Ter a força
Continuando a «refletir sobre a grave situação na Palestina e em Israel», mas também na martirizada Ucrânia e noutros conflitos, no Angelus de 5 de novembro o Papa Francisco desejou que «se tenha a força para dizer “basta”». Falando ao meio-dia da janela do Palácio apostólico do Vaticano, antes da oração mariana com os fiéis presentes na praça de São Pedro e com quantos o acompanhavam através dos meios de comunicação social, o Pontífice comentou o Evangelho do xxxi domingo do tempo comum, falando sobre a distância entre o dizer e o fazer e sobre o primado do exterior sobre o interior.
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
No Evangelho da Liturgia de hoje, ouvimos algumas palavras de Jesus a respeito dos escribas e fariseus, isto é, dos chefes religiosos do povo. Em relação a estas autoridades, Jesus usa palavras muito duras, «porque dizem e não fazem» (Mt 23, 3) e «fazem todas as suas obras para serem admirados pelo povo» (v. 5). É isto que Jesus diz: dizem e não fazem, e tudo o que fazem é para aparecer.
Detenhamo-nos, pois, nestes dois aspetos: a distância entre o dizer e o fazer e o primado do exterior sobre o interior.
A distância entre o dizer e o fazer. A estes mestres de Israel, que pretendem ensinar aos outros a Palavra de Deus e ser respeitados como autoridades do Templo, Jesus contesta a duplicidade da vida deles: pregam uma coisa, mas vivem outra. Estas palavras de Jesus recordam as dos profetas, especialmente de Isaías: «Este povo aproxima-se de mim só com a boca e honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim» (Is 29, 13). É este o perigo a que devemos estar atentos: a duplicidade de coração. Também nós corremos este perigo: esta duplicidade de coração que põe em causa a autenticidade do nosso testemunho e também a nossa credibilidade como pessoas e como cristãos.
Todos nós experimentamos, devido à nossa fragilidade, uma certa distância entre o dizer e o fazer; mas outra coisa é ter um coração duplo, viver com “um pé em dois sapatos” sem fazer disso um problema. Sobretudo quando somos chamados — na vida, na sociedade ou na Igreja — a desempenhar um papel de responsabilidade, lembremo-nos disto: não à duplicidade! Para um sacerdote, um agente pastoral, um político, um professor ou um pai, aplica-se sempre esta regra: o que se diz, o que se prega aos outros, compromete-se a vivê-lo primeiro. Para ser um mestre com autoridade, é preciso primeiro ser uma testemunha credível.
O segundo aspeto é uma consequência: o primado do exterior sobre o interior. De facto, vivendo na duplicidade, os escribas e os fariseus preocupam-se em ter de esconder a sua incoerência para salvar a sua reputação exterior. Porque, se as pessoas soubessem o que deveras está no seu coração, ficariam envergonhadas e perderiam toda a credibilidade. Por isso, fazem obras para parecerem justos, para “salvar as aparências”, como se diz. O truque é muito comum: pintam a cara, pintam a vida, pintam o coração. Estas pessoas “pintadas” não sabem viver a verdade. E muitas vezes também nós temos a tentação da duplicidade.
Irmãos e irmãs, aceitando esta advertência de Jesus, perguntemo-nos também a nós mesmos: procuramos praticar o que pregamos, ou vivemos na duplicidade? Dizemos uma coisa e fazemos outra? Preocupamo-nos apenas em mostrar-nos impecáveis por fora, pintados, ou cuidamos da nossa vida interior com sinceridade de coração?
Dirijamo-nos à Virgem Maria: ela que viveu com integridade e humildade de coração segundo a vontade de Deus, nos ajude a tornarmo-nos testemunhas credíveis do Evangelho.
Depois do Angelus, o bispo de Roma relançou o apelo a favor da paz, assegurando em seguida a proximidade à população do Nepal atingida pelo tremor de terra, aos refugiados afegãos que encontraram asilo no Paquistão e às vítimas das tempestades e inundações na Itália e noutros países.
Queridos irmãos e irmãs!
Continuo a pensar na grave situação da Palestina e de Israel, onde tantas pessoas perderam a vida. Peço-vos que pareis, em nome de Deus: cessar-fogo! Espero que todas as vias sejam seguidas para que se evite a todo o custo um agravamento do conflito, que os feridos possam ser socorridos e que a ajuda chegue à população de Gaza, onde a situação humanitária é muito grave. Os reféns devem ser libertados imediatamente. Entre eles há muitas crianças, deixem-nas regressar às suas famílias! Sim, pensemos nas crianças, em todas as crianças envolvidas nesta guerra, como na Ucrânia e noutros conflitos: assim está-se a matar o seu futuro. Rezemos para ter a força de dizer “basta”.
Estou próximo do povo do Nepal, que sofre com o terramoto; bem como dos refugiados afegãos que encontraram asilo no Paquistão, mas que agora já não sabem para onde ir. E rezo também pelas vítimas das tempestades e das inundações, em Itália e noutros países.
Saúdo com afeto todos vós, romanos e peregrinos provenientes de vários países. Saúdo em particular os fiéis de Viena e de Valência, o grupo paroquial de Cagliari, a banda e o coro de Longomoso, no Alto Adige. Saúdo os jovens de Rodengo Saiano, Ome e Padergnone; os catequistas de Cassina de’ Pecchi e os da paróquia de San Giovanni Bosco de Trieste; e saúdo o Comité “Fermare la guerra”.
Desejo a todos bom domingo. Por favor, não vos esqueçais de rezar por mim. Bom almoço e adeus!