· Cidade do Vaticano ·

Mensagem do Pontífice por ocasião do 80º aniversário do desembarque na Normandia

É hipócrita recordar
sem condenar
«Nunca mais a guerra!»

British veteran Bernard Morgan, 100, looks on at Bayeux cemetery, on the day of commemorative events ...
06 junho 2024

Por ocasião do 80º aniversário do desembarque das tropas aliadas na Normandia durante o seguindo conflito mundial, o Papa Francisco enviou ao bispo de Bayeux e Lisieux a seguinte mensagem.

A Sua Excelência
D. Jacques Habert
Bispo de Bayeux e Lisieux

É com alegria que me uno, em pensamento e oração, a todas as pessoas reunidas nesta catedral de Bayeux para comemorar o 80º aniversário do desembarque das forças aliadas na Normandia. Saúdo todas as autoridades civis, religiosas e militares presentes.

Conservamos na memória a recordação daquele colossal e impressionante esforço coletivo e militar levado a cabo para obter o regresso à liberdade. E pensemos também no preço pago por tal esforço: aqueles imensos cemitérios onde se encontram alinhadas milhares de sepulturas de soldados — na maioria muito jovens e numerosos vindos de longe — que heroicamente deram a vida, permitindo assim o fim da Segunda Guerra Mundial e o restabelecimento da paz, uma paz que — pelo menos para a Europa — dura há cerca de 80 anos. O desembarque também nos traz à mente, suscitando consternação, a imagem das cidades da Normandia completamente devastadas: Caen, Le Havre, Saint-Lô, Cherbourg, Flers, Rouen, Lisieux, Falaise, Argentan... e muitas outras; e queremos recordar inclusive as inúmeras vítimas civis inocentes e quantos sofreram aqueles terríveis bombardeamentos.

Mas o desembarque evoca, de modo mais geral, a catástrofe que representou aquele terrível conflito mundial em que tantos homens, mulheres e crianças sofreram, tantas famílias foram dilaceradas, tanta ruína foi causada. Seria inútil e hipócrita recordá-lo, sem o condenar e rejeitar definitivamente; sem renovar o clamor de São Paulo vi na tribuna da onu , em 4 de outubro de 1965: Nunca mais a guerra! Se, durante várias décadas, a recordação dos erros do passado apoiou a firme determinação de fazer tudo o que fosse possível para evitar a eclosão de um novo conflito mundial aberto, constato com amargura que hoje já não é assim e que os homens têm memória curta. Que esta comemoração nos ajude a recuperá-la!

Com efeito, é preocupante que a hipótese de um conflito generalizado às vezes seja seriamente reconsiderada, que lentamente os povos se habituem a esta inaceitável eventualidade. Os povos querem a paz! Desejam condições de estabilidade, de segurança e de prosperidade, em que cada um possa cumprir pacificamente o seu dever e o seu destino. Destruir esta nobre ordem das coisas por ambições ideológicas, nacionalistas e económicas é uma falta grave perante os homens e a história, um pecado diante de Deus.

Por isso, Excelência, quero unir-me à sua oração e à de todos os que estão reunidos na sua Catedral:

Oremos pelos homens que querem as guerras, por aqueles que as desencadeiam, que as alimentam de modo insensato, que as mantêm e prolongam inutilmente ou que lucram cinicamente com elas. Que Deus ilumine os seus corações, coloque diante dos seus olhos o cortejo de desgraças que provocam!

Rezemos pelos pacificadores. Querer a paz não é vileza, pelo contrário, exige grande coragem, a coragem de saber renunciar a algo. Ainda que o juízo dos homens às vezes seja severo e injusto para com eles, «os pacificadores... serão chamados filhos de Deus» (Mt 5, 9). Que eles se oponham à lógica implacável e obstinada do conflito, e saibam abrir caminhos pacíficos de encontro e de diálogo. Que perseverem incansavelmente nos seus propósitos e que os seus esforços sejam coroados de êxito.

Em conclusão, rezemos pelas vítimas das guerras; as guerras do passado e do presente. Que Deus acolha junto de Si todos os que morreram naqueles terríveis conflitos, e que venha em auxílio de todos os que os sofrem hoje; os pobres e os frágeis, as pessoas idosas, as mulheres e as crianças são sempre as primeiras vítimas destas tragédias.

Deus tenha piedade de nós! Invocando a proteção de São Miguel, Padroeiro da Normandia, e a intercessão da Bem-Aventurada Virgem Maria, Rainha da Paz, concedo de coração a cada um a minha Bênção.

Francisco