· Cidade do Vaticano ·

1700 anos do concílio de Niceia

Símbolo de colegialidade

 Símbolo de colegialidade  POR-004
08 abril 2025

Este ano comemora-se o 1.700º aniversário da celebração, em Niceia, do primeiro concílio ecuménico da história. De 27 de fevereiro a 1 de março, foi-lhe dedicada uma conferência internacional, que teve lugar na Pontifícia Universidade Gregoriana. O título do encontro — organizado pela Gregoriana e pela Universidade de Münster — foi: «A confissão do concílio de Niceia, história e teologia». A seguir, excertos de um dos relatórios, sobre o tema: «O que é um sínodo e qual é a particularidade de Niceia?».

Emanuela Prinzivalli

Com base na sua etimologia, o termo synodos, composto pela preposição syn e pelo substantivo odos (percurso), significa reunião, assembleia, encontro. O seu equivalente latino é concilium. O termo é geralmente associado a um encontro com debates e, às vezes, com disputas. Heródoto (séc. v a.c.) narra que, antes da batalha decisiva de Plateias (Histórias ix.27, 43), os Atenienses e os Tegeus participaram num debate verbal sobre quem deveria comandar um dos flancos do exército.

Em resposta à narração dos Tegeus sobre as suas antigas conquistas, os Atenienses começaram o seu discurso utilizando o dispositivo retórico da praeteritio (ou paralipsis), afirmando: «Sabemos que este sínodo foi convocado para combater os bárbaros, não para fazer discursos...», antes de continuar a destacar as suas proezas passadas. A própria utilização do mecanismo retórico da praeteritio confirma que um synodos é um encontro para debater. A constatação de que Heródoto utiliza este termo demonstra que já circulava no seu tempo.

Nos textos do Novo Testamento, o termo enquanto tal não aparece, mas volta a ideia de uma reunião para debater, na célebre passagem sobre o chamado sínodo de Jerusalém, onde se diz (At 15, 6): οιου τού του («Então, os apóstolos e os anciãos reuniram-se para examinar esta questão»). O verbo sun-ago é perfeitamente semelhante, quanto ao significado, a synodos: a situação, mutatis mutandis, parece análoga à descrita por Heródoto a propósito dos Atenienses e dos Tegeus. Trata-se de uma reunião de pessoas que compartilham um objetivo comum, neste caso específico a evangelização, provenientes de várias partes e com diferentes posições, e que debatem animadamente sobre as formas de alcançar este objetivo.

Portanto, embora os modos de se reunir para debater e tomar decisões se encontrem em todas as formas de organização e governo da área mediterrânea (pensemos no senado romano) e, por isso, seja natural que se encontre entre os cristãos, nos debates dos estudiosos não é tão claro quando se pode começar a falar de sínodos cristãos no sentido técnico.

Citando as palavras de Thomas Graumann, que em 2021 publicou o volume The Acts of Early Church Councils, «from the late second century onwards, leading churchmen from more than a single locality (“civitas” or “paroikia”) convened sporadically to discuss certain challenges arising in their churches and to decide how to respond. […] These sporadic gatherings evolved over the course of the third century into more regular synods or councils».

Graumann e, um pouco, todos aqueles que se ocuparam de sínodos nos últimos anos alertam para o risco do anacronismo, ou seja, de projetar para o passado, para os vários tipos de reuniões dos séculos ii e iii, costumes e instituições posteriores, como na verdade faz Eusébio. Mas, evidentemente, tudo depende da definição hoje aceite de sínodo cristão.

O sínodo deve distinguir-se dos encontros de assembleia no âmbito de uma única Igreja: quando Paulo escreve as suas cartas, dá por certo que elas serão lidas e debatidas na assembleia dos fiéis.

Quando se decide afastar um membro da comunidade, quer por indignidade, quer por ideias dissonantes em relação às da maioria dos fiéis, faz-se em assembleia, ainda que a assembleia se limite ao clero e a poucos leigos que se destacam: ou seja, não se perde o sentido original de reunião do povo cristão. Trata-se de assembleias no seio de uma Igreja: não são sínodos!

Podemos identificar como sínodos as assembleias que se reuniram para dirimir a questão da celebração pascal no final do séc. ii.

Enrico Norelli salientou com perspicácia que, paradoxalmente, esta primeira atestação de sínodos não tem origem num desejo de colegialidade efetiva, mas no objetivo oposto de centralização. Em meados do séc. iii, a documentação torna evidente que se sente a necessidade de dispor de uma sede de recurso externa, em caso de controvérsias surgidas no seio do corpo episcopal de uma região.

Roma parece ser uma sede privilegiada para desempenhar tal tarefa, mas as suas decisões, quando é interpelada e o seu parecer não é satisfatório, não são absolutamente inquestionáveis.

No outono de 254, Cipriano reúne um sínodo de bispos africanos para debater sobre o apelo de duas Igrejas espanholas a Estêvão de Roma, a fim de reintegrar os seus bispos libellatici Basílides e Marcial. Em seguida, com diplomacia irónica, escreveu aos espanhóis que Estêvão tinha agido sem estar bem informado, aliás, enganado por Basílides.

Não é novidade que Constantino tenha convocado o concílio; já o fizera precedentemente, convocando o concílio de Arles em 314, quando era imperador do Ocidente, a pedido dos Donatistas. Eduard Schwartz definiu-o como o primeiro «concílio imperial».

Mas do seu ponto de vista, o que autoriza Constantino a convocar um concílio? A sua posição de pontifex maximus, o principal guardião e garante de todas as práticas religiosas na sociedade romana, confere-lhe tal autoridade.

Este ofício tornou-se uma prerrogativa imperial durante a era de Augusto, período que marcou uma mudança radical na comunicação religiosa com o divino. Há algo de extremamente importante e sem precedentes em Niceia: pela primeira vez, um imperador preside e dirige os trabalhos do concílio, como atesta Eusébio de Cesareia, sem contestações de outras fontes.

Mas antes disso, a situação tinha mudado, nomeadamente num aspeto fundamental: após ter derrotado o cunhado Licínio, Constantino tornou-se o único imperador, reunificando o Império romano sob o seu governo e pondo fim à diarquia. Convocou um concílio que passará para a história como o primeiro concílio ecuménico.

Isto introduz outro aspeto novo: o termo «ecuménico» já é utilizado por Eusébio na sua Vida de Constantino, indicando que se tratava de um concílio destinado a reunir bispos de todos os cantos do mundo então conhecido (incluindo um da Pérsia), embora, na prática, apenas alguns bispos tenham vindo do Ocidente. Ao longo de toda a Antiguidade, os concílios eram considerados ecuménicos, pois foram convocados por imperadores.

As disposições conciliares tiveram valor legislativo em Niceia, uma vez que Constantino ameaçou o exílio e a confiscação de bens, impondo-a a dois não signatários: a oposição tendencialmente pró-ariana ou antialexandrina foi reduzida a duas figuras e isto diz-nos quão determinante foi este aspeto para o bom êxito do concílio.

Antes do concílio, há outra novidade. Agora os bispos são altos funcionários públicos. Já em 313, a seguir à sua vitória sobre Maxêncio (Ponte Mílvio, outubro de 312), Constantino tinha isentado os bispos de todos os munera, ou seja, das obrigações públicas que o cidadão devia ao Estado, quer fossem pessoais, patrimoniais ou mistas, e a partir de 326 estendeu-as também ao Oriente. E com esta medida incorporou os bispos na estrutura do Estado.

Embora tenham sido debatidas várias questões em Niceia, incluindo o antigo problema da data da Páscoa, e tenham sido promulgados 20 cânones, o principal motivo da convocação, ainda segundo as fontes antigas e apesar de algumas dúvidas dos modernos, foi a controvérsia doutrinal que teve início com o conflito público em Alexandria entre o bispo Alexandre e o seu influente sacerdote Ário, que envolveu as principais sedes episcopais do Oriente e viu a oposição a Alexandre dos dois bispos mais importantes daquela época, Eusébio de Cesareia e Eusébio de Nicomédia, sede imperial.

Em relação aos símbolos de fé utilizados até então nas várias Igrejas, o símbolo niceno contém um artigo que tenciona lançar o olhar sobre a imanência divina, e não só sobre a economia.

Além disso, é a primeira vez que um sínodo decide a subscrição comum de um Credo, ou a segunda vez, se quisermos considerar um Credo a profissão contida na carta sinodal de Antioquia: embora o significado intangível de Niceia se tenha consolidado com o passar do tempo, a curto prazo o acordo levou ao prolongamento do conflito doutrinário, durante todo o séc. iv: naquela época, Constantino considerava o símbolo niceno apenas um modo de encerrar uma disputa doutrinal que, a seu ver, nunca deveria ter iniciado, dado que a considerava, como sobressai da sua missiva a Alexandre e Ário, uma investigação perigosa sobre um mistério demasiado excelso para a mente humana. Ao contrário, como atesta a sua carta enviada a todas as Igrejas imediatamente após o concílio, ao povo devia ser assegurada a unidade do culto, de onde advém a valorização da decisão sobre o dia da celebração pascal numa data diferente da Páscoa judaica.

Também os 20 cânones de Niceia representam, em grande parte, uma novidade, comparados com as duas séries de cânones de concílios orientais imediatamente precedentes, a saber, os 25 de Ancira, em 314, e os 15 de Neocesareia, na Capadócia (de 314 a 319).

Em Ancira prevalecem os cânones relativos às consequências da perseguição de Diocleciano, seguidos pelos cânones dedicados à ética comunitária, onde sobressaem as difíceis condições do âmbito rural com o pecado da zoofilia, ou o eterno problema do aborto, onde se evidencia grande compreensão do sínodo em relação às mulheres, e há espaço para documentar um delito fortuito: um noivo engravida a irmã da namorada, casa com a noiva e a irmã seduzida enforca-se.

Em terceiro lugar estão os cânones relativos à disciplina do clero. O concílio de Neocesareia trata apenas de duas matérias: as transgressões no âmbito conjugal e sexual (cc. 1-6) e a disciplina do clero (cc. 7-15). Se compararmos o que pudemos evidenciar com os 20 cânones de Niceia — o único documento que sobreviveu ao concílio, além do símbolo — constatamos, apesar da persistência de certos problemas, a emergência de outros que dizem respeito à dimensão global das relações entre as principais sés. (...) Niceia permitiu que os cristãos pudessem ter uma fé comum a proclamar, mas causou também um aumento exponencial da intolerância que cresceu com dois problemas sucessivos: primeiro, no séc. iv, a obrigação de continuar a definir a fé com a produção de símbolos e, depois, a proibição de acrescentar algo ao intocável, de tal modo que, na realidade, o próprio Credo niceno-constantinopolitano, considerado por Calcedónia em conformidade com Niceia, devido à inserção do Filioque, continua a dividir no exato momento em que gostaria de unir.