A espiritualidade
«Praticar a espiritualidade do encontro: isto é essencial para viver a sinodalidade na Igreja», disse o Papa aos membros do Conselho primacial da Confederação dos cónegos regulares de Santo Agostinho, recebidos em audiência na manhã de 13 de janeiro na Biblioteca particular.
Prezados irmãos, bom dia e bem-vindos!
Tenho o prazer de vos dar as boas-vindas por ocasião da vossa reunião de Conselho primacial. Saúdo-o, padre Abade primaz, e agradeço-lhe as suas palavras, assim como a vós, Superiores-gerais e padre Secretário.
A vossa Confederação foi criada em 1959 por São João xxiii . Esta estrutura, embora não seja de tipo jurídico, é importante para fomentar a comunhão entre as Congregações que a compõem e compartilham o mesmo carisma. Com efeito, os principais objetivos da Confederação são unir os vários ramos da vossa Ordem num vínculo de caridade, valorizar o significado evangélico do vosso carisma e ajudar-vos uns aos outros, especialmente no que se refere à dimensão espiritual, à formação dos jovens, à formação permanente e à promoção da cultura.
Embora cada Congregação goze da própria autonomia, isto não impede que os Estatutos confederados prevejam competências que favoreçam um equilíbrio entre esta autonomia e uma oportuna coordenação que evite sempre a independência e o isolamento. O isolamento é perigoso. É preciso prestar muita atenção para se preservar da doença da autorreferencialidade e para conservar a comunhão entre as várias Congregações como um verdadeiro tesouro. Bem sabeis que estais todos no mesmo barco e que «ninguém constrói o futuro isolando-se ou apenas com as próprias forças, mas reconhecendo-se na verdade de uma comunhão sempre aberta ao encontro, ao diálogo, à escuta e à ajuda mútua» (Carta a todos os consagrados por ocasião do Ano da vida consagrada, 21 de novembro de 2014, ii , 3). Praticar a espiritualidade do encontro: isto é essencial para viver a sinodalidade na Igreja.
Como qualquer outra forma de vida consagrada, também a vossa deve adaptar-se às circunstâncias do tempo, dos vários lugares onde estais presentes e das culturas, sempre à luz do Evangelho e do próprio carisma. A vida consagrada é como a água, se não flui, estagna, perde sentido, é como o sal que perde sabor, torna-se inútil (cf. Mt 5, 13). A boa memória é fecunda, é a memória “deuteronómica” das raízes, das origens. Não podemos contentar-nos com uma memória arqueológica, porque ela nos transforma em peças de museu, talvez dignas de admiração mas não de imitação; ao contrário, a memória deuteronómica ajuda-nos a viver o presente plenamente e sem medo, para nos abrirmos ao futuro com esperança renovada. Também vós — como escreveu São João Paulo ii — «tendes uma história gloriosa a recordar e narrar», mas tendes acima de tudo «uma grande história a construir! Olhai para o futuro, no qual o Espírito vos projeta a fim de realizar convosco ainda grandes coisas» (Exortação Apostólica Vita consecrata, 25 de março de 1996, 110).
A regra fundamental da vida religiosa é o seguimento de Cristo, proposto pelo Evangelho. Assumir o Evangelho como regra de vida, a ponto de poder dizer com São Paulo: «Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim!» (Gl 2, 20). Que o Evangelho seja o vosso vade-mécum, de tal modo que, mantendo-vos afastados da tentação de o reduzir a ideologia, ele permaneça sempre espírito e vida para vós. O Evangelho leva-nos constantemente a pôr Cristo no centro da nossa vida e missão. Restitui-nos ao “primeiro amor”. E amar Cristo significa amar a Igreja, seu corpo. A vida consagrada nasce na Igreja, cresce com a Igreja e dá frutos como Igreja. E como Santo Agostinho nos ensina, é na Igreja que descobrimos o Cristo total!
Deus fez-nos para si e o nosso coração está inquieto enquanto não repousa n’Ele (cf. Santo Agostinho, Confissões, 1, 1, 1). Portanto, como Cónegos regulares, a vossa principal ocupação é a busca constante e diária do Senhor. Procurá-lo na vida comunitária, reflexo do ser de Deus e da sua exortação e testemunho de que «Deus é amor» (1 Jo 4, 8.16). Que a koinonia vos faça sentir todos construtores, tecelões de fraternidade. Procurar o Senhor na leitura assídua da Sagrada Escritura, em cujas páginas ressoam Cristo e a Igreja (cf. Santo Agostinho, Disc. 46, 33). Procurar o Senhor na liturgia, especialmente na Eucaristia, ápice da vida cristã, que significa e realiza a unidade da Igreja na harmonia da caridade (Conc. Vat. ii , Const. dogm. Dei Verbum, 25). Procurá-lo no estudo e no trabalho pastoral comum. Procurá-lo também nas realidades do nosso tempo, cientes de que nada do que é humano nos pode ser alheio e que, livres de toda a mundanidade, podemos animar o mundo com o fermento do Reino de Deus. São estes os diferentes percursos de uma única busca, que pressupõe o caminho da interioridade, do conhecimento e do amor do Senhor, na escola de Santo Agostinho: «Não saias de ti mesmo, entra constantemente em ti; a verdade habita o homem interior» (cf. De Vera Religione, 39, 72; Confissões, 3, 6, 11). Deste modo, a luz do Mestre interior ilumina para nós as realidades temporais.
Caros irmãos, que este tempo de encontro entre vós e com o Sucessor de Pedro vos ajude a revisitar o vosso carisma e a fortalecer a comunhão de vida segundo o exemplo da comunidade apostólica primitiva (cf. At 2, 42-47). E esta comunhão é também antecipação da união plena e definitiva em Deus e caminho para ela.
Agradeço-vos a vossa presença e testemunho na Igreja. Que Nossa Senhora vos ampare e interceda por vós! Abençoo-vos de coração, bem como as vossas comunidades. E peço-vos, por favor, que oreis por mim!