· Cidade do Vaticano ·

Crianças como alvos de guerra

Não estavam lá por acaso

TOPSHOT - A woman carries a girl next to a heavily damaged building of the Ohmatdyt Children's ...
11 julho 2024

Um hospital pediátrico e uma escola. As crianças. As crianças como alvos. Na verdade, chamam-lhes casualties: vítimas colaterais, para indicar as “perdas” de guerra que não estão diretamente relacionadas com alvos militares. O nome soa tragicamente irónico porque se refere ao acaso, a pessoas que “por acaso” estão no lugar errado no momento errado. Como se as crianças nos hospitais ou nas escolas estivessem lá por acaso.

As crianças. No Ocidente, já não são geradas, opta-se por se dedicar a outra coisa ou, se “por acaso” chegam, o processo vital que iniciaram é interrompido e tornam-se descartes, outras vítimas colaterais, outras casualties. Isto no Ocidente. No resto do mundo, na Europa do Leste como na Terra Santa, as crianças tornam-se alvos mais ou menos diretos de armas que atacam à distância. Muitas vezes guiadas por “inteligências” que não são humanas, mas artificiais. Foi também por isso que o Papa gritou durante a cimeira do g 7, a 14 de junho em Bari, que «nenhuma máquina deveria alguma vez escolher tirar a vida a um ser humano» e, por isso, apelou a uma «proibição do uso de armas autónomas letais». Precisamente a 9 de julho, o Papa manifestou também a sua tristeza pelo facto de locais como um hospital pediátrico (em Kyiv) e uma escola (em Gaza) terem sido alvo de ataques, causando terror e morte entre os pequenos “hóspedes” que todos os dias enchem estes ambientes. Não será este um sinal claro da desumanização a que conduzem todas as guerras? Haverá, de facto, lugares “mais humanos” do que um hospital e uma escola? São lugares onde alguns seres humanos cuidam dos seus semelhantes, de outras pessoas em dificuldade porque estão doentes ou porque são mais jovens e inexperientes e, portanto, precisam de acompanhamento para serem introduzidos na vida. Na vida.

Não se pode bombardear hospitais, escolas. E se pensarmos bem, não se pode bombardear nada, sejam limitados os arsenais, os dos outros e os próprios. E, no entanto, os bombardeamentos continuam e, desde o início dos conflitos, já se registaram quase 600 na Ucrânia e mais de 15.000 em Gaza as crianças que morreram sob as bombas.

Dostoiévski, o grande romancista russo, apresentou o escândalo do sofrimento e da morte das crianças definindo a dor inocente como a “pedra” da negação da fé em Deus, do ateísmo. Ao mesmo romancista é atribuída esta frase: «Quando um homem tem grandes problemas, deveria recorrer a uma criança; são elas, de uma forma ou de outra, que possuem o sonho e a liberdade». Sonho e liberdade que as crianças possuem até que um adulto cego pelo ódio lhos rouba da única forma possível, não tirando, mas tirando-lhes casualmente a vida.

Andrea Monda