Para uma informação
«O jornalismo e a inteligência artificial ( ia ) estão cada vez mais interligados, com a ia que desempenha um papel cada vez mais importante nas várias fases do processo jornalístico». Calma: quantos dos nossos leitores se deram conta de que o incipit, ou seja, o ataque (como se diz na gíria) deste artigo é fruto da inteligência artificial? Pessoalmente, acho que pouquíssimos, ou ninguém, se deu conta disto. Neste ponto, eu poderia parar aqui, dizer à máquina para ir em frente na redação deste artigo e concluir o meu trabalho em poucos minutos. Mas assim certamente eu não seria uma jornalista.
Quer isto dizer que a ia é realmente prejudicial para os profissionais da informação? Nada disso! O importante é utilizá-la corretamente, olhando sem preconceitos para os seus muitos aspetos positivos. «A automatização favorecida pela ia », — explica a L’Osservatore Romano Giovanni Tridente, jornalista, diretor de comunicação da Pontifícia Universidade da Santa Cruz e autor do livro Anima digitale. La Chiesa alla prova dell’Intelligenza Artificiale (Tau editrice, 2023, 228 páginas) — permitirá acelerar processos como transcrições, sínteses, traduções e revisões de textos. Também facilitará o acesso a uma grande quantidade de informação, mais do que um simples motor de pesquisa, tornando o conhecimento mais acessível». O mesmo acontece com a análise de grandes quantidades de dados, acrescenta Tridente, por exemplo nos campos estatístico, financeiro e sociológico, ou para «a análise do trend das redes sociais, do sentiment das pessoas, para poder preparar conteúdos mais próximos dos utilizadores, fidelizando-os e criando engagement, mas também conteúdos mais atraentes e de maior qualidade, graças à integração de infografias e tabelas».
No entanto, existem aspetos críticos na utilização da ia no mundo das notícias. O primeiro diz respeito ao âmbito do emprego: «Muitos dos trabalhos de compilação ou repetitivos», afirma Tridente, «serão realizados por máquinas e, por conseguinte, as pessoas que costumavam realizá-los deixarão de ser necessárias. Ao contrário, serão necessárias pessoas analíticas, criativas, capazes de contextualizar e reelaborar a informação. Isto implicará uma mudança radical no paradigma profissional». Além disso, há o tema alargado da integridade profissional, como referido no início: «Se eu tiver uma máquina que, em poucos segundos, me redige um texto que posso publicar sem o reelaborar», diz o jornalista, «então faço com que o leitor sinta falta da veracidade do meu profissionalismo. Falta a ética profissional».
Outro aspeto problemático está relacionado com o direito à informação: «A possibilidade que a ia oferece de criar fake news, facilitadas por conteúdos não verificados, lesa efetivamente o direito à informação das pessoas, inundadas pela desinformação». Um ponto crucial é também o da formação das máquinas que, às vezes, têm “preconceitos” internos e se o jornalista não investigar adequadamente, confiando que a máquina nunca se engana, então criam-se as chamadas “alucinações”, ou seja, a máquina restitui erros lógicos e formais que não se notam. Mas ao mesmo tempo, esta é uma boa notícia: com efeito, é aí que o profissionalismo jornalístico pode ser posto à prova, descobrindo tais erros». Assim, o papel do jornalista muda, realça Tridente, pois «deve saber como funcionam as máquinas e como elas geram respostas, deve saber interpretá-las e explicar aos leitores os seus limites. É uma redescoberta da profissão, como se o jornalista fosse, de certo modo, um educador, cuja tarefa principal passa a ser: verificar, contextualizar e simplificar conceitos complexos».
Sobre o conceito de educação, Tridente vai além, destacando a sua importância: «É preciso educar para o uso correto da ia , para que não aconteça o que ocorreu com as redes sociais. Sim, ao longo do caminho perdemos um pouco a educação sobre esta última, de tal modo que hoje só vemos os seus problemas e riscos, como as dinâmicas de conflito. Ao contrário, as próprias redes sociais, quando são bem utilizadas, podem tornar-se aliadas da ia » na divulgação de informações corretas.
Neste ponto, coloca-se a questão de saber qual será o futuro do jornalismo profissional. Para Tridente, a perspetiva é a de um regresso ao passado, no sentido positivo do termo: «Chegou a hora de voltar a fazer bem o que se fazia no início, ou seja, compreender, saber como correm as coisas», afirma. «O jornalista que não sabe o que quer transmitir, não faz bem o seu trabalho e torna-se um mero amplificador de um conteúdo, sem qualquer caráter mediador. Pelo contrário, neste momento complexo, o papel central de alguém que analisa, investiga, liga elementos que parecem distantes uns dos outros, torna-se um desafio muito importante. Afinal, assim como todas as evoluções na história da humanidade são um estímulo para viver melhor, também a ia , entendida como aliada, será uma oportunidade para melhorar a nossa profissão».
Então, como combinar a alma profissional com a alma digital? «Mais do que ter uma alma digital, devemos inserir a nossa alma no digital, conclui Tridente. O homem tem alma, consciência, noção, e esta é a única coisa que o distingue das máquinas. Além disso, os seres humanos têm uma grande chance: fazem perguntas. Pois é verdade que as máquinas dão respostas às nossas interrogações, mas o homem é o único que ainda se pode questionar sobre o sentido da existência».
Isabella Piro