· Cidade do Vaticano ·

O Dicastério para o clero por ocasião do Dia da santificação sacerdotal

A misericórdia do Coração de Deus regenera a miséria do coração

 A misericórdia do Coração de Deus  regenera a miséria do coração  POR-024
13 junho 2024

Por ocasião do Dia da santificação sacerdotal, celebrado a 7 de junho, solenidade do Sacratíssimo Coração de Jesus, o Dicastério para o clero enviou uma mensagem — assinada pelo cardeal prefeito Lazzaro You Heung-sik e pelo secretário D. Andrés Gabriel Ferrada Moreira — aos sacerdotes do mundo inteiro.

Amados Irmãos Sacerdotes!

Nesta solenidade do Sacratíssimo Coração de Jesus, celebramos o Dia da Santificação Sacerdotal. Este bonito encontro anual, que cada Igreja particular é convidada a celebrar, em comunhão e reciprocidade de oração, dispõe-nos a implorar do Senhor o dom de pastores santos, segundo o seu Coração. É um dia de oração sugerido pelo Dicastério para o Clero (naquela época Congregação) e instituído a 25 de março de 1995 por São João Paulo ii , para que a oração oferecida pela santificação dos Sacerdotes possa alcançar como reflexo o dom da santidade de todo o Povo de Deus, ao qual se destina o seu ministério.

No passado mês de fevereiro, dirigindo-se aos participantes na Conferência Internacional para a Formação Permanente dos Sacerdotes sobre o tema «Reaviva o dom de Deus que há em ti» (2 Tm 1, 6), o Papa Francisco pediu-nos, a nós sacerdotes, que tenhamos cuidado especial com a nossa humanidade: um desafio belo e apaixonante, para conservar o vigor do nosso ministério e ser cada vez mais «ponte, não obstáculo» ( pdv , 43) ao encontro com Cristo, transparência e reflexo da sua humanidade salvífica.

Muito se disse e escreveu sobre a importância da dimensão humana e da maturidade afetiva na vida do sacerdote; estamos conscientes também dos numerosos sinais de fragilidade que se manifestam neste âmbito. Em todos os contextos eclesiais e sociais, são muitas as observações sobre a carência de educação para os sentimentos e as emoções, bem como sobre a presença de um analfabetismo emocional e da falta de afetividade; há quem fale de uma globalização da indiferença, de cinismo crescente, com narcisismo e autorreferencialidade.

Por outro lado, todos sabemos por experiência como é fonte de verdadeira alegria poder viver plenamente a nossa humanidade e as nossas relações, perfumando-as de amor, gratuidade, beleza, verdade, bondade, autenticidade, espiritualidade, arte, música e poesia, todos frutos da obra do Espírito do Ressuscitado que sopra onde quer e suscita sempre assombro, admiração e gosto, uma carga de confiança e de esperança.

Mas como cuidar da nossa humanidade a fim de contribuir, também nós, para dar frutos assim, a não ser indo de novo ao encontro de Jesus e do seu Evangelho? Como nos recorda o Concílio Vaticano ii , sabemos que Jesus «amou com coração humano» ( gs 22) e que «quem segue Jesus Cristo, homem perfeito, torna-se também mais homem» ( gs 41).

É precisamente na ligação entre a Solenidade do Sagrado Coração e este Dia que queremos encontrar as motivações para reavivar o dom de Deus que há em nós, pedindo a graça de interiorizar ainda mais em nós e no nosso estilo de vida os mesmos sentimentos do Coração de Cristo. Com efeito, como nos recordou o Papa Francisco, eles são a verdadeira e eficaz contribuição para um novo humanismo (cf. Convenção de Florença 2015), o antídoto contra a desumanização que nos pode contagiar também a nós.

Experimentamos todos os dias como o nosso coração sofre em si uma divisão ( gs 10), de modo que cada um pode dizer com Paulo: «Não faço o que quero, mas o que deploro» (Rm 7, 15). O nosso coração é frágil e complicado, mas belo... É um campo de batalha, uma “mistura” de lama e espírito, guardião de desejos infinitos e ícone de limite, até à esclerocardia, mas ao mesmo tempo lugar onde se experimenta um amor imenso de que é inundado e de que é capaz, que tem como fonte última o próprio Deus, Trindade de amor. Sim, porque foi Deus que plasmou o nosso coração, o criou e recriou, derramando nele o seu amor através do Espírito, para que seja à imagem do Coração do seu Filho, capaz de amar segundo a mesma altura, largura e profundidade (cf. Ef 3, 18-19), a ponto de poder dizer: já não sou eu que vivo, é Cristo que vive e ama em mim (cf. Gl 2, 20), com a mesma medida do seu amor: amar sem medida (Santo Agostinho).

Portanto, o nosso coração profundamente humano é o lugar onde Cristo quer continuar a vir, habitar, palpitar, a ponto de se deixar trespassar com amor e por amor, à sua imitação. A Solenidade do Sagrado Coração de Cristo é uma ocasião preciosa para recordar a miséria e a pequenez do nosso coração, mas ao mesmo tempo e mais ainda a misericórdia infinita e regeneradora do Coração de Deus, manifestada no Coração de Jesus. É deste Coração que queremos continuar a haurir a caridade e a generosidade do Pastor que tem o cheiro das ovelhas e se põe em jogo para chamar e amar cada uma pelo seu nome, especialmente as tresmalhadas, feridas ou errantes, para que todas possam pastar livres e felizes no campo de Deus. É no lado do Coração trespassado que queremos refugiar-nos para redescobrir a confiança e a tenacidade do Pescador da Galileia que, depois de se encontrar pobre e infrutífero, com barcos e redes vazias, lança o coração ao mar, confiando na Palavra de Jesus. É sobre o peito do Mestre que queremos inclinar a cabeça para obter a força e a coragem do Profeta, que conserva e grita os sonhos de Deus, de fazer da humanidade uma só família de todas as irmãs e irmãos, de levar a libertação e a consolação a todos, anunciando a boa notícia aos pobres e proclamando um ano de graça como peregrinos e testemunhas da esperança. E aprendendo d’Ele a mansidão e a humildade, a ternura e a compaixão, que queremos continuar a gerar filhas e filhos para Deus, como uma mãe e um pai, alimentando-os com o pão da Palavra, da Eucaristia e do Perdão, a ponto de nos darmos a nós mesmos como alimento. É a partir dos seus sentimentos de amor e amizade, de bondade e docilidade, de respeito e delicadeza que queremos não seduzir, mas conduzir a Ele para que Ele cresça e nós diminuamos: dando de graça porque recebemos de graça, como cantores e testemunhas de novos céus e novas terras.

Caríssimos Irmãos Sacerdotes, para cuidar da nossa humanidade não podemos, em síntese, deixar de recorrer também com confiança ao Coração Imaculado da Mãe: temos a certeza de encontrar n’Ela um espelho puríssimo no qual satisfazer a saudade de um coração livre e pronto a escutar e a pôr em prática o seu convite: «Fazei tudo o que Ele vos disser», tornando-nos pastores segundo o Coração de Cristo, imerso no Pai e no povo.

Amados Irmãos Sacerdotes, caríssimos Irmãos e Irmãs todos, queremos implorar do Senhor de toda a bondade o dom de tantas vocações ao sacerdócio ministerial e à vida consagrada para o Reino, de vidas oferecidas que saibam ser transparência da santidade de Deus, testemunhas jubilosas do amor do Pai e do Coração de Cristo, rico em misericórdia para com cada criatura. Rezemos por todos os Sacerdotes, cuidemos deles e apoiemo-los sempre com o nosso afeto e a nossa proximidade!