
Paolo Ondarza
Aviagem dos peregrinos dos primeiros Jubileus não era fácil. O romeiro, ou seja, aquele que na Idade Média, vindo de todas as partes do mundo, fazia o voto de ir a Roma para rezar junto dos túmulos de Pedro e Paulo, venerar as relíquias da Terra Santa ou visitar os lugares de martírio dos primeiros cristãos, empreendia a viagem a pé, enfrentando numerosos obstáculos, incógnitas e dificuldades. Antes de partir, levava no alforge o necessário para os primeiros dias de viagem. Mas o que acontecia quando a comida acabava? Ao longo do caminho, era essencial parar para descansar e refrescar-se. As pessoas batiam então à porta das casas, dos conventos ou dos albergues, procurando abrigo contra as intempéries e alimentos simples mas nutritivos, capazes de lhes restituir as energias para continuar a viagem.
Existe um alimento do peregrino, um livro de receitas específico para o Jubileu? «Se procurarmos, encontraremos certamente receitas interessantes», explica o pe. Andrea Ciucci, coordenador do Secretariado da Pontifícia academia para a vida e autor de numerosos livros sobre o assunto. «Fala-se de borrego preparado com ervas muito perfumadas, de cerejas com açúcar — excelentes no gelado — ou de sopa de cevada, de pão, de alho francês e de ovos. Até um simples queijo curado, como o queijo de cabra, era um valioso aliado contra os enjoos de viagem, graças ao triptofano, uma substância que estimula a produção de serotonina com efeitos relaxantes e antioxidantes».
Entre os alimentos tradicionais contam-se também as “crespelle” ou crêpes, doces ou salgadas, do Papa Gelásio, que se diz terem sido oferecidas no século v pelo Pontífice a um grupo de peregrinos que tinham vindo a Roma de além-Alpes para a festa da Candelária. A partir de então, tornar-se-ão um prato típico da cozinha francesa. Trata-se, no entanto, de receitas clássicas da tradição romana, mas que, na realidade, não têm qualquer relação direta com o Jubileu. Por conseguinte, não existe uma verdadeira gastronomia do peregrino, específica para esta celebração.
«Em Roma, — continua o pe. Andrea Ciucci — os peregrinos, quando chegavam à cidade, eram acolhidos e alimentados com comida gratuita e nutritiva: sopas, legumes, produtos da horta, tudo o que pudesse ser partilhado. Por vezes, eram alimentos simples e um pouco secos, de acordo com o espírito penitencial do Jubileu».
Encontrámos o padre no convento de San Francesco a Ripa, em Trastevere. Com a sua magnífica igreja barroca, tesouro de obras-primas artísticas como O êxtase da Beata Ludovica Albertoni, de Gian Lorenzo Bernini, este lugar foi e continua a ser um ponto de referência para o acolhimento dos pobres e dos últimos. Na antiguidade, aqui se encontrava o hospício de San Biagio, dirigido pelos beneditinos de Ripa Grande: um albergue que oferecia hospedagem aos viandantes, aos necessitados e, sobretudo, aos leprosos. Entre os peregrinos que aí encontravam abrigo, destaca-se um nome ilustre: de facto, segundo as crónicas, Francisco de Assis nele se hospedou várias vezes durante as suas visitas a Roma para se encontrar com Inocêncio iii. A sua cela, ainda intacta, tornou-se um lugar de oração e de devoção ao longo dos séculos.
Quem lhe ofereceu hospitalidade foi a matrona romana Jacopa de’ Settesoli, a quem ele chamava carinhosamente Frei Jacopa, devido à profunda amizade que os unia. E é a esta mulher que se deve um alimento que remonta à tradição culinária dos peregrinos: o famoso mostacciolo, um doce que Jacopa preparava para o santo com ingredientes simples e genuínos, como amêndoas, mel, mosto de uvas, figos secos e uvas passas.
Conta-se que, em 1226, na Porciúncula, Francisco, à beira da morte, pediu aos seus companheiros que mandassem chamar a fidalga, pois desejava saborear pela última vez os seus deliciosos mostaccioli. Mas Jacopa, quase pressagiando a sua despedida iminente, já estava a caminho de Assis, onde chegou a tempo de cumprir o desejo do santo.
No sinal da partilha, do acolhimento e da gratuidade, entrelaçam-se muitas histórias que, ligadas à comida dos peregrinos, traçam o rosto mais autêntico do Jubileu. «Jubileu — conclui o pe. Andrea Ciucci — significa reconsiderar o modo de estar juntos, o modo como Deus pensa o mundo e as nossas relações. Vindo a Roma e atravessando a Porta Santa, os peregrinos experimentarão também o valor da partilha do alimento segundo a lógica divina. Se assim for, teremos tido sucesso: o alimento será verdadeiro e profundo, para o corpo e para a alma».