· Cidade do Vaticano ·

CATEQUESE — O Pontífice prosseguiu as reflexões sobre o zelo apostólico

O cristianismo não é maquiagem mas um encontro que muda o coração

 O cristianismo não é maquiagem  mas um encontro  que muda o coração  POR-013
30 março 2023

«Tornar-se cristão não é uma maquiagem que te muda o rosto, não! Se fores cristão muda-te o coração, mas se fores cristão de aparência, não está bem... cristão de maquiagem não serve. A verdadeira mudança é do coração. E isto aconteceu a Paulo», afirmou o Papa na audiência geral de quarta-feira, 29 de março, na praça de São Pedro. Dando prosseguimento às reflexões sobre a «paixão pela evangelização: o zelo apostólico do crente», o Pontífice iniciou a aprofundar a primeira de «algumas figuras que, de modos e em tempos diversos, deram testemunho exemplar», aquela do apóstolo das nações.

Estimados irmãos e irmãs,
bom dia!

No caminho das catequeses sobre o zelo apostólico, começamos hoje a olhar para algumas figuras que, de modos e em tempos diversos, deram um testemunho exemplar do que significa a paixão pelo Evangelho. E a primeira testemunha, naturalmente, é o apóstolo Paulo. A ele, gostaria de dedicar duas catequeses.

A história de Paulo de Tarso é emblemática sobre este tema. No primeiro capítulo da Carta aos Gálatas, assim como na narração dos Atos dos Apóstolos, podemos relevar que o seu zelo pelo Evangelho aparece após a sua conversão, e toma o lugar do seu zelo anterior pelo judaísmo. Era um homem zeloso da lei de Moisés para o judaísmo e depois da conversão este zelo continua, mas para proclamar, para pregar Jesus Cristo. Paulo era um apaixonado por Jesus. Saulo — o primeiro nome de Paulo — já era zeloso, mas Cristo converte o seu zelo: da Lei para o Evangelho. O seu impulso, primeiro queria destruir a Igreja, mas depois ao contrário edifica-a. Podemos perguntar-nos: o que aconteceu, como passou da destruição à construção? O que mudou em Paulo? Em que sentido o seu zelo, o seu impulso para a glória de Deus se transformou?

São Tomás de Aquino ensina que a paixão, sob o ponto de vista moral, não é boa nem má: o seu uso virtuoso torna-a moralmente boa, o pecado torna-a má.1 No caso de Paulo, o que o mudou não foi uma mera ideia ou convicção: para Saulo, o encontro com o Senhor ressuscitado — não esqueçais isto, aquilo que muda uma vida é o encontro com o Senhor — transformou todo o seu ser. A humanidade de Paulo, a sua paixão por Deus e a sua glória não foi aniquilada, mas transformada, “convertida” pelo Espírito Santo. O único que pode mudar os nossos corações é o Espírito Santo. E o mesmo é válido para cada aspeto da sua vida. Precisamente como acontece na Eucaristia: o pão e o vinho não desaparecem, mas tornam-se o Corpo e o Sangue de Cristo. O zelo de Paulo permanece, mas torna-se o zelo de Cristo. Muda o sentido mas o zelo é o mesmo. O Senhor é servido com a nossa humanidade, com as nossas prerrogativas e caraterísticas, mas o que muda tudo não é uma ideia mas a verdadeira vida, como o próprio Paulo diz: «Se alguém está em Cristo, é uma criação; passou o que era velho; eis que tudo se fez novo» (2 Cor 5, 17). O encontro com Jesus Cristo muda-te a partir de dentro, faz de ti outra pessoa. Se alguém estiver em Cristo é uma nova criatura, este é o sentido de ser uma nova criatura. Tornar-se cristão não é uma maquiagem que te muda o rosto, não! Se fores cristão muda-te o coração mas se fores cristão de aparência, não está bem... cristão de maquiagem não serve. A verdadeira mudança é do coração. E isto aconteceu a Paulo.

A paixão pelo Evangelho não é uma questão de compreensão ou de estudos, que certamente são úteis, mas não a geram; significa antes passar por aquela mesma experiência de “queda e ressurreição” que Saulo/Paulo viveu e que está na origem da transfiguração do seu impulso apostólico. Podes estudar toda a teologia que quiseres, podes estudar a Bíblia e tudo o resto, mas se és ateu ou mundano, não é uma questão de estudos; na história existiram muitos teólogos ateus! Estudar é útil, mas não gera a nova vida da graça. De facto, como diz Santo Inácio de Loyola: «O muito saber não sacia nem satisfaz a alma, mas o sentir e o saborear as coisas internamente».2 Trata-se das coisas que te mudam dentro, que te fazem conhecer outra coisa, saborear outra coisa. Cada um de nós pense nisto: “Sou um religioso?” — “Está bem” — “Rezo?” — “sim” — “Procuro observar os mandamentos?” — “sim” — “Mas onde está Jesus na tua vida?” — “Ah, não faço as coisas que manda a Igreja”. Mas Jesus onde está? Encontraste Jesus, falaste com Jesus? Lês o Evangelho ou falas com Jesus, recordas quem é Jesus? E esta é uma coisa que nos falta muitas vezes, um cristianismo não digo sem Jesus mas com um Jesus abstrato... Quando Jesus entra na tua vida, como entrou na vida de Paulo, Jesus entra e muda tudo. Muitas vezes ouvimos comentários sobre as pessoas: “Mas olha aquele, que era um pobre coitado e agora é um homem bom, uma mulher bondosa... Quem o mudou? Jesus, encontrou Jesus. A tua vida que é cristã mudou? “Não, mais ou menos, sim...”. Se Jesus não entrar na tua vida ela não muda. Podes ser cristão só por fora. Não, Jesus deve entrar e isto muda-te e aconteceu a Paulo. É preciso encontrar Jesus e por isso Paulo dizia que o amor de Jesus nos constrange, nos leva em frente. A mesma mudança aconteceu a todos os santos, que quando encontraram Jesus foram em frente.

Podemos fazer uma ulterior reflexão sobre a mudança que ocorreu em Paulo, o qual de perseguidor se tornou apóstolo de Cristo. Notemos que nele ocorre uma espécie de paradoxo: de facto, enquanto ele se considerar justo perante Deus, então sente-se autorizado a perseguir, a aprisionar, até a matar, como no caso de Estêvão; mas quando, iluminado pelo Senhor ressuscitado, descobre que foi “um blasfemador e um homem violento” (cf. 1 Tm 1, 13), — assim diz de si mesmo: “fui um blasfemador e um violento” — então começa a ser verdadeiramente capaz de amar. Este é o caminho. Se um de nós disser: “Ah, obrigado Senhor, porque sou uma pessoa bondosa, pratico coisas boas, não cometo grandes pecados...”: este não é um bom caminho, é uma estrada de autossuficiência, é um caminho que não te justifica, faz de ti um católico elegante, mas um católico elegante não é um católico santo, é elegante. O católico verdadeiro, o cristão verdadeiro é aquele que recebe Jesus dentro, que muda o coração. Esta é a pergunta que faço a todos vós hoje: o que significa Jesus para mim? Deixei-o entrar no coração ou só o tenho ao alcance da mão mas que não venha muito dentro? Deixei-me mudar por Ele? Ou Jesus é apenas uma ideia, uma teologia que prossegue... E isto é o zelo, quando alguém encontra Jesus sente o fogo e como Paulo deve pregar Jesus, deve falar de Jesus, deve ajudar as pessoas, deve praticar o bem. Quando alguém encontra a ideia de Jesus permanece um ideólogo do cristianismo e isto não salva, só Jesus nos salva, se tu o encontraste e lhe abriste a porta do coração. A ideia de Jesus não te salva! O Senhor nos ajude a encontrar Jesus, a encontrar Jesus, e que Jesus a partir de dentro nos mude a vida e nos ajude a ajudar os outros.


1 Cf. Quaestio “De veritate”, 24, 7.

2 Exercícios espirituais, Anotações, 2, 4.