· Cidade do Vaticano ·

Que festa sem paz?

 Que festa sem paz?  POR-025
20 junho 2024

As guerras são sempre tragédias, as guerras dos nossos dias são tragédias ao vivo. A tecnologia não deixa espaço à imaginação, são imagens em tempo real que nos dão a enorme dimensão da violência e do sofrimento. Além dos vídeos e das fotos chocantes, impressionam os acontecimentos e os números, que nada nem ninguém consegue impedir. Acontecimentos e números que não são apenas palavras e cifras, mas dizem respeito à situação real de uma humanidade assolada e ferida.

Nestes dias, os muçulmanos celebram o Eid al-Adhā, a Festa do Sacrifício, que recorda a imolação que Deus pediu a Abraão. São dias de alegria porque se celebra a profunda fé de Abraão, impedido quando está prestes a sacrificar o seu único filho. São dias de festa em que as comunidades de outras religiões trocam os bons votos de paz e de todas as bênçãos, porque a convivência pacífica é possível. São dias de alegria, em que as famílias celebram unidas, comendo alimentos tradicionais, em jardins iluminados e coloridos, em casas decoradas para as festas, dias em que se oferecem presentes e se compram roupa nova para a grande ocasião. Infelizmente nestes dias a Festa do Sacrifício reflete no seu nome o sacrifício e o sofrimento de tantas famílias que não poderão reunir-se porque muitos dos seus membros morreram. As crianças não brincam alegremente nos jardins, mas procuram lugares seguros e protegidos pois as suas casas foram destruídas, não esperam presentes nem roupa nova, mas procuram sobreviver à doença, à fome, à sede, ao calor.

O que mais me impressiona é o sofrimento das crianças, porque são sempre os indefesos e os sem-culpa que padecem as consequências da guerra.

Mais de 15.000 crianças foram mortas, sem contar aquelas que ainda restam sob os escombros. Antes de 7 de outubro, as crianças de Gaza com patologias graves conseguiam sobreviver e encontrar medicamentos graças às ajudas internacionais, os mesmos medicamentos que agora estão parados do outro lado da fronteira, a poucos metros de distância de quem deles tanto precisa.

As cirurgias são feitas nos poucos hospitais semidestruídos: pelo menos mil crianças foram submetidas a amputações sem anestesia.

É doloroso pensar que, a poucos quilómetros de mim, há 50.000 crianças a sofrer de subalimentação.

Os danos psicológicos são enormes e atingem quase um milhão de menores.

O acrónimo Wcnsf (Wounded child no surviving family) foi criado para identificar as crianças de Gaza que são órfãs, feridas e sem o amor e o conforto da família.

Há poucos dias, a 12 de junho, a Comunidade internacional celebrou o Dia mundial contra o trabalho infantil. Em Gaza e na Palestina há milhares de crianças que se tornaram chefes de família em consequência da morte ou da prisão dos pais.

Crianças que não crescem despreocupadas, porque de repente se tornaram adultos que devem alimentar e sustentar a família na dificuldade e na pobreza.

Pelas crianças que já morreram e por todas as que sofrem no mundo, peçamos a Deus Todo-Poderoso a dádiva da paz.

Olhemos para a paz como para o grão de mostarda de que fala a parábola do Evangelho de Marcos, proclamada no xi domingo do tempo comum e, como nos recordou o Papa Francisco no último Angelus, Deus está presente na nossa vida como aquela pequena semente: compete a nós semeá-la, fazê-lo com cuidado e atenção, esperar com confiança que ela germine até quando parece que a terra estéril não dá fruto.

É a presença de Deus na nossa vida que nos dá a esperança e a certeza de que a paz florescerá!

Ibrahim Faltas