Voltámos a cantar. Com os cantos do Congo e do Sudão do Sul ainda nos ouvidos, ou seja, no coração. Recordar isto significa: trazer no coração. Na memória desta longa viagem dividida entre dois países, a primeira recordação que permanece e resiste é o canto.
Diferentes os cantos do Congo e do Sudão do Sul (fruto de histórias diferentes), mas ambos brotam de onde menos se esperaria; são “cantos na noite”, como disse o Papa na homilia de domingo de manhã, perante quase cem mil pessoas reunidas em Juba e dedicada ao anúncio de Cristo crucificado e ressuscitado, que é «anúncio de esperança: na verdade, Ele conhece as angústias e os anseios que trazeis no coração, as alegrias e as canseiras que marcam a vossa vida, as trevas que vos oprimem e a fé que elevais ao Céu como um cântico na noite. Jesus conhece-vos e ama-vos; se permanecermos n’Ele, não devemos temer, porque, também para nós, cada cruz se há de transformar em ressurreição, cada tristeza em esperança, cada lamento em dança».
Canções e danças: vimos dois povos a cantar e a dançar, não obstante vivam à sombra de uma noite que parece nunca chegar a uma madrugada que ainda está longe.
Dois povos, dois rios. Nos seus discursos, o Papa voltou frequentemente à imagem dos dois grandes rios que marcam e de alguma forma “geram” a terra do Congo e a do Sudão do Sul, o rio Congo e o “grande pai” Nilo. No seu discurso ao clero do Sudão do Sul, na catedral de Juba, o Papa Francisco refletiu sobre esta ligação entre canções e rios, e falando do Nilo, observou: «no leito deste curso de água, vertem-se as lágrimas de um povo imerso no sofrimento e na dor, torturado pela violência; um povo que pode rezar como o salmista: “Junto aos rios de Babilónia nos sentamos a chorar” (Sl 137, 1). De facto, as águas do grande rio recolhem os dolorosos gemidos das vossas comunidades, recolhem o grito de dor de tantas vidas destroçadas, recolhem o drama de um povo em fuga, a aflição do coração das mulheres e o medo gravado nos olhos das crianças».
Ao contrário, estes dois povos, durante estes dias, ao longo de todas as estradas percorridas pelo Papa, cantaram, acompanhando a sua visita com uma alegria espontânea e transbordante. A felicidade de receber a visita do bispo de Roma suscitou um efeito de restituição generosa e sem limites. Cantar é em si um gesto generoso, que, embora exija mais esforço do que falar, é muitas vezes executado naturalmente por cada pessoa, pois até quando assobiamos uma música enquanto caminhamos, cantamos enquanto “somos cantados” (“canta-me, ó Diva”), como sob uma inspiração, algo maior que nos precede, vem ao nosso encontro e nos arrasta.
Talvez então seja a generosidade, ou melhor, a desproporção que, paradoxalmente, pode ser a medida útil para um primeiro balanço, imediato, desta 40ª viagem tão importante do Papa Francisco à África. Deste ponto de vista, a imagem que pode efetivamente fazer uma síntese da viagem é a da criança que estende a mão ao Papa para lhe dar dinheiro enrolado: aquela criança, dando todo o pouco que possui, entoou, divinamente, a sua canção.
Andrea Monda