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Homens de paz entre as feridas do mundo

 Homens de paz  entre as feridas do mundo  POR-008
02 julho 2025

Num cenário mundial marcado «por profundas tensões, por feridas abertas e por uma crescente necessidade de reconciliação», o núncio apostólico é chamado a ser «“um homem em paz e um homem de paz”», afirmou o arcebispo Luciano Russo, secretário da Secção para os funcionários diplomáticos da Secretaria de Estado, numa entrevista concedida aos meios de comunicação social do Vaticano por ocasião do Jubileu e do encontro dos representantes pontifícios, recebidos em audiência pelo Papa Leão XIV, na manhã de 10 de junho.

Excelência, qual é hoje, na sua opinião, a tarefa específica dos representantes pontifícios neste «delicado momento de viragem da história», como o definiu recentemente o Papa Leão XIV, marcado por tensões, conflitos e mudanças globais?

O papel do representante pontifício só pode ser vivido à luz do Evangelho. Num cenário mundial marcado por profundas tensões, por feridas abertas e por uma crescente necessidade de reconciliação, o núncio apostólico é chamado a ser, como recordava São João Paulo II, «um homem em paz e um homem de paz», contribuindo para o ministério de comunhão que brota do próprio Cristo. Estas palavras ressoam com força também hoje.

O Santo Padre Leão XIV, na sua primeira bênção Urbi et Orbi, falou da paz. Trata-se de «uma paz desarmada e desarmante, humilde e perseverante, que vem de Deus». É esta a paz que o núncio apostólico é chamado a anunciar e a perseguir, inclusive nos contextos marcados por conflitos. Nós, representantes pontifícios, devemos fazer-nos “instrumentos” desta paz.

O Jubileu oferece uma ocasião de encontro e partilha em Roma aos membros do Corpo diplomático da Santa Sé. Que desejos acompanham este momento de confronto e atualização mútuos?

O Jubileu é um tempo de graça. Será também um tempo de encontro, de escuta mútua, de fraternidade renovada. Regressar a Roma durante esta ocasião significa redescobrir as raízes do serviço: a comunhão profunda que nos liga ao Sucessor de Pedro.

Ora, é este o meu desejo: que o Jubileu nos ajude a reencontrar e preservar a dimensão pastoral do nosso serviço, que muitas vezes corre o risco de permanecer em segundo plano. Esta é uma ocasião para nos reunirmos, como irmãos, e partilhar experiências, dificuldades e orações.

Pode oferecer-nos um quadro atualizado da atual composição e distribuição geográfica do serviço diplomático da Santa Sé? Quais são os números e quais são os desafios mais relevantes hoje?

Atualmente, o Corpo diplomático da Santa Sé conta com 99 núncios apostólicos em serviço nas várias representações pontifícias no mundo, incluindo os observadores permanentes nas Nações Unidas em Nova Iorque e em Genebra. A estes juntam-se o presidente da Pontifícia Academia Eclesiástica e três núncios que, por razões de saúde, suspenderam temporariamente os seus cargos. No total, portanto, são 103 núncios apostólicos, para além dos superiores da Secretaria de Estado que, de diferentes formas, participam na mesma missão.

Ao seu lado, prestam um serviço precioso 5 representantes papais sem carácter episcopal, em organizações internacionais em Roma, Estrasburgo, Paris, Viena e Washington, bem como 3 encarregados de negócios com carácter permanente, respetivamente em Taiwan, Hong Kong e Myanmar. Importa ainda recordar que existem atualmente sete sedes vacantes: Iraque, Albânia, Argélia, Espanha, Sri Lanka, Uganda e Portugal. Soma-se a estes a missão permanente junto da Organização Mundial do Turismo. Noutros países, como Nicarágua, Sudão e Haiti, as condições locais não permitem, neste momento, a nomeação de um representante pontifício.

A esta realidade, já ampla e articulada, junta-se o grande conjunto de conselheiros, secretários e adidos de nunciatura, que com dedicação quotidiana colaboram no bom funcionamento das representações pontifícias.

Mas, para além dos números, o que quero sublinhar é a dedicação quotidiana de todos, núncios e colaboradores que, com discrição e fidelidade, se fazem voz do Sucessor de Pedro, mediadores de diálogo. Os dados que hoje apresentamos fazem o quadro de uma estrutura, mas por detrás de cada número há uma história de serviço, de oração e de disponibilidade total. E por isso não podemos deixar de dar graças a Deus.

A par dos núncios apostólicos, desempenham também um papel crucial os colaboradores com funções diplomáticas, como os assessores e os secretários de Nunciatura. Como se articula o seu serviço e que contributo específico fornecem à obra da Santa Sé nos diferentes contextos locais?

Nestes dois anos e meio em que tive a honra de servir como secretário para os funcionários diplomáticos, pude constatar de perto o valor precioso dos colaboradores das nunciaturas. Sem eles, o trabalho quotidiano das representações pontifícias não seria possível. O núncio apostólico não trabalha sozinho: faz parte de uma pequena comunidade que muitas vezes vive e trabalha em contextos delicados, onde se exige uma profunda disponibilidade para o serviço.

Estes colaboradores desenvolvem um trabalho silencioso, mas decisivo, partilhando, cada um segundo a própria função, com o núncio apostólico a responsabilidade de representar o Santo Padre.

Desejo sublinhar que não se trata apenas de funcionários competentes, mas de sacerdotes que escolheram colocar a sua vocação ao serviço deste âmbito do ministério da Igreja. A eles a minha gratidão. O meu desejo — e o meu empenho — é que cada um deles se possa sentir acompanhado, valorizado e apoiado.