«Se pensarmos num túnel, facilmente imaginamos um caminho escuro que, sobretudo se estivermos sozinhos, pode dar-nos medo». Foi assim que o Papa introduziu a saudação que quis levar até dentro do Túnel da amizade, que em Jacarta liga a mesquita Istiqlal, a maior da Ásia, à Catedral de Santa Maria da Assunção. E com estas palavras captou toda a força paradoxal deste lugar. De facto, um túnel é geralmente um lugar obscuro, e se há uma luz, é no fim. «Aqui, pelo contrário, é diferente», acrescentou o Papa, «porque tudo está iluminado. Gostaria de vos dizer, porém, que sois vós a luz que o ilumina, com a vossa amizade, a concórdia que cultivais, o apoio que dais uns aos outros, e com o vosso caminhar juntos que vos conduz, no fim do caminho, à plena luz».
Há assim uma luz, não no fim, mas no princípio, antes, durante e depois, em todo o lado. Porque se és luz, vais em direção à luz. Um pouco como aquele homem fechado no labirinto de que fala o escritor alemão Michael Ende: «há um homem fechado dentro de um labirinto. Para ser feliz tem de sair do labirinto, mas para sair do labirinto tem de ser feliz».
O Papa Francisco indicou aos presentes a luz que ilumina todo o túnel e depois, alguns minutos mais tarde, no final do seu discurso no encontro inter-religioso que teve lugar na mesquita, disse-lhes: «Obrigado pelo vosso sorriso gentil, que brilha sempre nos vossos rostos e é sinal da vossa beleza e abertura interior. Que Deus vos conceda este dom». Os homens que sorriem com gentileza são eles próprios essa luz resplandecente no túnel.
É interessante observar que o Papa quando afirma o esplendor luminoso desse sorriso reza também a Deus para que conceda esse dom. As duas coisas andam juntas; os homens podem ser luz, mas só se se tornarem “espaçosos”, acolhedores de uma luz que vem de fora, espaçosos e também “transparentes” de modo a refletir essa luz. Isto porque, como explicou o Papa no mesmo dia, durante a homilia da missa no estádio Gelora Bung Carno, «o coração humano está sempre à procura de uma verdade capaz de alimentar e saciar o seu desejo de felicidade; que não nos podemos contentar apenas com palavras humanas, com os critérios deste mundo, com juízos terrenos; precisamos sempre de uma luz que venha do alto para iluminar os nossos passos».
Somos luz e, ao mesmo tempo, a nossa é luz refletida. Somos simultaneamente crentes e descrentes, como o pai da criança possuída pelo espírito que se dirige a Jesus com a oração mais intensa e pungente, na palavra “mais humana” que se pode dizer: «Creio, ajuda-me na minha incredulidade» (Mc 9, 24). A nossa possibilidade de ser luz é tanto real quanto frágil. Muitas vezes, de facto, caímos na sombra da qual, por vezes, somos nós próprios os autores. «A luz está à tua volta», diz a personagem de Black ao White (do Preto ao Branco) de Sunset Limited de Cormac McCarthy, «mas tu não vês nada a não ser sombra. E a sombra é tua. És tu que a fazes».
Daí brota a responsabilidade para com aqueles que caminham na luz da fé: «Nós, crentes”, recordou o Papa na sua saudação, “que pertencemos a diferentes tradições religiosas, temos um papel a desempenhar: ajudar todos a atravessar o túnel com o olhar virado para a luz». Para dar a nossa luz aos outros é, portanto, necessário reconhecer que essa luz não é nossa, mas é um dom, como nos recorda poeticamente o Salmo 35, 10: «Em ti está a fonte da vida, da tua luz vemos a luz».
É necessária, portanto, a humildade: «A nossa vida de fé inicia», afirmou o Papa na homilia da Missa, «quando humildemente acolhemos Jesus no barco da nossa existência, abrimos espaço para Ele, escutamos a sua Palavra e deixamo-nos interpelar, abalar e transformar por ela». Também aqui, no apelo à responsabilidade de ser luz, gentil e humilde, do mundo, reside o sentido desta longa viagem do Papa Francisco ao outro lado do mundo.
Andrea Monda