· Cidade do Vaticano ·

Instrumentum laboris da segunda sessão da XVI assembleia geral do Sínodo dos bispos

Uma Igreja a caminho com o compromisso missionário
de todos

 Uma Igreja a caminho  com o compromisso missionário de todos  POR-028
11 julho 2024

Como ser uma Igreja sinodal missionária? Esta é a pergunta de fundo da qual parte o Instrumentum laboris da próxima sessão do Sínodo dos Bispos, programada de 2 a 27 de outubro sobre o tema «Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão», a segunda da xvi assembleia geral ordinária, depois da de 2023. O documento recolhe os frutos da reunião do ano passado, integrando-os com os resultados de outros encontros, como o encontro internacional de párocos (realizado em Sacrofano, na província de Roma, de 29 de abril a 2 de maio últimos) e os dos dez grupos de estudo que, em nome do Papa, aprofundaram algumas questões que surgiram no Sínodo de 2023. O documento — publicado a 9 de julho, e apresentado na Sala de Imprensa da Santa Sé — não oferece «respostas pré-fabricadas», mas sim «indicações e propostas» sobre como a Igreja, no seu conjunto, pode e poderá responder «à necessidade de ser “sinodal em missão”», ou seja, uma Igreja mais próxima das pessoas, menos burocrática, que seja casa e família de Deus, na qual todos os batizados sejam corresponsáveis e participem na sua vida na distinção dos seus diferentes ministérios e funções.

As cinco partes do documento

O documento está estruturado em cinco secções: introdução, fundamentos e três partes centrais. A introdução recorda o caminho percorrido até agora e destaca os marcos já alcançados, como a utilização generalizada da metodologia sinodal da Conversação no Espírito. Seguem-se os fundamentos (n.ºs 1-18) que se detêm na compreensão da sinodalidade, entendida como um caminho de conversão e de reforma. Num mundo marcado por divisões e conflitos, sublinha-se, a Igreja é chamada a ser sinal de unidade, instrumento de reconciliação e escuta para todos, especialmente para os pobres, os marginalizados, as minorias afastadas do poder. «Como a lua — lê-se no Il — a Igreja brilha com uma luz refletida: não pode entender a sua própria missão num sentido autorreferencial, mas recebe a responsabilidade de ser sacramento de vínculos, de relações e de comunhão em vista da unidade de todo o género humano» (n. 4). Reiterando, portanto, que «a sinodalidade não implica de modo algum a desvalorização da autoridade particular e da tarefa específica que o próprio Cristo confia aos pastores» (n. 8), o documento sublinha que «a sinodalidade não é um fim em si mesma» e recorda a ligação entre ela e a missão, «intimamente unidas» (n. 9).

Valorização da mulher na Igreja

As fundações dão também um amplo espaço (n. 13-18) à reflexão sobre o papel da mulher em todos os sectores da vida da Igreja, sublinhando «a necessidade de reconhecer mais plenamente» os seus carismas e a sua vocação. «Deus escolheu algumas mulheres como primeiras testemunhas e anunciadoras da Ressurreição», recorda o Il; elas, portanto, «em virtude do Batismo, estão em condição de plena igualdade, recebem a mesma efusão dos dons do Espírito e são chamadas ao serviço da missão de Cristo». A primeira mudança a ser feita, portanto, «é a de mentalidade», com «uma conversão a uma visão de relacionalidade, interdependência e reciprocidade entre mulheres e homens, que são irmãs e irmãos em Cristo, em vista da missão comum».

Participação e responsabilidade

Nalgumas culturas, como se depreende do Il, «continua a ser forte a presença do machismo»; por isso, pede-se à segunda sessão sinodal «uma participação mais ampla das mulheres nos processos de discernimento eclesial e em todas as fases dos processos de decisão», juntamente com «um acesso mais amplo aos cargos de responsabilidade nas dioceses e nas instituições eclesiásticas», bem como nos seminários, institutos, faculdades de teologia e «no papel de juiz nos processos canónicos». As sugestões dizem respeito também às mulheres consagradas, para as quais se espera «um maior reconhecimento e um apoio mais decidido» à sua vida e ao seu carisma, bem como «o seu emprego em cargos de responsabilidade».

O diaconado feminino

Quanto à admissão de mulheres ao ministério diaconal, o Il informa que é pedida por «algumas Igrejas locais», enquanto outras «reiteram a sua oposição» (n. 17). O assunto, sublinha-se, «não será objeto de trabalho» no próximo mês de outubro e por isso é bom que «a reflexão teológica continue». Em todo o caso, a atenção dada ao papel da mulher «evidencia o desejo de um reforço de todos os ministérios exercidos pelos leigos», para os quais se pede que «adequadamente formados possam contribuir para a pregação da Palavra de Deus também durante a celebração da Eucaristia» (n. 18).

As relações com Deus, entre os irmãos e entre as Igrejas

Depois da introdução e dos fundamentos, o Il detém-se sobre as relações (nn. 22-50) que permitem à Igreja ser sinodal na missão, ou seja, as relações com Deus Pai, entre irmãos e irmãs e entre as Igrejas. Os carismas, os ministérios ordenados e não ordenados são, portanto, essenciais num mundo e para um mundo que, no meio de tantas contradições, procura a justiça, a paz e a esperança. Das Igrejas locais, emerge também a voz dos jovens que reclamam uma Igreja não de estruturas, nem de burocracia, mas fundada em relações que suscitam e vivem em dinâmicas e caminhos. Nesta perspetiva, a assembleia de outubro poderá analisar a proposta de dar vida a novos ministérios, como o da «escuta e do acompanhamento». «É necessária uma “porta aberta” da comunidade», explica o texto, «através da qual as pessoas possam entrar sem se sentirem ameaçadas ou julgadas» (nº 34).

Percursos formativos e discernimento comunitário

Estas relações deverão depois ser desenvolvidas cristãmente por caminhos adequados e contextualizados (n. 51-79), porque «não há missão sem contexto, não há Igreja sem enraizamento num lugar preciso» (n. 53). Fundamental, portanto, será a formação e o «discernimento comunitário» que permita às Igrejas tomar decisões adequadas, articulando a responsabilidade e a participação de todos. Sublinhando, então, que «a família, como comunidade de vida e de amor, é um lugar privilegiado de educação na fé e na prática cristã», o Il afirma que «o entrelaçamento das gerações é uma escola de sinodalidade. Todos, os fracos e os fortes, as crianças, os jovens e os idosos, têm muito a receber e muito a dar» (n. 55).

A importância da responsabilidade

Mas entre os caminhos a seguir estão também aqueles que permitem aos responsáveis eclesiais prestar contas de forma transparente das suas ações para o bem e a missão da Igreja. «Uma Igreja sinodal precisa de uma cultura e de uma prática de transparência e de responsabilidade», diz o Il, «que são indispensáveis para promover a confiança mútua necessária para caminhar juntos e exercer a corresponsabilidade pela missão comum» (n. 73).

Uma Igreja credível exige transparência e responsabilidade

Recordando então que «a responsabilidade pelo próprio ministério perante a comunidade pertence à tradição mais antiga, que remonta à Igreja apostólica» (n. 74), o documento de trabalho sublinha que, atualmente, «a exigência de transparência e de responsabilidade na e pela Igreja tornou-se evidente em consequência da perda de credibilidade devida a escândalos financeiros e, sobretudo, a abusos sexuais e outros abusos de menores e de pessoas vulneráveis. A falta de transparência e de responsabilidade alimenta o clericalismo» (n. 75), que se baseia erradamente no pressuposto de que os ministros ordenados não são responsáveis perante ninguém pelo exercício da sua autoridade.

São necessárias estruturas de avaliação

A responsabilidade e a transparência, insiste o Il, dizem respeito a todos os níveis da Igreja e não se limitam à área do abuso sexual e financeiro, mas também tocam «os planos pastorais, os métodos de evangelização e as formas como a Igreja respeita a dignidade da pessoa humana, por exemplo, no que diz respeito às condições de trabalho nas suas instituições» (n. 76). Daí o apelo a «estruturas e formas necessárias de avaliação — entendida num sentido não moralista — do modo como são exercidas as responsabilidades ministeriais de todo o género» (n. 77). A este propósito, o documento recorda a necessidade de a Igreja garantir, por exemplo, a publicação de um relatório anual, quer sobre a gestão dos bens e dos recursos, quer sobre o desempenho da missão, que inclua «uma ilustração das iniciativas empreendidas no âmbito da salvaguarda (proteção dos menores e das pessoas vulneráveis) e da promoção do acesso das mulheres a cargos de autoridade e da sua participação nos processos de decisão» (n. 79).

Os lugares do diálogo ecuménico e do diálogo inter-religioso

O Il analisa depois os lugares (n.ºs 80-108) nos quais as relações e os percursos se concretizam. Lugares a serem entendidos não simplesmente como espaços, mas como contextos concretos, caracterizados por culturas e dinamismos da condição humana. Convidando-nos a superar uma visão estática e uma imagem piramidal das relações e experiências eclesiais, o documento de trabalho reconhece a sua variedade e pluralidade, que permitem à Igreja — una e universal — viver uma circularidade dinâmica «nos lugares e a partir dos lugares», sem cair no particularismo nem no achatamento. Pelo contrário: é precisamente neste horizonte assim delineado que se devem inserir os grandes temas do diálogo ecuménico, inter-religioso e cultural. Neste contexto, a procura de formas de exercício do ministério petrino que se abram à «nova situação» do caminho ecuménico, rumo à unidade visível dos cristãos (n. 102 e 107).

Peregrinos da esperança

Por fim, o documento recorda como cada uma das questões nele contidas pretende ser um serviço à Igreja e uma possibilidade de curar as feridas mais profundas do nosso tempo. Por isso, o Instrumentum laboris conclui com um convite a continuar o caminho como «peregrinos da esperança», também na perspetiva do Jubileu de 2025 (n. 112).

Isabella Piro