· Cidade do Vaticano ·

Em busca das perguntas certas

 Em busca das perguntas certas  POR-022
29 maio 2024

«Eagora fazei-me perguntas». Num mundo que procura espasmodicamente respostas para tudo, o Papa Francisco está a ensinar-nos de novo o valor da pergunta, a fecundidade da dúvida quando se abre a uma procura sincera do verdadeiro, do bom e do belo. Cada vez mais, nos seus encontros — em particular com os jovens, como estamos a registar também nas últimas semanas e, mais recentemente, no Dia mundial da criança — o Pontífice deixa de lado o texto preparado para tecer um diálogo com quem está à sua frente. E prefere “arriscar” uma comunicação livre e espontânea, como livre e espontânea deve ser toda a relação autêntica entre as pessoas. Além disso, tem sublinhado repetidamente que, para comunicar, é preciso estabelecer contacto visual, ver o rosto do outro, o que não é possível se mantivermos os olhos fixos numa folha de papel. Esta recentragem da comunicação na pergunta e, portanto, em última análise, na escuta, e não na resposta, tem claramente um significado pedagógico e não apenas comunicativo. Uma dimensão que Bergoglio, jesuíta e educador, absorveu certamente desde a sua juventude, inspirando-se na espiritualidade inaciana que, precisamente no discernimento — portanto, no questionamento profundo —, tem uma das suas pedras angulares que continua a inspirar para além dos limites da Companhia de Jesus.

As perguntas são muitas vezes incómodas — todos nós o experimentamos diariamente — especialmente se forem feitas por crianças que não têm filtros ou superestruturas. Por outro lado, já em 1985, um grande pensador como Karl Popper observava que a nossa pedagogia «consiste em canalizar respostas sobre as crianças sem que elas tenham feito perguntas e sem que as perguntas que elas fazem sejam ouvidas». Quarenta anos mais tarde, o homem contemporâneo está cada vez mais limitado pela falta de tempo (mas não se supunha que a tecnologia “nos daria” muito mais tempo livre?) e, por isso, parece incomodar-se com as perguntas que o obrigam a parar e a pensar. Ao mesmo tempo, assistimos a um fenómeno paradoxal: nunca o homem dirigiu tantas perguntas às máquinas, aos computadores, como hoje. Todos os dias, o motor de busca Google recebe 99.000 perguntas por segundo, ou seja, 8,5 biliões de pesquisas em cada 24 horas. Mas quantas dessas perguntas exprimem uma procura de sentido? Não serão antes reflexos condicionados, perguntas quase automáticas? Os dados parecem tender mais para esta última opção, se for verdade que entre as cinco perguntas mais populares dirigidas ao Google nestes primeiros meses de 2024 encontramos: Que horas são?, Quantas semanas tem um ano?, Quantos dias faltam para o Natal?

Neste contexto, a nova realidade disruptiva da Inteligência Artificial coloca-nos um desafio que é mais antropológico do que tecnológico. Coloca-nos precisamente a questão do diálogo — coessencial à natureza humana — sob uma nova forma que abre o horizonte a desenvolvimentos imprevisíveis. De facto, é da natureza do ser humano elaborar uma pergunta e encontrar uma resposta. Foi assim que o homem desenvolveu todas as etapas da sua vida na terra e da sua convivência com os seus semelhantes. E é assim, precisamente através do diálogo, que o homem cresce no conhecimento do seu Criador, fazendo-lhe perguntas e recebendo-as, como nos testemunha a Bíblia desde as suas primeiras páginas. Por isso é particularmente significativo o facto de o Papa participar no g 7 em Apúlia, centrado na Inteligência Artificial. Num encontro onde se procuram sobretudo respostas pragmáticas, Francisco terá, de facto, a oportunidade de fazer aquelas perguntas de sentido sem as quais não se podem encontrar soluções duradouras e válidas para todos, sem excluir ninguém.

Alessandro Gisotti