No Alto Solimões, o primeiro diácono permanente indígena

Tocar a realidade

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28 abril 2020

A Igreja do Alto Solimões, que se estende na parte mais ocidental da Amazónia brasileira, num triângulo que se encrava entre a Colômbia e o Peru, colheu recentemente um dos primeiros frutos de uma evangelização que perdura há mais de cem anos. Nas últimas semanas foi ordenado o primeiro diácono permanente indígena: Antelmo Pereira Ângelo, pertencente à tribo Ticuna, a mais numerosa do Brasil. A ordenação teve lugar na igreja de São Francisco de Assis, em Belém do Solimões, a aldeia considerada o centro espiritual da tribo, e foi presidida pelo bispo xaveriano D. Adolfo Zon Pereira.

Na imensa diocese (131.600 km2 com uma população de 216.000 habitantes, 38% dos quais são indígenas) os frades menores capuchinhos da Úmbria (Itália) trabalham desde 1909 em prol da implantação da Igreja no seio da tribo que, embora tenha acolhido alguns elementos da cultura ocidental, não renunciou às suas peculiares caraterísticas tribais, como a língua, as festas e outras particularidades, que os missionários ajudam a manter vivas inclusive, mediante um Festival que as revigorou, recuperando também outras.

Obviamente, no rito da consagração diaconal estavam presentes algumas destas tradições, tais como os cânticos, as danças, os colares feitos de sementes, de dentes de animais, de conchas e de caracóis, juntamente com pulseiras realizadas com fibras vegetais e uma esteira preparada pelas mulheres com a casca de uma árvore chamada capinuri, da qual se obtém um tecido fibroso — tururi — também utilizado para o vestuário de forma circular, símbolo típico de proteção contra todas as forças da natureza. Pode-se falar de uma verdadeira “arte amazónica”, que não só desenvolve as capacidades criativas de crianças e adultos, mas fez também do artesanato artístico um bem produtivo.

«A diocese, composta por oito paróquias e 250 comunidades, disse o bispo, está nas mãos dos leigos: catequistas, líderes de comunidades — para os quais existe uma formação específica —  organizam a catequese, realizam a preparação para os sacramentos, animam a liturgia da palavra. E estão próximos das pessoas também nas necessidades concretas: por exemplo, cobram impostos de si mesmos para enfrentar as vicissitudes que possam verificar-se com os membros da comunidade. Na Amazónia não haveria Igreja sem os leigos. Desde que fui nomeado bispo da diocese de Alto Solimões, em 2015, reflito muito sobre o significado da realidade da primeira evangelização. Só agora compreendo o conteúdo dos livros que eu lia, quando estudava teologia. A primeira evangelização tem um ponto de partida fundamental: estar presente. É impossível semear o Evangelho, sem este primeiro elemento: estar presente, tocar a realidade. Só tocando a realidade podemos ouvir Deus que nos fala. O problema é encontrar pessoas dispostas a dedicar-se ao Senhor aqui, no meio destas pessoas». A resposta que o prelado espera poderia vir de algumas jovens que se preparam para uma forma de vida consagrada “amazónica”. Seria o melhor fruto do Sínodo sobre a Amazónia, bem como a realização do desejo do Papa: uma Igreja com rosto amazónico que exige a presença estável de líderes maduros, dotados de autoridade, «que conheçam as línguas, as culturas, a experiência espiritual e o modo de viver em comunidade nos diferentes lugares, contudo deixando espaço para a multiplicidade de dons que o Espírito Santo semeia em todos».

Egidio Picucci