No Dia mundial de oração pelo cuidado da criação

Esperança de cura para uma humanidade que sofre

07 setembro 2021

Com uma carta datada de 6 de agosto de 2015, o Papa Francisco instituiu o Dia mundial de oração pelo cuidado da criação, que se celebra todos os anos a 1 de setembro. Começou a sua carta, afirmando que partilha «com o amado irmão, o patriarca ecuménico Bartolomeu, as preocupações pelo futuro da criação». Depois, acrescentou que «a celebração deste Dia, na mesma data, com a Igreja ortodoxa, será uma ocasião profícua para testemunhar a nossa crescente comunhão com os irmãos ortodoxos». A carta contém inclusive um convite a todas as confissões cristãs a unir-se à celebração deste Dia. Em seguida, o Papa Francisco observou que «vivemos num tempo em que todos os cristãos enfrentam desafios idênticos e importantes, diante dos quais, para ser mais credíveis e eficazes, devemos dar respostas comuns». Naturalmente, a carta está em completa sintonia com a encíclica Laudato si’, onde a referência ao ecumenismo em geral, aos cristãos em particular e ao patriarca Bartolomeu a nível pessoal, está claramente presente desde os primeiros parágrafos.

Nos capítulos conclusivos do livro dos Atos dos Apóstolos encontramos São Paulo a caminho de Roma para cumprir a pena de prisão domiciliária após o julgamento por parte do governador Festo e do rei Agripa e a sua transferência para o tribunal do Império (cf. At 25 e 26). A viagem do Apóstolo dos gentios com outros prisioneiros foi marcada por terríveis eventos naturais. Aos ventos fortes seguiu-se uma tempestade, que provocou o naufrágio da embarcação com quase trezentas pessoas (cf. At 27, 13-44). Quando chegou milagrosamente à terra, Paulo teve que enfrentar um novo ataque da natureza. Parecia que um destino mortal estava a persegui-lo. Desta vez, na ilha de Malta, foi mordido por uma víbora que escapara do incêndio ateado pelos habitantes locais e quase perdeu a sua vida ainda antes de chegar a Roma (cf. At 28, 1-10). De quem era a culpa destes ataques da natureza contra Paulo? Segundo o dramático relato bíblico, os malteses apressaram-se a lançar a culpa sobre Paulo: «Sem dúvida, este homem é homicida, pois tendo escapado ao mar, a justiça não o deixa viver» (At 28, 4). Mas alguns minutos depois daquele julgamento sentencioso e injustificado do Apóstolo, a sua sobrevivência ao ataque da víbora não só fez com que eles mudassem de ideia, mas também o elevou à categoria divina. «Julgavam os indígenas que ele viesse a inchar, e que subitamente caísse morto. Mas, depois de esperar muito tempo, vendo que não lhe acontecia mal algum, mudaram de parecer e disseram: “Ele é um deus”» (At 28, 6). Com quanta facilidade, perante a incompreensão do caráter de Deus, do seu lugar na criação e do verdadeiro impacto humano diante dela, aqueles homens voltaram a emitir um juízo equivocado!

Nestes tempos de pandemia e em vista de uma fase pós-pandémica, temos necessidade de rever estes juízos errados sobre a humanidade, Deus e a criação que fizemos com leviandade. Culpamos e vitimizamos os seres humanos com demasiada facilidade. Responsabilizamos Deus com grande superficialidade e vimos traços pré-apocalípticos como desígnio da sua ira. Atribuímos o que aconteceu a um capricho da natureza, ou subestimamos o seu sofrimento nos últimos tempos. Para reconstruir um mundo doentio, encontrar um equilíbrio sábio no que aconteceu e renovar a nossa firme esperança, é necessário o fruto da virtude da reflexão serena. Devemos recuperar a fidelidade a Deus, tal como realmente é, e ser zelosos guardiães da casa comum que Ele nos concedeu. Prestando atenção às mudanças climáticas e a outros desafios ambientais que se seguiram à pandemia, devemos permanecer fiéis, sem ceder ao desespero. A fidelidade que nos faz esperar na nossa salvação através do Senhor ressuscitado também nos dá a confiança para cuidar da nossa casa comum e olhar para o futuro com otimismo.

O relato do livro dos Atos dos Apóstolos que se segue aos acontecimentos acima narrados, escrito na primeira pessoa do plural (isto significa que o seu autor, Lucas, viajava com Paulo), oferece-nos algumas cenas de uma cura restabelecida e total. «Havia na vizinhança lugares pertencentes ao governador da ilha, chamado Públio. Este homem hospedou-nos por três dias na sua casa, tratando-nos bem. Ora, o pai de Públio achava-se acamado com febre e sofria de disenteria. Paulo foi visitá-lo e, orando, impôs-lhe as mãos e sarou-o. Depois, vieram ter com ele todos os habitantes da ilha que se achavam doentes, e foram curados. Tiveram assim connosco toda a sorte de considerações. Regaram-nos com muitas honras e, quando partimos, forneceram-nos o necessário» (At 28, 7-10).

Nas terras pertencentes ao governador da ilha, o milagre da cura do pai realiza-se através da fé em Cristo. Esta cena simboliza a riqueza das culturas ancestrais, donos das terras e conscientes da necessidade de cuidar da casa comum. Da mesma maneira, na ação do Espírito Santo, através de Paulo, pode-se sentir a esperança da cura de uma humanidade que sofre. Todos os doentes da ilha foram curados! Isto é também símbolo da cura da humanidade sofredora por parte de Deus. Recuperemos a fidelidade a este Deus que nos cura, ouçamos o clamor da terra e a sabedoria das culturas ancestrais. No final desta pandemia, devemos ser filhos de Deus melhores, fiéis à sua vontade e atentos à nossa casa comum.

Que este Dia de oração una todos nós, cristãos do mundo, em comunhão e oração, a fim de entrarmos em união comum com Jesus que rezou pela nossa diversidade reconciliada (cf. Jo 17, 21).

Marcelo Figueroa