· Cidade do Vaticano ·

O confessor que pedia desculpa a Jesus por ter perdoado muito

13 julho 2023

Éo último da lista, mas não está certamente em último lugar no coração de Jorge Mario Bergoglio. Ao anunciar a lista dos novos cardeais que receberão o barrete púrpura no consistório de 30 de setembro próximo, o Papa Francisco concluiu-a pronunciando o nome de um idoso frade franciscano que vive no confessionário insonorizado do santuário de Nossa Senhora de Pompeia, em Buenos Aires, desde que se retirou em 2007: é frei Luis Pascual Dri, capuchinho, nascido em Federación, província de Entre Ríos, Argentina, a 17 de abril de 1927, numa família em que todos os filhos, exceto um, se consagraram a Deus na vida religiosa.

Francisco falou dele várias vezes. A primeira foi a 6 de março de 2014, quando se encontrou com os párocos de Roma. Repetiu o exemplo alguns meses depois, a 11 de maio de 2014, na homilia da missa das ordenações sacerdotais. Voltou a citá-lo no livro-entrevista O Nome de Deus é Misericórdia, depois voltou a propô-lo em fevereiro de 2016 durante a homilia da missa em São Pedro com os frades capuchinhos e novamente no encontro com os confessores do Jubileu. Em fevereiro de 2017, o Papa quis oferecer aos párocos de Roma um exemplar do livro Non avere paura di perdonare, com uma biografia do padre Dri. Quando se fala de confissão e do acolhimento dos penitentes no confessionário, o pensamento do Papa Bergoglio vai sempre para ele.

«Lembro-me de um grande confessor, um padre capuchinho, que exercia o seu ministério em Buenos Aires. Uma vez veio ter comigo, queria falar. Disse-me: “Peço-te ajuda, tenho sempre tanta gente diante do confessionário, gente de todo o tipo, humildes e menos humildes, mas também muitos sacerdotes... Perdoo muito e, por vezes, surge-me um escrúpulo, o escrúpulo de ter perdoado demais”. Falámos de misericórdia, e perguntei-lhe o que fazia quando sentia esse escrúpulo. Respondeu-me assim: “Vou à nossa capelinha, em frente ao sacrário, e digo a Jesus: Senhor, perdoa-me porque perdoei demais. Mas foste tu que me deste o mau exemplo!”. Nunca mais me esquecerei disto. Quando um sacerdote vive assim a misericórdia para consigo mesmo, pode doá-la aos outros».

Há sete anos, fomos procurá-lo no santuário dedicado à Virgem de Pompeia, em Buenos Aires. Havia pouca gente, era uma tarde bastante abafada. Só estava aberto um confessionário, e dentro um monge de hábito capuchinho à espera, entre painéis brancos de insonorização que lembram os de um antigo estúdio de rádio. Era ele. Contou-nos porque o Papa o mencionava tantas vezes. «Eu, apesar de tudo, sou, não diria escrupuloso, mas digamos um pouco preocupado com as confissões. Quando ele era cardeal aqui em Buenos Aires, eu tinha muita confiança nele, costumava ir falar com ele e uma vez confidenciei-lhe tudo isto. Ele disse-me: “Perdoa, perdoa, tens de perdoar. E eu: sim, perdoo, mas depois fico com uma certa inquietação e é por isso que vou ter com Jesus e digo-lhe que foi ele que me ensinou, que me deu o mau exemplo, porque ele perdoava tudo, nunca rejeitou ninguém. Vê-se que estas palavras tocaram Bergoglio, ficaram-lhe na memória. Ele sabe que eu confesso muito, durante muitas horas, de manhã e à noite. E mais de uma vez aconselhou alguns sacerdotes, por algum problema, a virem falar comigo, eu ouvi-os e agora somos grandes amigos, alguns deles vêm muitas vezes, falamos, e eles sentem-se muito bem espiritual e pastoralmente. Devo agradecer muito ao Papa por esta confiança que depositou em mim, porque não a mereço. Não sou uma pessoa, um sacerdote, um frade que tenha feito estudos, não tenho doutoramento, não tenho nada. Mas a vida ensinou-me muito, a vida marcou-me, e dado que nasci muito pobre, sinto que devo ter sempre uma palavra de misericórdia, de ajuda, de proximidade para quem vem aqui. Ninguém deve sair daqui pensando que não foi compreendido ou desprezado e rejeitado».

O frade que passa todas as manhãs e tardes no confessionário, continuando «até que as velas se consumam», não tem algum conselho particular a dar aos seus “colegas” confessores: «O que o Papa diz. Não posso dizer outra coisa, porque o sinto, porque o vivo. Misericórdia, compreensão, pôr toda a vida à escuta, para compreender, para ser capaz de se pôr na pele do outro, para compreender o que se passa. Não devemos ser, a começar por mim, funcionários que se limitam a fazer qualquer coisa: “Sim, dei-lhe a absolvição”. “Sim, não, e acaba ali”. Muito pelo contrário. Penso que devemos ter uma certa proximidade, uma amabilidade especial, porque às vezes há pessoas que não sabem muito bem o que é a confissão. “Não te assustes, não te preocupes”. A confissão... a única coisa que é preciso é o desejo de ser melhor, nada mais. Não é preciso pensar com quem, ou quantas vezes, ou isto ou aquilo. Todas essas coisas não ajudam. Sinto que afastam a pessoa. E eu tenho de fazer com que as pessoas se aproximem de Deus, de Jesus».

Quanto aos penitentes, o frade que agora vai vestir-se de púrpura, dava sempre este conselho: «Não tenhais medo. Mostro sempre esta imagem, este quadro que representa o abraço do Pai ao Filho pródigo. Pois me perguntam: “Deus vai-me perdoar?”. Mas Deus abraça-vos, Deus ama-vos, Deus caminha convosco, Deus veio para perdoar, não para castigar, veio para estar connosco, deixou o céu para estar connosco. Então, como podemos ter medo! Parece-me quase um absurdo, um desconhecimento, uma ideia errada do nosso Deus Pai».

O padre Dri recorda a figura do padre Leopoldo Mandić, que tinha a mesma atitude com as pessoas no confessionário. «Sim, sim, conheço-o muito; li a sua vida e aprendi muito com ele — confidenciou o frade argentino. Também aprendi com o padre Pio: estive com ele em 1960. E tudo isso me ensinou muito. Estive com o padre Pio, confessei-me com ele, estive no mesmo convento em 1960. São Leopoldo e São Pio ensinaram-me muitas coisas, tantas coisas bonitas sobre a misericórdia, o amor, a paz, a tranquilidade, a proximidade. Embora o padre Pio fosse tão forte, tão enérgico, quando tinha de ouvir e perdoar, era Jesus».

Andrea Tornielli