· Cidade do Vaticano ·

Há corrida e corrida

 Há corrida e corrida  POR-032
10 agosto 2023

«Por aqueles dias, pôs-se Maria a caminho e dirigiu-se à pressa para a montanha, a uma cidade de Judá» (Lc 1, 39). Este é o versículo do Evangelho de Lucas escolhido como título da Jmj que se concluiu no domingo 6 de agosto, em Lisboa. Um título que deu o imprinting a toda a manifestação, graças também às palavras do Papa que, sobre este tema do mover-se à pressa, do primeiro ao último discurso, refletiu e conversou com os jovens (cerca de um milhão e meio) que invadiram alegremente as ruas da capital portuguesa. Precisamente no último discurso, uma saudação de agradecimento aos mais de 25.000 voluntários, o Pontífice frisou que a pressa tem a ver com o amor, porque «quem ama não fica de braços cruzados, quem ama serve, quem ama corre para servir, corre para se empenhar ao serviço dos outros. E vós correstes, correstes muito, nestes meses!», acrescentando uma distinção importante: «Correstes muito, mas não com a corrida frenética e sem objetivo que é por vezes a maneira de ser do nosso mundo, não, correstes de outra maneira, correstes uma corrida que leva ao encontro dos outros para os servir em nome de Jesus».

E é verdade: há corrida e corrida. Assim como há pressa e pressa. Pode ser a pressa abençoada de Maria que corre para a casa da sua prima Isabel, mas também uma pressa “frenética” de quem está sempre a correr na vida, porém sem meta, apenas para chegar antes dos outros, como se quisesse cobrir, com a sua ação vencedora, uma zona de sombra feita de inseguranças e medos; há uma corrida que é a de Zaqueu (que o Papa citou no seu último discurso) que desce do sicómoro para acolher Jesus, e há a corrida-fuga do ímpio do qual fala o livro dos Provérbios: «O ímpio foge sem que ninguém o persiga» (28, 1), uma corrida que é uma fuga de si mesmo, que, quem sabe, talvez Zaqueu conhecesse bem até àquele dia em Jericó, quando Jesus foi ao seu encontro.

O homem corre muitas vezes, mas para onde e por que razão? O maior dos heróis da antiguidade clássica era famoso por correr: Aquiles, conhecido como “pé veloz”. A sua corrida era para a glória, para o poder marcial. Em meados do século xix , nos Estados Unidos, havia uma corrida para a fronteira do Far West, e era sobretudo uma corrida pelo ouro, descoberto na Califórnia. Uma corrida de avidez. Ainda hoje se fala tragicamente de uma “corrida ao armamento”: também uma corrida à glória e ao poder militar.

Felizmente, há outros tipos de corrida, de pressa. Repetidamente o Papa evidenciou a importância dos dois momentos que constituem uma corrida: a partida, ou seja, a origem, e a meta. O que impele o homem e o que o atrai, eis as perguntas que devemos fazer, para compreender que muitas vezes a resposta coincide. Dois exemplos bíblicos afirmam de forma eloquente esta verdade da pressa ligada ao amor, que para o cristão equivale a um encontro com Jesus. Há o exemplo de Paulo, um incansável “corredor” de Cristo, que aos cristãos de Filipos pode dizer com alegria: «Irmãos, não penso que já a alcancei, mas uma coisa faço: esquecendo-me do que fica para trás e avançando para o que está adiante, prossigo em direção à meta, para obter o prémio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus» (Fl 3, 13-14). A sua corrida nasce e tende para a alegria do Evangelho, sobre a qual o Papa falou aos jovens nestes dias, dizendo que «a alegria é sempre missionária».

E antes de Paulo, Pedro. Também ele corre, mas fá-lo «juntamente», outra palavra-chave para compreender a mensagem que o Papa transmitiu aos jovens de Lisboa: «Corriam os dois juntamente, mas o outro discípulo antecipou-se e chegou primeiro ao sepulcro» (Jo 20, 4). Pedro, o mais velho, corre juntamente com João, o mais novo dos Apóstolos, e os dois, com os seus passos nitidamente diferentes, têm um objetivo comum: o sepulcro. A deles não é ainda uma alegria, mas uma grande esperança, já pronta a transformar-se em alegria. Esta imagem de Pedro com o jovem João que chega primeiro (e pára e espera por ele) pode efetivamente representar a cena que se desenrolou durante estes cinco dias em solo português: o sucessor de Pedro, o idoso Papa Francisco, que caminhou sem fadiga juntamente com os jovens, provenientes de todo o mundo, para o encontrar e ouvir. E juntos ouviram Jesus e Maria, e assim, durante a vigília de sábado à noite, mais de um milhão de jovens permaneceram em silêncio durante muito tempo para adorar, juntamente com o Pontífice, o grande mistério de um Deus feito homem, que se apressou na sua vida a “levar o fogo” de um anúncio de grande alegria para todos, realmente todos, os seres humanos, e assim despertá-los e convidá-los a incendiar o mundo, percorrendo-o até aos confins da terra.

Andrea Monda