· Cidade do Vaticano ·

À escuta de um “fio sonoro de silêncio”

05 outubro 2023

«Averdade, disse o Papa Francisco na homilia da Vigília ecuménica de oração do sábado passado, em vista do Sínodo que teve início a 4 de outubro, não necessita de gritos violentos para chegar ao coração dos homens. Deus não gosta de proclamações e gritarias, de bisbilhotice e tumulto: Deus prefere antes, como fez com Elias, falar no “murmúrio de uma brisa suave” (1 Rs 19, 12), num “fio sonoro de silêncio”». E repete esta expressão: um fio sonoro de silêncio. Com efeito, o silêncio tem um som, um sussurro, uma voz. É preciso sintonizar-se com essa voz. Não é fácil fazê-lo no meio do alarido dos sons de hoje, sons que são gritos, mexericos, publicidades, posts, vídeos, imagens... não é fácil encontrar o comprimento de onda desse fio sonoro de silêncio, mas se o homem o conseguir, então as suas palavras e obras serão repletas, fecundas, ricas de significado. Com efeito, esse fio mantém unidas as obras e as palavras, que se tornam geradoras, criadoras.

No início da criação por parte de Deus, encontramos uma imagem poderosa: «A terra era informe e vazia e as trevas cobriam o abismo, e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Deus disse: “Faça-se a luz!”. E a luz fez-se» (Gn 1, 2-3). Uma cena envolta no silêncio, interrompido pela palavra criadora de Deus. Intui-se que o silêncio é como o ventre da palavra, uma força que gera, preserva e depois deixa a palavra exprimir-se, quase explodir, em toda a sua plenitude.

Como recordou Paolo Ruffini, prefeito do Dicastério para a comunicação, na conferência de imprensa de apresentação do Sínodo, citando a carta pastoral Effatà do cardeal Martini (republicada em parte a 2 de outubro pelo diário): «Toda a comunicação autêntica nasce do silêncio. Com efeito, cada palavra humana visa dizer algo a alguém: algo que deve, primeiro, nascer dentro».

Assim também a vida de Jesus parece repetir o mesmo esquema: em primeiro lugar há um longo silêncio, de cerca de trinta anos, a visão escondida de Jesus em Nazaré, e só mais tarde há a palavra audaz e poderosa, que é lançada ao mundo: o reino de Deus está próximo! A vida pública de Jesus, a da pregação, é muito breve em comparação com o longo interlúdio silencioso, um pouco como o concerto de um músico após semanas de ensaios, como uma peça de teatro para o ator, como o combate de boxe para o pugilista, que treina durante longos meses. Assim deveria ser o falar humano, a realização de uma obra—prima que só justifica a interrupção do silêncio.

Mas o silêncio não é apenas esse ventre fecundo para uma palavra bela, boa, verdadeira. Às vezes é também irmão da sombra e da obscuridade, por vezes é um silêncio que nasce da mudez. «Hoje, na terra, há grande silêncio, grande silêncio e solidão», recita uma antiga homilia para o Sábado Santo, dia alitúrgico do calendário cristão: «Grande silêncio porque o Rei dorme: a terra ficou deslumbrada e cala—se porque o Deus que se fez carne adormeceu». O Sábado Santo é o dia sem palavra, sem a Palavra, Jesus, que jaz morto no sepulcro. É o momento do silêncio de Deus. Esta é, talvez, a imagem de toda a história humana, o caminho de homens orantes, que falam a um Silêncio (como diz Karl Rahner) e, no entanto, continuam a caminhar, esperando uma nova escuta que interrompa o silêncio inquietante. Pois nem sequer o silêncio do Sábado Santo é desesperante, mas aberto à luz do Domingo de Páscoa, porque na sua descida ao abismo da morte, Jesus «acordou quantos dormiam há séculos», continua a antiga homilia, «Deus morreu na carne e desceu para abalar a mansão dos mortos».

Bem precioso, poderoso e frágil, o silêncio deve ser preservado, com a atitude própria da guarda: a fé. Aquela confiança expressa eficazmente pela pequena parábola da semente, que Jesus narra no Evangelho de Marcos: «O Reino de Deus é semelhante a um homem que lança a semente à terra; quer durma, quer esteja acordado, de noite ou de dia, a semente germina e cresce; ele mesmo não sabe como. Pois a terra produz por si própria, primeiro o caule, depois a espiga, por último o grão abundante na espiga. Quando o fruto amadurece, ele mete—lhe logo a foice, porque chegou o tempo da colheita» (Mc 4, 26—29).

A Igreja começou uma grande aventura, a do Sínodo sobre a sinodalidade, um desafio excelso e exigente que só pode ser enfrentado com esta fé, de que a semente florescerá e de que na realidade a verdade não precisa de proclamações nem de gritos violentos para chegar ao coração dos homens.

Andrea Monda