Viagem do Pontífice à Hungria
Na manhã de 30 de abril, domingo iv de Páscoa e 60º Dia mundial de oração pelas vocações, o Papa Francisco celebrou a santa missa na praça Kossuth Lajos, na capital da Hungria. Em seguida, o texto da homilia proferida pelo Pontífice depois da proclamação das leituras.
As últimas palavras que Jesus pronuncia, no Evangelho que ouvimos, resumem o sentido da sua missão: «Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância» (Jo 10, 10). É isto o que faz um bom pastor: dá a vida pelas suas ovelhas. Assim Jesus, como um pastor que vai à procura das ovelhas do seu rebanho, veio procurar-nos quando estávamos perdidos; como um pastor, veio arrebatar-nos da morte; como um pastor, que conhece as suas ovelhas uma por uma e as ama com infinita ternura, fez-nos entrar no redil do Pai, tornando-nos seus filhos.
Contemplemos, pois, a imagem do bom Pastor, detendo-nos em duas ações que Ele, segundo o Evangelho, realiza pelas suas ovelhas: primeiro chama-as, depois fá-las sair.
1. Em primeiro lugar, «chama as suas ovelhas» (10, 3). No início da nossa história de salvação, não estamos nós com os nossos méritos, as nossas capacidades, as nossas estruturas; na origem, está a chamada de Deus, o seu desejo de nos alcançar, a sua solicitude por cada um de nós, a abundância da sua misericórdia que nos quer salvar do pecado e da morte, para nos dar a vida em abundância e a alegria sem fim. Jesus veio como bom Pastor da humanidade, a fim de nos chamar e levar para casa. Assim nós, com memória agradecida, podemos recordar o seu amor por nós; por nós que estávamos longe d’Ele. Sim, enquanto «todos nós andávamos desgarrados como ovelhas perdidas, cada um seguindo o seu caminho» (Is 53, 6), Ele assumiu as nossas iniquidades e carregou as nossas culpas, trazendo-nos de volta ao coração do Pai. Assim o ouvimos, do apóstolo Pedro, na segunda Leitura: «Éreis como ovelhas desgarradas, mas agora voltastes ao Pastor e Guarda das vossas almas» (1 Pd 2, 25). E ainda hoje, em cada situação da vida, naquilo que trazemos no coração, nos nossos extravios, nos nossos medos, no sentimento de derrota que às vezes nos assalta, na prisão da tristeza que ameaça enjaular-nos, Ele chama-nos. Vem como bom Pastor e chama-nos por nome, para nos dizer quanto somos preciosos a seus olhos, para curar as nossas feridas e tomar sobre si as nossas fraquezas, para nos reunir em unidade no seu rebanho e tornar-nos familiares do Pai e uns dos outros.
Irmãos e irmãs, reunidos aqui esta manhã, sintamos a alegria de ser povo santo de Deus: todos nascemos da sua chamada; foi Ele que nos convocou e, por isso, somos o seu povo, o seu rebanho, a sua Igreja. Reuniu-nos aqui para que, embora sendo diversos uns dos outros e pertencendo a comunidades diferentes, a grandeza do seu amor nos reúna a todos num único abraço. É bom estarmos juntos: bispos e sacerdotes, religiosos e fiéis leigos; e é bom partilhar esta alegria juntamente com as Delegações ecuménicas, os chefes da Comunidade judaica, os representantes das Instituições civis e do Corpo Diplomático. Isto é catolicidade: todos nós, chamados por nome pelo bom Pastor, somos chamados a acolher e espalhar o seu amor, a tornar o seu rebanho inclusivo, e nunca excludente. E, por conseguinte, somos todos chamados a cultivar relações de fraternidade e colaboração, sem nos dividirmos entre nós, sem considerar a nossa comunidade como um ambiente reservado, sem nos deixarmos tomar pela preocupação de defender cada um o próprio espaço, mas abrindo-nos ao amor recíproco.
2. Depois de ter chamado as ovelhas, o Pastor «fá-las sair» (Jo 10, 3). Primeiro fá-las entrar no redil chamando-as, agora impele-as para fora. Primeiro somos reunidos na família de Deus para sermos constituídos seu povo, mas depois somos enviados ao mundo para nos tornarmos, com coragem e sem medo, arautos da Boa Nova, testemunhas do Amor que nos regenerou. Este movimento — entrar e sair — podemos captá-lo a partir de outra imagem que Jesus utiliza: a da porta. Diz Ele: «Eu sou a porta. Se alguém entrar por mim, estará salvo; há de entrar e sair e achará pastagem» (10, 9). Ouçamos com atenção isto: há de entrar e sair. Por um lado, Jesus é a porta que se abriu de par em par a fim de nos fazer entrar na comunhão do Pai e experimentar a sua misericórdia; mas, como todos sabem, uma porta aberta serve não só para entrar, mas também para sair do lugar onde nos encontramos. Assim, depois de nos ter reconduzido ao abraço de Deus e ao redil da Igreja, Jesus é a porta que nos faz sair para o mundo: Ele impele-nos a ir ao encontro dos irmãos. E — fixemo-lo bem na memória! — todos nós, sem exceção, somos chamados a isto: sair das nossas comodidades e ter a coragem de alcançar toda a periferia que necessita da luz do Evangelho (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium, 20).
Irmãos e irmãs, para cada um de nós, viver «em saída» significa tornar-se, como Jesus, uma porta aberta. É triste e custa ver portas fechadas: as portas fechadas do nosso egoísmo em relação a quem caminha diariamente ao nosso lado; as portas fechadas do nosso individualismo numa sociedade que corre o risco de se atrofiar na solidão; as portas fechadas da nossa indiferença em relação a quem está no sofrimento e na pobreza; as portas fechadas a quem é estrangeiro, diferente, migrante, pobre. E até as portas fechadas das nossas comunidades eclesiais: fechadas entre nós, fechadas para o mundo, fechadas para quem «não está dentro das normas», fechadas para quem aspira pelo perdão de Deus. Irmãos e irmãs, por favor, por favor: abramos as portas! Procuremos ser também nós — com as palavras, os gestos, as atividades quotidianas — como Jesus: uma porta aberta, uma porta que nunca se fecha na cara de ninguém, uma porta que a todos permite entrar para experimentar a beleza do amor e do perdão do Senhor.
Repito isto sobretudo para mim mesmo, para os irmãos bispos e sacerdotes: para nós, pastores. Porque o pastor — diz Jesus — não é um salteador nem um ladrão (cf. Jo 10, 8); isto é, não se aproveita da sua função, não oprime o rebanho que lhe está confiado, não «rouba» o espaço aos irmãos leigos, não exerce uma autoridade rígida. Irmãos, encorajemo-nos a ser portas sempre mais abertas: «facilitadores» da graça de Deus, peritos de proximidade, dispostos a oferecer a vida, como Jesus Cristo, nosso Senhor e nosso tudo, nos ensina de braços abertos a partir da cátedra da cruz e sempre no-lo mostra no altar, Pão vivo repartido para nós. Digo-o também aos irmãos e irmãs leigos, aos catequistas, aos agentes pastorais, a quem tem responsabilidades políticas e sociais, àqueles que simplesmente levam para a frente a sua vida quotidiana, por vezes com dificuldade: sede portas abertas. Deixemos entrar no coração o Senhor da vida, a sua Palavra que consola e cura, para depois sairmos fora e sermos, nós mesmos, portas abertas na sociedade. Estar abertos e ser inclusivos uns para com os outros, para ajudar a Hungria a crescer na fraternidade, caminho da paz.
Caríssimos, Jesus bom Pastor chama-nos por nome e cuida de nós com infinita ternura. É a porta e quem entra através d’Ele tem a vida eterna: portanto Ele é o nosso futuro, um futuro de «vida em abundância» (Jo 10, 10). Por isso, nunca desanimemos, nunca deixemos roubar a alegria e a paz que Ele nos deu, não nos fechemos nos problemas ou na apatia. Deixemo-nos acompanhar pelo nosso Pastor: com Ele resplandeçam de vida nova a nossa própria vida, as nossas famílias, as nossas comunidades cristãs e toda a Hungria!