Discurso aos participantes no encontro da International Catholic Legislators Network

A política ao serviço do bem comum e não do benefício pessoal

  A política ao serviço do bem comum  e não do benefício pessoal  POR-035
31 agosto 2021

A «chamada mais nobre» para a política consiste em «servir o bem comum e dar prioridade ao bem-estar de todos, antes do benefício pessoal», recomendou o Papa Francisco aos participantes no encontro da International Catholic Legislators Network, recebidos em audiência na manhã de 27 de agosto, na Sala Clementina.

Gostaria de vos pedir desculpa por não falar de pé, mas ainda estou no período pós-operatório e devo fazê-lo sentado. Desculpai-me.

Excelentíssimas Senhoras
e Excelentíssimos Senhores!

Sinto-me feliz por me encontrar de novo convosco, parlamentares de diversos países, neste momento crítico da história: um momento crítico da história. Agradeço ao cardeal Schönborn e ao senhor Alting von Geusau as suas palavras de saudação e introdução. E regozijo-me com a presença de Sua Santidade Ignatius Aphrem ii, Patriarca da Igreja Siro-ortodoxa.

Desde o início da International Catholic Legislators Network em 2010, acompanhastes, apoiastes e promovestes o trabalho da Santa Sé como testemunhas do Evangelho ao serviço dos vossos países e da comunidade internacional como um todo. Estou grato pelo vosso amor à Igreja e pela colaboração com a sua missão.

O nosso encontro de hoje tem lugar num momento muito difícil. A pandemia de Covid-19 agride com mais força. Fizemos certamente progressos significativos na criação e distribuição de vacinas eficazes, mas há ainda muito trabalho a ser feito. Já se registaram mais de duzentos milhões de casos confirmados e quatro milhões de mortos devido a esta terrível chaga, que também causou tanta ruína económica e social.

Portanto, o vosso papel de parlamentares é importante como nunca. Prepostos para servir o bem comum, agora sois chamados a colaborar, através da vossa ação política, na renovação global das vossas comunidades e da sociedade inteira. Não apenas para derrotar o vírus, nem sequer para regressar ao status quo pré-pandémico, não, seria uma derrota, mas para abordar as causas profundas que a crise revelou e ampliou: pobreza, desigualdade social, desemprego generalizado e falta de acesso à educação. Irmãos e irmãs, de uma crise não saímos iguais: sairemos melhores ou piores. De uma crise não saímos sozinhos: sairemos juntos ou não poderemos sair dela.

Numa época de perturbação e polarização política, os parlamentares e os políticos em geral nem sempre são tidos em grande estima. Isto não é novidade. No entanto, que vocação maior do que servir o bem comum e dar prioridade ao bem-estar de todos antes do benefício pessoal? Este deve ser sempre o vosso objetivo, porque a boa política é indispensável para a fraternidade universal e a paz social (cf. Encíclica Fratelli tutti, 176).

Na nossa época, em particular, um dos maiores desafios neste horizonte é a administração da tecnologia para o bem comum. As maravilhas da ciência e da tecnologia modernas aumentaram a nossa qualidade de vida. «É justo que nos alegremos com estes progressos e nos entusiasmemos à vista das amplas possibilidades que nos abrem estas novidades incessantes, porque a ciência e a tecnologia são um produto estupendo da criatividade humana que Deus nos deu» (Enc. Laudato si’, 102). Contudo, deixadas à própria sorte e às forças do mercado, sem uma orientação apropriada das assembleias legislativas e outras autoridades públicas guiadas por um sentido de responsabilidade social, estas inovações podem ameaçar a dignidade do ser humano.

Não se trata de impedir o progresso tecnológico. Todavia, os instrumentos da política e da regulamentação permitem que os parlamentares protejam a dignidade humana quando está ameaçada. Penso, por exemplo, no flagelo da pornografia infantil, na exploração de dados pessoais, nos ataques a infraestruturas sensíveis como hospitais, e em falsidades difundidas através das redes sociais e assim por diante. Uma legislação cuidadosa pode e deve orientar a evolução e aplicação da tecnologia para o bem comum. Por conseguinte, irmãos e irmãs, encorajo-vos calorosamente a assumir a tarefa de uma reflexão moral séria e profunda sobre os riscos e oportunidades inerentes ao progresso científico e tecnológico, para que a legislação e as normas internacionais que as regulam possam concentrar-se na promoção do desenvolvimento humano integral e da paz, em vez do progresso por si só.

Os parlamentares refletem naturalmente os pontos fortes e fracos de quantos representam, cada um com especificidades a pôr ao serviço do bem de todos. O empenho dos cidadãos, nos vários âmbitos de participação social, civil e política, é imprescindível. Somos todos chamados a promover o espírito de solidariedade, a começar pelas necessidades dos mais fracos e desfavorecidos. No entanto, a fim de curar o mundo, dolorosamente provado pela pandemia, e para construir um futuro mais inclusivo e sustentável no qual a tecnologia sirva as necessidades humanas e não nos isole uns dos outros, precisamos não só de cidadãos responsáveis, mas também de líderes preparados e animados pelo princípio do bem comum.

Caros amigos, que o Senhor vos conceda ser fermento de regeneração da mente, do coração e do espírito, testemunhas do amor político pelos mais vulneráveis, para que, servindo-os, O possais servir em tudo o que fizerdes.

Abençoo a vós, as vossas famílias e o vosso trabalho. E também vós, peço-vos por favor, rezai por mim. Obrigado.