· Cidade do Vaticano ·

Num livro de Andrea Tornielli

O teólogo
o Pontífice, o homem

 O teólogo  o Pontífice, o homem  POR-049
07 dezembro 2023

Não devemos correr o risco de recordar Bento xvi apenas pelo ato — certamente histórico e corajoso — da sua renúncia ao pontificado. A sua vida de teólogo e estudioso, de professor, de bispo e depois de cardeal colaborador de São João Paulo ii , o seu intenso pontificado e, finalmente, a sua “coabitação” de quase dez anos no Vaticano com o seu sucessor representam uma riqueza a partilhar e a contar. É o que se depreende do livro de Andrea Tornielli, Benedetto xvi . Il teologo, il pontefice, l’uomo (pp. 336, Edizioni Piemme), acabado de publicar, que reconstrói a biografia de Joseph Ratzinger e conta em primeira mão o seu pontificado.

O vaticanista, agora diretor editorial dos meios de comunicação do Vaticano, acompanhou o Papa Bento nas suas viagens apostólicas e oferece um retrato que nos ajuda a focar a natureza poliédrica da sua figura, demasiadas vezes “esmagada” em clichés de conveniência. Como não recordar, por exemplo, a adesão convicta do teólogo Ratzinger, perito conciliar, à reforma litúrgica desejada pelo Vaticano ii ? Como não recordar a marcada sensibilidade pela defesa da Criação, que encontrou em Bento xvi o seu campeão? E, ainda, como não recordar, ao contrário as imagens estereotipadas, o magistério do Papa Ratzinger sobre a pobreza da Igreja, sobre a necessidade de não se apoiar em estruturas e organizações? Como não recordar o efeito desorientador das palavras de Bento xvi sobre o facto de o ataque mais forte contra a Igreja não vir de inimigos externos, mas do pecado interior, e a sua consequente proposta — no meio da crise dos abusos — de uma Igreja “penitencial”, a anos-luz das imagens de poder e protagonismo, que pede humildemente perdão?

São todos aspetos aprofundados no livro de Tornielli, que contribuem para restituir a complexidade da figura de Ratzinger livre dos clichés, fazendo “falar" o seu magistério e os seus gestos, e que levam a compreender como o gesto de renúncia não surgiu de repente, fora de qualquer contexto, mas representou o epílogo do ministério de um “humilde servo na vinha do Senhor”. Um humilde servo que não se colocou a si mesmo e ao seu protagonismo no centro, mas que sempre recordou que no centro está Aquele que conduz a Igreja, sem o qual nada podemos fazer.

r.a.