Na tarde de 15 de dezembro, o Papa Francisco celebrou a santa missa do domingo iii do Advento na Place d’Austerlitz, em Ajácio. Participaram aproximadamente quinze mil pessoas, incluindo os presentes na praça conhecida como “U Casone” e quantos acompanhavam nas áreas da cidade onde foram colocados ecrãs gigantes. Eis o texto da homilia proferida pelo Pontífice nessa circunstância.
As pessoas perguntam a João Batista: «Que devemos, então, fazer?» (Lc 3, 10). É uma pergunta que deve ser escutada com atenção, porque exprime o desejo de renovar a vida, de a mudar para melhor. João está a anunciar a chegada do Messias há muito esperado: quem ouve a pregação do Batista quer preparar-se para esse encontro, para o encontro com o Messias, para o encontro com Jesus.
O Evangelho segundo Lucas testemunha que são precisamente os mais distantes que exprimem este desejo de conversão: não aqueles que socialmente pareciam ser mais próximos, não os fariseus e os doutores da lei, mas os distantes, os publicanos, que eram considerados pecadores, e os soldados que perguntam: «Mestre, que havemos de fazer?» (Lc 3, 12). Esta é uma boa pergunta, que talvez hoje, antes de ir dormir, cada um de nós pode pronunciar como oração: “Senhor, que hei de fazer para preparar o coração em vista do Natal?”. Quem se considera justo não se renova. Mas, aqueles que eram considerados pecadores públicos querem passar de uma conduta desonesta e violenta para uma vida nova. E quem está longe torna-se próximo quando Cristo se faz próximo de nós. Com efeito, João responde aos publicanos e aos soldados deste modo: praticai a justiça, sede retos e honestos (cf. Lc 3, 13-14). Implicando especialmente os últimos e os excluídos, o anúncio do Senhor desperta as consciências, porque Ele vem para salvar e não para condenar quem está perdido (cf. Lc 15, 4-32). E o melhor que podemos fazer para sermos salvos e procurados por Jesus é dizer a verdade sobre nós próprios: “Senhor, sou pecador”. Todos nós que aqui estamos o somos. “Senhor, sou um pecador”. E, assim, nos aproximamos de Jesus com a verdade, não com a maquillage de uma justiça falsa. Porque ele vem precisamente salvar os pecadores.
E por isso, também hoje fazemos nossa a pergunta que as multidões colocaram a João Batista. Neste tempo de Advento, tenhamos a coragem de perguntar, sem medo: “Que devo fazer?” “que devemos fazer?”. Perguntemo-nos com sinceridade, para preparar um coração humilde e confiante ao Senhor que vem.
As Escrituras que escutámos apresentam-nos dois modos de esperar o Messias: a espera suspeitosa e a espera alegre. Pode esperar-se a salvação com estas duas atitudes: a espera suspeitosa e a espera alegre. Reflitamos sobre estas atitudes espirituais.
O primeiro modo de esperar, o suspeitoso, está cheio de desconfiança e ansiedade. Aquele que tem a mente ocupada com pensamentos egocêntricos perde a alegria da alma: em vez de vigiar com esperança, duvida do futuro. Totalmente envolvido em projetos mundanos, não espera a obra da Providência. Não sabe esperar com a esperança que nos dá o Espírito Santo. Surge então a palavra salutar de São Paulo, que sacode deste torpor: «Por nada vos deixeis inquietar» (Fl 4, 6). Quando a angústia se apodera de nós, arruína-nos sempre. Uma coisa é a dor, a dor física, a dor moral por alguma calamidade na família...; outra coisa é a angústia. O cristão não deve viver com a angústia. Não andeis angustiados, desiludidos, tristes. Como estão difundidos estes males espirituais hoje em dia, sobretudo onde se difunde o consumismo! Nestes dias, via nas ruas de Roma muita gente a ir às compras, com a ansiedade do consumismo, que depois desaparece e não deixa nada. Uma sociedade assim, que vive do consumismo, envelhece insatisfeita, porque não sabe dar: quem vive para si nunca será feliz. Quem vive assim [mão fechada] e não faz isto [mão aberta] não é feliz. Quem tem as mãos assim [mão fechada], para mim, e não tem mãos para dar, para ajudar, para partilhar, nunca será feliz. E este é um mal que todos nós podemos ter, todos os cristãos, mesmo nós, padres, bispos, cardeais, toda a gente, até o Papa.
No entanto, o Apóstolo oferece-nos um remédio eficaz quando escreve: «em tudo, pela oração e pela prece, apresentai os vossos pedidos a Deus em ações de graças» (Fl 4, 6). A fé em Deus dá esperança! Precisamente nestes dias, no Congresso que aqui teve lugar em Ajácio, foi sublinhada a importância de cultivar a fé, valorizando o papel da piedade popular. Pensemos na oração do Rosário: se for redescoberta e bem praticada, ensina-nos a manter o coração centrado em Jesus Cristo, com o olhar contemplativo de Maria. E pensemos nas confrarias, que nos podem educar para o serviço gratuito ao próximo, tanto espiritual como corporal. Estas associações de fiéis, tão ricas de história, participam ativamente na liturgia e na oração da Igreja, que embelezam com os cânticos e as devoções do povo. Aos membros das confrarias, recomendo que, sempre e com disponibilidade, se aproximem, sobretudo das pessoas mais frágeis, tornando a fé operosa na caridade. Aquela confraria que tem uma devoção especial torne-se próxima de todos, esteja ao lado do próximo para o ajudar.
E daqui chegamos à segunda atitude: a espera alegre. A primeira atitude era a espera suspeitosa, que é “para mim”, com as mãos que se fecham. A segunda atitude é a espera alegre. E não é fácil ter alegria. A alegria cristã não é de modo algum irrefletida, superficial, uma alegria de carnaval. Nada disso. Pelo contrário, é uma alegria do coração, assente num fundamento sólido, que o profeta Sofonias, dirigindo-se ao povo, exprime assim: alegra-te, porque «o Senhor, teu Deus, está no meio de ti como poderoso salvador» (Sf 3, 17). Confiar no Senhor que está no meio de nós, que está connosco. Muitas vezes não nos lembramos disto: ele está no meio de nós quando fazemos uma boa ação, quando educamos os filhos, quando cuidamos dos idosos. Mas não está no meio de nós quando nos dedicamos a bisbilhotar, falando sempre mal dos outros. Aí não está o Senhor, estamos somente nós. A vinda do Senhor traz-nos a salvação: é, por isso, motivo de alegria. Deus é “poderoso”, diz a Escritura: pode redimir a nossa vida porque é capaz de realizar o que diz! Portanto, a nossa alegria não é uma consolação ilusória para esquecer as tristezas da vida. Não, não é uma consolação ilusória. A nossa alegria é fruto do Espírito Santo por meio da fé em Cristo Salvador, que bate ao nosso coração, libertando-o da tristeza e do tédio. Por conseguinte, o advento do Senhor torna-se uma celebração cheia de futuro para todos os povos: na companhia de Jesus, descobrimos a verdadeira alegria de viver e de dar os sinais de esperança que o mundo espera.
E o primeiro destes sinais de esperança é a paz. Aquele que vem é o Emanuel, o Deus connosco, que dá a paz aos homens por Ele amados (cf. Lc 2, 14). Neste tempo de Advento, enquanto nos preparamos para O acolher, que as nossas comunidades cresçam na capacidade de acompanhar todos, especialmente os jovens, no caminho rumo ao Batismo e aos Sacramentos; e também de uma forma especial os velhinhos, os idosos. Os idosos são a sabedoria de um povo. Não o esqueçamos! E cada um de nós pode pensar: como é que eu me comporto perante os idosos? Vou à procura deles? Perco tempo com eles? Ouço-os? “Oh não, eles são aborrecidos, com as suas histórias!”. Abandono-os? Quantos filhos abandonam os pais nos lares de terceira idade. Lembro-me que uma vez, na minha outra diocese, fui a um lar de idosos para visitar as pessoas. E estava lá uma senhora que tinha três ou quatro filhos. Perguntei-lhe: “E como estão os seus filhos?” — “Estão ótimos! Tenho muitos netos” — ‘E eles vêm visitá-la?’ – “Sim, vêm sempre”. Quando saí, a enfermeira disse-me: “Vêm uma vez por ano”. Todavia, a mãe encobria os defeitos dos filhos. Muitos deixam os velhinhos sós. Mandam votos de Natal ou de Páscoa pelo telefone! Cuidem dos idosos, que são a sabedoria de um povo!
E pensemos nos jovens que se preparam para o Batismo e os Sacramentos. Graças a Deus, na Córsega, são muitos! Parabéns! Nunca vi tantas crianças como aqui! É uma graça de Deus! E só vi dois cachorrinhos. Queridos irmãos, tende filhos, que serão a vossa alegria, a vossa consolação no futuro. Esta é a verdade: nunca vi tantas crianças. Só em Timor-Leste é que havia assim tantas, mas nas outras cidades não foi assim. Esta é a vossa alegria e a vossa glória.
Irmãos e irmãs, infelizmente sabemos bem que não faltam grandes motivos de tristeza entre as nações: miséria, guerras, corrupção, violência. Vou dizer-vos uma coisa: por vezes aparecem nas audiências crianças ucranianas, que foram trazidas por causa da guerra. E sabem que mais? Essas crianças não sorriem! Esqueceram o sorriso. Por favor, pensemos nas crianças dos países em guerra, na dor de tantas crianças.
A Palavra de Deus, porém, encoraja-nos sempre. E perante as devastações que oprimem os povos, a Igreja proclama uma esperança certa, que não desilude, porque o Senhor vem habitar no meio de nós. Assim, o nosso compromisso em favor da paz e da justiça encontra na sua vinda uma força inesgotável.
Irmãs e Irmãos, em cada tempo e em qualquer tribulação. Cristo está presente, Cristo é a fonte da nossa alegria. Ele está connosco na tribulação para nos levar em frente e nos dar alegria. Conservemos sempre esta alegria no coração, esta certeza de que Cristo está connosco e caminha ao nosso lado. Não o esqueçamos! E assim, com esta alegria, com esta segurança de que Jesus está connosco, seremos felizes e faremos os outros felizes. Deve ser este o nosso testemunho!