· Cidade do Vaticano ·

Francisco em ligação com o programa “Che tempo che fa” do canal de televisão italiano Nove

«O Senhor abençoa todos, todos, todos»

 «O Senhor abençoa todos, todos, todos»  POR-003
18 janeiro 2024

A bênção a todos, também aos casais «irregulares», imitando Deus que é «bom», não «castigador» e «abençoa todos, todos, todos»; o «medo» de uma escalada bélica e da capacidade de «autodestruição» da humanidade; a confirmação de que não tem a intenção de renunciar e o anúncio de duas viagens: à Polinésia, em agosto, e à sua terra natal, a Argentina, no final do ano. Eis alguns dos temas abordados pelo Papa na entrevista ao jornalista Fabio Fazio do programa italiano Che tempo che fa, transmitido na noite de domingo, 14 de janeiro, no canal Nove. Em 2021, Francisco já tinha concedido uma entrevista a este popular programa (na época transmitido pela rai ); agora, uma nova entrevista com duração de menos de uma hora para refletir sobre assuntos relacionados com a atualidade, os desafios do mundo, a Igreja e o pontificado.

Francisco em ligação com o programa “Che tempo che fa” do canal de televisão italiano Nove

«O Senhor
abençoa todos, todos, todos»

O Papa respondeu a uma pergunta sobre o documento do Dicastério para a doutrina da fé,  Fiducia supplicans, que abre a possibilidade de abençoar casais em situações «irregulares» em relação à moral católica, incluindo casais do mesmo sexo. Um documento que teve várias reações, até contrastantes. Francisco reconheceu que «às vezes as pessoas não aceitam as decisões», mas muitas vezes «é porque não as conhecem»; depois reafirmou aquele princípio de «todos, todos, todos», já expresso durante a Jmj de Lisboa: «O Senhor abençoa todos, todos, todos aqueles que vêm. O Senhor abençoa todos aqueles que podem ser batizados, ou seja, todas as pessoas. Mas depois as pessoas devem entrar em diálogo com a bênção do Senhor e ver qual é o caminho que o Senhor lhes propõe. Mas devemos pegar-lhes pela mão e ajudá-las a seguir este caminho, sem as condenar desde o início».

Os confessores perdoem tudo

Esse é «o trabalho pastoral da Igreja», é um trabalho «muito importante» para os confessores, a quem Francisco reitera o convite a «perdoar tudo» e a tratar as pessoas «com muita bondade». Ele mesmo, revelou, em 54 anos de sacerdócio, só negou o perdão uma vez, «por causa da hipocrisia daquela pessoa»: «Sempre perdoei tudo, mas também digo com a consciência de que aquela pessoa talvez tenha uma recaída, mas o Senhor perdoa-nos, ajudar a não recair, ou a recair menos, mas perdoar sempre».

O Senhor «não se escandaliza com os nossos pecados, porque é Pai e acompanha-nos», observou o Papa Francisco, confidenciando que gosta de esperar que o inferno esteja vazio.

O risco das guerras

Mais uma vez, como nestes 100 dias de conflito no Médio Oriente e nos quase dois anos de agressão à Ucrânia, o Papa estigmatizou o horror da guerra: «É verdade que é arriscado fazer a paz, mas é mais arriscado fazer a guerra». «Por detrás das guerras», insistiu, «há o comércio de armas. Um economista disse-me que, neste momento, os investimentos que rendem mais juros, mais dinheiro, são as fábricas de armas. Investir para matar».

O medo da escalada bélica

Assim, o bispo de Roma confidenciou um seu medo pessoal: «Tenho medo desta escalation bélica porque, com este avanço bélico no mundo, perguntamo-nos como iremos acabar. Com as atuais armas atómicas, que destroem tudo. Como acabaremos. Como a Arca de Noé? Tenho medo disto. Da capacidade de autodestruição da humanidade hoje».

Muita crueldade com os migrantes

Na entrevista, também foi dado espaço ao tema que lhe é muito caro, o dos migrantes, com a lembrança do abraço a Pato, o jovem camaronês que perdeu a esposa e a filha de 6 anos no ano passado por causa da fome, do calor e da sede no deserto entre a Tunísia e a Líbia. Francisco recebeu-o em novembro na Casa Santa Marta. «Há muita crueldade no tratamento desses migrantes, desde o momento em que deixam a própria casa até chegarem aqui, à Europa», disse, lembrando a situação dramática de tantas pessoas nos lagers líbios e a tragédia de fevereiro de 2022 em Cutro, na costa da Calábria. «É verdade que todos têm o direito de permanecer na própria casa e de migrar», disse o Papa, mas «por favor, não se fechem as portas». O que é necessário é uma política migratória «bem pensada» que ajude a «controlar o problema dos migrantes» e a «remover todas essas máfias que exploram os migrantes».

Reformas

Mudando o foco para a Igreja, o Pontífice falou de reformas. A primeira a ser implementada é «uma reforma dos corações»; depois, passou a falar das estruturas, que «devem ser preservadas, mudadas, reformadas de acordo com a finalidade». Mas a primeira coisa a fazer é «mudar o coração» e limpá-lo da maldade e da inveja, «um vício amarelo, que arruína todos os relacionamentos».

Não à renúncia
sim às viagens à Polinésia e à Argentina

Concluindo, há uma pergunta sobre a sua possível renúncia ao pontificado: «Não é um pensamento, nem uma preocupação, nem sequer um desejo. É uma possibilidade, aberta a todos os Papas, mas neste momento não está no centro dos meus pensamentos e das minhas inquietações, dos meus sentimentos». Confirmando essas palavras, Francisco anunciou as duas viagens antecipadas como hipóteses em entrevistas anteriores: Polinésia e Argentina. À Argentina — onde foi oficialmente convidado com uma carta do novo presidente Javier Milei — o Pontífice poderá ir no final do ano: «As pessoas sofrem muito lá. É um momento difícil para o país. A possibilidade de uma viagem no segundo semestre do ano está em fase de programação, pois agora há uma mudança de governo, há coisas novas... Em agosto devo fazer a viagem à Polinésia, que é muito longe, e depois faríamos a viagem à Argentina, se for possível. Quero ir lá. Dez anos está bem, muito bem, posso ir».

Salvatore Cernuzio