Na mensagem aos jovens economistas reunidos em Assis

A responsabilidade dos cristãos na visão de Francisco para um desenvolvimento plenamente humano

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24 novembro 2020

Ocristão destaca-se porque tem boas notícias, um “evangelho” a anunciar a outros homens; o cristão comprometido na economia, ou seja, na atividade de transformar o mundo para o tornar cada vez mais humano, é também o portador de uma boa notícia que tem um conteúdo preciso: «A perspetiva do desenvolvimento humano integral é uma boa notícia a profetizar e a implementar — e estes não são sonhos: este é o caminho». Eis uma das passagens-chave da mensagem que o Santo Padre enviou no sábado passado aos jovens economistas reunidos durante três dias em Assis para o grande evento da “Economia de Francisco” juntamente com outros grandes nomes das ciências económicas de todo o mundo. Portanto, o feliz anúncio de que os jovens economistas cristãos devem comunicar a todo o mundo é o que está relacionado com o desenvolvimento humano integral, um tema querido ao Papa que, em agosto de 2016, criou um novo dicastério ao serviço deste desenvolvimento.

Para explicar melhor e mais claramente o que é o “desenvolvimento”, Francisco citou as palavras da Populorum progressio  de São Paulo VI na sua mensagem vídeo: «O desenvolvimento não se reduz a um simples crescimento económico. Para ser autêntico, deve ser integral, quer dizer, promover todos os homens e o homem todo  [...] — cada homem e o homem todo! — não aceitamos que o económico se separe do humano; nem o desenvolvimento das civilizações em que ele se incluiu. O que conta para nós, é o homem, cada homem, cada grupo de homens, até se chegar à humanidade inteira».

Não se trata apenas de profetizar o desenvolvimento humano integral, mas também de o implementar: a responsabilidade que o Papa indica aos economistas cristãos é tanto grande quanto urgente, é preciso agir (“incidir”, diz Francisco) em profundidade e não amanhã, porque «a gravidade da situação atual, que a pandemia de Covid tornou ainda mais evidente, exige uma consciência responsável de todos os atores sociais, de todos nós, entre os quais tendes  um papel primordial: as consequências das nossas ações e decisões  afetar-vos-ão pessoalmente, pelo que não podeis permanecer fora dos locais onde é gerado, não digo o vosso futuro, mas o vosso presente. Não  podeis ficar fora do local onde o presente e o futuro são gerados. Ou estais envolvidos ou a história irá passar por cima de vós».

A implementação deste projeto tem um alcance “revolucionário”: é urgente elaborar respostas e novas propostas para nos opormos a essa «única lógica dominante» à qual o Papa nos lembra que «não estamos condenados».  Ele refere-se aos modelos económicos que concentram «o  interesse imediato nos lucros como unidade de medida e na procura de políticas públicas semelhantes que ignoram o  custo humano, social e ambiental. Como se pudéssemos contar com uma disponibilidade absoluta, ilimitada ou neutra de recursos». Face a uma economia meramente extrativa, o Papa indica o caminho de uma economia generativa que, contudo, não pode ser uma escolha emocional e sentimental, mas o resultado de uma elaboração cultural séria e sólida.

Cultura é outra palavra-chave na mensagem: «Afinal, falta-nos a cultura necessária para permitir e estimular a abertura de diferentes visões, baseadas num tipo de pensamento, de política, de programas educacionais, e até de espiritualidade que não se deixe fechar por uma única lógica dominante. Se há uma necessidade urgente de encontrar respostas, é indispensável crescer e apoiar grupos dirigentes capazes de elaborar cultura, iniciar processos — não esqueçais esta palavra: iniciar processos — traçar caminhos, alargar horizontes, criar pertenças...».

Estes grupos dirigentes, inspirados por uma cultura aberta à espiritualidade, serão capazes de desafiar e contrastar «certas lógicas (ideológicas) que acabam por justificar e paralisar cada ação face às injustiças» e aqui Francisco recorda a Cáritas in Veritate de Bento XVI, segundo a qual a fome «não depende tanto da escassez material como da escassez de recursos sociais, o mais importante dos quais é de natureza institucional» e acrescenta: «Se fordes capazes de resolver isto, tereis o caminho aberto para o futuro».

Eis a terceira palavra-chave da mensagem: o futuro, ou seja, a esperança, a esperança de uma fraternidade renovada. A realização do projeto de um desenvolvimento humano integral permite que cada homem «se encontrar a si mesmo como humanidade com base no melhor de si: o sonho de Deus de que aprendamos a cuidar do irmão, e do irmão mais vulnerável (cf. Gn 4, 9)». A resposta irada de Caim («Sou porventura o guarda do meu irmão?») indica a verdade do homem e aquele sonho de Deus efetivamente expresso no texto da Spe salvi de Bento XVI que o Papa oportunamente cita: «A medida da humanidade é determinada essencialmente na relação com o sofrimento e com o sofredor - a medida da humanidade. Isto aplica-se tanto ao indivíduo como à sociedade», acrescentando «uma medida que também deve ser encarnada nas nossas decisões e modelos económicos». Portanto, a medida da humanidade é  plenamente expressa pelo Bom Samaritano que assume o drama e a dor do outro, do diferente; esta é a “revolução”, a contestação das estruturas estabelecidas que é exigida a cada cristão e que abre um futuro novo e surpreendente. Neste ponto Francisco conclui a sua mensagem propondo uma grande visão: «Um futuro imprevisível já está em gestação», uma passagem que recorda a profecia de Isaías «Eis que vou realizar uma obra nova, a qual já começa: Não a vedes?», mas também a intuição de São Paulo «toda a criação geme e sofre até hoje as dores do parto» e contudo revela uma grande confiança na obra de Deus na história da humanidade, porque, conclui o Papa: «A história ensina-nos que não existem sistemas ou crises capazes de anular completamente a capacidade, o engenho e a criatividade que Deus nunca cessa de suscitar nos corações. Com dedicação e fidelidade aos vossos povos, ao vosso presente e ao vosso futuro, podeis unir-vos a outros para tecer uma nova forma de fazer história. Não temais envolver-vos e tocar a alma das cidades com o olhar de Jesus; não temais habitar corajosamente nos conflitos e encruzilhadas da história para os ungir com o aroma das Bem-aventuranças. Não temais, pois ninguém se salva sozinho».

Andrea Monda