· Cidade do Vaticano ·

Discurso do Santo Padre à Assembleia plenária da Pontifícia academia das ciências

O verdadeiro progresso baseia-se na dignidade humana

 O verdadeiro progresso baseia-se na dignidade humana  POR-039
26 setembro 2024

O «verdadeiro progresso» não é aquele que agrava «as desigualdades e os conflitos», mas o que se baseia na «dignidade intrínseca de cada pessoa» e na «fraternidade», melhorando «a qualidade de vida de toda a humanidade»: foi o foco do discurso do Papa Francisco entregue à Assembleia plenária da Pontifícia academia das ciências – inaugurada a 23 de Setembro na Casina Pio iv , no Vaticano. A Assembleia, que terminou na quarta-feira, 25 de setembro, teve como tema: “Ciências para a sustentabilidade e o bem-estar no antropoceno — Oportunidades, desafios e inteligência artificial”. Publicamos em seguida o texto do discurso do Santo Padre.

Caro Presidente, Eminência distintos Senhoras
e Senhores!

Saúdo-vos cordialmente, a vós que compondes a Pontifícia Academia das Ciências e, de modo particular, saúdo os novos membros. A vossas investigações e competências são muito importantes no mundo complexo em que vivemos. Agradeço ao Presidente, Joachim von Braun, e ao Chanceler, Cardeal Peter Turkson, e aos Académicos por terem escolhido os temas do Antropoceno e da Inteligência Artificial para o estudo e a discussão na Assembleia Plenária deste ano.

Todos nós estamos cada vez mais preocupados com o forte impacto da humanidade na natureza e nos ecossistemas. Tomei conhecimento de que um de vós, Paul Crutzen, ao descrever este impacto na criação, se referiu ao processo como constituindo a Era do Antropoceno. Alguns membros da vossa Academia foram dos primeiros a identificar o impacto crescente das atividades humanas na criação, estudando os riscos e problemas que lhe estão associados. O Antropoceno está, de facto, a revelar as suas consequências cada vez mais dramáticas para a natureza e para os seres humanos, especialmente na crise climática e perda de biodiversidade.

Por isso, estou grato que a Pontifícia Academia das Ciências continue a concentrar-se em questões como estas, com particular atenção às suas implicações para os pobres e os marginalizados. As ciências, na sua busca de conhecimento e compreensão do mundo físico, nunca devem perder de vista a importância de utilizar esse conhecimento para servir e promover a dignidade das pessoas e da humanidade no seu conjunto.

Enquanto o mundo enfrenta graves desafios sociais, políticos e ambientais, vemos claramente a urgência de um contexto mais amplo, no qual o discurso público inclusivo seja informado não só pelas várias disciplinas científicas, mas também pela participação de todos os componentes sociais. A este respeito, acolho com satisfação e louvo vivamente a intenção da Academia, nas suas várias Conferências, de prestar atenção às pessoas marginalizadas e pobres, incluindo os povos indígenas e a sua sabedoria nos seus encontros.

Este ano, a vossa Assembleia plenária considera também novos conhecimentos emergentes e inovações, bem como relativas oportunidades para a ciência e a saúde do planeta. Penso, em particular, nos desafios colocados pelo progresso realizado na Inteligência Artificial. Este desenvolvimento pode revelar-se benéfico para a humanidade, por exemplo, promovendo inovações nos setores da medicina e dos cuidados de saúde, bem como ajudando a proteger o ambiente natural e permitindo a utilização sustentável dos recursos à luz das alterações climáticas. No entanto, como vemos, também pode ter graves implicações negativas para a população, especialmente para as crianças e os adultos mais vulneráveis. Além disso, há que reconhecer e prevenir os riscos dos usos manipuladores da Inteligência Artificial para moldar a opinião pública, influenciar as escolhas de consumo e interferir com os processos eleitorais.

Estes desafios recordam-nos a dimensão imutavelmente humana e ética de todo o progresso científico e tecnológico. Desejo, portanto, reafirmar a convicção da Igreja de que «A dignidade intrínseca de cada pessoa e a fraternidade que nos une como membros da única família humana devem estar na base do desenvolvimento de novas tecnologias [...]. Os avanços tecnológicos que não conduzem a uma melhoria da qualidade de vida da humanidade inteira, antes pelo contrário agravam as desigualdades e os conflitos, nunca poderão ser considerados um verdadeiro progresso.» (Mensagem para o Dia Mundial da Paz 2024, 2). Neste sentido, o impacto das formas de Inteligência Artificial em cada povo e na comunidade internacional requer mais atenção e estudo. Apraz-me saber que a Pontifícia Academia das Ciências, por sua vez, está a trabalhar para propor normas adequadas a fim de prevenir os riscos e promover os benefícios neste complexo campo.

Queridos amigos, num momento no qual parecem prevalecer as crises, as guerras e as ameaças à segurança mundial, os vossos contributos pacatos para o progresso do conhecimento ao serviço da família humana são ainda mais importantes para a causa da paz global e da cooperação internacional. Agradeço-vos a vossa participação nos trabalhos da Academia e apresento-vos os meus calorosos votos para as deliberações da atual Assembleia Plenária. Sob vós, sob as vossas famílias e sob todos os que estão associados ao vosso importante compromisso, invoco as abundantes bênçãos de Deus. E peço-vos, por favor, que vos lembreis de mim nas vossas orações. Obrigado.