face fixa na terra, mas para levantar o olhar para o céu, para os outros, para a sociedade.

E, quando nos sentirmos em baixo — porque todos, em certos momentos da vida, nos sentimos um pouco desanimados; todos nós passamos por esta experiência — e quando nos sentimos em baixo, que podemos fazer? Há um remédio infalível para erguer-se. Aquilo que nos referistes tu, Petra: a Confissão. Vós ouvistes Petra? [“Sim!”]. O remédio da Confissão... Petra, perguntaste-me: “Como pode um jovem ultrapassar os obstáculos no caminho para a misericórdia de Deus?”. Também aqui é uma questão de olhar, de olhar o que é mais importante. Se eu vos perguntar “em que pensais quando vos ides confessar?” (não o digais em voz alta), tenho quase a certeza da resposta: “Nos pecados”. Mas — pergunto-vos (e respondei) — são verdadeiramente os pecados o centro da Confissão? [“Não!”]. Não ouvi... [“Não!”]. Acertastes! Deus quer que te aproximes d’Ele pensando em ti, nos teus pecados, ou n’Ele? Deus, o que quer? Que te aproximes d’Ele ou dos teus pecados? Que quer Ele? Respondei [“Que me aproxime d’Ele!]. “Mais alto, que sou surdo... [«…d’Ele!»]. Qual é o centro: os pecados ou o Pai que perdoa todos os pecados? O Pai. Não vamos confessar-nos como pessoas castigadas que se devem humilhar, mas como filhos que correm para receber o abraço do Pai. E o Pai levanta-nos em qualquer situação, perdoa-nos todos os pecados. Fixai-o bem: Deus perdoa sempre! Entendestes? Deus perdoa sempre!

Deixo-vos um pequeno conselho: depois de cada Confissão, permanecei alguns momentos a recordar o perdão que recebestes. Guardai aquela paz no coração, aquela liberdade que sentis dentro de vós: não os pecados, que já não existem, mas o perdão que Deus te deu, a carícia de Deus Pai. Este, o perdão de Deus, guardai-o; não deixeis que vo-lo roubem. E na próxima vez que vos fordes confessar, lembrai-vos disto: vou receber de novo aquele abraço que me fez muito bem. Não vou a um juiz para regularizar as contas; vou a Jesus que me ama e cura. Neste momento, tenho vontade de dar um conselho aos padres. Digo, aos padres que se sentam no lugar de Deus Pai, que Ele sempre perdoa, abraça e acolhe. Demos a Deus o primeiro lugar na Confissão. Se o protagonista for Ele, tudo se torna belo e confessar-se torna-se o sacramento da alegria. Sim, da alegria: não do medo e do julgamento, mas da alegria. E é importante que os padres sejam misericordiosos. Nunca sejam curiosos, nunca inquisidores, por favor, mas sejam irmãos que dão o perdão do Pai, sejam irmãos que acompanham neste abraço do Pai.

Mas alguém poderia dizer: “Seja como for, sinto vergonha; não consigo superar a vergonha de me ir confessar». Não é um problema; trata-se de uma coisa boa. Sentir vergonha na vida, às vezes faz bem. Se te envergonhas, quer dizer que não aceitas aquilo que fizeste. A vergonha é um bom sinal, mas, como qualquer sinal, convida a ir mais longe. Não fiques prisioneiro da vergonha, porque Deus nunca se envergonha de ti. Ama-te mesmo no ponto em que te envergonhas de ti mesmo. E ama-te sempre. Não está no ecrã, isto que vos digo: na minha terra, aos descarados que fazem mal em tudo, chamamos-lhes “desavergonhados”.

Uma última dúvida: “Mas, padre, não consigo perdoar-me, pelo que nem sequer Deus poderá perdoar-me, pois cairei sempre nos mesmos pecados”. Ouve! Mas Deus, quando é que se ofende? Quando lhe vais pedir perdão? Não! Nunca se ofende... Deus sofre quando pensamos que Ele não pode perdoar-nos, pois é como se lhe dissesses: “És fraco no amor”. Dizer, de Deus, isto — “és fraco no amor” — é injusto! Ao contrário, Deus alegra-se em nos perdoar, todas as vezes. Quando nos levanta, acredita em nós como na primeira vez. Ele não desanima. Somos nós que desanimamos; Ele não. Não vê pecadores a etiquetar, mas filhos a amar. Não vê pessoas erradas, mas filhos amados; porventura feridos, e então Ele tem ainda mais compaixão e ternura. E de cada vez que nos confessamos — nunca o esqueçais — faz-se festa no Céu. Seja assim também na terra.

Por fim... Peter e Lenka, na vida, experimentastes a cruz. Obrigado pelo vosso testemunho. Perguntastes como “encorajar os jovens para não terem medo de abraçar a cruz”. Abraçar: é um verbo significativo. Abraçar ajuda a vencer o medo. Quando somos abraçados, readquirimos confiança em nós mesmos e também na vida. Então deixemo-nos abraçar por Jesus, pois, quando abraçamos Jesus, reabraçamos a esperança. A cruz, não se pode abraçar por si só; o sofrimento não salva ninguém. É o amor que transforma o sofrimento. Portanto, é com Jesus que se abraça a cruz; nunca sozinho! Se se abraça Jesus, renasce a alegria. E a alegria de Jesus, no sofrimento, transforma-se em paz. Queridos jovens, queridas jovens, desejo-vos esta alegria, mais intensamente do que qualquer outra coisa. Desejo que a leveis aos vossos amigos. Não sermões, mas alegria. Levai alegria! Não palavras, mas sorriso, proximidade fraterna. Agradeço-vos por me terdes escutado e peço-vos uma última coisa: não vos esqueçais de rezar por mim. Ďakujem [Obrigado]!

Todos, de pé, rezemos a Deus que nos ama, dizendo o Pai-Nosso: «Pai nosso... (em eslovaco).

[Bênção].