· Cidade do Vaticano ·

É preciso ter a coragem de sonhar com uma economia diversa, ao serviço de todos

-S.S. Francesco-Visita al Cimitero austro-ungarico di Fogliano  13-09-2014 - (Copyright ...
09 março 2023

Apresentamos amplos excertos da entrevista do Papa Francisco ao semanário católico belga «Tertio», publicada a 28 de fevereiro.

«Tertio» já tivera o privilégio de entrevistar longamente o Papa Francisco a 17 de novembro de 2016. A razão dessa entrevista fora, por um lado, o centenário da primeira guerra mundial e, por outro, os ataques terroristas em Paris em novembro de 2015 e em Bruxelas a 22 de março de 2016. Seis anos mais tarde, pareceu apropriado pedir outra entrevista, desta vez por ocasião do 10º aniversário do seu pontificado, a 13 de março de 2023... A nova entrevista foi marcada para 19 de dezembro de 2022, dois dias após o 86º aniversário do Papa Francisco e no dia seguinte à vitória da Argentina no Campeonato mundial de futebol. Saudamos o Papa transmitindo-lhe duplos parabéns... Uma vez testados os microfones para a gravação, a entrevista pôde começar.

Um fio condutor para compreender o seu pontificado é o Concílio Vaticano ii . Por que a implementação contínua desse Concílio lhe é tão cara? O que está em questão?

Os historiadores dizem que é preciso um século para que as decisões de um Concílio produzam pleno efeito e sejam implementadas. Ainda temos 40 anos pela frente... Estou tão preocupado com o Concílio porque esse acontecimento foi, com efeito, uma visita de Deus à sua Igreja. O Concílio foi um daqueles acontecimentos que Deus realiza na história através de pessoas santas. Talvez quando João xxiii o convocou, ninguém se apercebeu do que iria acontecer. Diz-se que ele mesmo pensou que se teria concluído num mês, mas um cardeal reagiu dizendo: “Comece a comprar os móveis e o resto, levará anos”. João xxiii considerou isto, era um homem aberto aos apelos do Senhor. É assim que Deus fala ao seu povo. E ali falou-nos realmente. O Concílio não implicava só uma renovação da Igreja. Não era apenas uma questão de renovação, mas também um desafio para tornar a Igreja cada vez mais viva. O Concílio não renova, ele rejuvenesce a Igreja. A Igreja é uma mãe que vai sempre em frente. O Concílio abriu a porta para uma maior maturidade, mais em sintonia com os sinais dos tempos. A Lumen gentium, por exemplo, a constituição dogmática sobre a Igreja, é um dos documentos mais tradicionais e ao mesmo tempo mais modernos, porque na estrutura da Igreja, o tradicional — quando é bem compreendido — é sempre moderno. Isto porque a tradição continua a desenvolver-se e a crescer.

Como afirmou o monge francês Vincent de Lérins no século v , os dogmas devem continuar a desenvolver-se, mas segundo esta metodologia: «Ut annis scilicet consolidationtur, dilatetur tempore, sublimetur aetate» («Progride consolidando-se com os anos, desenvolvendo-se com o tempo, sublimando com a idade»). Ou seja: a partir da raiz, continuamos sempre a crescer. O Concílio deu este passo em frente, sem cortar a raiz, porque não se pode fazer se se quiser produzir fruto. O Concílio é a voz da Igreja para o nosso tempo e estamos agora no primeiro século em que o pomos em prática.

É uma imagem estranha: a Igreja é como uma mãe que não envelhece, mas que fica cada vez mais jovem...

Incrível de facto, mas a Igreja é assim. Ela rejuvenesce sem perder a sua sabedoria secular.

A contínua implementação e realização do Concílio inclui o encorajamento da sinodalidade. O que significa isto concretamente?

Há um ponto que não deve ser perdido de vista. No final do Concílio, Paulo vi ficou muito impressionado ao ver que a Igreja Ocidental tinha quase perdido a sua dimensão sinodal, enquanto as Igrejas católicas orientais souberam preservá-la. Assim, anunciou a criação da secretaria do sínodo dos bispos, a fim de promover novamente a sinodalidade na Igreja. Ao longo dos últimos sessenta anos, ela desenvolveu-se cada vez mais. Gradualmente, algumas coisas foram esclarecidas. Por exemplo, se apenas os bispos tinham o direito de voto. Por vezes não era claro se as mulheres podiam votar... No último sínodo sobre a Amazónia, em outubro de 2019, houve uma maturação a este respeito. Ocorreu então um facto particular. Quando um sínodo termina, perguntam àqueles que nele participaram e a todos os bispos do mundo que tema gostariam de ver na ordem do dia do próximo sínodo. O primeiro tema mencionado foi o sacerdócio, depois a sinodalidade. Evidentemente, era um tema comum que todos os bispos julgavam que era tempo de abordar. Por ocasião do cinquentenário desse órgão permanente do sínodo dos bispos, alguns teólogos já tinham traçado o seu balanço num documento. Viemos de longe, agora estamos aqui e temos de seguir em frente. É isto que fazemos através do atual processo sinodal, e os dois sínodos sobre a sinodalidade ajudar-nos-ão a esclarecer o significado e o método do processo decisório na Igreja.

É importante afirmar claramente que um sínodo não é um parlamento. Um sínodo não é uma sondagem de opinião à esquerda e à direita. Não. O principal protagonista de um sínodo é o Espírito Santo. Se o Espírito Santo não estiver presente, não pode haver sínodo...

Durante a nossa entrevista anterior em 2016, Vossa Santidade evocou a terceira guerra mundial que estamos a viver em pedaços. Hoje a situação não melhorou, na verdade piorou, com mais guerras ainda como a da Ucrânia. Que papel pode desempenhar a diplomacia do Vaticano?

O Vaticano preocupa-se muito com este conflito desde o primeiro momento. No dia seguinte ao início da invasão, fui pessoalmente à embaixada russa. Algo que nunca tinha sido feito por um papa e que um papa normalmente não faz. Manifestei também a minha vontade de ir a Moscovo e assegurar-me de que o conflito não iria continuar. Desde o seu início até hoje, o Vaticano está sempre no centro da ação. Vários cardeais já foram à Ucrânia, o cardeal Konrad Krajewski, foi lá seis vezes para ajudar o povo ucraniano. Ao mesmo tempo, não deixamos de falar com o povo russo para fazer algo.

Esta guerra é terrível, é uma atrocidade imensa. Há ali muitos mercenários a combater. Alguns são muito cruéis, muito cruéis. Há tortura; as crianças são torturadas. Muitas crianças que estão na Itália com as suas mães, que são refugiadas, vieram visitar-me. Eu nunca vi uma criança ucraniana rir. Por que estas crianças não riem? O que viram elas? É aterrador, realmente aterrador. Estas pessoas estão a sofrer, a sofrer com a agressão. Estou em contacto com vários ucranianos. O presidente Volodymyr Zelensky enviou várias delegações para falarem comigo.

Daqui fazemos o que podemos para ajudar a população. Mas o sofrimento é muito grande. Lembro-me do que os meus pais me costumavam dizer: “A guerra é uma loucura”. Não há outra definição. Sentimo-nos muito envolvidos nesta guerra porque se verifica perto de nós. Mas há anos que existem guerras no mundo às quais não prestamos atenção: Myanmar, Síria — já há 13 anos de guerra — Iémen, onde as crianças não recebem educação nem pão, passam fome... Por outras palavras: o mundo está, de facto, sempre em guerra. Há uma coisa que deve ser denunciada: é a grande indústria dos armamentos. É o comércio das armas. Quando um país rico começa a enfraquecer, diz-se que precisa de uma guerra para continuar e tornar-se ainda mais forte. E as armas preparam-se para isto. Há o comércio de armas. Livram-se de todas as armas velhas que têm e procuram novas armas. É terrível. Diz-se — não sei se é verdade — que a guerra vivil espanhola serviu para testar armas para a segunda guerra mundial. Não sei se é verdade, mas as armas são sempre testadas, não é verdade? É a indústria da destruição, a indústria da guerra, de um mundo em guerra. Em cerca de um século, vivemos três grandes guerras mundiais: a de 1914-1918, a guerra de 1939-1945, e a guerra atual, que é também uma guerra mundial, na qual os países ricos estão a renovar as próprias armas.

Quando fui à cidade italiana de Redipuglia para o centenário da primeira guerra mundial, uma das minhas primeiras viagens como Papa em 2014, vi todas aquelas sepulturas. E chorei. Chorei. A minha avó viveu aquela guerra e contou-me coisas que me ficaram na memória. A 2 de novembro vou sempre a um cemitério. Assim, há alguns anos, fui ao cemitério de Anzio, perto de Roma, para a comemoração de todos os fiéis defuntos, e vi as sepulturas e as idades dos rapazes: 18, 19, 20 anos... Também lá, não consegui conter as lágrimas. Porquê esta loucura para aqueles rapazes? Quando alguns líderes governamentais organizaram um ato de comemoração do aniversário dos desembarques na Normandia, pensei na crueldade daquele desembarque, porque os nazis esperavam-no. Eles sabiam. De acordo com os números, 30.000 jovens morreram naquela praia. Pensei nas mães. O carteiro bate à porta e entrega uma carta. Abrem-na e leem: “Senhora, temos a honra de informar que tem um filho um herói”. A sua reação é: “Tive um filho, eles mataram-no”. Cada guerra é um fracasso. Não se aprende com ela. E agora que estamos a viver outra de perto, é de esperar, se Deus quiser, que finalmente aprendamos uma lição... Tudo começou com Caim e Abel, e continua ainda e ainda. Para mim é muito doloroso, muito doloroso, e não posso estar de um lado ou do outro, a guerra é um mal em si.

Na Bélgica também estamos muito preocupados com a guerra e a violência na República Democrática do Congo.

Lembro-me que quando o rei Baudouin estava lá para proclamar a independência, a sua espada foi-lhe retirada, não foi? Foi uma ação simbólica. Sim, violência em Goma, no nordeste do Congo, onde há a guerrilha ruandesa. Guerras semelhantes têm sido travadas há anos, mas ignoramo-las. Vemos a Ucrânia porque está perto. A guerra é uma loucura, é suicídio, é autodestruição. Paz, por favor, paz!

Nos nossos países — com um clero em diminuição e menos fiéis — a liderança da Igreja tende a concentrar-se na liturgia e no anúncio. Não deveria a Igreja preferir mostrar a sua face social e profética se quiser ser relevante hoje?

Não posso contrapor estas missões. Não são contraditórias. Oração, adoração e culto não significa retirar-se na sacristia. Não é correto. Uma Igreja que não celebra a Eucaristia não é uma Igreja. Mas também não é uma Igreja que se esconde na sacristia. Esconder-se na sacristia não é um culto adequado. A celebração da Eucaristia tem consequências. Há o partir do pão. Isto implica uma obrigação social, a obrigação de cuidar dos outros. Oração e compromisso andam de mãos dadas. Adoração a Deus e serviço aos nossos irmãos e irmãs caminham juntos, porque em cada irmão e irmã vemos Jesus Cristo.

Atenção, o compromisso social da Igreja é uma reação, uma consequência do culto. Portanto, este compromisso não deve ser confundido com a ação filantrópica que até um não-crente pode realizar. A ação social da Igreja deriva do seu ser, porque nela reconhece Jesus. É tão forte que constitui até o metro de base com o qual, como nos diz Jesus, seremos julgados. Segundo Mateus, capítulo 25, ouviremos esta medida da nossa caridade durante o Juízo final: «Tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber; estive na prisão e viestes visitar-me; estive doente e curastes-me...». Todas estas são ações sociais, mas não são realizadas por obrigação ou dever social, mas porque Jesus está presente nelas. No entanto, nunca reconhecerei Jesus se não o reconhecer também na adoração e no culto. Os dois andam juntos. Eles têm de estar unidos. Uma Igreja puramente cultual não é uma Igreja, nem é uma Igreja puramente “social”, por assim dizer...

O cuidado dos jovens e dos idosos é-lhe muito querido, porque correm o risco de não contar verdadeiramente numa cultura do descarte...

Coisas muito belas acontecem no diálogo entre as diferentes gerações. O profeta Joel escreveu uma frase magnífica a este propósito: «os vossos filhos e filhas profetizarão; os vossos anciãos terão sonhos, os vossos jovens terão visões» (3, 1). E então os jovens e os idosos encontrar-se-ão. Os idosos não devem ser mantidos num armazém ou num museu, mas devem poder continuar a dar à sociedade o que têm dentro. A pessoa idosa tem uma missão. Temos de cuidar do idoso como de uma joia. Mesmo que já não tenha boa saúde ou se já não estiver completamente consciente, devemos cuidar dele como de uma joia, porque essa pessoa, esse homem ou mulher, deu-nos a vida. Por isso, temos de cuidar dele.

E os jovens não estão aqui para serem mimados sem serem incomodados. Temos de os ajudar a crescer em sabedoria. Por conseguinte, o encontro entre jovens e idosos é profético. Já experimentei isto muitas vezes com os jovens. Lembro-me, por exemplo, de uma atividade em que propusemos a alguns jovens tocar violão num lar de idosos. “Que chatice, que coisa aborrecida!”. “Vamos de qualquer maneira”. E depois já não queriam ir embora, começaram a cantar e o diálogo com os idosos começou. Esses jovens descobriram algo nos mais velhos. Os idosos sabem como falar, sabem onde está o problema. Um dos jovens disse-me que passou por um período muito complicado na vida e que percorreu caminhos difíceis, incluindo a toxicodependência; muito triste. A família não se apercebeu disso. Ele sabia como o esconder. Contudo, a sua avó deu-se conta e disse-lhe suavemente: “Espero por ti. Quando quiseres, estou aqui. Apoio-te, gosto de ti”. A avó deu-lhe alguma esperança para que, quando voltasse, não se sentisse como um débil. Os avós são a memória que transmite o conhecimento. E pôr os jovens em contacto com os avós é semear a vida, é semear o futuro. Temos de os valorizar. Não são materiais para serem deitados fora, nem os jovens o são. “Deixai que façam o que quiserem”: equivale a abandoná-los à própria sorte, excluindo-os das nossas vidas por conveniência. Cuidai de ambos, jovens e idosos, e fazei-os encontrar. Aquele versículo de Joel é muito bonito. Quero mostrar-vos algo, apenas um instante... [o Papa chamou um porteiro e pediu-lhe que fosse procurar uma fotografia tirada durante a sua visita à Roménia, a 1 de junho de 2019, n.d.r.].

Quando entrei na praça principal de Iaşi, para conhecer famílias e jovens, estava cheia de gente. Vi uma idosa a mostrar-me um bebé de cerca de dois meses, sorridente, como se dissesse: “Esta é a minha esperança”, “vê, agora posso sonhar”. Fiquei comovido. Naquele momento, fiquei tão comovido que não lhe pude dizer: “Venha comigo, senhora, para que o possamos mostrar a todos”. Mas no final do meu discurso, contei essa história e disse que os avós sonham quando veem os netos progredir e que os netos ganham coragem quando podem apoiar-se na raiz dos avós. Espontaneamente, disse: “Pena que não tiramos uma fotografia”. Mas o fotógrafo respondeu que tendo visto o meu entusiasmo tinha tirado a fotografia. Aqui está a fotografia com a história no verso. Significa muito para mim. Uma idosa com uma criança, dizendo: “Esta é a minha força”. “Este é o meu futuro”. E a criança pode dizer: “Esta é a minha força”. Esta fotografia é um símbolo da ligação entre avós e netos. É importante que as crianças tenham contacto com os avós, muito importante.

Que mensagem tem para todos os agentes sanitários que dão o melhor em circunstâncias muitas vezes difíceis?

Desempenham uma função importante, um trabalho muito digno, muito digno. E também necessário. Se este trabalho for vivido como uma vocação, com ternura, é muito digno. É tão triste que algumas casas de repouso adotem uma linha demasiado comercial, o que resulta na perda da ternura. Quando eu era bispo em Buenos Aires, gostava de ir celebrar a Eucaristia em lares de idosos. Assegurava-me de ter sempre tempo suficiente, por isso falava com todos e só depois celebrava a Missa. Lembro-me de certa vez — alguns vão ficar zangados por eu estar a contar esta história, mas conto-a à mesma — quando chegou a hora da Comunhão alguém disse: “Se alguém quiser comungar, levante a mão”, e eu passava na frente deles para que não precisassem de se levantar. Claro que todos levantaram a mão. Havia uma senhora a quem dei a comunhão que pegou na minha mão e disse: “Obrigado, padre, sou judia”. Eu respondi: “Bem, este que te dei também era judeu, não era?” (risos). O idoso procura companheirismo, proximidade e contacto, que transcende a fé religiosa. Aos bispos digo: “Ide a lares de idosos, visitai os anciãos”.

O modelo de mercado neoliberal atingiu os seus limites. De que maneira oferece uma alternativa a “economia de Francisco”?

Em primeiro lugar, a doutrina social da Igreja — desde o Papa Leão xiii até aos dias de hoje — pode inspirar. Este ensino analisa questões económicas a partir do Evangelho. Com o jornalista Austen Ivereigh, escrevi um livro que lhe oferecerei: Let us dream [Voltemos a sonhar]. Com efeito, devemos ter a coragem de sonhar, de sonhar inclusive com economias que não sejam puramente liberais... Temos de ser cautelosos com a economia: se se concentrar demasiado apenas nas finanças, em meras figuras que não têm entidades reais por trás delas, então a economia pulveriza-se e pode levar a uma séria traição. Há pessoas extraordinárias a repensar a economia neste momento, entre elas algumas mulheres. As mulheres são génios criativos. Menciono-as nesse livro. A economia deve ser uma economia social. À expressão “economia de mercado”, João Paulo ii acrescentou “social”, uma economia social de mercado. É preciso ter sempre em mente o social.

Neste momento, sem dúvida a crise económica é grave, a crise é terrível. A maioria das pessoas no mundo — a maioria — não tem o suficiente para comer, não tem o suficiente para viver. A riqueza está nas mãos de poucas pessoas que dirigem grandes empresas, que por vezes são propensas à exploração. Na Argentina tivemos uma bela experiência que nos chegou da Bélgica, das Flandres. [Alguns empresários] instalaram-se na Argentina com a doutrina social da Igreja como ponto de referência. Na Flandria — era o nome da empresa têxtil da qual eram proprietários — os próprios trabalhadores partilhavam os dividendos. Foi um enorme passo em frente que vós, belgas, destes. Na Argentina seria uma boa ideia reexaminar o que lá aconteceu. Estou a falar das décadas de 1940 e 1950. Portanto é possível, e em harmonia. Jules Steverlinck era o responsável da Flandria, certo? A cerca de 70 quilómetros de Buenos Aires. Por conseguinte, tal economia social é possível e tive um exemplo dela precisamente graças a vós, belgas. Sim. A economia deve ser sempre social, ao serviço do social.

Com três jornalistas holandeses tomei a iniciativa de lhe escrever uma carta aberta por ocasião da canonização, a 15 de maio de 2022, do carmelita holandês Titus Brandsma. Pedimos-lhe que proclame Titus Brandsma, muito comprometido no jornalismo, padroeiro dos jornalistas. O nosso pedido tem alguma possibilidade de ser considerado?

Sim, concordo. Concordo plenamente com esta proposta. Há outro santo que pode ser proposto para o efeito, que também morreu num campo de concentração. No entanto, tenciono contactar o Dicastério para as causas dos santos para ver o que pode ser feito. Seria, de qualquer modo, um prazer para mim. E gostaria também de aproveitar esta oportunidade para agradecer, através de vós, a todos os jornalistas pelo vosso trabalho. É uma profissão nobre: transmitir a verdade. Mas, ao mesmo tempo, peço-vos que tomeis cuidado com os quatro pecados dos jornalistas. Sabe quais são?

Não. Vossa Santidade mencionou-os na nossa entrevista anterior, mas não os saberia enumerar agora.

A desinformação — relatar apenas uma parte e não o todo — a calúnia, a difamação — que não são a mesma coisa — e a coprofilia, que é a busca de coisas “sujas” que suscitam escândalo e chamam a atenção.

E em relação a estes vícios, quais são as virtudes de um bom jornalista?

As qualidades de um jornalista são a escuta, a tradução e a transmissão, porque é necessário traduzir sempre, certo? Mas antes de mais, ouvir... Há jornalistas que são brilhantes porque dizem claramente: “Eu ouvi, disse isto, apesar de eu pensar o contrário”. Assim joga-se bem, mas não se deve dizer: “Disse isto”, mesmo que não seja o que foi dito. Escutai, relatai a mensagem e depois criticai. Os jornalistas desempenham um trabalho formidável.

Emmanuel Van Lierde