«Estamos aqui para testemunhar as palavras
O Cardeal Timothy Michael Dolan, Arcebispo de Nova Iorque, encontra-se atualmente em Jerusalém, onde está empenhado — na sua qualidade de presidente da Catholic Near East Welfare Association — num calendário cheio de encontros, tanto institucionais como com as comunidades cristãs locais.
Eminência, qual é o objetivo desta visita?
Viemos com um objetivo preciso: celebrar o 75º aniversário da «Pontifical Mission for Palestine», fundada em 1949 pelo Papa Pio xii para prestar assistência aos refugiados do primeiro conflito israelo-árabe. Uma instituição que realizou, e ainda realiza, uma grande e preciosa obra de apoio, na saúde, na educação, na caridade, às populações desta terra, e em particular à pequena comunidade cristã. Uma obra que envolve a Igreja norte-americana com alacridade. A Pontifical Mission está também fortemente empenhada em incutir uma cultura de respeito e de convivência com as comunidades judaica e muçulmana. Durante estes dias encontrámo-nos com muitas comunidades de todas as crenças religiosas, especialmente com as que se ocupam das crianças, que são as principais vítimas deste conflito que dura há 76 anos. Em Belém visitámos a universidade onde crianças islâmicas, judias e cristãs vivem e estudam juntas: um paradigma da sociedade futura que esperamos. E visitaremos um lar para idosos, onde cristãos, muçulmanos e judeus também vivem juntos. Como dizia o Papa Bento xvi , o trabalho na saúde, na educação e na caridade tem um valor sacramental para o cristão. E a Pontifical Mission, ao longo de todos estes anos, deu um testemunho concreto desta sacramentalidade.
Aqui também se realizaram importantes encontros institucionais.
Sim. Tive uma conversa agradável com o presidente palestiniano Mahmoud Abbas. E fiquei muito feliz por receber dele, como também do presidente israelita, Isaac Herzog, agradecimentos e elogios pelo trabalho realizado pela Pontifical Mission. Ambos manifestaram igualmente o seu apreço pelo papel que as comunidades cristãs desempenham nas suas sociedades civis. Pude constatar que as comunidades cristãs e, em particular, a comunidade católica, sob a direção do Patriarca de Jerusalém dos Latinos, Pierbattista Pizzaballa, gozam aqui de grande estima. Sobretudo na situação de grave tensão que derivou do ataque de 7 de outubro, os nossos esforços para usar sempre palavras de apaziguamento e promover uma lógica de encontro são reconhecidos e apreciados muito não só na pequena dimensão das nossas comunidades. E, para além das nossas atividades, pude apreciar a escuta da voz influente do Papa Francisco. De ambos os lados, há quem encontre motivos para o criticar, mas é unânime o apreço pelas suas palavras fortes a favor do diálogo e da paz.
Também se encontrou com o Patriarca Pizzaballa.
Claro que sim. E rezámos e celebrámos juntos. Devo dizer que fiquei muito sensibilizado com as palavras que utilizou na sua maravilhosa homilia de Quinta-feira Santa. O fim deste conflito de longa data não virá de um acordo político, muito menos será o resultado de uma convergência económica ou, pior ainda, de uma intervenção militar. A verdadeira solução reside apenas numa renovação radical do nosso pensamento e das nossas convicções, que nos leve a reconhecer-nos a todos como filhos do único Deus, feitos à sua imagem e, por isso, necessitados de dignidade e de respeito. E esta é a voz concorde não só do Cardeal Pizzaballa, mas também a voz vigorosa do Papa Francisco e de toda a Igreja, na qual nós, como Pontifical Mission, prestamos um pequeno mas valioso serviço para a unidade e a paz. Ser luz para este mundo, como nos pede o Evangelho.
A sua visita a Jerusalém, Eminência, aconteceu num momento de grave crise. Também pôde ver os clarões dos mísseis sobre a Cidade Santa no sábado à noite.
Foi de facto assustador ser acordado a meio da noite pelo som das explosões e ter de correr para baixo, aqui na casa de acolhimento dos peregrinos de Notre Dame. Mas na manhã seguinte, sentado aqui onde estamos agora, fiquei espantado ao ver que os autocarros e os elétricos estavam cheios de pessoas que iam para o trabalho e que tudo já tinha voltado a uma normalidade paradoxal. Por um lado, pensei: isto é trágico, as pessoas aqui estão habituadas àquilo a que nunca se deviam habituar, a guerra. Por outro, refleti: este é também um belo exemplo de resistência à violência e ao mal. A vida deve continuar. E nós viemos aqui para que ela possa continuar em paz.
Roberto Cetera
de Jerusalém