«Daqui a poucas semanas será publicada a carta apostólica para a convocação oficial do Jubileu, a viver como «experiência de fé, conversão e perdão», anunciou o Papa Francisco no discurso aos participantes na plenária do Dicastério para a evangelização — Setor para as questões fundamentais do mundo, recebidos em audiência na manhã de 15 de março, na Sala Clementina. Publicamos o texto preparado por Francisco e lido por um dos seus colaboradores.
Prezados irmãos e irmãs!
É com alegria que vos dou as boas-vindas, Superiores, Membros e Consultores do Dicastério para a Evangelização — Setor para as questões fundamentais do mundo, reunidos em assembleia plenária. É um momento importante para o debate a respeito dos problemas da evangelização, sobretudo quando olhamos para as várias regiões do mundo, tão diferentes em termos de culturas e tradições.
O primeiro pensamento vai para a condição em que vivem várias Igrejas locais, onde o secularismo das últimas décadas criou enormes dificuldades: desde a perda do sentido de pertença à comunidade cristã, até à indiferença em relação à fé e aos seus conteúdos. São problemas sérios, que muitos irmãos devem enfrentar todos os dias, mas não podemos desanimar. O secularismo foi estudado e sobre ele foram escritas avalanches de páginas. Conhecemos os efeitos negativos que produziu, mas este é um tempo propício para compreender que resposta efetiva somos chamados a dar às jovens gerações a fim de que recuperem o sentido da vida. O apelo à autonomia da pessoa, apresentado como uma das pretensões do secularismo, não pode ser teorizado como independência de Deus, pois é precisamente Deus que garante a liberdade do agir pessoal. E no que diz respeito à nova cultura digital, que apresenta tantos aspetos interessantes para o progresso da humanidade — pensemos na medicina e na salvaguarda da criação — traz consigo também uma visão do homem que parece problemática quando se refere à necessidade de verdade que habita em cada pessoa, unida à exigência de liberdade nas relações interpessoais e sociais.
Portanto, a grande questão que se nos apresenta consiste em compreender como superar a fragmentação que se verificou na transmissão da fé. Por isso, é urgente recuperar uma relação efetiva com as famílias e os centros de formação. A fé no Senhor ressuscitado, coração da evangelização, para ser transmitida tem necessidade de uma experiência significativa vivida em família e na comunidade cristã como encontro transformador com Jesus Cristo. Sem este encontro, real e existencial, estaremos sempre sujeitos à tentação de fazer da fé uma teoria, não um testemunho de vida.
Ainda sobre a questão prioritária da transmissão da fé, agradeço-vos o serviço que prestais no campo da catequese. E fazeis isto recorrendo também ao novo Diretório, que redigistes em 2020. É um instrumento válido e pode ser eficaz, não só para a renovação da metodologia catequética, mas diria sobretudo para a participação da comunidade cristã no seu conjunto. Nesta missão, um papel específico é confiado àqueles que receberam e receberão o ministério de Catequista, para serem fortalecidos no seu compromisso ao serviço da evangelização. Desejo que os Bispos saibam alimentar e acompanhar as vocações para este ministério, especialmente entre os jovens, a fim de que se reduza a divisão entre as gerações e a transmissão da fé não seja vista como tarefa confiada apenas aos mais velhos. Neste sentido, encorajo-vos a encontrar caminhos para que o Catecismo da Igreja Católica continue a ser conhecido, estudado e valorizado, de modo a poder responder às novas exigências que vão surgindo com o passar das décadas.
Um segundo tema que gostaria de partilhar convosco é a espiritualidade da misericórdia, como conteúdo fundamental da obra de evangelização. A misericórdia de Deus nunca falha e somos chamados a testemunhá-la e a fazê-la, por assim dizer, circular nas veias do corpo da Igreja. Deus é misericórdia: esta mensagem perene foi relançada com força e modalidades renovadas por São João Paulo ii para a Igreja e a humanidade no início do terceiro milénio. A pastoral dos santuários, que é da vossa competência, deve ser imbuída de misericórdia, para que quantos chegam a estes lugares encontrem neles um oásis de paz e serenidade. Os Missionários da misericórdia, com o seu generoso serviço ao Sacramento da Reconciliação, oferecem um testemunho que deve ajudar todos os sacerdotes a redescobrir a graça e a alegria de serem ministros de Deus que perdoa sempre e sem limites. Ministros de Deus que não só espera, mas vai ao encontro, vai à procura, pois é Pai misericordioso, não patrão, é bom Pastor, não mercenário, e enche-se de alegria quando pode acolher uma pessoa que volta ou reencontrá-la enquanto vagueia nos seus labirintos (cf. Jo 10; Lc 15). Quando a evangelização é feita com a unção e o estilo da misericórdia, encontra maior escuta, o coração abre-se com mais disponibilidade à conversão. Com efeito, somos tocados no que sentimos mais necessário, ou seja, o amor puro e gratuito, nascente de vida nova.
O terceiro tema que vos quero propor é a preparação para o Jubileu ordinário do próximo ano. Será um Jubileu em que deverá sobressair a força da esperança. Daqui a poucas semanas publicarei a Carta Apostólica para a sua convocação oficial: espero que aquelas páginas possam ajudar muitos a refletir e sobretudo a viver concretamente a esperança. Esta virtude teologal foi vista poeticamente como a “irmãzinha” no meio das outras duas, fé e caridade, mas sem a qual estas duas não progridem, não se exprimem o melhor de si. O povo santo de Deus precisa muito disto! Conheço o grande esforço que o Dicastério dedica diariamente à organização do próximo Jubileu. Agradeço-vos e estou certo de que todo este trabalho dará os seus frutos. O acolhimento dos peregrinos, porém, deve exprimir-se não só nas obras estruturais e culturais, que são necessárias, mas também permitindo que vivam a experiência da fé, conversão e perdão, encontrando uma comunidade viva que testemunhe isto com alegria e convicção.
E não esqueçamos que este ano que precede o Jubileu é dedicado à oração. Devemos redescobrir a oração como experiência de estar na presença do Senhor, de nos sentirmos compreendidos, acolhidos e amados por Ele. Como Jesus nos ensinou, não se trata de multiplicar as nossas palavras, mas de dar espaço ao silêncio para escutar a sua Palavra e para a acolher na nossa vida (cf. Mt 6, 5-9). Comecemos, irmãos e irmãs, a rezar mais, a rezar melhor, na escola de Maria e dos santos e santas.
Obrigado pelo vosso trabalho destes dias e pelo vosso serviço à Igreja. Abençoo-vos de coração e rezo por vós. E vós também, por favor, rezai por mim. Obrigado!