· Cidade do Vaticano ·

Mensagem de Francisco ao Patriarca ecuménico Bartolomeu por ocasião da festa de Santo André

Num mundo flagelado
por guerras os cristãos sejam testemunhas de fraternidade

 Num mundo flagelado por guerras  os cristãos sejam testemunhas de fraternidade  POR-049
05 dezembro 2024

No âmbito da tradicional troca de delegações para as respetivas festas dos santos padroeiros, a 29 de junho em Roma para a celebração dos Santos Pedro e Paulo e no dia 30 de novembro em Istambul para a festa de Santo André, o cardeal Kurt Koch, prefeito do Dicastério para a promoção da unidade dos cristãos, chefiou a delegação da Santa Sé para a festa do Patriarcado ecuménico. O purpurado estava acompanhado pelos outros superiores do Dicastério, D. Flavio Pace, secretário, e monsenhor Andrea Palmieri, subsecretário. Uniu-se à delegação em Istambul o núncio apostólico na Turquia, D. Marek Solczyński. A delegação da Santa Sé participou na divina Liturgia presidida pelo Patriarca ecuménico, Sua Santidade Bartolomeu, na igreja patriarcal de São Jorge no Fanar, e teve um encontro com o Patriarca e com a Comissão sinodal encarregada das relações com a Igreja católica. O cardeal Koch entregou ao Patriarca ecuménico uma mensagem autografada pelo Santo Padre, que leu no final da divina Liturgia.

A Sua Santidade Bartolomeu
Arcebispo de Constantinopla
Patriarca Ecuménico

Santidade, amado irmão em Cristo!

A comemoração litúrgica do Apóstolo André, padroeiro do Patriarcado ecuménico de Constantinopla, oferece-me a oportuna ocasião para manifestar, em nome de toda a Igreja católica e em meu próprio nome, cordiais votos a Vossa Santidade, aos Membros do Santo Sínodo, ao clero, aos monges e a todos os fiéis reunidos na Catedral patriarcal de São Jorge no Fanar. Transmito também a certeza das minhas fervorosas preces a fim de que Deus Pai, fonte de todos os dons, conceda abundantes bênçãos celestes por intercessão de Santo André, primeiro entre os chamados e irmão de São Pedro. A delegação que enviei novamente este ano demonstra o afeto fraterno e o profundo respeito que continuo a ter por Vossa Santidade e pela Igreja confiada ao seu cuidado pastoral.

Há poucos dias, a 21 de novembro, celebrou-se o 60º aniversário da promulgação do Decreto Unitatis redintegratio, que marcou a entrada oficial da Igreja católica no movimento ecuménico. Este importante documento do Concílio Vaticano ii abriu o caminho para o diálogo com outras Igrejas. O nosso diálogo com a Igreja ortodoxa foi e continua a ser particularmente fecundo. O primeiro dos frutos alcançados é certamente a renovada fraternidade que hoje vivemos com particular intensidade, e por isso dou graças a Deus Pai Todo-Poderoso. No entanto, o que a Unitatis redintegratio propõe como finalidade última do diálogo, a plena comunhão entre todos os cristãos, compartilhando o único cálice eucarístico, ainda não se concretizou nem sequer com os nossos irmãos e irmãs ortodoxos. Isto não surpreende, uma vez que divisões milenares não se podem superar em poucas décadas. Ao mesmo tempo, como afirmam alguns teólogos, o objetivo de restabelecer a plena comunhão tem uma inegável dimensão escatológica, na medida em que o caminho da unidade coincide com o da salvação já concedida em Jesus Cristo, da qual a Igreja só participará plenamente no fim dos tempos. Isto não significa que devemos perder de vista o fim último, a que todos aspiramos, nem podemos perder a esperança de que tal unidade possa ser alcançada no decurso da história e dentro de um prazo razoável. Católicos e ortodoxos nunca devem deixar de rezar e trabalhar juntos a fim de se dispor para aceitar o dom divino da unidade.

O esforço irreversível da Igreja católica no caminho do diálogo foi reiterado pela recente Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que teve lugar no Vaticano de 2 a 27 de outubro de 2024. O impulso em vista de um renovado exercício da sinodalidade na Igreja católica certamente favorecerá as relações entre a Igreja católica e a Igreja ortodoxa, que sempre manteve viva esta dimensão eclesial constitutiva. Além das decisões concretas que resultarão dos trabalhos da Assembleia, durante esses dias pudemos experimentar um clima de diálogo autêntico e franco. Num mundo dilacerado pela oposição e a polarização, os participantes na Assembleia, apesar da proveniência de experiências muito diferentes, conseguiram ouvir-se uns aos outros sem julgar nem condenar. Ouvir sem condenar deveria ser também o modo como católicos e ortodoxos seguem o seu caminho rumo à unidade. Sinto-me particularmente feliz que também representantes de outras Igrejas, incluindo o metropolita Job da Pisídia, delegado do Patriarca ecuménico de Constantinopla, participaram ativamente no processo sinodal. A sua presença e trabalho assíduo enriqueceram a todos e foram um sinal tangível da atenção e do apoio a este processo sinodal.

Santidade, o iminente 1.700º aniversário do primeiro Concílio ecuménico de Niceia será uma ulterior oportunidade para dar testemunho da crescente comunhão já existente entre todos os batizados em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Já manifestei várias vezes o desejo de poder celebrar este acontecimento com Vossa Santidade e agradeço sinceramente a todos aqueles que já começaram a trabalhar para o tornar possível. Este aniversário não diz respeito apenas às duas antigas Sedes que participaram ativamente no Concílio, mas a todos os cristãos que continuam a professar a sua fé com as palavras do Credo niceno-constantinopolitano. A comemoração deste importante evento certamente fortalecerá os vínculos já existentes, encorajando todas as Igrejas a dar um renovado testemunho no mundo atual. A fraternidade vivida e o testemunho oferecido pelos cristãos serão também uma mensagem para o nosso mundo flagelado pela guerra e a violência. A este propósito, uno-me de bom grado à sua oração pela paz na Ucrânia, Palestina, Israel e Líbano, bem como em todas as regiões onde se trava aquela a que muitas vezes chamei uma “guerra mundial em pedaços”.

Com estes sentimentos, renovo a Vossa Santidade os meus cordiais bons votos. Confiando-o à intercessão dos Santos Irmãos Pedro e André, troco com Vossa Santidade um abraço fraterno em Cristo Nosso Senhor.

Roma, São João de Latrão, 30 de novembro de 2024

Francisco